segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

Bruno Lage

Sem surpresa, Bruno Lage foi hoje oficialmente anunciado, como treinador principal do Benfica, até ao final da época. Defendi esta decisão desde da primeira hora. Aliás, ainda antes da saída de Rui Vitória, sempre disse que Bruno Lage iria ser o próximo treinador do Benfica!!! Não só porque lhe reconheço qualidade e competência... mas também, porque na já 'famosa' conferência de imprensa da 'luz' do nosso Presidente, fiquei com a impressão que o próprio Luís Filipe Vieira, acreditava que Bruno Lage seria o futuro do Benfica!!! Creio que a única 'dúvida' na cabeça do Presidente (e na minha) seria a recepção que Bruno Lage teria por parte dos jogadores, porque ser um treinador da 'formação' não é mesma coisa do que ser um treinador de 'profissionais'...!!! E todas as indicações publicas, dão a entender que o balneário recebeu Bruno Lage muito bem...
Agora, só espero que no próximo Verão exista uma conferência de imprensa com o Presidente e o Bruno Lage, a anunciarem um novo contracto... será bom sinal!!!

Clássico foi bom entre os 90' e os 90'+5

"À atenção de quem de direito: com 42 faltas em 90 minutos (no City-Liverpool houve 19...) é difícil dar mais minutos ao tempo útil de jogo

Chegou ao fim a primeira volta da I Liga portuguesa e, de forma natural, já que apresentou a equipa mais sólida, o FC Porto arrecadou o título honorífico de campeão de inverno. A tabela classificativa apresenta-nos algumas tendências, mas nenhumas certezas. Por exemplo, a cinco pontos do líder, o Benfica ainda pode, em tese, sonhar com o título. Porém, não é complicado avaliar a dificuldade suprema dessa empresa quando se constata que, na segunda volta, os encarnados viajam a Guimarães, a Alvalade, a Moreira de Cónegos, ao Dragão e a Braga. É verdade que o feeling deixado pela equipa de Bruno Lage (provisório, definitivo ou definitivamente provisório?) nos Açores foi positivo, graças a uma exibição personalizada. Mas, provavelmente, só a dupla ronda na cidade-berço permitirá conclusões, já com a poeira mais assente.
Já o SC Braga, que ocupa o degrau mais baixo do pódio, tem pela frente o desafio da continuidade, a necessidade de dar resposta positiva a dúvida sobre a profundidade do seu plantel e a resistência física e resiliência mental de jogadores, técnicos e dirigentes.
A primeira volta, Luz à parte, foi bastante boa, mas seguramente que a segunda metade da Liga será mais exigente, sob todos os pontos de vista.
Finalmente, de olhos ainda postos no título mas sobretudo no acesso indirecto à Champions, está o Sporting, que se manteve como patinho feio produtivo com Peseiro, sonhou alto com os inícios de Keizer e parece agora ter constatado que oito pontos para o FC Porto (tendo de jogar no Dragão na 34.ª jornada) são pontos a mais. Já apontar a um segundo lugar que deixou de ser o primeiro dos últimos (o Benfica encaixou está época mais de 50 milhões na Liga dos Campeões...) poderá encerrar motivação suficiente para uma equipa que ainda procura o melhor equilíbrio defensiva.
Quanto ao clássico do último sábado: O melhor período do jogo foi entre o minuto 90 e 90+5. Depois de hora e meia de tédio, sacudido apenas por um falhanço de Soares e uma defesa de Casillas, esses cinco minutos cá e lá deixaram água na boca. Viu-se um Sporting menos virado para a frente e um FC Porto com visíveis carências de ordem física, num jogo que teve 42 faltas (o último City - Liverpool teve 19...) e um tempo útil ao nível do pior campeonato da Europa nesse particular, o nosso.

Às
Bruno Lage
Nos Açores, viu-se um Benfica diferente da versão-Vitória. Presença na área a atacar, sectores mais juntos e pressão alta, criaram condições para um triunfo claro em exibição segura. É ainda demasiado cedo para quaisquer outros considerandos. Mas, ao identificar os pressupostos acima descritos, há que congratular Lage.

Ás
Lito
São públicas e notórias as dificuldades por que passa o Vitória de Setúbal, estando inclusivamente em causa a perda de pontos na Liga. Não obstante, Lito vai segurando as pontas dentro do balneário e o ponto conquistado ontem em Vila do Conde representa um tónico importante para o futuro do clube. Organizem-se, por favor.

