sexta-feira, 24 de maio de 2024
Análise...
Entrevista a Rui Costa dissecada. Podem ouvir aqui https://t.co/EPrJ6ZGAMf
— O Fura-Redes (@OFuraRedes) May 23, 2024
Dez perguntas difíceis para Rui Costa
"O presidente do Benfica estará esta quinta-feira a responder a questões colocadas por um grupo de jornalistas selecionado pelo clube. O zerozero não foi convidado para o evento: primeiro, lamento profundamente esta falta de respeito; segundo, peço desculpas aos nossos muitos milhares de leitores diários por não os informar como pretendia.
Rui Costa apresentará as explicações possíveis para o annus horribilis do futebol profissional das águias. Uma tarefa condenada ao insucesso, atrevo-me a antecipar.
É difícil pensar em atenuantes, quando o amontoado de erros é tão categórico. Da construção irrealista do plantel, à comunicação absolutamente desastrada, pouco há a salvar deste 23/24 para os lados da luz. Se fracassar é não cumprir objetivos, Rui Costa fracassou em todo o esplendor.
Seja como for, aplaudo a aparição pública do líder da direção. É um dever dos responsáveis desportivos esclarecerem os sócios e adeptos, principalmente nos maus momentos. Sem esta gente, sem o povo encarnado, o Benfica não existe.
Rui Costa não dirá tudo o que diria se entrevistado noutras circunstâncias. Não deixará de ser interessante, ainda assim, tal a complexidade atual no mundo do clube.
O zerozero teria o maior gosto em questionar Rui Costa. Não sendo possível, por única e exclusiva responsabilidade das águias, deixo dez sugestões para perguntas a colocar ao antigo número 10.
1. Roger Schmidt: perante tamanha contestação dos adeptos, o desejo continua a passar pela continuidade do alemão? Não é esse um risco passível de contagiar negativamente já a época 24/25?
2. Ainda Roger Schmidt: além do alemão, profissional experiente, quem têm sido os responsáveis pela estratégica comunicacional do treinador – Rui Costa revê-se nas palavras e no discurso de Schmidt, nomeadamente no que afirmou depois do 5-0 no Dragão?
3. O lado esquerdo da defesa: quais os motivos para as contratações de Jurasek (14 milhões) e Juan Bernat (emprestado e lesionado toda a época), dois laterais incapazes de preencher a saída de Grimaldo?
4. Guarda-redes: concordou com o processo de saída de Vlachodimos?
5. Ponta-de-lança: Arthur Cabral (20 milhões) e Marcos Leonardo (18 milhões) garantem-lhe golos e fiabilidade para a nova época ou o Benfica vai investir mais uma fortuna num número 9?
6. Sem Rafa, a posição 10 que tão bem conhece é para entregar a Kokçu ou vai atacar no mercado um nome forte para a função?
7. Finanças: o anterior presidente foi detido em julho de 2021, acusado pelo MP de lesar gravemente o Benfica. A auditoria forense prometida pela sua direção continua sem ver a luz do dia. Não teme que os sócios critiquem a sua credibilidade?
8. Justiça: o bom nome do Benfica tem-se arrastado de tribunal em tribunal, envolvido em inúmeros processos. O mais recente envolve também o seu nome e está relacionado a supostos contratos de intermediação falsos, num total de seis milhões de euros. O que tem a dizer aos benfiquistas sobre este processo, que terá ocorrido quando era vice-presidente?
9. O Benfica ainda utiliza os serviços de Paulo Gonçalves e César Boaventura, homens envolvidos em processos judiciais e da confiança do anterior presidente?
10. Está satisfeito com o comportamento do diretor desportivo Rui Pedro Braz, um dos responsáveis maiores pela política de contratações do Benfica?"
Di María, um luxo
"Schmidt não conseguiu resolver o paradoxo de ter alguém com tanta qualidade e que ao mesmo tempo enfraquecia a equipa a defender
Roger Schmidt foi o primeiro a defender Ángel Di María da insatisfação de alguns adeptos. Que ferveram, várias vezes e sobretudo no final da época, em pouca água com alguns erros ou dificuldades do campeão do mundo em momentos de jogos quando já deles deveria ter saído, ou seja, quando já deveria ter sido protegido pelo treinador e estar a descansar.
