Estrumeira...

"O campeonato português está oficialmente de volta àquilo que melhor nos habituou: uma estrumeira em céu aberto. Abordemos, então, os tópicos do momento.

- A novidade: Cláudia Santos.
Fernando Gomes, presidente da FPF, assumido portista e participante activo nas escutas do apito dourado escolheu Cláudia Santos para liderar o Conselho de Disciplina da FPF e cedo se levantaram as vozes de indignação da cartilha do FC Porto e Sporting CP. Como seria de esperar, os habituais ratos de esgoto da cartilha azul e verde logo se apressaram a levantar dúvidas sobre a idoneidade da deputada.
Será a revolta destes resultante de Cláudia Santos ser considerada uma jurista competente, isenta e se calhar até demasiado imparcial para ocupar este tipo de cargo no futebol português (quão irónico)? 
Ou será devido ao facto de esta ser deputada do Partido Socialista e isso hipoteticamente resultar num conflito de funções? É que o parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados é claro e menciona precisamente o contrário, referindo que não existe qualquer tipo de incompatibilidade entre funções. Além do mais, não vimos estes energúmenos revoltados pelo facto de Fontelas Gomes ser casado com Eliana Pinelo (e aqui sim, existir uma incompatibilidade de funções), ou de Alfredo Braga ter um sobrinho observador, ou ainda o Dr. Paulo Costa, vice presidente da secção não profissional, ter como irmão o árbitro Rui Costa.
Se não é um nem outro, qual é então o verdadeiro motivo da revolta? Já todos devem saber a resposta.
O que verdadeiramente os incomoda dentro da panóplia de estupidez argumentativa é o facto de Cláudia Santos - veja-se bem - nutrir simpatia pelo SL Benfica, mesmo não gostando de futebol. É fundamentalmente isto que está em causa para a tão famigerada e conhecida cartilha dragarta.
Não importa que seja uma pessoa competente, isenta e com valores. Não. Como nutre simpatia pelo SL Benfica, é forçosamente um alvo a abater o mais rapidamente possível. Para a cartilha, os únicos nomes que lhes interessam para ocupar estes lugares de relevo decisório no futebol português, são aqueles que beneficiem unicamente os interesses dos clubes que apoiam (FC Porto e Sporting CP) e que prejudiquem severamente o SL Benfica. Para estes, Meirim é o boneco amestrado perfeito. Veja-se o caso mais recente de arquivamento vergonhoso do caso da agressão a soco bem notória de Pepe sobre Taarabt. É apenas um exemplo entre muitos outros, pois a lista é extensa.
Veremos até que ponto resistirá Cláudia Santos à pressão doentia que lhe tem sido incutida por um sem número de soldados ao serviço da santa aliança, um deles inesperado e com um dobrar de espinha capaz de fazer inveja à melhor contorcionista do mundo, Julia Günthel.

Falamos do espezinhado e ex-presidente da Liga de Clubes, Mário Figueiredo, que após um coma prolongado, apareceu da gruta de onde estava hibernado para cuspir verborreia de forma sistemática contra a deputada.
Resta saber a troco do quê.
Perante todas estas pressões e jogo sujo, não seria surpreendente se Cláudia Santos não tivesse força para iniciar funções no dito cargo. O Polvo está atento e de olhos bem abertos.
- Anatomia de um urso: Mário Figueiredo.
E por falar em hibernação, é com espanto (para dizer no mínimo), que vemos o ex presidente da Liga de Clubes a usar a sua página pessoal de Facebook para se insurgir contra a escolha de Cláudia Santos para liderar o CD da FPF, acusando-a de ser parcial e anti-direcção do FC Porto, nomeadamente do seu líder Pinto da Costa. Mário Figueiredo, inclusive, confidencia que incluiu Cláudia Santos na sua lista para o CII da Liga da altura, porque lhe foi recomendada pelo advogado do FCP. Ou seja, ficámos a saber que Mário Figueiredo actuava e escolhia pessoas para a Liga, tendo por base ordens do advogado do FCP, o que por si só é gravíssimo e diz muito da falta de idoneidade, honestidade e imparcialidade desta figura.
Mário Figueiredo também demonstra indignação por Cláudia Santos utilizar nas suas aulas, como modelo, o acordão de absolvição do FCP do Tribunal da Relação do Porto, dando-o como um exemplo para aquilo que não se deve fazer na Justiça em Portugal. Como se Cláudia Santos estivesse errada ao defender que o FCP incorreu em práticas de corrupção desportiva nesse processo. Veja-se o desplante e a falta de vergonha na cara deste senhor.
Relembramos que quando Mário Figueiredo cumpria o seu mandato na Liga de Clubes foi perseguido, humilhado e ultimamente despachado do cargo por interesses portistas e sportinguistas, que posteriormente colocaram no cargo o seu boneco amestrado favorito, o ex-árbitro Pedro Proença. No entanto, quem "manda nisto tudo" é o Benfica, com a conivência do portista presidente da FPF Fernando Gomes. Curioso, no mínimo.
Um chorrilho de disparates por parte de um sujeito que só poderá ter motivações obscuras por detrás. Será que terá a ver com o facto de ter resolvido o diferendo judicial que tinha com Adelino Caldeira, advogado do Futebol Clube do Porto, e daí ter mudado de direcção? Será que Mário Figueiredo tem algum cargo prometido?
O que leva alguém que sofreu uma tentativa de assassinato a passar a ser porta-voz de quem o tentou matar, tendo sido, inclusive, um dos indivíduos recentemente "entrevistados" por Tariq Panja, jornalista no NY Times correlacionado com a cartilha do FC Porto?
Já dizia o povo e é verdade: «quem tem cu, tem medo». 
- Putrefação dos anos 90: José Leirós.
Também ficámos a saber que José Leirós pretende apresentar uma candidatura ao Conselho de Arbitragem da FPF. Isto por si só daria motivo de risos às gargalhadas, não fosse este um assunto demasiado sério.
José Leirós, um dos rostos mais evidentes do lado mais negro do Apito Dourado que minou o futebol português durante largas décadas. É este tipo de gente sem valores, sem escrúpulos e com ódio bem vincado contra o Benfica que querem fazer regressar aos cargos de maior poder do futebol português.
Este, além da sua alegada candidatura, também anunciou que nessa lista constarão ex-árbitros. A equipa da Polvo das Antas antecipa-se a José Leirós e afirma que entre esses nomes estarão Jorge Coroado ou mesmo Marco Ferreira, dois sujeitos que fazem do cronismo anti-Benfica o seu modo de vida.
É este tipo de gente que fará com que o futebol português respire melhor? Não brinquem com a cara das pessoas.

