sexta-feira, 7 de outubro de 2011

A ridícula 'febre' dos números

"Foi o presidente norte-americano Franklin Delano Roosevelt que, no período do 'new deal', criou a figura de referência dos '100 dias de governação', a qual, desde então e sobretudo depois da Segunda Guerra Mundial, nunca mais deixou de fazer carreira na prática dos governos democráticos que gostam de prestar contas. Portugal, desde o 25 de Abril, não tem sido excepção a esta regra. O pior é que esta 'febre' numérica e estatística se transmitiu ao mundo do Futebol, por vezes de forma ridícula. Durante as transmissões televisivas e radiofónicas de jogos, em que é sempre preciso arranjar assunto para preencher os tempos mortos, ficamos a saber que o guarda-redes X ou Y está há 873 minutos sem sofrer golos, que o defesa K ou W está há mil minutos a jogar sem descontinuidade na condição de titular ou que um qualquer ponta-de-lança está há 1.500 minutos sem conseguir marcar. O poder do ouvinte-espectador é assim obrigado a recorrer à calculadora do telemóvel para conseguir trocar esses números arredondados por jogos, tarefa de estatística que está longe de ser fácil, mas que sempre ajuda a justificar a contratação de 'especialistas' para apoiarem o que verdadeiramente conta, ou seja, a informação que é relevante.

Este exibicionismo numérico e estatístico torna-se até irritante, se dermos por nós a pensar na forma como nos distrai do que verdadeiramente importa. Por este andar, teremos em breve jogadores a fazer a festa dos dois mil minutos de titularidade, dos 10 mil minutos na baliza ou dos cinco mil minutos sem sair do banco. Se tal acontecer, fará lembrar os artistas que passam a vida a comemorar os mesmos anos de carreira, como se o tempo não passasse por eles e por nós e tudo se resumisse e efemérides e operações de 'marketing'. Felizmente que a vida é muito mais feita com pessoas do que com números, queira ou não queira a 'troika' a quem executa as suas ordens imperativas."


José Jorge Letria, in O Benfica

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