quarta-feira, 29 de julho de 2020

Desmentido oficial

"O Sport Lisboa e Benfica repudia e desmente as várias notícias falsas veiculadas por diversos órgãos de comunicação social que publicitam o interesse do Clube pela aquisição de vários jogadores, sem qualquer tipo de fundamento.
De entre elas, destacamos particularmente a notícia que dava conta de um suposto directo envolvimento do Presidente Luís Filipe Vieira, que teria chamado a si a condução do eventual processo de aquisição do jogador internacional uruguaio, Edinson Cavani.
Essa notícia é totalmente falsa, aproveitando o Clube para esclarecer que eventuais contactos institucionais com vista ao reforço do plantel para a próxima época só terão lugar após a realização da final da Taça de Portugal, do próximo sábado, que assinala o término da presente época, desmentindo qualquer envolvimento do Presidente no processo atrás citado ou em quaisquer outros noticiados."

«O SL Benfica está demasiadas vezes em tribunal e a ser enxovalhado»

"«Foi como um puxar do tapete». É assim que José Soares descreve o resultado do polémico e marcante Campomaiorense-FC Porto, em que fez marcação cerrada e agressiva a Mário Jardel. Ao Bola na Rede, o antigo defesa falou ainda sobre a instabilidade do SL Benfica – o clube do coração – nos tempos de Vale e Azevedo, a aventura pelo Médio Oriente, os vários empregos após pendurar as chuteiras e ainda houve tempo para falar sobre a actualidade encarnada, onde revela que «nem nos piores sonhos» acreditava que as águias não seriam campeãs nacionais esta época.

– De Elvas para a Luz –
“As negociações com o FC Porto estavam muito mais avançadas que com o SL Benfica, só que o meu benfiquismo falou mais alto”

Costuma-se dizer que filho de peixe sabe nadar e esta expressão parece aplicar-se na perfeição ao José Soares. Como foi crescer com um pai futebolista?
Foi muito bom. Nasci a ver o meu pai a jogar futebol e estava sempre à espera que fosse fim-de-semana para ir vê-lo jogar aos sábados ou domingos. Já nasci com esse bichinho por causa do meu pai jogar e de ter uma família de futebolistas. A sensação foi óptima e consegui realizar um sonho de criança – que nem sempre é fácil concretizar – foi fantástico. Parece que foi há dois ou três anos que via o meu pai a jogar nos pelados e no meu caso, do meu irmão e dos meus sobrinhos, aplica-se perfeitamente essa expressão.

Ele também era defesa?
Não, não. O meu pai não tem nada a ver, as características dele são as opostas das minhas. O meu pai era canhoto, jogava nas linhas – a extremo ou médio esquerdo – era muito habilidoso, coisa que eu não era [risos].

E é por causa dele que acabas por ir para o O Elvas…
Sim. Em Elvas existem dois clubes: o O Elvas e Os Elvenses. O meu pai representou os dois clubes e eu, quando era miúdo, comecei a representar o O Elvas.

Que condições tinhas?
O Elvas sempre foi um clube com boas condições. Era pequeno, regional, mas tinha condições e a nós nunca faltou nada. É uma cidade que vive muito o futebol e os empresários na altura ajudavam bastante o clube. Lembro-me perfeitamente do sr. Hernâni Santana, o sr. Manuel Mendão, entre outros ajudavam sempre o clube e quando pararam de ajudar, veio por aí abaixo, mas agora está a tentar levantar-se de novo.

Depois de quatro anos no O Elvas, como é que acabas por chegar ao Benfica?
Aconteceu algo que não era muito natural – talvez agora seja, mas não estou muito dentro do futebol jovem – que foi um senhor chamado Fernando Casaca, antigo jogador profissional do Vitória FC, foi treinar os juniores do O Elvas e iam começar a jogar o campeonato nacional. Ele viu-me jogar nos iniciados, com 12 ou 13 anos, e achou que tinha «arcaboiço» para jogar nos juniores, que se podia fazer mas tinha primeiro de ir fazer um teste a Lisboa, à Cidade Universitária, para ver se tinha estrutura óssea que permitisse jogar cinco anos acima. Levaram-me a Lisboa, fiz os exames médicos necessários e comecei a jogar no campeonato nacional de juniores, mas na altura era miúdo ainda, só com 13 anos. As coisas correram bastante bem e há sempre alguém que vai dizer que há um miúdo, então numa equipa conhecida como era o O Elvas, que joga nos juniores só com 13 anos e foi aí que surgiu o interesse do Benfica e do FC Porto. Curiosamente, as negociações com o FC Porto estavam muito mais avançadas que com o Benfica, só que o meu benfiquismo falou mais alto.

Foi difícil trocar o Alentejo pela capital?
Sim, sim, foi muito complicado. Eu era miúdo, sempre vivi em Elvas, perto dos meus pais, os meus irmãos, os meus amigos e estava completamente identificado com a minha cidade. De repente, de um momento para o outro, estou a viver numa cidade com esta dimensão, longe dos meus pais, e foi muito complicado ao início. Mas depois o meu amor pelo clube, estar com os meus colegas e os treinadores tratarem-me bem, acabou por ser um processo normal, apesar da idade que tinha.

Então acabou por não te afectar dentro de campo…
Não, isso nunca. Eu consigo separar uma coisa da outra. O Benfica tinha umas condições excelentes no centro de estágio, estavam lá 24 colegas e foi muito bom. Sempre com muitas saudades da família, mas já se sabia que é mesmo assim e apoiávamo-nos uns aos outros, com o Benfica a dar todo o apoio possível também e foi assim que tudo começou.

De quem eras mais próximo lá?
Eu sempre tive muitos amigos. No futebol jovem tinha o pessoal que vivia comigo no centro de estágio e outros colegas como o João Peixe, o Bruno Caires, o Filipe Correia, o Gil que, na altura, já era júnior mas ajudáva-nos bastante. Tinha o Edgar Pacheco que também vivia connosco e o meu irmão que, curiosamente, foi no mesmo ano que eu para o Benfica. Havia muito colega, boas pessoas que ainda hoje somos amigos, que na altura já eram muito próximos de mim e continuámos com esta amizade para a vida toda.