- Regresso à normalidade: vandalismo anti-Benfica.
Nem em plena pandemia que já ceifou inúmeras vidas conseguimos ter paz no futebol português. E porquê? Pelo simples facto do ódio ao Benfica ser tão severo e doentio que ultrapassa qualquer tipo de barreira lógica e sensata neste país. Há uns dias tivemos mais um exemplo no Olival com a tarja da claque Super Dragões que indicava que «agora o Vírus é outro», com a palavra “Vírus” escrita a vermelho, em clara referência ao SL Benfica e aos benfiquistas. Não obstante tivemos ainda recentemente outro acto de vandalismo no mural dedicado a grandes glórias do SL Benfica na rotunda Cosme Damião, e também nas Casas do Benfica de Almada e Charneca da Caparica, vandalizadas com tinta verde em alusão ao anti-benfiquismo de alguns acéfalos afectos ao Sporting CP.
As entidades que gerem o futebol português continuam sem nada fazer e sem nada dizer, e depois admiram-se que a violência no futebol português volte a escalar. Até quando?

Estamos atentos às manobras do FC Porto e aos seus verdadeiros interesses."

A salvação do canal do crime?

"Numa altura em que o FC Porto continua impunemente a pressionar e coagir todas as instâncias judiciais, políticas e desportivas, através de uma rede de influência que ganha novos soldados a cada dia, promovendo o seu contínuo domínio, poder e influência, ressaltam dois acontecimentos recentes:
António Costa, concedeu uma entrevista ao Porto Canal e é noticia que Marcelo Rebelo de Sousa vai receber o Presidente do FC Porto, Pinto da Costa, na condição de Administrador da FC Porto Média.
- Onde estão os arautos de indignação da promiscuidade entre política e futebol?
- Qual a razão para o Primeiro-Ministro conceder uma entrevista ao canal de um clube que recentemente, abriu as portas do seu estádio, para a sua claque legalizada, exibir uma tarja em que o acusa de decidir campeonatos de futebol?
- Porque motivo um canal condenado em tribunal no processo de divulgação de emails do SL Benfica, assente numa estratégia de propaganda e manipulação, merece agora este cuidado especial por parte do sistema político?
- Vamos todos pagar a salvação de um canal, outrora com rigor e qualidade, mas que se transformou num mero veículo de comunicação da FC Porto, SAD e dos que mais tem contribuído para o enlamear do desporto em Portugal?
- O que não se diria se António Costa desse uma entrevista à BTV?
É mais do mesmo. A estratégia do ruído, suspeição e insinuação, que visa apenas continuar a perpetuar o poder e influência de sempre."

O 11 mais caro de sempre do SL Benfica

"Duas vezes por ano, no verão e no inverno, os clubes têm a oportunidade de abrir os cordões à bolsa e de reforçar os seus plantéis de acordo com as suas necessidades. Pois bem, hoje trago uma lista daquela que é a formação mais cara de sempre do SL Benfica, ou seja, onze jogadores que foram os mais caros do clube, de acordo com a sua posição.
Antes de prosseguir para a lista, fica já a saber que o valor gasto neste lote de onze jogadores foi de 135,7 milhões de euros.

Guarda-redes
Roberto Roberto dispensa apresentações. Foi o guarda-redes mais caro da história do SL Benfica, tendo custado qualquer coisa como 8,5 milhões de euros aos cofres encarnados. Um autêntico balúrdio na altura, ainda para mais tendo em conta o desempenho que o guardião espanhol teve ao serviço das águias.
Realizou 41 partidas com águia ao peito, e provocou demasiados calafrios nos adeptos do glorioso. 

Lateral-direito
Maxi Pereira Maxi foi o defesa direito mais caro da história do Benfica. Custou 5,7 milhões de euros, valor que fez render nas oito temporadas que realizou de vermelho e branco.
No Benfica, disputou um total de 333 partidas e marcou por 21 ocasiões. Não fosse a sua saída para o rival FC Porto, e Maxi seria uma lenda eterna do universo encarnado.

Defesa-central
Sidnei Chegou ao SL Benfica em 2008, vindo dos brasileiros do Internacional, por valores a rondar os sete milhões de euros.
Envergou o manto sagrado pela principal formação encarnada por 75 ocasiões e 21 pela equipa secundária do Benfica, tendo marcado um total de sete golos. Pelo meio, ainda houve um empréstimo ao Besiktas JK, ao RCD Espanyol e ao RCD Deportivo de Corunha.
Acabou por se desvincular do clube lisboeta em 2015, por 6,5 milhões pagos pelo Deportivo. 

Defesa-central
Ezequiel Garay Garay chegou ao Benfica a troco de 5,5 milhões de euros pagos ao Real Madrid CF e “pegou logo de estaca”.
Nas três temporadas em que Garay representou o Benfica, fez 136 jogos e apontou 12 golos, números que colocaram o defesa argentino na rota de grandes clubes europeus.
Ainda assim, o internacional transferiu-se para o Zenit por apenas seis milhões de euros – valores bastante anormais, tendo em conta que o seu valor de mercado, à data, era de 20 milhões de euros. 