Agora que a época acabou, o regresso de Di María ao Benfica, saudado por benfiquistas e provavelmente por poucos questionado no último verão, parece ter sido um paradoxo que não foi resolvido. Se dá muito à equipa a atacar, também tira a defender. Se esteve tanto tempo em campo como há dez anos não acontecia, a idade (36 anos) aconselhava outra gestão física. Se ficar no plantel, jovens por quem o Benfica pagou muito dinheiro, como Rollheiser ou Schjelderup, têm o caminho da afirmação dificultado.
Não é difícil concordar que Di María é um dos melhores jogadores de sempre, o percurso e os títulos falam por ele, e que mantém algumas das melhores qualidades. Tem o lastro de uma carreira ímpar e o comportamento de líder. Deles se valeu, também, quando algumas vezes ultrapassou o risco vermelho em campo.
Esta época foi o sétimo mais utilizado do plantel, marcou 17 golos e somou 13 assistências, contribuiu com o primeiro golo para a conquista da Supertaça contra o FC Porto, marcou o golo da vitória sobre o FC Porto no clássico da Luz para o campeonato, foi muitas vezes um raio de luz na escuridão. A isso se poderá juntar a vantagem intangível de ser, apenas e só, Di María, com tudo o que isso representa.
Para o bem e para o mal, Di María é um luxo para o Benfica. E um clube como o Benfica tem de dar-se ao luxo de ter alguém em campo com a qualidade rara de resolver um jogo com um passe ou um remate. Continuar no Benfica, porém, só faz sentido se Schmidt encontrar a solução para se proteger das fragilidades que a presença do argentino provoca e que Sérgio Conceição, com a magnanimidade que uma goleada de 5-0 no clássico oferece a qualquer um, tão bem explicou. O que não se consegue imaginar, sobretudo a quem está prisioneiro do momento, ou seja, da má época do Benfica, é como o treinador será capaz de fazê-lo, apesar de estar interessado em fazê-lo, tomando por bons os elogios ao argentino no final do jogo com o Arouca, penúltimo do campeonato. Para quem está dominado pelas atuais circunstâncias — e talvez possamos estar todos —é mesmo difícil imaginar que o Benfica possa dar-se ao luxo de continuar a ter Di María.
Rui Costa fala, hoje, aos benfiquistas. Explicar bem explicadinho como será possível reconciliar sócios e adeptos com o treinador é só um primeiro passo para que a próxima época possa correr bem. Foi Schmidt que disse ser impossível o Benfica voltar a ser campeão nestas circunstâncias e colocou o presidente nesta situação."
Revelação 23/24: João Neves, o “puto” que nunca desiste
"A distinção de João Neves como Jogador Revelação GoalPoint da Liga 2023/24 é tudo menos uma surpresa, embora possa surpreender aqueles para quem o médio se “revelou” há cerca de um ano, mas essa questão fica esclarecida pelo critério de eleição, que explicamos no próximo parágrafo. O médio mas assumiu desde cedo na temporada um papel fundamental em toda a manobra “encarnada”, tornando-se num verdadeiro “patrão” do meio-campo, terminando uma época memorável a nível individual e agitando o interesse dos “tubarões” do futebol, ainda antes de ver a sua presença confirmada no EURO 2024. Neves sucede ao colega de equipa, António Silva, que foi a Revelação de 22/23.
No imediato pode o leitor questionar-se sobre este prémio, uma vez que já na época passada o médio havia dado ares da sua graça. Porém, o critério para a distinção é simples e definido há anos pelo nosso Antunes: o Jogador Revelação resulta do maior GoalPoint Rating entre jogadores Sub-23 que disputaram mais de 1020 minutos na época em análise e menos de 765 na anterior (25% do tempo possível). João Neves brilhou na fase final do título anterior mas ficou-se pelos 637 minutos, contexto que o habilita ao prémio que vence este ano, com inteira justiça, seja o critério a “olho” ou aquele que vamos desenvolver em seguida: o analítico.
Maturidade acima da média, inteligência na leitura de jogo e ocupação de espaços, qualidade de passe e a “guardar” a bola, técnica apurada, nervos de aço. Estas são algumas das qualidades demonstradas por João Neves, que têm dado uma outra dimensão ao futebol benfiquista e tem encantado adeptos e crítica.