O que se destaca no teu percurso pelas camadas jovens foram as idas à selecção nacional no Euro sub-18 e no Mundial sub-20. De que te lembras destas competições?
Lembro-me bastante bem, porque selecção é inesquecível, vai para o resto da vida. O que nós fizemos na selecção, essa geração, é muito mais positivo que negativo. Ganhámos o Europeu de sub-18, que é muito complicado, com grandes que havia na altura, e no ano a seguir podíamos ter ganho o Mundial porque, não só tínhamos muita qualidade individual, como um colectivo muito forte. O nosso lema era sempre dar tudo pela equipa, independentemente do jogo ser bonito ou não. Tínhamos material humano para jogar em várias vertentes, podíamos jogar com muita qualidade, mas o espírito de sacrifício e entreajuda estava sempre presente. Depois, nem sempre dá para jogar sempre bem, apesar de termos grandes individualidades: Dani, Nuno Gomes, Bruno Caires, Ramires, jogadores de grande qualidade, mas acima de tudo tínhamos grande espírito de equipa, neste caso de selecção, em que todos remávamos para o mesmo lado. Por isso tivemos esse sucesso todo, mas infelizmente não fomos campeões do Mundo por detalhes.

Que tipo de detalhes?
Lembro-me que no jogo com o Brasil merecíamos ganhar. Tínhamos o Dani doente, o jogo não nos correu bem e podíamos perfeitamente ter ganho. Nesse ano o campeão do Mundo foi a Argentina mas, na fase de grupos, fomos muito melhores no jogo contra eles. Estou convencido que, com um pouco mais de sorte e mais uma ou outra coisa, tínhamos sido campeões do Mundo nesse ano.

- De empréstimo em empréstimo até ao duelo com Mário Jardel –
“Devido às características do Jardel, o Carlos Manuel pediu-me para estar mais em cima dele e exagerei um bocadinho”

O teu percurso pelas selecções ficou-se por aí, mas a tua carreira sénior tinha acabado de começar com um empréstimo ao Famalicão. Como foi para começar?
Não foi fácil, mas quem escolhe esta profissão sabe que hoje pode viver em Lisboa ou em Elvas e no dia a seguir está em Famalicão, como foi o meu caso. Fui para lá porque era o ano do Mundial [sub-20] e precisava de jogar num clube que me acolhesse bem e não fosse um choque muito grande, que desse para aprender também. Fui muito bem tratado em Famalicão, joguei alguns jogos mas também tinha muitos estágios de selecção e muitas vezes não estava no clube. Mas foi muito importante, as pessoas de Famalicão são excelentes, vivi na vila e foi muito acolhedor mas também é difícil estar habituado a Lisboa e depois ir para tão longe, mas não fiquei arrependido porque as pessoas trataram-me muito bem e foi uma boa experiência para mim.

Mesmo com apenas oito jogos feitos?
Sim, sim. Porque, como disse, tínhamos muitos estágios. Eu fui mais tarde, não fui logo no início do campeonato e depois tínhamos muitos torneios – de Las Palmas, de Toulon, em todo o lado – e muitas vezes faltava e não podia jogar.

Então a tua passagem pela selecção limitou o teu primeiro ano de sénior…
Sim porque, para teres uma ideia, terminámos o campeonato da Europa no verão, em Espanha, depois fomos um mês para o Japão e logo aí prejudicou o início do campeonato, porque tivemos férias. Começámos muito mais tarde por causa disso e não foi benéfico, mas o nosso percurso de selecções, apesar de durar muito tempo, foi muito bem planeado, as gerações eram muito fortes mentalmente e estávamos muito identificados com a selecção que representávamos desde miúdos. A qualidade era enorme, as equipas eram muito equilibradas.

No ano seguinte, mais um empréstimo e agora ao Alverca, onde ficaste quatro anos. Não ficaste chateado por não ter uma oportunidade no Benfica?
Fiquei um pouco chateado por ir para o Alverca – que era um clube com muita estabilidade – porque na altura pensei: «até me correu bem o Mundial, se calhar vou ficar no Benfica» e fiquei um bocado desiludido, mas pronto. Ainda bem que fui para o Alverca porque ensinou-me muito, trataram-me muito bem e era um clube que estava muito ligado ao Benfica e ainda havia de estar mais. As coisas correram bem, porque jogava sempre e isso é importante naquela idade.

Tiveste quatro anos emprestado e só no final da terceira época é que tiveste uma oportunidade na equipa principal do Benfica, com o Greame Souness…
Tive uma antes, mas acabei por não jogar. Fui convocado pelo Manuel José para um jogo em Braga onde era para ser titular mas depois o mister achou que não devia de ser. Devia haver aquela transição entre equipa B e andar a rodar, mas não foi assim.

E como era a tua relação com os vários treinadores do Benfica na altura? Quem marcou-te mais ou desiludiu-te?
Os treinadores que apanhei na equipa principal… Por exemplo, quando era júnior, treinava muitas vezes na equipa principal com o mister Tony e o Jesualdo Ferreira e gostava imenso, tratavam-me muito bem e cheguei a fazer jogos particulares aos 17 anos com Boavista, Académica. Gostei dos treinos do mister Tony, gostei do Souness – houve coisas que não gostei, mas não é para aqui agora – porque deu-me uma oportunidade e eu aprendi com ele. O Manuel José deu-me a oportunidade de ser convocado um jogo, que era para jogar mas acabou por não dar… Com todos aprendi um bocado. Com o Jupp Heinckes, se calhar, foi com quem joguei mais, mas depois tive uma lesão algo grave no gémeo. Apanhei o mister Nelo Vingada que também gostei bastante, era o número 2 do Souness mas já tinha sido meu treinador muito tempo nas selecções. Não houve nenhum treinador do Benfica que eu dissesse que não aprendi, o que é muito importante. É muito negativo ter treinador com que não se aprende e dizia que o treinador tem de passar uma mensagem boa, positiva, e tem de te acrescentar… E no SL Benfica tive a sorte de encontrar sempre alguém que me acrescentou.

E o Mário Wilson, como era?
O Mário Wilson era o maior. Em termos de psicologia foi o melhor que apanhei. Não era grande treinador em termos de trabalho de campo e, com a idade que tinha, não podia ter essa função, mas em saber de futebol, em motivação de jogadores e outras coisas muito importantes para um profissional exercer a profissão com a cabeça limpa e motivado, ele foi o melhor de todos.