Defesa-esquerdo
Loris Benito A posição de lateral esquerdo foi uma das maiores lacunas nas formações encarnadas nos últimos anos. Na tentativa de colmatar essa mesma lacuna, vários foram os jogadores que chegaram para essa posição.
Ainda assim, foi nesta zona do terreno que o Benfica foi mais comedido – gastou apenas três milhões de euros na contratação de Loris Benito.
Poderia ter sido uma verdadeira pechincha, não fosse Benito apenas mais um entre tantos outros que passaram por aquela posição. Realizou apenas seis jogos no Benfica.
Felizmente, chegou Grimaldo.

Médio-defensivo
Julian Weigl Além de recente, esta é uma das contratações mais caras de sempre do Sport Lisboa e Benfica.
Weigl chegou à Luz proveniente dos alemães do Borussia Dortmund, e custou cerca de 20 milhões de euros – um valor “absurdo” para a realidade portuguesa.
Até agora, disputou onze jogos de águia ao peito, não tendo marcado nenhum golo. Ainda é demasiado cedo para avaliar se a sua contratação foi ou não demasiado cara.
Ainda assim, a realidade é que Weigl tem a obrigação de ser irrepreensível.

Médio-centro
Gabriel O médio brasileiro chegou ao Sport Lisboa e Benfica em 2018, e, desde então, tem sido um dos médios mais utilizados pelos encarnados.
Transferiu-se do CD Leganés, clube que milita no país vizinho, em Espanha, a troco de oito milhões de euros – um valor que se tem provado baixo para aquilo que Gabriel tem jogado.
No total, Gabriel já vestiu o equipamento encarnado por 58 vezes e marcou três golos.

Médio-direito
Pedrinho Na saga dos grandes investimentos que o SL Benfica tem feito recentemente, é contratado Pedrinho. Proveniente de São Paulo, mais propriamente do Corinthians, o ala brasileiro custou 20 milhões de euros.
Este jovem de 22 anos ainda não se estreou pelo clube, uma vez que só chega no final da temporada. No entanto, grandes coisas são esperadas do jogador.
Pedrinho assinou contrato com os encarnados até 2025, e diz que “vem para ganhar muitos títulos”. 

Médio-esquerdo
Rafa Silva Rafael Alexandre Silva foi a maior transferência realizada entre clubes portugueses da história. O Sport Lisboa e Benfica pagou um total de 16,4 milhões de euros ao Sporting Clube de Braga pelo passe do agora internacional português.
As primeiras temporadas de Rafa ao serviço das águias não correram de feição. Contudo, Rafa deu a volta por cima, e tem feito temporadas de alto nível.
No glorioso, Rafa disputou um total de 125 partidas e já fez balançar as redes adversárias por 35 ocasiões.

Avançado-centro
Raúl Jiménez Decorria a temporada de 2015/16 quando chegou a Lisboa Raúl Jiménez, um ponta de lança que vinha para marcar, marcar e marcar.
Raúl ganhou, ao serviço dos encarnados, uma função que não era bem aquilo que era esperado. Passou a ser o “saca-rolhas” do glorioso, e marcou muitos golos importantes.
Jiménez foi, e é, a contratação mais cara do futebol português – custou um total de 22 milhões de euros. Disputou 120 jogos de águia ao peito, marcando 31 tentos.

Avançado-centro
Raúl de Tomás RDT é um caso de um jogador que, na minha óptica, não teve oportunidades suficientes para demonstrar o seu valor.
A verdade é que o Benfica pagou 20 milhões de euros pelo avançado espanhol, e esperava obter uma mais valia dentro de campo… o que não aconteceu
 Raúl esteve apenas meia temporada no clube. Foi vendido ao RCD Espanyol exactamente pelo mesmo preço que o Benfica havia pago ao Real Madrid CF."

Que espaço para Tiago Dantas?


"É desde há muito uma das atracções da formação do SL Benfica. Pela qualidade de execução e critério de excelência das suas decisões. Visualiza, antecipa e decide antes de todos os outros, e como tal a sua frágil estatura é um não assunto quando se trata do momento ofensivo.
Sénior por uma semana (nasceu no final de Dezembro de 2000), e com um talento absurdo, a dúvida maior prende-se sobre que espaço / papel virá a tomar no futebol sénior.
Na Segunda Liga, passou a actuar como Extremo Esquerdo no sistema de Renato Paiva, e embora tal não pareça a posição onde mais poderá oferecer ao jogo ofensivo, é uma possibilidade no seu futuro. Protege-o defensivamente, e permite-lhe vir pisar espaços interiores aquando da posse.
Contudo, é quando joga mais baixo e no corredor central, assumindo o início da Construção Ofensiva que todas as suas características se evidenciam ainda mais, e mais qualidade oferece ao jogar da sua equipa. Com Tiago Dantas mais baixo, a tocar mais vezes e mais cedo na bola, a equipa ganha mais saída e com mais qualidade. A grande questão será sempre perceber se no momento da perda e em Organização Defensiva, se as suas limitações (na cobertura do espaço e no índice de recuperações por duelo ou intercepção) serão ou não compensadas com o tremendo impacto ofensivo que coloca no jogo.
O que parece certo é que a sua chegada à equipa principal do Benfica começa a desenhar-se a grande velocidade, e tamanho talento tem de ser aproveitado. Mais atrás ou mais à frente, mais dentro ou mais fora, é um jogador diferente."

#2 - Anatomia de um Sticker: do milagre europeu ao milagre de Berna.