Eis um resumo dos destaques que realçamos, no desempenho de João Neves na Liga agora finda:
Especialista no passe progressivo
Neves foi o quarto jogador da Liga com mais passes progressivos (113) entre médios e avançados. O que é um passe progressivo? Qualquer passe eficaz que permite à equipa reduzir em mais de 25% a distância original para a baliza contrária.
Trabalhador incansável
A médio-defensivo ou médio-centro, João Neves sabe pressionar em zonas adiantadas como poucos, tendo sido o quarto jogador com mais ADMA, as acções defensivas no meio-campo contrário (59).
Implacável no desarme
Apesar de não ser um jogador alto ou fisicamente imponente, Neves foi o jogador com melhor eficácia (82%) no desarme completo (53 com manutenção de posse).
Rei no duelo individual
João Neves foi o quarto futebolista com mais duelos ganhos (235), segundo entre médios, uma imagem de marca do seu jogo.
Sempre dentro do jogo, na hora de construir
O benfiquista foi o jogador da Liga com maior média de acções com bola por 90 minutos (98,9).
Qualidade inigualável no passe
“Patrão” do meio-campo, foi o sexto jogador com melhor eficácia de passe (89,6%), sendo o segundo com mais elevada média de passes (75,4) por 90 minutos e líder entre médios.
Líder na recuperação da posse
Nenhum outro jogador da Liga registou tão elevada média de recuperações de posse por 90 minutos (8,3).
João Neves não está sozinho entre as maiores revelações da Liga, naturalmente. Eis os restantes nove “revelados” que o acompanham, no top de craques que, cumprindo o critério já explicado, se destacaram nos ratings da época.
Muitos outros jovens e/ou novos recrutas da Liga deixaram a sua marca, com excelentes desempenhos e adaptação rápida às exigências do nosso futebol. Estes são os dez melhores, dentro do critério Revelação, que melhores ratings registaram na Liga finda, com destaque, também, para outros jogadores dos “grandes”, como o turco Orkun Kökçü, mas também o central do Porto, que começou no Famalicão, Otávio Ataíde, ou o herói do último dérbi, o sportinguista Geny Catamo. Mas também outros nomes de clubes com outras ambições, mas que mostraram qualidade para mais altos voos.
Parabéns João Neves, Jogador Revelação GoalPoint Ratings de 23/24, mas também a todos os “rookies” que abrilhantaram a Primeira Liga!"
Balanço da época hoje na BTV
"Esta edição da BNews é dedicada a vários assuntos da atualidade benfiquista.
1. Especial Informação
Não perca o Especial Informação, hoje, na BTV, a partir das 19h00, com o Presidente do Sport Lisboa e Benfica, Rui Costa, dedicado ao balanço da temporada e às perspetivas quanto à próxima época desportiva.
2. Eusébio Cup
A 12.ª edição da Eusébio Cup está agendada para 28 de julho, no Estádio da Luz. O adversário é o Feyenoord.
3. Chamadas internacionais
António Silva e João Neves estão convocados para o Campeonato da Europa. E Di María e Otamendi integram a mais recente convocatória da seleção argentina.
4. Pleno no futebol feminino
Fernando Tavares, vice-presidente do Sport Lisboa e Benfica, analisa a notável temporada da equipa feminina de futebol, na qual venceu todas as provas domésticas e alcançou o feito inédito do apuramento para os quartos de final da Liga dos Campeões.
5. Época dos Sub-23 em análise
Paulo Lopes concedeu uma entrevista à BTV em que aborda a temporada dos Sub-23 e os objetivos de evolução dos jogadores.
6. Arranque vitorioso
No primeiro jogo das meias-finais dos play-offs do Campeonato Nacional de basquetebol, o Benfica ganhou, por 100-55, frente à Oliveirense. O jogo 2 também é na Luz, sexta-feira às 20h30.
7. Nas meias
Ao vencer, por 2-4, no rinque do Valongo, o Benfica qualificou-se para as meias-finais do Campeonato Nacional de hóquei em patins.
8. Bons desempenhos
Pedro Pichardo obteve o 2.º lugar do concurso do triplo salto na etapa de Rabat/Marraquexe da Liga Diamante. E Alexandre Nobre sagrou-se vice-campeão na média distância de triatlo.