Às
Tiago Fernandes
A forma pouco humilde como se expressou durante a interinidade leonina levantou reservas. Mas já então se percebia uma vocação para a função. Chaves não começou por ser uma missão fácil, mas a pouco a pouco a água tem-se separado do azeite e este, ao vir à tona, revela um jovem técnico com interessante potencial.

E agora, qual o lugar para Pepe no onze do FCP?
«Já antes podíamos jogar com três centrais. Depende do que se quer de alternativa...»
Sérgio Conceição, treinador do FC Porto
Pepe está no FC Porto com o estatuto merecido de «ele e mais dez». Resta saber quem sai. Sai Maxi e Militão passa para a direita? Ou haverá mudanças mais profunda, com a entrada em cena de três centrais? Seja qual for a decisão de Sérgio Conceição, estamos perante uma mudança significativa na estrutura dos dragões. A meio da Liga, grandes manobras em curso...

Estão a brincar, não é?
O Casa Pia foi punido com a subtracção de seis pontos, a que acresce uma multa de 14 mil euros e a inibição de estar no banco do treinador Rúben Amorim por um ano, por este se ter levantado no banco, quando não tinha habilitações para tal. Punir o Cas Pia? E os outros? E os inúmeros casos semelhantes que têm sido prática nas várias divisões, incluindo a primeira, com clubes de topo até? É uma cobardia que seja um emblema humilde (embora histórico) a servir de bode expiatório. Fortes com os fracos, fracos com os fortes...

Finalmente, o Mónaco faz prova de vida...
O tipo de investimento feito pelo Mónaco desde que foi comprado por um oligarca russo nunca inspirou grande confiança. Agora, em risco de uma despromoção impensável, voltou a aparecer dinheiro e será com jogadores do calibre de Fabregas que a equipa continuará sua política de montanha-russa."

José Manuel Delgado, in A Bola

Sabe quem é? De descalço a desertor - Pedro Pablo Pichardo

"Tio morreu para salvar Che Cuevara duma emboscada; Na sua casa há túnel que vai dar ao cemitério de Fidel

1. De pequeno se lhe notou tendência de correr para fora de casa - para jogar caricas, beisebol, futebol. «Não marcava muitos golos, naqueles jogos em que púnhamos duas pedras a fazer de baliza, era mais defesa». O pai era treinador de atletismo, a mãe andava pelas ruas de Santiago a vencer o que pudesse: roupas, batata doce, bananas, legumes. «Sim, vida difícil: o nosso pequeno almoço era pão com óleo e café, o almoço tinha de ser, muitas vezes, ovo com arroz, melhor só ao jantar, em que já havia bocado de carne». O boxe foi a sua primeira paixão - o pai o desviou de lá...

2. Pio e Toi, dois dos tios, foram heróis na revolução que desfez a ditadura de Fulgêncio Baptista. No DN, contou-o: «Pio morreu numa emboscada a Che Guevera, acabando por salvá-lo. Toi vingou o assassinato de Frank País. O governo de Fidel esqueceu tudo isso. E perto da casa onde vivia Toi, havia túnel que ia dar ao cemitério, onde agora está sepultado Fidel, Frank País, Che Guevara e outros guerrilheiros iam muitas vezes a essa casa, o túnel era para a fugirem se fossem alvo de emboscada».

3. Aos seis anos começou a aparecer pela pista de Santiago onde o pai treinava. Aos 14 anos pô-lo no triplo salto - apesar dele gostar mais do comprimento. Poucas eram as condições de treino: o campo era de basebol, os exercícios de saltos na relva. Sem ténis, nem roupa conforme - descalço saltava.

4. Da primeira vez que foi a Havana (e deixou abertas de espanto as bocas de quem o viu...) não lhe permitiram que saltasse descalço (como fazia em Santiago): «Emprestaram-me um par de ténis, senti-me esquisito porque não estava habituado, mas ganhei. No comprimento fiz 7,12 metros e no triplo 15,45. Apesar dessas marcas, não me deixaram ir aos Jogos Olímpicos da Juventude de 2010, a Singapura».