Ele que tinha um apreço especial pelo Valdo, não era?
[Risos] Pelo Valdo e os craques todos, ele protegia ao máximo. Tudo o que era grande jogador, com grande qualidade, ele super-protegia e, apesar de às vezes não ficarmos muito satisfeitos porque ficava bravo com uma entrada ou algo assim, mas depois pensávamos um bocadinho e dava vontade de rir. Ele era uma pessoa única, como nunca apanhei no futebol.

E só o apanhaste no Alverca ou também chegaste a tê-lo no Benfica?
Curiosamente, ele estava no Alverca comigo e o Benfica despediu o treinador e ele foi lá fazer dois, três, quatro ou cinco jogos na equipa principal para substituir o Paulo Autuori, e eu pensei que, como jogava sempre com ele e ele dizia que eu podia fazer alguma coisa no Benfica, quando ele até me chamou para treinar com a equipa principal pensei que se estava a encaixar tudo, porque ele gosta de mim, sabe a minha qualidade e é possível que ele me dê uma oportunidade. Assim que lá cheguei avisou-me logo que era para não dar porrada no João Pinto, senão punha-me fora do treino [risos].

Passaste seis temporadas vinculado ao Benfica enquanto sénior e com a quantidade de jogadores com qualidade mais duvidosa que passaram por lá, não te ficou a mágoa por não seres aposta?
Sim, mas a culpa não era deles, era de quem os ia buscar. É uma mágoa que vou ter durante a minha vida. Se o Benfica fosse estruturado como está neste momento, se calhar tinha jogado muito mais tempo, mas não estava e toda a gente sabe que presidente tínhamos na altura e sabemos que era um clube super desorganizado em que toda a gente fazia o que queria. O Benfica é o clube do povo, é um clube democrata, não é clube de uma pessoa ou outra, em que chegam lá e possam mandar em toda a gente. Não era o clube mais organizado para um miúdo da minha idade pegar de estaca e ficasse muitos anos a titular, era complicado. Havia sempre alguém de fora que tinha de jogar.

Depois de uma série de empréstimos ao Alverca, vais cedido para o Campomaiorense e ficas marcado pelo episódio com o Mário Jardel. O que se passou nesse jogo?
Nesse ano só fui em meados de Janeiro para o Campomaiorense porque as pessoas gostam de mim, sou amigo do presidente, do director também e as coisas correram bem. Nesse jogo, devido às características do Jardel, o Carlos Manuel pediu-me para estar mais em cima dele e exagerei um bocadinho. Faz parte do futebol, saí prejudicado do jogo, mas ganhámos e isso foi muito importante para a manutenção do Campomaiorense.

Achas que foi um episódio que te afectou negativamente a carreira?
Sim, completamente. Marcou-me pela negativa. São coisas que podem acontecer, mas na altura penso que as críticas não foram as mais corretas. O futebol é assim, não se pode mudar, mas fiquei muito triste na altura e não é algo que recorde com felicidade… Foi como um puxar do tapete.

E como foi a ida para o CD Aves, o teu último clube na Primeira Liga?
Foi mais ou menos porque não queria ir para o Aves, mas tive de ir. Era um clube muito instável e não foi uma época boa. Fiz alguns jogos, mas tive algumas lesões que me prejudicaram e a minha cabeça não estava na Vila das Aves e as coisas não correram bem.

Estavas a ser empurrado para fora do Benfica?
Não sei se estava a ser empurrado porque o Benfica não era o clube que é hoje. Não tinha a estrutura profissional que tem hoje e nós sabemos qual era o presidente que o Benfica tinha, o clube não estava entregue às melhores pessoas e passava a pior crise da vida dele. Só a partir do presidente Vilarinho é que as coisas começaram a dar uma volta.

– Da desilusão em França à aventura pelo Médio Oriente –
“Quando se leva muito pontapé no futebol, as portas começam-se a fechar e o amor… Não se perde, mas a motivação vai caindo cada vez mais”

Depois dessa época no Aves termina a tua ligação com o SL Benfica e começa uma série de viagens pelo mundo, que começa no Istres, da Segunda Liga francesa…
Sim, mas no Istres também não correu bem porque assinei contrato e depois recebi uma carta da Federação francesa a dizer que já tinham inscrito dois jogadores e eu não podia jogar… Fiquei o resto da época sem jogar.

Chegaste lá no final do mercado?
Sim, cheguei lá no fim do mercado de inverno, mas só depois é que repararam que já tinham inscrito dois jogadores. Não sabiam as leis… Foi um problema directivo e quem sofreu fui eu.

E acabaste num clube do terceiro escalão da Alemanha…
Sim… Tens de ser muito forte para aguentar isso. Depois lá parti o pé, mas recuperei e ainda voltei a jogar. Só depois é que fui para a Arábia Saudita.

Pensaste em acabar a carreira nessa altura, na Alemanha?
Sim, pensei. Não foi uma fase positiva da minha vida e, em termos desportivos, pensei em muita coisa, uma delas essa. Durante um ano as coisas correram horrivelmente mal, pensa-se tudo, mas o meu amor pelo futebol falou mais alto. Mas foi uma fase muito difícil desportivamente.

Como é que aparece a Arábia Saudita?
Foi através de um amigo meu empresário – o Faustino Gomes – que me perguntou se queria ir para a Arábia Saudita. E ainda bem que ele apareceu porque ajudou-me na altura e foi a decisão mais certa para mim. Não foi fácil entrar no país, porque estava habituado a Portugal, a Lisboa e aos nossos costumes, mas como eu sou tipo «cidadão do Mundo» habituei-me com alguma facilidade e pensei pouco, jogava muito, descansava muito e assim foi a minha vida lá. Fiquei um ano seguido e as coisas correram muito bem, joguei sempre, os jogos praticamente todos e readquiri confiança e a vontade de jogar e de reconstruir a minha carreira voltou com mais força ainda.

Como foi o choque de culturas?
Estava habituado a Portugal, à nossa cultura. Aquilo é uma cultura completamente diferente, não estou a dizer que é melhor ou pior, é diferente. Estamos habituados a ser mais abertos – somos europeus – e de repente entras num país mais fechado, que não é tão aberto ao turismo, que não é aberto em muita coisa. Custou-me um bocado ao início mas, como disse, sou um «cidadão do Mundo» e vou aprendendo. Naquele caso aprendi outra cultura, conheci outras pessoas, trataram-me bem, o que é importante… Estava a fazer o que gostava, recebia relativamente bem, não é o que se paga agora, mas relativamente bem. Fiz uma boa época na Arábia Saudita, joguei muito e voltei ao meu nível.