9. Casas Benfica
As tricampeãs nacionais de andebol e o canoísta João Ribeiro foram recebidos na Casa Benfica Barcelos e juntaram-se à comemoração do 23.º aniversário desta embaixada do benfiquismo.
Nota ainda para o desempenho desportivo de algumas Casas Benfica nos últimos dias."
Saber (quando) perder
"Faltou ao Leverkusen ‘enrijecer a pele’ como fez o FC Porto de Villas-Boas em 2011
«Não estávamos interessados no recorde de invencibilidade, nunca foi uma preocupação nossa. O que interessava era o jogo e infelizmente perdemos uma final»
Granit Xhaka, médio do Leverkusen, após derrota com a Atalanta na final da Liga Europa
A invencibilidade do Leverkusen chegou ao fim, depois de 51 jogos. Ao 52.º, a equipa de Xabi Alonso não só perdeu como foi dominada pela Atalanta, no pior cenário: a final da Liga Europa.
A época não deixa de ser de sonho – afinal, deixou de ser Neverkusen e após cinco ocasiões em que fora vice-campeão alemão conquistou a primeira Bundesliga do seu palmarés. Mais, é o primeiro campeão de sempre sem derrotas. Mas não conseguiu juntar-lhe um troféu europeu.
A época do Leverkusen fez lembrar a do FC Porto de Villas-Boas, em 2010/2011. Esse FC Porto também foi campeão sem derrotas e também foi a Dublin jogar a final da Liga Europa. Mas já levava derrotas no currículo – duas na própria competição europeia (com Sevilha e Villarreal, mas em segundas mãos, depois de vitórias nas primeiras), uma na Taça de Portugal (em casa, com o Benfica, três meses depois daquele célebre 5-0, mas revertida na segunda mão, na Luz), outra na Taça da Liga (com o Nacional, essa sim a custar a continuidade na prova). Que lhe enrijeceram a pele. E depois, nos momentos certos, ganhou.
Esse FC Porto soube quando vencer. Este Leverkusen não deixa de ter um lugar na história, mas depois de tantas ocasiões a brincar com o fogo (para além da quantidade de jogos em que evitou a derrota na compensação, foi a quinta partida da época em que esteve a perder por dois golos de diferença e sobrevivera nas quatro anteriores...) não soube mesmo (quando) perder."
Notas finais
"Ontem, na final da Liga Europa, Xavi Alonso do Bayer Leverkussen não conseguiu os seus intentos, venceu surpreendentemente a Bundesliga, mas perdeu contra a Atalanta de Gasperini.
O campeonato nacional acabou e agora segue-se a final da Taça de Portugal, para o Sporting se vencer será ouro sobre azul e culminará uma época fantástica, para o FC Porto se vencer não salva a época, mas acaba-a de cabeça erguida.
O dia 26 de Maio marcará, um antes com Pinto da Costa e um depois com André Villas-Boas.
O futebol não é mensurável, no futebol tudo é subjectivo e nessa subjetividade cabe tudo, até o grotesco.
Uma final é uma final e o FC Porto galvaniza-se nestes jogos. No Inicio de época, na Supertaça, o FC Porto perdeu para o Benfica, agora, tem que se redimir e vencer.
Este sábado temos a final da Taça de Inglaterra entre o Manchester City e o Manchester United, razão tinha Ronaldo sobre as infra-estruturas do Manchester United e da má gestão. O Manchester United pode salvar a época que foi muito medíocre, ficou em 8.º lugar e está fora da Europa, precisa mesmo de vencer a Taça.
Aqui ao lado, em Espanha o Real Madrid passeou-se e venceu com larga margem, mas Toni Kross diz adeus ao futebol depois do Euro 2024, estando em grande forma.
Carlo Ancelotti é um expert em gerir jogadores e colocar as peças no relvado, assim como, quem está no banco sabe que é importante. O seu filho Davide Ancelotti tem dado uma enorme ajuda e pode seguir as pisadas do pai, sempre muito interventivo e a dar sugestões sobre o jogo.
Ao Real Madrid só falta vencer a Liga dos Campeões contra o Borussia Dortmund, no dia 1 de Junho.