5. Nas competições que fazia em Havana, normal era passar a noite nas bancadas do Estádio Panamericano: «Levámos cobertores para nos taparmos e dormíamos no chão». Por vezes, não - porque aparecia atleta da selecção que, por pena ou solidariedade, e levava, sorrateiro, para o seu quarto no centro de estágio, mesmo correndo risco de ser castigado. Foi o que fizeram, por exemplo, Alex Copello e Guillermo Martínez (até serem apanhados): «Para comer, havia cafetaria aberta 24 horas, comprávamos pão e refresco que se vendia em sacos...»

6. A federação impediu o pai de continuar a treiná-lo em Santiago. Para não ser cortado dos Mundiais de 2013 aceitou passar para Ricardo Ponce, o técnico nacional. Em Moscovo ganhou medalha de prata - e, depois, nos Mundiais de Pista Coberta foi terceiro: «Tinha dor na canela, Ponce queria que fizesse tratamento caseiro com ligas para trancar o corrimento do sangue. Depois, tirava a liga e aumentava a circulação. Era experiência perigosa, pedi, por favor, outro treinador». Claro, o que queria era o regresso ao pai - e afiançaram-lhe que isso não...

7. Acusado de faltar aos treinos, deram-lhe seis meses de suspensão. (Ao pai, impediram-no de voltar a treinar no atletismo - para sobreviver, ainda andou como treinador de basebol). Estava-se já em 2015, quando regressou à competição - e não tardou a passar os 18 metros. Tinha 21 anos - e era efeito dos treinos que continuava a fazer com o pai, em segredo. (Em Pequim voltou a ser vice-campeão mundial).

8. Na Aldeia Olímpica do Rio, exame detectou-lhe fractura de 7,4 milímetros. Ainda assim, queriam que competisse. Recusou - e recambiaram-no para Cuba. Percebeu que só lhe restava uma solução: desertar. O pai já o fizera, estava como treinador na Suécia...

9. Aproveitou estádio em Estugarda para fugir. À espera tinha, clandestino, o pai, no carro que só parou na Suécia. Turcos, espanhóis e italianos correram a desafiá-o para lá. Empresário falou do seu caso a Ana Oliveira - e foi ela que o convenceu a ligar-se ao Benfica. Veio, com o pai, viver em Portugal - num fogacho bateu o recorde de Nélson Évora, já como português ganhou a final da Liga Diamante, para o pódio foi, embrulhado na bandeira nacional, fechou o ano com a melhor marca do mundo no triplo. (Desolado ficara por não o deixarem competir nos Europeus, mas nos Mundiais do Catar já pode estar...)."

António Simões, in A Bola

Vitória e clássico

"De partida para a Arábia Saudita, Rui Vitória falou à TVI sobre a saída da Luz. Não disse nada de polémico - não é surpresa -, mas o que disse deve ter chegado para causar mal-estar na Luz. Admite-se que sim, tendo em conta que ainda no início da semana Luís Filipe Vieira fora bastante simpático para com o ex-treinador, não se coibindo até de afirmar que os benfiquistas, que não morriam de amores por Vitória, dele iam sentir saudades. Optou Vitória por não retribuir a cortesia, aproveitando a oportunidade para, sacudindo responsabilidades, falar do que, de outro lado, não correu bem nos últimos tempos - esquecendo-se, talvez, daqueles que mais de perto o acompanharam e ampararam nos piores momentos -, algo que, mesmo à vista de todos, não explica tudo. Era, no mínimo, escusado. Tem razão Mourinho ao nunca falar dos clubes de onde sai, porque deixa, sempre, uma porta aberta. O ex-treinador do Benfica optou por outro caminho. E embora tenha assumido vontade de voltar um dia, o mais provável é que enquanto Vieira estiver na Luz essa possibilidade viverá, só, na cabeça de Vitória.

O clássico de sábado começou, sem razão plausível, com oito (!) minutos de atraso. Pode parecer coisa pouco relevante mas não é, se tivermos em conta que são jogos como o Sporting - FC Porto que fazem com que os direitos do campeonato sejam vendidos para o estrangeiro por números, de certeza, simpáticos. E, em televisão, para quem paga, oito minutos é demasiado tempo perdido - e dinheiro também. No sábado o principal culpado foi o FC Porto - a entrega de prémios não ajudou... -, mas a Liga tem de fazer os clubes perceberam de uma vez por todos que o futebol, mesmo o nosso, é um negócio que não se compadece com caprichos. Se não perceberam a bem, tem de ser a mal. E não vamos lá com multas de 300 euros..."