Acabaste por ir para o Qatar porquê?
Foi mais pelo lado financeiro, porque o futebol na Arábia Saudita era melhor, os sauditas são melhores jogadores que os qataris. Mas o futebol do Qatar tinha maior visibilidade na altura porque os estrangeiros que iam para lá – Guardiola, Batistuta… – davam muita visibilidade ao campeonato. Tinham lá grandes jogadores juntamente com os jogadores do Qatar, mas grandes jogadores mesmo, de nível mundial.

Qual foi a pior parte de estar nestes países mais conservadores?
A pior parte? Foi estar longe do Mundo do futebol, não viver aquela adrenalina do dia-a-dia, do calor das pessoas, o calor humano dos jogos na Europa, isso faz falta. Senti falta do calor do futebol, até um bocado das confusões porque, às vezes, estamos nesses países assim, com saudades de uma confusão por causa de futebol, que é o que acontece na Europa. Até o calor humano dos adeptos, dos jornais… Aquelas coisas que reclamamos aqui, mas quando vamos para países tão calmos sentimos muita falta dessas coisas.

Surpreendentemente, deixas o Qatar para vir para a III Divisão portuguesa, para o O Elvas. Tinhas saudades de casa?
Eu saí do Qatar e, mais uma vez, a decisão não foi certa porque eu achava que ia ter uma oportunidade na Primeira Divisão ou, no máximo dos máximos, na Liga de Honra. Pensava que podia mas, mais uma vez, as portas não se abriram. Tentei ir para outros países, mas não consegui. Então deixei praticamente de jogar e fiquei em casa.

Desmoralizaste outra vez?
Desmoralizei porque pensava uma coisa: lutei tanto, voltei a ganhar forma, voltei a jogar com grandes jogadores estrangeiros que lá estão e vi que tinha possibilidade de voltar ao meu nível, mas mesmo assim não aconteceu porque as portas, mais uma vez, fecharam-se e acabei a carreira.

Acabaste mas sem primeiro passar pelo Badajoz…
Sim, mas foi mais por desporto. Depois perdi um bocado o amor, aquela adrenalina de jogar todos os fins-de-semana vai-se perdendo. Quando se leva muito pontapé no futebol, as portas começam-se a fechar e o amor… Não se perde, mas a motivação vai caindo cada vez mais.

– Dos holofotes do futebol para os flashes do mundo da moda –
“Por mim, tinha jogado a minha vida toda no Benfica, teria feito 20 anos lá”

Com tanto tempo para ponderar o final da carreira, o que pensavas fazer depois do futebol?
Eu gostava de ter ficado ligado ao futebol, mas não houve possibilidade. Estive ligado a várias áreas, trabalhei com um empresário espanhol, já estive ligado a exportação de vinhos e neste momento estou ligado ao imobiliário e sou personal trainer também. Temos de trabalhar… A vida continua. O amor pelo futebol não acabou, mas a vida continua. Terminamos a carreira relativamente novos para depois termos outra vida pela frente.

Ainda chegaste a trabalhar numa academia do Benfica, não foi? 
Sim, foi em Badajoz. Funcionou bem e acho que ainda hoje está aberta, mas voltei para Lisboa e tive de sair. Mas correu bem, não é uma academia em que haja muita qualidade, mas tem muitos miúdos e funciona bem.

E como é que acabas por ser modelo? É que há muito aquela ideia que o jogador pensa que é mais modelo que futebolista…
Isso foi depois porque, um dia, estava em Badajoz a passear e houve alguém de uma agência que falou comigo e me contactou. Entregou-me um folheto e disseram para ir ter com eles, era um casal. Eu disse que não tinha nada a ver com aquilo mas ele tanto insistiu que depois liguei e acabámos por fazer algumas coisas. De vez em quando, até aqui em Lisboa, quando me convidam vou fazendo. Mas não é nada de… Se me pagam sim, tudo bem. Se for de borla, é para esquecer. Para isso fico em casa e não me chateio.

Gostavas de regressar ao futebol?
Gostava, mas não sei bem. Treinador não, porque já tenho 44 anos e não é fácil ir agora tirar cursos durante 10 anos. É difícil ser treinador de futebol, por causa dos cursos e depois podes nem ser aceite. É tão complicado tirar quatro níveis que mais vale tirar um ou dois e estar mais ligado à parte do treino, sem ser treinador principal. Isso é algo que gostava.

De que te arrependes na carreira?
Arrependo-me de algumas decisões que tomei na altura. Por minha culpa, não devia ter feito algumas coisas. Sou um jogador à antiga: por mim, tinha jogado a minha vida toda no Benfica, teria feito 20 anos lá. Era algo que gostava de ter feito. Era mais fácil fazê-lo na minha altura que agora, mas era algo que ambicionava. Mas as coisas não correram, nem de longe, nem de perto, assim mas era o que eu ambicionava para a minha carreira.

– A actualidade do SL Benfica pelos olhos de José Soares –
“Nem nos meus piores sonhos eu pensava que o Benfica ia perder o campeonato este ano”

Como és um grande adepto do Benfica, como olhas para a actualidade encarnada com a saída de Lage e o regresso de Jorge Jesus?
Como deves calcular, não muito feliz. Nem nos meus piores sonhos eu pensava que o Benfica ia perder o campeonato este ano. Como terminou a época no ano passado, esta tinha de ser avassaladora na minha opinião, ou taco-a-taco com o FC Porto até ao fim… O Benfica ainda fez uma primeira volta boa, mas nunca convenceu as pessoas, é o que eu acho. Podem dizer que teve sete ou oito pontos à frente do FC Porto, mas não era convincente, víamos as exibições e, se o Benfica começasse a perder, tinha grandes dificuldades de dar a volta, porque sempre ganhou pelo talento e, no futebol de hoje em dia, se ganhas pelo talento vais ter dificuldades. Se sofres muitos golos mas ganhas os jogos, vais ter muitas dificuldades porque as equipas fazem-se a partir de trás. Não sou muito adepto do estilo «ah ganhámos por 5-4 ou 4-3», sofres muitos golos e no dia em que não marcares? Será que consegues defender bem e não sofrer três? Eu prefiro o 2-0, o 3-1, sofrer poucos golos sempre, porque isso dá uma solidez defensiva e quando se ganha 4-3 ou 5-4 é bom para o espectáculo, mas para a equipa não é bom porque sofres muitos golos e, no dia em que não consigas fazer os quatro ou cinco golos, não ganhas o jogo. Eu via o Benfica a marcar e a ganhar mas não via consistência suficiente para as pessoas não ficarem preocupadas e, infelizmente, foi o que aconteceu.