"«A Europa não se fará de uma só vez, nem de acordo com um plano único. Far-se-á através de realizações concretas que criarão, antes de mais, uma solidariedade de facto.»
Robert Schuman

9 De maio de 1950.
O ministro dos negócios estrangeiros francês à época, Robert Schuman, profere uma declaração na televisão francesa, onde apela à criação de uma comunidade supranacional europeia para gestão das reservas de carvão e aço. Nesse dia faziam exactamente 5 anos (ou 5 anos e 1 dia consoante a localização geográfica), desde o chamado V-Day (Victory Day), dia da vitória aliada, que marcou a rendição alemã que entrou em vigor às 23h01 CET de 8 de maio de 1945 (9 de maio em fusos horários mais a leste), dando assim início ao final da 2ª Guerra Mundial.
Um confronto sangrento que tirou a vida a quase 90 milhões de pessoas.
Cinco anos depois, havia um clima de paz e de esperança num futuro próspero. Os EUA, a braços com a criação de esferas de influência, numa incipiente Guerra Fria, bombeavam dinheiro através do plano Marshall para o ocidente europeu. Viviam-se tempos de reconstrução, tempos em que as matérias primas escasseavam.
Os intuitos de Schuman não eram meramente humanistas. França precisava de carvão para colocar a sua indústria do aço a funcionar. E os depósitos na altura disponíveis, estavam na região do Rhur (não é à toa a alcunha de "mineiros" dada ao Schalke 04). Algo que poderia colocar (de novo) em fricção dois países que sempre estiveram de costas voltadas e precipitar a Europa para uma nova guerra.
Com o Reino Unido sem propensão continental europeia, coube à França trazer a Alemanha (RFA) para junto de si, colocando-a num plano igual (ao contrário do erro cometido em 1918 no final da 1ª Grande Guerra). A ideia, revolucionária à época (e que 70 anos depois, ainda parece "contranatura" dada o historial de conflito existente), seria "amarrar" a Alemanha numa estrutura supranacional europeia independente que facilitaria e estimularia a cooperação entre os demais participantes. Obter paz através de cooperação. Uma realidade à época não dada como garantida ou estável. Como que uma vertigem.
Talvez seja uma curiosa coincidência, mas exactamente 8 anos depois do discurso de Schuman, a 9 de maio de 1958, estreava em San Francisco, uma das obras primas de Alfred Hitchcock. "Vertigo" (ou "A Mulher que Viveu Duas Vezes" no muito literal título dado em português, tanto que revela o final do filme...).
O que é certo que face à proposta vertiginosa de Schuman, não consta que tenha sido necessária a intervenção de um otorrinolaringologista, sendo o repto aceite, pelo então chanceler alemão Konrad Adenauer, um político pragmático que no pós-conflito, procurou criar laços com as nações vencedoras, privilegiando a reconstrução de uma Alemanha praticamente destruída, naquilo que pouco anos depois seria considerado o "Wirtschaftswunder" (Milagre Económico, aqui em tradução livre). Rapidamente os países do Benelux e a Itália juntaram-se, e a 18 de abril 1951 era assinado o tratado de Paris que formava a CECA (Comunidade Económica do Carvão e Aço em português).
O sucesso da mesma foi imediato e poucos anos depois, em 25 de Março 1957, em Roma, os mesmos países estariam a lançar as bases para uma integração mais profunda com a criação da CEE (Comunidade Económica Europeia) que depois abriria caminho, com sucessivas reformulações aos tratados, à actual União Europeia.
Antes de 1960, o registo europeu do Sport Lisboa e Benfica nas então recém criadas provas europeias da UEFA (infelizmente o organismo que superintende o futebol europeu não reconhece a Taça Latina, que precedeu a própria criação do organismo), cifrava-se nuns míseros dois jogos disputados, na 1ª ronda da edição de 1957/58 da então Taça dos Clubes Campeões Europeus (TCCE), contra os andaluzes do Sevilha FC, com um saldo de uma derrota forasteira por 3-1 (golo do Francisco Palmeiro), seguido de um empate a zero em casa. Até poderíamos ter mais uma outra participação, na edição inaugural da prova em 1955/56, dado que fomos os campeões nacionais em 54/55, mas estranhamente (ou talvez não), a federação portuguesa indicou a ida do terceiro classificado.
Se alargarmos o registo à participação das equipas portuguesas até então, notamos que nessa primeira edição da prova, o Sporting (o tal clube que foi indicado) tinha conseguido um empate no primeiro jogo de sempre da recém prova, seguindo-se de uma posterior derrota e eliminação em Belgrado (frente ao Partizan), o Porto perdeu ambos os jogos da 1ª pré-eliminatória em 1956/57 (frente ao Athletic Bilbao), o Sporting conseguiu duas vitórias na 1ª pré-eliminatória em 1958/59 frente aos holandeses VV DOS(pela primeira vez uma equipa portuguesa seguia em frente), mas caiu logo a seguir na 1ª ronda com os belgas do Standard Liége com duas derrotas, e finalmente, o Porto continuou na sua maré de azar (com Guttmann ao leme) ao perder os dois jogos da 1ª pré-eliminatória frente ao (actual) Inter de Bratislava.
Portanto, quando o Benfica subiu ao relvado do Tynecastle Stadium, a 29 de Setembro de 1960, para defrontar o Hearts em Edimburgo, poucas esperanças haviam que a equipa conseguisse um bom resultado. O que é certo é que essa primeira pré-eliminatória foi passada com pleno sucesso obtendo duas vitórias (com Zé Augusto e José Águas a serem os marcadores em ambos os jogos). Na ronda seguinte (1ª ronda), vitória confortável caseira frente ao húngaros do Újpest FC, num jogo em que aos 30 minutos, o Benfica já goleava por 5-0 (ficou 6-2). Na segunda mão, uma derrota por 2-1 não impediu que, pela primeira vez, uma equipa portuguesa chegasse aos quartos de final da prova. Nesta ronda, segundo crónicas da época, o sorteio bafejou a equipa e o adversário foram os dinamarqueses do AGF Aarhus. Duas vitórias (por 3-1 em casa e 4-1 fora jogado num relvado sobre neve), selaram a chegada às meias finais da prova.
Pela frente, os campeões austríacos do operário Rapid Wien. Uma vitória em casa por 3-0 deu uma vantagem confortável, mas a deslocação ao Praterstadion não era fácil e a história da segunda mão comprovaria isso mesmo. Mesmo em ambiente adverso, José Águas adianta o marcador aos 66, havendo um empate 4 minutos depois. O ambiente ficou realmente quente e prova disso foi a invasão de campo aos 88 minutos que acabou por interromper a partida, tendo os jogadores que ser retirados de campo sob escolta policial.
Mas nada disso importava.
O Benfica conseguia o inimaginável e chegava à final da prova, agendada para o Wankdorfstadion em Berna. Um palco dado a milagres.