Em França, o artista do costume, o PSG campeão, mas vai ficar sem Mbappé.
Em Inglaterra, novo campeonato para o Manchester City de Pep Guardiola, vão 4 seguidos. É obra!
A despedida de Klopp é triste e vai deixar saudades, o alemão mais latino que conheço, sempre com um sorriso e uma capacidade de se reinventar que transformou o Liverpool.
Agora vem o Euro 2024 e espero que Portugal faça uma boa figura.
Por fim, fico expectante para ver para onde vai José Mourinho, na próxima época."
Obrigado a Pepe e Jurgen, o futebol pode mesmo ser uma lição de vida
"Guardiola e Klopp são a resposta a Millôr Fernandes: «Ser génio não é difícil. Difícil é haver quem o reconheça». Uma crónica do Livro do Desassossego, numa gargalhada para Ukra, um repto para Neto e a cadeira de Sérgio Conceição que pode ser tudo menos de conforto.
As despedidas podem até ser dolorosas, mas não têm de ser tristes. A de Jurgen Klopp no Liverpool foi bonita. E a mais comovente nem partiu dos adeptos do Liverpool, que garantiram, em cântico que brotou não da voz mas da alma, que o treinador nunca mais caminharia sozinho. A mais comovente chegou da voz embargada e olhar marejado de Pep Guardiola, rival do Manchester City: «Obrigou-me a ser melhor cada dia», resumiu o espanhol num testemunho de dois minutos que faz arrepiar a pele só de ouvir… Só mesmo alguém tão grande como Guardiola para prestar à grandeza de Klopp o tributo que é devido. Um momento em que quem presta e é alvo de homenagem surgem em igual esplendor de humanidade.
Rivalidade é o genuíno desejo de me vencer a mim mesmo e não a ânsia de vencer o meu oponente. Rivalidade é saber que o melhor tributo que posso prestar ao meu rival é querer ser cada dia melhor e ultrapassar todos os meus limites. Não porque o temo, muito menos porque o quero ver derrotado, mas porque ele me inspira a ser cada vez melhor. Na rivalidade entre os grandes, nunca há contas de dividir, apenas de multiplicar. O trono não se divide por dois, multiplica-se por quatro. O Universo, na sua incomensurável capacidade de expansão, acomoda sempre o génio em gloriosas constelações. O verdadeiro génio é também a onda que agradece à rocha o esplendor da rebentação.
O escritor brasileiro Millôr Fernandes até brinca com as palavras ao considerar que «ser génio não é difícil. difícil é encontrar quem reconheça isso.» Por norma, outro génio. E eis como, no mesmo domingo, o futebol coroou em Inglaterra dois verdadeiros campeões.
Ukra: ser grande sem jogar num 'grande'
As despedidas podem até ser dolorosas, mas não têm de ser tristes. Após 17 anos como jogador profissional, no passado dia 17 de maio, corria o minuto 17 do Rio Ave-Benfica quando o jogo parou para todos aplaudirem em emocionante homenagem o número… 17 dos vilacondenses: Ukra.
Para quem, como eu, considera o sentido de humor como manifestação superior de inteligência, Ukra foi então dos jogadores mais inteligentes que alguma vez conheci. Corrijo, Ukra é das pessoas mais inteligentes que já conheci. Muitas das suas brincadeiras, partidas ou tomadas de posição tornaram-se virais e épicas pelo sentido de humor. O jogador que todos os treinadores adorariam ter pela força positiva que acrescentam a qualquer balneário. UKra não precisou de jogar num grande para ser grande. E vai continuar a sê-lo, seja qual o destino que dê à carreira não deixará de nos maravilhar em explosão de gargalhadas…
Escolhia Neto para suceder a Rúben Amorim
As despedidas podem até ser dolorosas, mas não têm de ser tristes. Luís Neto deixa do Sporting, resta saber o que será o seu futuro no futebol. Se eu fosse Frederico Varandas tudo faria para o manter no Sporting, noutras funções. E, não sabendo qual o desejo de Luís Neto para o futuro, tenho para mim a convicção que já deveria estar a ser preparado, e a preparar-se, para ser o substituto de Rúben Amorim como treinador do Sporting. Talvez o jogador mais culto e arguto que já ouvi falar sobre futebol. Um comunicador que pode não ser expansivo, mas é cativante. E um líder de balneário, um adjunto de Amorim no plantel, alguém que, assumindo realisticamente a realidade de ausência de protagonismo no onze, entendeu o seu papel no grupo como o de inspirador e conselheiro dos mais jovens. Um homem que demonstra ser muito bem formado e que merece um especial agradecimento. Os campeões por vezes são coroados na sombra.