Tu que estiveste lá dentro, achas que a culpa é só do treinador ou também do plantel?
Não acredito que seja só culpa do treinador, é culpa de todos. O treinador é o líder, mas há mais 20 jogadores experientes que sabem perfeitamente o que têm de fazer. Se as coisas estão a correr mal, não pode ser só culpa de um treinador que, ainda por cima, não joga. Os jogadores eram os mesmos, a equipa era a mesma, por isso não acredito que seja só do treinador. Os jogadores têm culpa também. 

Acreditas que os jogadores tenham «feito a folha» ao Bruno Lage?
Não, não acredito. Acho que é mais desmotivação, não sei porquê, mas acho que é desmotivação, não estar bem psicologicamente, que outra coisa. Agora, não acredito que os jogadores tenham-lhe feito a folha. Isso não.

E como vês o regresso de Jorge Jesus?
Digo que não se deve voltar ao lugar onde foste feliz, mas no futebol tudo é possível. Na minha opinião, ele quando esteve no Benfica fez um enorme trabalho, foi dos melhores treinadores do SL Benfica porque sabe muito de futebol, os jogadores com ele vão correr muito, vão dar tudo sempre porque ele é muito chato. Às vezes até faz coisas que os jogadores não gostam, mas eles dão tudo quando têm treinadores que puxam por eles como ele faz. Teve sucesso no Benfica – para mim, fez coisas extraordinárias – agora, se é o momento ideal para ele voltar, não sei… Mas acho que os grandes treinadores são sempre bem-vindos às grandes equipas e o Benfica, que não tem treinador, só o Veríssimo que está a ocupar as funções, precisa de um grande treinador. Seja Jorge Jesus ou outro qualquer.

Achas que será o fim de linha para o projecto de Luís Filipe Vieira? É que ele está praticamente a voltar atrás…
Num clube com a grandeza do Benfica estamos sempre a prazo e o presidente também. Os sócios estão descontentes pelo que se tem passado, pelo que se passou esta época, as eleições são em Outubro… Não sei. Não sei quais são as alternativas também. Ele tem feito um bom trabalho, mas as coisas passam e o futebol é o presente. Os sócios do Benfica são muito exigentes e eles não querem saber se fez o estádio, se fez o Seixal… Querem é saber do presente. Este ano foi muito mau, muita confusão, o Benfica está muitas vezes em tribunal, é falado mal na imprensa por coisas judiciais, o que leva os sócios a pensar em muita coisa.

Como olhas para esta situação, já que ele foi teu presidente no Alverca?
Ele é um excelente presidente, eu tenho uma boa relação com ele, mas o Benfica está muitas vezes em tribunal. Eu também não gosto disso. Algo vai ter de mudar porque o clube está sempre a ser enxovalhado na praça pública com pessoas arguidas, o clube a fazer parte de processos por coisas más. Isso não é benéfico e alguém tem de fazer alguma coisa.

E achas que vai ser Jorge Jesus a conseguir essa mudança? É que parece que vai ser ele a tomar as rédeas de tudo…
Eu penso que sim. Ele também já tinha feito um bom trabalho no clube e agora vem moralizado pelo que fez no Flamengo e, de certeza, que vai ter grandes poderes. Os grandes treinadores têm sempre grandes poderes nos clubes e ele não vai fugir à regra, vai pôr em prática as suas ideias e o que será o melhor para o clube e fazer um excelente trabalho… E espero bem que o faça, porque este ano as coisas correram muito mal. Mas ainda há uma Taça de Portugal para ganhar e isso é muito importante.

Que motivação os jogadores vão ter para jogar essa final? É que parece que já estão a pensar no próximo ano…
Mas têm de ter. O que tu disseste é verdade, ainda hoje estava a pensar nisso, mas quando vestes aquela camisola tens de ter… A pressão é diária e só o facto de haver mais um jogo e representares aquele clube tens de saber que a época ainda não terminou.

Achas que o Veríssimo, que jogou contigo, consegue mantê-los em ordem?
Eu acho que sim. Foi adjunto do Lage por algum motivo. Ele é benfiquista, foi jogador da casa muitos anos portanto, até ao final da época, ele dará tudo. Mais que ninguém, porque foi profissional de futebol, ele sabe o que os jogadores precisam neste momento e tem de se preparar bem para honrar aquela camisola com muita dignidade."