Sete anos antes, um milagre tinha ocorrido nesse mesmo estádio na final do Mundial'54.
A selecção semi-profissional da RFA (país lembre-se governado por Adenauer) conseguiu vencer a "Aranycsapat" (Equipa de Ouro, numa tradução livre) húngara, uma equipa com Puskas, Hidegkuti, Kocsis e Czibor, que até à derrota na final, esteve imbatível por 31 jogos (ao longo de mais de 5 anos).
Mais, esta derrota ocorreu depois de na fase de grupos do Mundial, a Hungria ter esmagado a RFA por 8-3. É communemente considerado um dos resultados mais surpreendentes da história dos Mundiais (face ao desnível das equipas em causa), em parte explicado pelas condições atmosféricas que favoreceram os alemães nesse dia (choveu copiosamente) e pela vantagem técnica obtida pelo uso, por arte destes, de botas Adidas (criadas por Adi Dassler) adaptadas ao terreno em causa.
Após recuperar de 0-2 inicial, os alemães conseguiram dar a volta ao marcador e acontecia o "Das Wunder von Bern".

O Milagre de Berna.
Um enorme bálsamo para um país, que tendo saído vergado a uma forte derrota na 2ª Guerra Mundial, tinha aqui uma grande injecção de moral.
Não sei se este exemplo foi tido em conta pelo Benfica, mas o que é certo é que sete anos depois, novo milagre ocorreria no relvado do Wankdorfstadion.
O adversário, era o já todo o poderoso, FC Barcelona, que tinha afastado na 1ª ronda a sua eterna Nemésis e vencedor das anteriores cinco edições da Taça dos Clubes Campeões Europeus, o super Real Madrid de Di Stéfano, Puskas ou Gento.
Barcelona, que tinha afastado nas meias finais os alemães do Hamburger SV, contava nas suas fileiras com um trio temível de húngaros (Kubala, Kocsis e Czibor - este dois últimos tinham estado presentes na final do Mundial, sete anos antes), tendo na baliza o afamado Ramallets e contava ainda com o temível armador de jogo Luis Suárez (até à data que escrevo estas linhas, o único espanhol nascido em Espanha a ganhar um Ballon d'Or).
Só mesmo uma anormalidade ou uma situação de "vertigo" (assumindo o termo em latim), poderia tirar a vitória ao Barcelona. E o início do jogo parecia indicar isso mesmo. Após passe de Luis Suárez, Kocsis inauguraria o marcador aos 21' minutos.
Mas o capitão José Águas, sempre ele (acabaria por ser o melhor marcador desta edição da prova com 10 golos), repôs o empate aos 30' minutos, e dois minutos depois um auto-golo de Ramallets, colocava surpreendentemente o Benfica na frente do marcador ao intervalo.
Já aqui fiz menção a um pormenor técnico que tinha ajudado a RFA a ganhar à poderosa Hungria. Nesta outra final, houve igualmente um pormenor técnico que indirectamente ajudou o Benfica: os postes das balizas eram quadrados e não redondos.
Há uns anos, em conversa em Barcelona com jornalistas desportivos catalães (super culés), esse facto foi-me referido como a causa para a vitória do Benfica. De facto, crónicas à época referem que na segunda parte, o Barcelona mandou três bolas ao poste, algo que nos dias de hoje com postes redondos, talvez tivessem entrado. Nunca saberemos.
O que sabemos é que aos 8' minutos de jogo, Mário Coluna, avançado feito médio centro todo-o-terreno pelo génio de Guttmann, partiu o seu nariz cumprindo os restantes 82 minutos em sofrimento. Isso não o impediu de aos 55' minutos, num belo pontapé de ressaca em "voley", marcar o 3-1, golo que se revelaria essencial para a vitória final por 3-2, conquistada após enorme solidariedade e espírito de sacrifício de toda a equipa.
O segundo Milagre de Berna acontecia e contra todas as expectativas, uma equipa de um país com pouca tradição futebolística, tornava-se campeã europeia.
E José Águas tirava umas das mais belas e icónicas fotos do ideário benfiquista.
Como já devem ter reparado, o "to.colante" Sport Europa e Benfica (presente na terceira imagem neste texto) usa como base o programa oficial de jogo desta final de Berna em 1961.
A imagem minimalista da Europa com a bola de futebol a avançar sobre a mesma, é na minha opinião forte. A cor vermelha sobre o azul é uma combinação que gosto (à parte de qualquer interpretação clubista).
Este foi uma das minhas primeiras alterações que fiz, tendo inclusive usado uma variação do mesmo, por altura da final de Amesterdão em 2013 (ainda nem sonhava em imprimir autocolantes), para um pequeno poster motivacional que foi partilhado pela malta mais próxima que foi comigo a esse jogo. 
Isso explica em parte, o porquê dos acabamentos serem rudimentares (usei na altura um freeware chamado GIMP), algo que optei por manter quando decidi em Março de 2016 imprimir 500 cópias em tamanho 55 x 55 mm, em papel adesivo 90 gr (estilo Panini), tendo usado uma fonte da família das True Type Font com a simples e directa mensagem: Sport Europa e Benfica.
Os últimos anos não têm sido compatíveis com a rica história europeia do nosso clube. E talvez estas efemérides sejam sempre uma maneira de voltar a vincar isso. É certo que hoje em dia, dada a cada vez maior desigualdade de meios, muito provavelmente só um milagre nos fará voltar a uma final europeia na principal competição de clubes.
No entanto, em 1961, a questão era igual ou mesmo pior e aqueles homens provaram durante aquela campanha europeia que os milagres por vezes existem. Tal como o que tinha ocorrido sete anos antes.
Pode parecer uma miragem ou algo "contranatura", mas se há algo que a declaração de Schuman provou, é que a construção europeia não se fez de uma vez só, nem levou apenas um único caminho. E só a solidariedade e a cooperação entre os diferentes povos, têm mantido a mesma (ainda que ameaçada).
Retorno à frase de Schuman.
"A Europa não se fará de uma só vez, nem de acordo com um plano único. Far-se-á através de realizações concretas que criarão, antes de mais, uma solidariedade de facto."
Neste dia da Europa, transponho isto para o futebol e para as ambições europeias do Benfica. O objectivo está longe de ter ficado esgotado na década de 60. Queiramos todos, enquanto clube, dar os passos de forma a voltar a tornar isso realidade novamente. Se assim for, certamente haveremos de ter um novo V-Day."