Ricardo Quaresma, in A Bola

Um clássico com muitos salamaleques, cortesias, “por quem sois” e satyagrahas de Gandhi


"Conhecem a história daquele jogo disputado entre tropas inimigas no Natal de 1914, poucos meses após o início da Primeira Guerra? Um acontecimento extraordinário, sem dúvida, em que, devidamente imbuídos de espírito natalício, aqueles homens mostraram que o futebol pode unir o que a política e o ódio separam.
Lembro-me sempre deste jogo quando vejo um Sporting-Porto. Não há clássico no futebol português, e dificilmente haverá algum no futebol mundial, disputado em tão grande ambiente de cordialidade. Clássico como o conto de Charles Dickens. Clássico como o “Jingle Bells” e o “Silent Night”. Clássico como o “Música no Coração” na noite de Natal. Mais do que um jogo amigável, é um armistício. Sente-se que a partida pode ser interrompida a qualquer momento para deixar passar um comboio humanitário da Cruz Vermelha; que, no intervalo, o coro de Santo Amaro de Oeiras pode subir ao relvado e espalhar magia natalícia pelo ar. Todos e quaisquer sentimentos de raiva e de rivalidade são reservados, como quem reserva um molho, para ocasiões em que serão de maior utilidade a ambos os contendores.
O jogo de sábado foi, assim, mais uma celebração deste espírito de fraternidade, tão raramente testemunhado nos estádios de futebol. Na tribuna presidencial, a proximidade entre Frederico Varandas e Pinto da Costa deu o mote para um encontro de acordo com as regras da urbanidade e do convívio aristocrático. Se os treinadores gostam de citar Sun Tzu e a sua “Arte da Guerra”, Sérgio Conceição e Marcel Keizer devem ter optado por basear as respetivas palestras no “Livro do Cortesão”, de Baldassare Castiglione.
Os adversários depuseram as armas e entraram numa espécie de pacto de não-agressão, com muitos salamaleques, cortesias, “por quem sois”, culminando na recusa educada em infligir danos ao adversário, mormente através de remates perigosos ou entradas homicidas. O habitualmente letal Marega comportou-se à altura dos mandamentos da satyagraha de Gandhi. Soares, isolado, não quis desrespeitar os anfitriões e, à boca da baliza, preferiu chutar caridosamente com a canela. Bas Dost teve uma oportunidade que não costuma desperdiçar, mas, tolhido pelo clima cristão, foi tão meigo como um objector de consciência. Até o árbitro contribuiu, na medida das suas possibilidades, para que os instintos belicistas não viessem à superfície. Quando Bruno Fernandes fez uma daquelas faltas cínicas a meio-campo, Hugo Miguel poupou-lhe o segundo amarelo para não tingir de sangue a festa, entendendo que uma falta tão cirúrgica era, mais do que um comportamento anti-desportivo, um ato médico, digno de Hipócrates, um “primum non nocere” aplicado ao futebol. Mas como é que poderia haver derramamento de sangue se os jogadores entraram em campo anémicos?
Tudo isto teve como resultado uma grande propaganda à paz entre os homens de boa vontade, mas um medonho espectáculo de futebol. As quase 50 mil almas em Alvalade devem ter ficado arrependidas de não terem passado a tarde de sábado numa sala de teatro, seguindo o sábio conselho dado por Conceição há uns meses. O outrora bárbaro Maxi Pereira disfarçou-se de Florence Nightingale, a quantidade de faltas serviu para se jogar a um gracioso ritmo distrital, dentro dos limites de velocidade nas localidades, e, não fossem as reacções pavlovianas do banco do Futebol Clube do Porto ao apito do árbitro e algumas amostras do cancioneiro vernáculo, ninguém se atreveria a confundir este jogo com um confronto oficial entre dois dos maiores clubes portugueses. Não se chegou ao ponto de os jogadores entrarem em campo com papoilas na lapela e de trocarem abraços durante o jogo, mas, no final, os jornalistas terão hesitado entre escrever uma crónica ou um tratado de diplomacia.
Compreende-se que alguns jogadores do Sporting, depois do que viveram na Academia, sofram de stress pós-traumático e se esforcem por evitar a todo o custo situações de conflito que lhes relembrem aquele cenário. Como tal, o louvor maior deve ir para os jogadores do Porto que, benevolentemente, pouparam os companheiros de profissão a semelhante sofrimento. Um Sporting-Porto como este pode afastar os adeptos do futebol, mas pode aproximá-los da meditação, da solidariedade e do pacifismo. Quem sabe se alguns dos adeptos que, até agora, têm confortado os estômagos com cachorros e bifanas nas roulottes à volta dos estádios não se convertem ao vegetarianismo, às salsichas de soja e aos enchidos de seitan?
Não se pode menosprezar o impacto de um acontecimento destes. Se há muitos jogos que são lembrados pelas suas características bélicas – quem não se recorda da Batalha de Nuremberga, em 2006? – este merece ficar para a história como o Tratado de Alvalade, o Acordo de Camp Grand ou a Cimeira do Lumiar. Sporting e Porto podem ter perdido dois pontos, mas por tudo o que fizeram no sábado são dignos do prémio fair-play da Fifa, do prémio Sakharov, do Nobel da Paz. O que interessa um resultado de futebol quando se dá ao mundo um exemplo tão elevado de humanitarismo e filantropia."