Competitividade garantida

"O regresso das modalidades de pavilhão ao activo está a intensificar-se por estes dias, com muitos atletas a manterem já a sua forma física nas instalações do Sport Lisboa e Benfica.
No andebol, os treinos colectivos vão começar no dia 3 de Agosto, mas já há um trabalho intensivo a ser desenvolvido durante esta semana – de acordo com as normas de segurança definidas pela DGS – por todos os profissionais que vão representar o Clube nas diversas frentes competitivas. Para a nova temporada desportiva, a equipa conta com seis reforços anunciados, todos com experiência adquirida em grandes campeonatos europeus e, por isso, habituados a altos níveis de competitividade.
Sergey Hernández tem 25 anos, é internacional espanhol e destacou-se como guarda-redes na conceituada Liga ASOBAL. Arnau García, de 26 anos, também já foi internacional por Espanha, reforça a lateral esquerda encarnada e vem de três temporadas no categorizado andebol francês. Com experiência também em França, Matic Suholeznik (25 anos) é internacional esloveno e chega para alinhar na posição de pivô. Para as posições de ponta, foram contratados Ole Rahmel (30 anos) e Mahamadou Keita (25 anos). O primeiro atleta é um nome de referência da selecção da Alemanha, joga no lado direito e actuou durante as últimas três épocas no THW Kiel, um dos colossos do andebol da Alemanha. Keita é internacional pelas camadas jovens de França, actua como ponta-esquerda e traz consigo a experiência de alinhar no competitivo campeonato gaulês. O central Lazar Kukic (24 anos) foi o último nome a ser oficializado, é internacional sérvio e chega com experiência no andebol espanhol.
Destacam-se ainda as renovações já conhecidas de Paulo Moreno, João Pais e Bélone Moreira, todos atletas importantes, assim como outros elementos do grupo de trabalho, para uma integração que se espera de sucesso dos novos rostos para a época 2020/21.
Depois do andebol, o hóquei em patins e o futsal serão as equipas que voltarão ao trabalho. Os índices de competitividade estão assegurados em ambas, com o hóquei em patins – que era líder do Campeonato 2019/20 aquando da paragem por causa da pandemia – a manter a sua base. Já foi anunciado o regresso de Danilo Rampulla (avançado de 21 anos) e a continuidade do capitão Valter Neves, que vai para a 17.ª temporada ao serviço do Clube.
No que respeita ao futsal, além das renovações de Diego Roncaglio, Robinho, Fits e Tiago Brito, já foram oficializadas a chegada dos internacionais Nílson (fixo português de 28 anos) e Arthur (ala brasileiro de 26 anos). Sublinhe-se a integração dos jovens da Formação Silvestre Ferreira e Martim Figueira num plantel que estará pronto para corresponder aos pergaminhos do Clube.
No voleibol, a aposta no trabalho que vinha a ser desenvolvido é clara. A pandemia até pode ter travado o trajeto brilhante que a equipa estava a fazer – era líder invicta do Campeonato e estava na fase decisiva da Taça de Portugal –, mas não impediu que a estrutura fosse mantida para perseguir mais conquistas. O treinador Marcel Matz prolongou a sua ligação com o Clube, tal como os atletas Hugo Gaspar, André Lopes, Zelão, Rapha, Marc Honoré, Tiago Violas e Afonso Guerreiro.
O basquetebol, por seu turno, assegurou a permanência da base portuguesa que tinha para a época que se avizinha. As renovações de Arnette Hallman, Fábio Lima e José Silva foram oficializadas e mais novidades – além do já conhecido reforço Scottie Lindsey (extremo de 23 anos) – serão comunicadas até ao início oficial, com a certeza de que será um grupo ambicioso para atacar 2020/21.
O desporto feminino foi e continuará a ser um foco do Clube e as renovações recentes no caso do futsal mostram que as atletas estão em sintonia com a aposta que tem sido feita na modalidade. As capitãs Inês Fernandes, Ana Catarina e Sara Ferreira são referências a nível nacional e internacional, assumindo um papel muito importante na transmissão dos valores para as mais novas. Destacar as renovações também já conhecidas de Maria Pereira e Beatriz Sanheiro e a contratação da jovem internacional Sub-19 Leninha (ala de 18 anos).
O hóquei em patins irá partir com o objectivo de manter a hegemonia na modalidade, tendo já garantido a aquisição da internacional argentina Flor Felamini (avançada de 22 anos), além das jovens de 17 anos Rita Albuquerque (guarda-redes) e Catarina Pedro (avançada). Nota especial ainda para a integração de Inês Severino (defesa/médio), de 14 anos, no plantel sénior.
No voleibol, a equipa irá lutar pela subida ao escalão principal em Setembro e já assegurou a internacional portuguesa Neusa Neto (central de 26 anos) para a nova época. Haverá mais novidades durante o próximo mês, tal como no andebol e no basquetebol, sendo que nesta última modalidade já foi anunciada a contratação do treinador Eugénio Rodrigues.
Em suma, apesar de todo o contexto provocado pela COVID-19, o Clube apetrechou – e está a apetrechar – as suas equipas de pavilhão para que estas lutem pelos triunfos nas várias competições."

Lamento, mas esperar pelo erro não é jogar à bola. Futebol é Famalicão e Rio Ave: os elogios aos segundos que mereciam ser primeiros

"Ao final da cada época fazem-se os balanços, entregam-se as medalhas, e o campeão tem merecidamente todos os focos em si apontados. Ainda assim, as equipas que me ficam na memória são aquelas que causam boas sensações na experiência de visualização dos seus jogos. Estou certo de que o título irá gerar algumas graçolas motivadas pela celebração das vitórias morais, e porque ainda há quem ache que está fora do meu entendimento que existem vários caminhos para se chegar a vitória. Deixem-me surpreender-vos: não está!
O futebol não é uma ciência exacta, não é matemática, e há demasiados factores externos a contribuir para o catapultar - ou para a hecatombe das equipas que competem dentro do relvado.
O que me recuso a aceitar é que queiram que abandone o meu espírito crítico, e siga a mediocridade reinante no futebol como se fosse ela a apaixonar pelo jogo os milhões de fãs que tem por todo o mundo.
Há já alguns anos que abandonei a lógica de que o vencedor é intocável. Deixem-me reiterar o apaixonar pelo jogo e não pela aceitação mediática de todos os que querem colar-se ao vencedor, independentemente da forma como lá chegou.
Quem gosta do jogo, por exemplo, não pode achar digno de aplauso a postura do Vitória desde que Lito Vidigal assumiu o comando da equipa. Recuso-me a aceitar que seja esse o único caminho para conseguir a manutenção e, mais ainda, a dar-lhe todo o mérito por ter funcionado naquele contexto. Não tem nada a ver com modelo de jogo, não tem nada a ver com a escolha dos jogadores; tem a ver com dizer basta a uma ideologia baseada em não jogar e em não deixar que os adversários joguem. Uma equipa de futebol onde a principal ideia é que não se jogue futebol é o regresso absoluto à idade da pedra.
Lamento, mas isto não é futebol.
O futebol tem regras, e as regras constrangem. Constrangimentos esses que ditam melhores ou piores caminhos para se chegar ao sucesso. Fazer um autogolo de propósito não é jogar bem futebol, porque diminui a probabilidade de chegar ao objectivo final. Esperar o jogo todo por um erro do adversário como eu espero que me saia o Euromilhões também não é boa política para se chegar ao destino; afinal, é possível, mas a probabilidade continua a ser muito baixa.
Talvez seja melhor fazer um pouco por aumentar as probabilidades e com elas as possibilidades – ter um plano traçado para a época desportiva onde a congruência é o ponto chave. Criar um plano e um modelo desportivo, contratar as competências directivas necessárias para cumprir com o plano, pensar nas pessoas certas para dirigir o futebol, em que jogadores para chegar ao destino, e em que treinador para comandar o perfil de jogador escolhido.
O futebol de sucesso sustentado é isto, e é com esses preceitos que terá menor probabilidade de desabar com a queda de um ou outro sujeito.

