quinta-feira, 21 de julho de 2011

A 'incorrecção' de juntar futebol e crise (II)

"As dificuldades por que passa Portugal (e o Mundo) deveriam conduzir quem decide a ser prudente e parcimonioso. No futebol, a cultura dominante é a de que vale tudo, desde que se ganhe. E, ao invés, de que nada vale, quando se perde. A única métrica é a do marcador. Tal constatação leva a que a ponderação das decisões e sentido de responsabilidade se desvalorizem como factores de avaliação de uma gestão desportiva.

Um facto é objectivamente irrefutável: este modo de agir constitui uma fuga para a frente. Perigosa fuga, quando se sabe que, nos próximos anos, o retorno dos dinheiros gastos será mais difícil ou impossível. As receitas com publicidade e merchandising vão recuar, o acesso à banca é mais difícil e mais caro, a diminuição do rendimento disponível das famílias vai manifestar-se numa menor receita de bilheteira e de quotas de associado e - mais grave - atravessa-se a pior altura para negociar direitos televisivos, por sua vez suportados por publicidade que se retrai.

Os clubes são instituições que sobrevivem como os Estados: acumulando dívida e passivo ou antecipando proveitos futuros. Repercutem para a frente os gastos de hoje. Com uma diferença: não podem cobrar... impostos!

Esta é uma crise que nem sequer tem levado a um pacto de contenção entre clubes. Pelo contrário: a ideia é vencer, no mercado, o opositor, custe o que custar e a quem custar. Ao que sei, da fartura dos quase trinta jogadores que os três grandes contrataram, não há um único português (apenas Michael para não jogar e Eduardo por empréstimo). Apenas magotes de jogadores banalíssimos por milhões. Iguais ou piores que muitos dos que cá nasceram. Mas que, na onda da crise, dão sempre azo a comissões e outras prebendas sem crise."


Bagão Félix, in A Bola

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