Voando sobre as oliveiras...

"Spiksley apostava em tudo, o que quase o levou à indigência – até no teatro, onde trabalhou com Charlie Chaplin.

Desde muito miúdo que Fred gostava de cavalos. Imaginava-se um jockey de categoria a vencer grandes prémios à garupa dos mais belos puros-sangues. O mais próximo que chegou de um cavalo foi à custa de talões de apostas nas corridas que o levaram à indigência.
Vendo bem a vida de Fred Spiklsley foi um cavalo à solta pela margem do seu próprio corpo, como cantaria o meu querido Fernando Tordo. Nasceu num sítio antiquíssimo chamado Gainsborough, terra que foi conquistada pelos Canutes da Dinamarca no início do milénio anterior, filho de um fabricante de caldeirões, tornou-se um garoto vivaço, incapaz de se sujeitar a ser uma segunda versão do pai, mais panela menos panela, jogador de futebol de todos os clubes da terriola, sempre de olhos postos na possibilidade de passar para algum mais exigente, até que lhe surgiu um convite do Wednesday, de Sheffield, não sei se numa quarta-feira ou não, mas certamente num dia de sorte.
O rapazola que gastara os tendões e os ligamentos em absolutas batalhas campais com as camisolas do Gainsborough Working Men’s Club, Gainsborough Wednesday e Gainborough Trinity, que obteve a glória de atingir a II Divisão do futebol em Inglaterra, esteve oito anos em Sheffield, marcando golos atrás de golos, até desfazer por completo um joelho em 1903 e voltar à mendicância de clubes de rebotalho como o Glossop ou o Leeds City. Basicamente, Fred voltava a cair do cavalo. Mas desta vez tinha deixado rastro. De tal forma que foi chamado por sete vezes para defender a camisola dos três leões da selecção de Inglaterra."

O visível e o invisível no Karaté

"O local onde se pratica karaté chama-se “dojo” (termo japonês). As decorações de estilo oriental e os retratos dos mestres (“sensei”) fazem do dojo um lugar onde se mistura exotismo e solenidade, e no qual um certo número de rituais ritmam a passagem dos praticantes. É o lugar da “Via”.
O karaté é uma arte marcial, como se diz vulgarmente. Para muitos, é uma arte e para a compreender é preciso penetrar na cultura nipónica. É uma prática que oferece técnicas corporais, mentais e espirituais. Muitos karatecas recusam-se a considerar a sua prática de eleição como um desporto, mesmo se a forma de a ensinar se identifica exactamente com ele. As artes marciais japonesas, do qual o karaté faz parte, saíram da cultura Samurai, que marca o tempo da feudalidade japonesa que se estende dos séculos XII ao XIX. Na prática do karaté encontramos um funcionamento muito hierarquizado, com iniciações, ritos, rituais e mitos. As graduações fazem essa distinção, marcando um caminho de progressão.
Para compreender a especificidade da ritualidade do karaté, não se pode “economizar” na palavra do treinador. É ele que conhece os termos técnicos japoneses, que os traduz em português (no nosso caso), que assegura o respeito pelo local de treino, que dá um sentido à história das artes marciais e, consequentemente, à cultura nipónica. O karaté é muitas vezes mistificado. A magia que se opera depende muito dos treinadores, que não têm todos o mesmo carisma. É preciso assistir aos treinos dos mestres japoneses para se sentir a força dos ritos, dos signos e dos símbolos. Uma espécie de “rito religioso” se encontra na prática dos katas (formas que representam a “memória” do karaté), que começam com uma saudação. Actualmente, retém-se o aspecto visível das técnicas do corpo e a eficácia dos combates. Esquece-se que as técnicas provêm de Okinawa, da China e, antes disso, da Índia, que se estudavam e eram transmitidas nos mosteiros. O aspecto invisível das técnicas, que nos remetem para a interioridade do ser, é preponderante e leva aos estados místicos. Os treinos de karaté são duros. E é na capacidade individual de suportar a dor que se constrói a relação com o corpo.
O karaté ficou mais pobre, com o recente falecimento do mestre Raul Cerveira, com 76 anos. Foi um dos fundadores da Federação Nacional de Karaté Portugal. Tive o privilégio de o conhecer, de o entrevistar e de treinar com ele algumas vezes. Endereço as minhas sentidas condolências aos familiares e amigos."

Futebol - um jogo com vida!...