Sérgio Conceição sai da zona de (des)conforto?
As despedidas podem até ser dolorosas, mas não têm de ser tristes. A de Sérgio Conceição deverá estar por dias. No lavar dos cestos as contas a uma vindima com altos e baixos. De glória (muitas) e derrotas (algumas). De gargalhadas e de descontrolo emocional. Dizer-se que vai deixar a zona de conforto é uma tremenda injustiça. As condições em que teve de comandar a equipa, reconstruindo-a ano após ano, limitado pelo fair-play financeiro, necessidade de vendas e até alguns boicotes internos, tornaram aquele cadeirão num permanente desconforto.
Critiquei aos seus destemperos, elogiei o trabalho brilhante que fez. Se sair mesmo, acho que vou sentir saudades de o ver naquele posto de comando. Há relações que não se escolhem à la carte. É tudo ou nada. No caso de Sérgio Conceição... compro."
As escolhas de Martínez
"Da preferência por Ricardo Horta à deselegância com Trincão e Pedro Gonçalves
Roberto Martínez escolheu, está escolhido! São estes os nossos 26 convocados para o Euro-2024. Cada cabeça sua sentença e todos, claro, temos as nossas preferências. Estes 26 jogadores não eram os meus 26, como, de resto, não eram os 26 eleitos pela maioria dos jornalistas de A BOLA. Dos meus, estão 24 entre os chamados pelo selecionador. Falhei dois. Como muitos, fui surpreendido com a não inclusão de Raphael Guerreiro. E também não estava à espera da chamada de Pedro Neto.
Roberto Martínez optou, dado o defesa do Bayern não estar operacional para o início do Euro, por chamar apenas um lateral-esquerdo, Nuno Mendes, compensando com três laterais-direitos, João Cancelo, Diogo Dalot e Nélson Semedo. Este só será o segundo lateral-direito quando um dos outros dois for o primeiro lateral-esquerdo. Estranho. Como discutível é também a chamada de Pedro Neto, que só agora voltou à competição, e durante apenas 12 minutos, depois de mais de dois meses lesionado.
Compreendo a chamada de Pepe, dado não só o indiscutível valor do central como o peso que tem no grupo, assim como a de Diogo Jota, dada a versatilidade e o golo do avançado do Liverpool, mas não deixam de ser apostas arriscadas. Pelo menos, depois da justificação para a não chamada de Raphael Guerreiro, já sabemos que estão aptos. Ou seja, Pepe vai jogar a final da Taça de Portugal…
De qualquer forma, o selecionador ainda tem duas semanas para fazer alterações. E se tiver de as fazer que as faça. Já nos chega o Mundial-2014. Os «índices de suspeição lesional» que nos foram explicados pelos responsáveis médicos da Seleção Nacional após o fracasso no Brasil custaram caro a Paulo Bento e, claro, a todos nós.
O treinador decidiu arriscar e lá terá as suas razões. O que mais estranhei foram as explicações para as ausências. Especialmente a preferência por Ricardo Horta. Compreendo que esteja grato ao extremo do SC Braga e que se tivesse justificado pessoalmente, mas ao elogiá-lo publicamente acabou por ser deselegante com outros não convocados, como Pedro Gonçalves e Francisco Trincão, nomes que o espanhol também abordou na conferência de imprensa.
O «tiveram azar» vai demorar a esquecer entre os adeptos, especialmente os do Sporting, logicamente, mas também entre muitos outros jogadores. Afinal, o azar de Pote e Trincão foi o de estarem lesionados aquando da anterior convocatória. Sim, tiveram azar de estar lesionados em março, mas, se Roberto Martínez os queria observar de perto, por que razão não os chamou anteriormente?"