Os Segundos
Decerto, haverá mais uma ou outra piada uma vez que Rio Ave, Famalicão e Atalanta não ficaram no segundo lugar (em Itália ainda está por decidir) nos seus respectivos campeonatos. Não obstante disso, em Portugal foram as duas equipas do norte do país que mais fizeram por serem reconhecidas pelo que jogaram, e nos campeonatos da UEFA a estrela mais brilhante está no terceiro lugar em Itália.
A Atalanta é um espanto. Joga sem os preceitos e os preconceitos dos princípios de jogo definidos nas universidades do futebol; contudo, faz-nos querer ver mais sem nos queixarmos das horas que perdemos a ver futebol. Gasperini é o treinador em quem o clube apostou para dar corpo a uma filosofia baseada na valorização das melhores qualidades dos seus activos, que se compreendem e complementam nas qualidades que têm. Joga um futebol sem medo, nada geométrico na forma de atacar, sem as simetrias com que nos habituaram a olhar para a movimentação dos jogadores, mas com as intenções todas focadas no mesmo propósito: criar situações de golo de qualidade.
É uma equipa onde todos os jogadores jogam o momento ofensivo e o momento defensivo; e claro que para tal contribui de forma decisiva o facto de não existir por lá nenhum nome que não tenha sido ampliado pela exposição que a equipa e o treinador lhe permitiram.
Este trabalho de Gasperini, onde superou o recorde de pontos, e nesta época superou o seu recorde conseguido na primeira época, só é possível com todos os interesses aliados – direcção, jogadores, treinador; e é por isso que se torna, para mim, tão difícil de explicar em texto o que a Atalanta produz em campo. Vejam os jogos.
Em Portugal, é uma tristeza que o Famalicão tenha ficado fora da Europa. Foi das equipas que mais alegrou os dias de quase todos os que seguiram uma liga que durante meses não nos deixou grandes motivos para sorrir. Ainda assim o projecto do Famalicão é ganhador, e se seguir por este caminho terá condições para em breve atacar a luta pela Europa desde o dia zero.
Os destinos do clube foram traçados por Miguel Ribeiro, que abandonou uma ideia de equipa na segunda liga onde o peso e a altura eram o denominador comum. Subiu de divisão e percebeu que a sustentabilidade e, sobretudo, o modelo de negócio não teria nada de diferenciador para que os olhos de Portugal ficassem vidrados numa equipa cuja expectativa seria a de conseguir assegurar rapidamente a manutenção.
Comprou inteligência e qualidade técnica, e contratou um treinador que tentou não fugir à ideia de jogo pensada para aqueles executantes. Houve um foco tão grande no ideário que nem nos largos momentos de dúvida, de maus resultados, houve mudanças no projecto desportivo do clube. Dessa forma valorizou os jogadores de forma extraordinária, deu palco a um treinador que é agora pretendido por clubes com outras responsabilidades, está em condições de vender vários deles por milhões de euros que o Famalicão nunca viu na história, conseguiu o respeito de todos os seus adversários - e um estatuto que lhe vai cobrar uma subida de nível no planeamento e objectivos declarados para a próxima época. O Famalicão, tal como o Rio Ave, mereciam ter sido ambos premiados com a Europa.
O Rio Ave é o resultado de um grupo de jogadores com qualidade e de um treinador sem complexos em expor os seus comandados à plenitude do jogo de futebol. Foi uma irresponsabilidade responsável de Carlos Carvalhal. O reflexo das vivências e das mudanças que o técnico português acumulou ao longo dos últimos anos foram vistos em Vila da Conde na forma das intenções com que convenceu os seus jogadores a abordarem os jogos: querer jogar todos os momentos do jogo, querer sair a jogar, querer entrar nas costas da pressão adversária, ter vários movimentos de profundidade com a bola coberta ou descoberta, não abusar dos cruzamentos e querer também invadir a área, tentar pressionar a saída de bola de todos os adversários, e subjugar até alguns deles (inclusivamente os dois primeiros) ao momento de organização defensiva.
As equipas do mister Carvalhal sempre foram muito organizadas, mas não eram particularmente criativas nos momentos colectivos; este Rio Ave é criativo a atacar e a defender. É certo que nem todos os jogos foram bons, que houve algumas flutuações de rendimentos, porque no fim são os jogadores a definir o último momento ofensivo e defensivo, mas restam-me poucas dúvidas que é o momento ideal para o treinador dar um grande salto e ter finalmente a oportunidade de lutar por troféus importantes.
Como seres humanos, temos uma tendência fatal para procurar qualidades em quem ganha e colocar defeitos a quem não ganha, quando eles estão presentes em ambos, e a vitória ou a derrota não se fizeram pela força das qualidades ou fragilidade dos defeitos.
Nesta ronda, em Portugal, a forma como o Famalicão sofre o primeiro golo e como o Rio Ave se coloca na frente do marcador são o exemplo mais simples de como podem ser os imponderáveis a marcar, no final, os destinos de uma equipa. Ainda assim, não me vou esquecer que foram estas duas equipas, nesta época, que mais fizeram por superar as expectativas que neles foram depositadas em Portugal, e na Europa.
Os campeões, nas maiores ligas europeias, foram equipas com responsabilidade para o ser; e o facto de Rio Ave, Famalicão e Atalanta terem conseguido superar a sua melhor pontuação de sempre, e terem durante a época lutado por objectivos que não eram da sua responsabilidade - relegando para um plano inferior equipas com outras ambições-, fez-me escrever sobre o mérito das equipas, dos directores, dos jogadores, e dos treinadores que neste ano deveriam ter sido levados ao pódio como grandes campeões que foram."

