domingo, 4 de dezembro de 2011

Apanhando nuvem

"Presidente da Federação deveria ter chamado presidentes de Benfica e Sporting e colocado água na fervura


1. (...)


2. O Benfica, ao perder na Madeira, disse adeus, mais uma vez, à Taça de Portugal. E concentra-se, necessariamente, na nossa Liga e na Liga dos Campeões. Mas, sem esquecermos a Taça da Liga que, obviamente, deve ser encarada com uma opção menor. Numa época que antecede um Europeu - onde, por sorteio nos calhou o verdadeiro grupo da morte - e em que são relevantes os euros a arrecadar, é imperioso que o Benfica vá o mais longe possível na Liga que gera milhões e consiga, uma vez mais e em meados de Maio de 2012, a entrada directa na fase de grupos da próxima Liga dos Campeões. Nestes tempos em que a Alemanha quer conseguir, à força, uma união orçamental, é essencial que, no futebol, nos concentremos no essencial. E o essencial, nestes tempos complexos, são os euros! E sabendo que, no Euro 2012, o primeiro jogo de Portugal vai ser contra a selecção que quer dominar o euro (moeda).


3. O rescaldo (termo rigoroso, pelo que se viu e sabe) dos actos de vandalismo registados no final do Benfica-Sporting estão sob investigação das autoridades policiais. Na realidade, como resulta com clareza meridiana das imagens divulgadas, o incêndio que foi deflagrado no sector do Estádio da Luz delimitado pelo espaço de protecção conformou a prática de um crime público de fogo posto e, como tal, merece acção conforme das polícias. E passados já os dias necessários para arrefecer ânimos e restituir ponderação e bom senso a esta discussão, importa reflectir sobre três questões que os factos em causa evidenciam: a violência associada ao futebol e ao desporto tem de ser ferozmente combatida com medidas eficazes; manifestamente, o ordenamento jurídico nacional, embora se suporte no rigor de outros, são tem propiciado resposta mínimas e não há jogo importante em que episódios desta natureza não ecludam; não se podem confundir grupos de energúmenos com claques, embora estas, por vezes conscientemente, lhes dêem guarida, nem se podem confundir adeptos dos clubes com as respectivas claques, embora as direcções por vezes cuidem mais destas do que daqueles. Exemplo paradigmático de combate à violência no desporto é a Inglaterra. Porque não assumir claramente o registo das identificações dos adeptos violentos, afastando-os dos estádios através da medida de segurança de apresentação coerciva nas esquadras à hora dos jogos sobre pena de prisão por desobediência qualificada? Este o segredo inglês. A lei portuguesa não o permite com esta simplicidade? Altere-se a lei. E, sobretudo, as estruturas organizativas (ou, perante a sua omissão, o Estado) têm de impor aos dirigentes desportivos em redobrado cuidado com o que dizem e com a forma como actuam.


4. Ainda sobre esta matéria, permitem uma reflexão que está para além do que a agenda mediática preencheu. Vozes credíveis permitem-me assumir que, no Estádio da Luz, se viram casais com camisolas e outros símbolos de ambos os clubes, famílias muiticolores, amigos e grupos de amigos verdes e vermelhos, muitos sportinguistas nos cativos da Luz, muita boa e sã confraternização. Isso foi o que se viu. Neste, como em todos os dérbies. São sempre jogos quentes, de muita rivalidade, vivida em conjunto, entre famílias e amigos que abraçaram as diferentes cores e convivem com elas na alegria do desporto. O resto - o que é mediático - são epifenómenos de marginalidade que bordejam os casos de polícia.


5. Faço, no entanto, votos que tudo isto serene e se consigam extrair lições e ensinamentos. E a primeira entidade que, neste caso, deveria ter intervindo seria o presidente da Federação, chamando ambos os presidentes e pondo a necessária água na fervura. Caso se revelassem infrutíferas as duas diligências, o Governo não poderia deixar de intervir. Em causa não está a autonomia - exigível e constitucionalmente consagrada - do movimento associativo. Em causa, enfim, está a diferença entre o mau perder e o não saber ganhar. Se os clubes não a percebem, que a Federação se imponha. Se a Federação não sabe, ou não logra, impor-se, que se imponha a Administração.


6. (...)"


Fernando Seara, in A Bola

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