Os 26 de Martínez: assim se chegou até aqui
"Escolhas na primeira lista condicionaram as decisões finais para o Euro-2024
Esqueçam lá isso de, a partir de agora, esta ser a Seleção de todos os portugueses. A ideia pode ser válida para os adeptos, mas nunca poderá retirar-nos, a nós jornalistas, a responsabilidade de manter apurado o sentido crítico. Se tal parece um dado adquirido em tudo o resto, e a primeira pedra que nos atiram mesmo sem responsabilidade do lado de cá, não pode mudar só porque agora o nosso objeto passou a vestir a camisola do país em que nascemos e a representá-lo em campo e fora deste.
Continuo a acreditar que as expetativas têm de ser altas perante o acumular de talento. Acho ainda que Roberto Martínez tem as ideias certas, ao pensar o modelo de uma forma proativa e com uma identidade atacante, e que até encontra equilíbrio nas decisões estratégicas. No entanto, devo sublinhar o que identifiquei na altura da oficialização do selecionador: o apego às figuras e estatutos faz com que, por vezes, deixe passar o momento certo para as roturas. Os compromissos que assumiu pós-Catar limitam-no agora nas escolhas. E no Médio Oriente basta lembrar o que aconteceu com a Bélgica e com Eden Hazard.
Cada um tinha uma lista de convocados na cabeça. Jornalistas e adeptos. A BOLA apresentou esta terça-feira a sua, a soma de todas as escolhas dos seus jornalistas, e também a versão dos seus seguidores nas redes sociais. Não se falhou por muito. Já eu confesso que a minha hierarquia de opções era talvez a mais divergente da anunciada: cinco nomes nos 26 finais não são os mesmos.
O ciclo iniciou-se em 2023 e já então não deveria haver espaço para Cristiano Ronaldo e Pepe, ainda mais agora com as questões físicas recorrentes do central. Depois, a mudança de Rúben Neves e Otávio para a Arábia Saudita colocaram-nos num patamar abaixo de todos os que ficaram na Europa. Não há que esconder as diferenças e de nada vale dizer que é melhor liga que a francesa ou a portuguesa. É todo um outro mundo e estar numa competição menos exigente terá obviamente custos. Por fim, a baliza. Não fará mais sentido escolher um titular em vez de Rui Patrício?
No lugar desses cinco estariam Pedro Gonçalves, Trincão, Matheus Nunes, Florentino e Rui Silva. Cada um acrescentaria algo a esta Seleção. Polivalência e desempenho híbrido entre ataque e meio-campo no primeiro caso, criatividade e meia-distância no segundo, transporte de bola em velocidade no terceiro, capacidade de pressionar alto a saída rival no quarto e ritmo competitivo no último. Também levaria Pedro Neto, decisivo quando está bem e tão versátil tanto na transição como no ataque posicional, além de Francisco Conceição e Diogo Jota. Não há muitos como eles.
Senti alguma fragilidade de Martínez na hora das explicações. Algumas contradições. Nunca seria escolha fácil, porém a verdade é que ele próprio acentuou essas mesmas dificuldades na primeira lista que teve a sua assinatura. Para a federação, acredito que a sua nomeação tenha evitado problemas, ruído e até instabilidade, mas o mesmo não se poderá dizer em relação à equipa. Se não a curto, a médio prazo. Mesmo que traga o caneco."
Dançando como Josephine Baker junto a uma bandeirola de canto
"Um ano após o Mundial de 1990, o tenista Yannick Noah convidou Roger Milla para cantar com ele.
Dominique Claude Rocheteau: chamaram-lhe o Anjo Verde quando, ainda rapazinho, fez parte daquela equipa do Saint-Étienne que jogou a final da Taça dos Campeões contra o Bayern de Munique. Vi-o jogar tantas e tantas vezes, na televisão, depois também ao vivo, e conheci-o num campo de futebol, em Issy-les-Molineaux, quando A Bola com Eusébio e Humberto Coelho e um conjuntos de jornalistas e camaradas que marcaram uma época da Travessa da Queimada defrontou o l’Équipe com Michel Platini e, precisamente, Dominique. Depois houve mais dois jogos, em Lisboa, um na Luz e outro no Estádio Nacional. Rocheteau sempre foi aquilo que os franceses chamam de ‘un gentil garçon’. Platoche, por seu lado, era e continua a ser ‘un vieux blagueur’, ou um ‘chenapan’, se preferirem. Com o primeiro perdi o contacto. Com o segundo, ódio de estimação de tantos portugueses, vou mantendo uma amizade saudável e brincalhona.