“Deixe-me acabar!” com os painéis de adeptos

"Águias, leões, dragões e gatos pardos.

quase dez anos, o cirurgião Eduardo Barroso berrava “Deixe-me acabar!” a Fernando Seara, em plena televisão por cabo, no programa Prolongamento. Esta semana, assistimos ao princípio do fim desse tipo de formatos. A SIC e a TVI decidiram acabar com os painéis de adeptos dos três grandes nos seus canais informativos e a decisão tem sido recebida com elogios.
Não há dúvidas que muitos dos conteúdos futebolísticos nos canais de informação prejudicam, lá está, a informação. A partir do momento em que as televisões não acompanham em directo o Conselho Europeu que municiou o Estado português de milhares de milhões para distribuir pela economia, mas têm uma equipa de reportagem no terminal de aeroporto onde vai pousar a aeronave que transporta um treinador, o papel do jornalismo na democracia está em causa. Não só porque a informação relevante para as pessoas decidirem não chega na plenitude ao cidadão, como a futebolização da televisão foi também contribuindo para a futebolização da democracia.
O caso mais descarado parte de um canal que, até agora, parece querer manter estes formatos que agora caem em desgraça. O sucesso de André Ventura não é por acaso. Não foi pela candidatura autárquica apoiada pelo PSD - um erro grave que o partido pagará mais tarde; nem pelo comentário a casos judiciais na mesma estação que Ventura ganhou reconhecimento. Foi o comentário clubístico acéfalo, anti-desportivo e propagandista que tinha na CMTV todas as semanas que o nome de Ventura começou a ser familiar aos portugueses.
Para quem não gosta de futebol, é fácil e compreensível considerar estes programas todos iguais e equitativamente deploráveis, um óbvio desperdício de tempo de antena. Mas a verdade é que nem sempre foram o lamaçal que hoje conhecemos. Apesar de sempre contarem com picardia, desaforo e a ocasional falta de respeito, tudo mudou quando as televisões aceitaram substituir adeptos mais ou menos livres por funcionários das máquinas de propaganda dos clubes. Situo a mudança de paradigma talvez em 2014. A CMTV tinha surgido no mercado, as direcções de informação começavam a transformar os canais de notícias em canais de notícias futebolísticas, os três grandes eram presididos por entusiastas da guerrilha de informação.
Não há dúvida que certos programas, na sua fórmula actual, deviam acabar. Mas parece-me difícil crer que as direções de informação não tivessem em mãos o poder de reconfiguração. Dificilmente se acredita que os diretores não sabiam quem recebia a cartilha, metonímia para as versões da realidade que a comunicação oficial dos clubes queriam propagandear. A decisão de ontem - que me parece conjunta - da SIC e da TVI de acabar com os programas desportivos com representantes de clubes tem um lado meritório, mas também serve para alijar responsabilidades, pondo o ónus da tal toxicidade primeiro nos adeptos, depois nos clubes e, por fim, no desporto - como se as televisões não tivessem promovido, lucrado e tido mais do que tempo para alterarem o tom dos programas.
Se o argumento for retirar programas de adeptos porque são apenas ruído, nada acrescentam ao futebol e não veiculam informações relevantes para o público - e que o tempo que ocupavam seja preenchido por hard news -, tudo bem. Se o plano for substituir os programas de futebol de duas horas e meia por magazines de desporto mais curtos, assertivos e informativos, tudo certo. Agora, se o objectivo for repor estes formatos com painéis de pseudo-independentes, com a mesma duração, o mesmo sequestro do espaço mediático, os mesmos temas, a mesma estultificação do espectador, teremos resolvido zero problemas. Talvez seja mais difícil identificar águias, leões e dragões, mas facilmente nos lembraremos d’O Leopardo. Isto é, da frase mais conhecida da obra de Tomasi di Lampedusa, filmada por Visconti: “se queremos que tudo fique como está, é preciso que tudo mude”."

O fim do futebol, o princípio do desporto

"Confessemos: em Portugal não há notícias, há futebol e uma imensa quantidade de areia para os olhos adormecidos e torpes de uma população alheada.

Creio falar em nome de todas as portuguesas e portugueses ao afirmar a peremptoriedade do fim dos telejornais 20 minutos após o seu começo, quiçá meia hora, para dar lugar ao futebol, não só o nacional mas todo o futebol internacional, seguido de entrevistas a treinadores, jogadores de futebol e mil e um comentadores em estúdio ou em directo.
Confessemos: em Portugal não há notícias, há futebol e uma imensa quantidade de areia para os olhos adormecidos e torpes de uma população alheada.
Alheados do país, da cultura, do ensino, da saúde, dos seus direitos, do futuro e da vida enquanto as televisões insistirem em debitar toneladas de futebol entre antevisões de jornada, jornadas, comentários à jornada e a antevisão da antevisão da jornada seguinte, mais a Taça se Portugal, a Taça da Liga, os Campeões, a Liga Europa, o Europeu e o Campeonato do Mundo.
Assim, naturalmente, congratulamos as recentes decisões da SIC Notícias e TVI em acabar com os programas de futebol com comentadores que representam clubes.
Inevitavelmente, partilho o exemplo inglês, um país preenchido de futebol de norte a sul e onde os principais canais de notícias não dedicam senão cinco minutos ocasionais ao futebol, sem comentários, sem entrevistas, muitas vezes sem golos ou imagens do jogo, somente o pivot diante da câmara a relatar as notícias.
O resto do tempo de antena? É dedicado às outras modalidades, do atletismo à ginástica, do râguebi ao críquete (desporto ainda incompreensível aos olhos deste narrador), sem esquecer o desporto automóvel, o ciclismo, o basquetebol, andebol, vólei, tratando o desporto feminino e masculino por igual e celebrando as conquistas de todos os atletas nacionais, no sentido da promoção do desporto como elemento essencial da cultura de um país.
Se em Inglaterra pretendemos ver um programa de futebol e respectivos comentários, estes estão abundantemente presentes nos canais pagos. Cabe assim ao espectador decidir o que quer ver em função de quanto pretende gastar, mas sempre com a premissa de não ser inundado pelas ilusões do futebol 24 horas por dia, 365 dias por ano.
Infelizmente, ainda não vi iguais notícias da parte da RTP. Pretenderá a RTP tomar uma atitude mais conservadora, mas igualmente aproveitadora desta oportunidade, mantendo-se como o único canal com comentadores que representam clubes?
Ou quererá a RTP aceitar o desafio de dar um passo em frente e, verdadeiramente, democratizar o desporto? Mas o mundo é feito de pequenas conquistas. Enquanto a RTP não se decide, temos o dia ganho e um pouco mais de esperança num futuro onde no céu não habitam apenas as constelações de jogadores de futebol mas todos nós, desportistas e amantes do desporto por igual."