"Palavra dada …palavra honrada!...
E assim vamos ao tema que se encontra na ordem do dia, nesta tentativa de reaproximar do que falta para o cumprimento do calendário da 1ª Liga do Futebol Português. Não obstante a opinião de Michel D´Hooghe, presidente do comité médico da F.I.F.A. ter referido que o Futebol não deveria regressar antes de Setembro, o organismo que tutela o Futebol europeu (U.E.F.A.), em 23 de Abril veio aconselhar que as federações deveriam terminar os seus campeonatos, anotando como sendo uma das fórmulas classificativas o critério de mérito desportivo e nesse caso sendo o título entregue a quem tivesse mais pontos no momento da interrupção, referindo ainda que se reservava no direito de recusar a admissão nas suas provas qualquer clube que prematuramente tenha terminado a competição, sem ter sido processada a resolução. Para já muito curioso (ou talvez não) esta opinião tão adversa.
Tendo o governo dado luz verde para o regresso da competição, a L.P.F.P. procurou reunir todas as condições, deixando de haver argumento institucional para tornear tal questão, muito embora eu discorde de que por pressão de obrigatoriedade de cumprimento de datas a parte económica correspondente aos direitos televisivos, publicidade, sponsorização, etc, se sobreponha aos cuidados inerentes ao foco da pandemia por contágio, sendo a saúde relegada para segundo plano.
Numa das entrevistas que proferi à Lusa esta semana, foi descrito que eu tenha referido que o campeonato poderia estar ferido de legalidade. Jamais poderia contextualizar na minha opinião os aspectos de ordem jurídica. O que pretendi explicitar foi o facto de existir uma incoerência nesta “apressada” preparação e desenvolvimento da competição. O que era verdade no início da prova passou para contornos absolutamente discutíveis, quer ao nível da operacionalização do treino, quer dos espaços de jogo onde se vai realizar a competição, estágios, viagens, público, arbitragem, examinação e vigilância médica, etc …etc … todo o processo está “magoado” de consistência pela diferenciação dos clubes em prova.
Importa referir que todos estamos com uma saudade imensa do Futebol, nem que seja vê-lo pelo buraco da fechadura, contudo devemos ter em conta as matrizes que dignificam a possibilidade de viver a vida, aliás como refere o nosso presidente da Federação Portuguesa de Futebol, Dr. Fernando Gomes, numa comunicação séria, objectiva e deveras comprometedora:” O futuro do Futebol não está garantido e não é pelo facto de esta fantástica modalidade ser o centro da vida de muitas pessoas, que estas mesmas consigam viver sem Futebol.” Muita coragem para uma afirmação tão evidente como categórica e que não rejeita à fuga de partilha da responsabilidade e que será justo referir a forma inteligente como tem gerido a liderança, apoiado por uma magistratura de influência autenticamente ganhadora.
É impensável imaginar que aqueles que verdadeiramente amam o Futebol possam dispensar esta inspiradora obra de arte escrita sobre a relva, rubricada por gente capaz de transformar em sucessivos movimentos de inspiração, onde a harmonia do gesto se vai combinando com uma eficácia emocionalmente excitante, e onde por vezes há mais cultura que civilização, mais coração do que razão, mais sabor do que saber, mas acima de tudo há uma inexplicável fórmula de encontrar uma imagem sagrada convertida em festa. Por isso esta minha preocupada análise crítica da situação vivida.
Continuando e em relação ao momento actual, gostaria contudo de ressalvar o carácter exemplar como o Futebol se permitiu expor neste tempo de interregno competitivo: jogadores, treinadores, equipas técnicas, equipas médicas e demais estrutura dos clubes, têm procurado com ciência, paixão, devoção e entusiasmo oferecer as melhores provas de isolamento profilático para que os treinos possam ser efectuados. Contudo, nada nos garante que de súbito tudo volte ao princípio, com as consequências graves que daí possam advir. É trabalhar de forma segura mas o arame subitamente pode partir. E depois?
Aliás o Senhor Secretário de Estado do Desporto, Dr. João Paulo Rebelo já referiu que se houver crescimento de infecções, o governo admite suspender o regresso do Futebol e, pergunto eu: a classificação será aquela que no momento desse hipotético confronto, estava definida? …
Sem querer ser o patinho feio (volto a dizer que só ver os jogadores em treino e a bola a rolar já me alegra o sentimento dum tão esperado mundo novo), não se poderia ter antecipado este cenário, tal como se fez na 2ª Liga?... ou então ser este tempo precioso para a organização e estruturação do Futebol Português, quer ao nível da formação, regulamentação dos quadros competitivos, arbitragem /VAR e reiniciar-se em Setembro ou Outubro e funcionando o quadro competitivo ajustado ao ano civil, com uma vantagem correspondente à preparação da Copa do Mundo Catar (Dezembro 2020) e do próprio campeonato do mundo da F.I.F.A. que irá decorrer também no Catar de 21 de Novembro a 12 de Dezembro de 2022?. Claro que seria absolutamente necessária a directiva da U.E.F.A. e F.I.F.A. para que tal se processasse. Mas como já vimos, outros valores se “alevantam”!...
É evidente que este tempo também tem sido de muito querer para muito fazer. Aproveito para em prole da justiça referir no âmbito formativo as figuras do Director Geral F.P.F. Dr Tiago Craveiro, um autêntico desmultiplicador por excelência das competência que lhe são atribuídas, bem como a Football School, liderada magistralmente pelo meu querido colega Prof Doutor André Seabra, que ao longo do tempo tem vindo a qualificar de forma incansável e profícua, agentes desportivos quer no âmbito da Arbitragem, quer no Dirigismo, Saúde e Performance, Adeptos, estabelecendo protocolos de investigação e desenvolvimento e com o inestimável contributo de cultura da experiência feita, do meu estimado ex aluno do Nível IV – UEFA/PRO do curso de treinadores, Dr. José Couceiro.