Em 1989, o Anjo Verde despediu-se do futebol muito pouco à francesa: uma festa de três dias e três noites em Paris, hotéis cheios de convidados, um jogo de velhas e novas estrelas. A grande figura do acontecimento foi Roger Milla, o camaronês que acordava a cantar e adormecia a dançar, fossem que horas fossem. Seu companheiro de quarto, o argentino Alberto Márcico, espantava-se: «Quando acordei na primeira manhã pensei que estava a dar em maluco – olhei para a banheira e vi aquela figura negra a bailar debaixo do chuveiro como se estivesse numa discoteca. Percebi que não iam ser dias sossegados». Nessa altura, Roger cumpria a sua última época pelo Montpellier e estava decidido a reformar-se. Morrera-lhe a mãe, que ele adorava, e a mulher ficara grávida, estava na altura de mudar algo na sua vida, afinal já estava com 37 anos e apesar de festeiro não era nenhuma criança. Exilou-se. Foi jogar para a Jeunesse Sportive Saint-Pierroise, da ilha da Reunião, perdida no Oceano Índico, a leste de Madagáscar, basicamento onde Judas teria perdido as botas se tivesse tido a decência de as usar. No ano seguinte, Paul Barthélemy Biya’a Bi Mvondo, Presidente dos Camarões e seu amigo de infância, moveu todos os cordelinhos que estavam ao seu alcance, e eram muitos, para o enfiar entre os convocados do russo Valeriy Nepomnyashchiy que comandou a selecção do país no Mundial de 1990, em Itália. O resto é história por demais conhecida. Quem consegue lembrar-se da forma como Milla enganou o enlouquecido Higuita num jogo que marcou o apuramento para os quartos-de-final e comemorou junto à bandeirola de canto com um balancear de ancas capaz de fazer inveja a Josephine Baker, sabe do que estou a falar.
Milla passou definitivamente a fazer parte não apenas da história do futebol como, até, do anedotário do futebol. Quatro anos depois, com 42 anos e 39 dias, fez um golo inolvidável contra a Rússia. Valeu-lhe de pouco, porque os Camarões foram goleados por 6-1 e, ainda por cima, Oleg Salenko assinou cinco golos só à sua conta. Nesse tempo, Roger confessara numa entrevista que, para se manter operacional, deixara de comer carne. Como pilhéria, um jornal inglês tratou de achincalhar a alcunha dos camaroneses: Os Leões Indomáveis, como gostam de se apelidar, passaram a ser Os Leões Vegetarianos.
Não sei se alguém esqueceu verdadeiramente Roger Milla, e se o fez cometeu uma injustiça ao futebol mais selvagem e mais autêntico que passou por todos os Mundiais. Sei que Yannick Noah, tenista vencedor de Roland Garros, fez os possíveis para o manter inesquecível quando, um ano após o Campeonato do Mundo de Itália, publicou um álbum de música no qual_Saga África era a canção ‘piéce de résistence’. Convidou Roger para se juntar a ele, embora a voz do camaronês fosse do timbre da de um devorador de bagaços.
«François Omanbiyik amortit et glisse un zolo
Deux zolos et passera Milla
Milla dribble la balle, un dribble
Qui sort des laboratoires
Foot balistiques d’Etudi
L’affaire est grave, il tire au goal
Il y est!».
Quantos jogadores ficaram eternizados em canções?, eis uma pergunta à qual não sei responder embora já tenha trazido um bom ror deles para estas páginas. Com Milla, eternizar não será o mais correcto dos termos pois Noah como cantor ficou quase ao mesmo nível que a princesa Stephanie do Mónaco com o seu Irristible. Mas cantou futebol tal como Milla dançou futebol.
«Hey là, le type-là
Oui oui, petit blanc
Paris-Yaoundé
Connexion mais venez
Allons ambiancer
Ambiance soukouss
Ambiance makossa
Ou l’ambiance du bikutsi
Ambiance assiko
Mouvement partout…».
Para a minha memória fica sempre Roger Milla dançando como um garoto em redor de uma bandeirola de campo. Bendita imagem que o tempo não apaga."