II
Bom, para não divagar ainda mais, vamos a outro assunto que tem a ver com o contexto actual em termos da planificação e operacionalização do treino.
Penso que os atletas, não obstante a avaliação da antropometria (peso, pregas cutâneas, bio impedância); provas de esforço e demais avaliações ao nível da potência muscular e outras ao nível psicológico e mental (motivação, stress e ansiedade, atenção e concentração, formulação de objectivos, locus de controlo, etc…), estão potencialmente observados, como nunca.
Ao nível da estrutura do treino, causa-me contudo uma certa estranheza ver jogadores que estão perfeitamente optimizados com uma saúde a todos os níveis exemplar, a treinar de forma individualizada, personalizados pela distância, mas um jogador de Futebol, não é apenas e só um atleta. É possuidor de características biológicas, fisiológicas e anatómicas muito próprias, pois o desenvolvimento das suas capacidades, quer condicionais, coordenativas, volitivas, etc, tem de ser desenvolvida em premissas relacionadas com um fundamento táctico, que se incorpora no trinómio: pensar, decidir e executar. E tudo isto está ligado ao tempo e espaço. Não existe preparação física específica sem esta ligação com o jogo táctico, mas lá está, uma obediência a novos princípios que, para medidas extraordinárias - exigências excepcionais, vemos um organização estritamente colectiva sem privar com balneário, refeições, reuniões de grupo, quando o Futebol é tudo menos isto!...
Creio que virá o tempo (urgentíssimo), duma dinâmica de treino por sectores e a formulação prática dos processos ofensivos, defensivos, transições e bolas paradas e isso só em termos colectivos se pode fazer. Quando referíamos “ diz-me como treinas e eu te direi como deves jogar” …neste momento em termos de periodização das cargas de treino e sua readaptação, encontram-se escondidas entre as brumas da memória.
Importantíssimo nestas condicionantes é a inserção da metodologia do treino psicológico e mental, usando técnicas que promovam a confiança no jogador, assegurando-o e encorajando-o relativamente à capacidade de ser bem - sucedido; inserir os aspectos motivacionais, formulando-lhes objectivos difíceis e desafiadores de complexidade crescente; operacionalizar nos processos de treino técnicas de redução do stress e ansiedade (relaxamento, muscular progressivo e respiração, imaginação e visualização mental), com intenção clara de níveis óptimos de desempenho em momentos claros de funções (livres, penaltis, marcação de cantos, etc), e simulando as condições adversas que irão ser confrontados, instrumentalizando-as no sentido de estar bem preparado para ser bem sucedido.
Ainda muito importante é aplicar ao jogador modelos de combate ao medo que o reassumir da nova competição com a natureza que lhe está afecta pode gerar, e que se não for gerido de forma adequada, encurrala-o, tortura-o e afasta-o do núcleo da melhor decisão. Quem não for capaz de controlar estes aspectos mentais acaba por se boicotar a si próprio, acabando por não ganhar, porque teve medo de perder.
Por isso, ter confiança em si próprio é o grande segredo para o sucesso e não ter medo do medo, pois cada medo que enfrenta também o fará sentir mais forte se se vir a ultrapassar e vê assim aumentada a auto estima e quanto maior for a auto estima maiores serão os recursos para enfrentar os desafios e maiores serão as possibilidades de vencer!... e se possível viver feliz, porque as equipas felizes ganham mais vezes!...

III
Estava por terminar por aqui (e já vou longo). Mas já agora mais umas notas referentes aos jogos à porta fechada, no sentido de verificar ao nível comportamental esta capacidade reactiva por parte das equipas sem presença de púbico, anotando algumas estratégias que me parecem as mais adequadas. 
Creio que não haverá ninguém que prefira jogar sem público. O Futebol sem adeptos transforma-se num jogo sem alma. Eles gritam e vibram com o peso da sua bandeira, numa profunda relação de afectos no apoio participativo. Contudo, se em equipas habituadas a ter pouco público ou até adeptos por vezes de difícil controlo pelo uso da discussão permanente, com o uso do dedo em riste e vozeirão com gritos lancinantes contra os jogadores que falham – pode parecer favorável.
As equipas na sua globalidade fazem do público o seu 12º jogador e desse eco desencadeado do empenhamento e discussão de cada lance até à última gota de suor, este silêncio pode ser altamente perturbador. Vejamos o caso específico que muito bem conheço porque por várias vezes o senti, do Vitória (Guimarães), em que muitas foram as vezes que à medida que o jogo se aproximava do seu termo, renascia uma onda de entusiasmo, fazendo do seu hino voz de tanta gente … sede de vencer … vitória até morrer … e os resultados de negativos passavam a positivos, pela força inquebrantável dos seus adeptos que, como sabemos, fazem do clube uma das razões da sua existência!...
Podem ainda os jogadores sem público entrar mais relaxados, e isso ser um indicador de facilitismo por falta de incentivos, e o deficit no domínio da concentração também poder servir para ver escondidos os erros cometidos pelo medo de perder, ou encobrir a coragem e a ousadia de quem tudo fez para ganhar, embora saibam que estão a ser observados pela T.V. e que mais cedo ou mais tarde irão receber o elogio, ou ser confrontados com a represália!...
Anotamos algumas das estratégias para casos desta natureza: Importantíssima será a capacidade comunicacional por parte do treinador, que será ouvido por todos como nunca. Daí as mensagens verbais e não verbais devam ser assertivas e sem duplo significado e sintonizadas com a formulação de objectivos pessoais ou grupais, desafiadoras mas realistas porque essas geralmente produzem melhor rendimento.
Igualmente muito importante é a comunicação interna entre jogadores, fundamentalmente orientada para a capacidade de opinião dos líderes.
Ainda neste capítulo, a auto comunicação do jogador consigo próprio se reserve dum elemento prioritário, balizando o seu comportamento ou desempenho na visualização mental de imagens de sucesso, previamente seleccionadas, documentadas ou exaltadas, associadas ao controlo respiratório dirigido para o foco atencional e libertado pela palavra/chave. Este trabalho mental ao nível da consciência torna-se fundamental, pois as perturbações emocionais adversas que este estado de sítio pode causar, criam instabilidade, percepção de ameaça e o jogador mais facilmente entra em crise de raciocínio e logo, prisioneiro da sua própria sombra.
Mas … se após toda esta modificação estrutural inédita no mundo do Desporto e do Futebol em particular, a época terminar sem hipóteses de renegar o cumprimento sagrado do regímen de saúde de todos os intervenientes, mais do que títulos de campeão ou candidaturas à Liga de Campeões, Liga Europa e lugares de manutenção, o Futebol no seu todo, pela competência como soube gerir esta agonia que a todos provoca, será merecer dum amplo e generoso aplauso. Faço votos para que tal aconteça."