O que fazem os filósofos?

"Li, já não sei onde, que um dia um jornalista perguntou a uma cozinheira da casa de Alexandre Herculano o que fazia habitualmente o notável historiador e escritor. E ela, expressiva e rápida, mordiscando uma peça de fruta: “O Senhor Herculano? Não faz nada. Só lê e escreve”. Durante os três primeiros anos da década de oitenta, trabalhei no Centro de Medicina Desportiva de Lisboa, como adjunto do Dr. Aníbal Silva e Costa, médico cirurgião e director-geral do Apoio Médico. Como licenciado em Filosofia, todos me tratavam por “senhor doutor” e cheguei mesmo a passar por cirurgião, quando, uma vez, um cavalheiro, já avelhentado, me agradeceu uma cirurgia que eu lhe teria feito “e que correu muito bem”, dizia ele – eu, que de medicina e cirurgia (e de tudo o mais) só sei que nada sei. Mediante recursos de uma certa oralidade folclórica, tentei informá-lo que era um simples funcionário administrativo do Ministério da Educação e professor do ISEF/UTL. Acompanhava-me o Dr. Maia Ferreira, médico fisiatra, que desfez o equívoco, junto do meu inesperado e confuso interpelante: “De facto, o doutor Manuel Sérgio não é médico, não faz Medicina, mas faz outras coisas que esta Direcção-Geral precisa que se faça”. Eu trabalhava na edição dos “Cadernos de Medicina Desportiva”, uma obra oportuna e coesa, que mereceu palavras de gratidão de alguns médicos de Medicina do Desporto, exercendo a sua profissão em clubes desportivos de norte a sul do País. Vendo bem as coisas, na Direcção-Geral de Apoio Médico, eu só lia e escrevia, ou seja, segundo a empregada da casa do Alexandre Herculano, não fazia nada. No entanto, no escárnio serôdio ao labor dos filósofos (ou dos modestos aprendizes de filosofia, como eu) que em alguns deles até deu frutos bem sazonados, há um desconhecimento de que os filósofos sempre mostraram um interesse muito especial por um trabalho que não se confunde com qualquer solitária especulação filosófica.
Vejamos: o Sócrates, após o serviço militar, que cumpriu com exemplar pundonor, andava pelas ruas interrogando as pessoas e procurando conduzi-las à Virtude, ao que, para ele, era Bom e Belo e Justo. Em 408 a. C. , encontrou Platão, fizeram-se Amigos e foi Platão que escreveu e deu a conhecer as ideias socráticas, dado que Sócrates nada deixou escrito. Platão fundou ainda uma Academia e manifestou interesse pela vida política. Descartes foi militar, durante vários anos. Pascal inventou, para o pai, uma máquina de calcular, e um coche de cinco pisos, para transporte público. Leibniz teve uma intensa e profícua atividade diplomática. Espinosa polia lentes e os filósofos das Luzes filosofavam e não escondiam os seus interesses políticos e a sua exposição social. Kant e Hegel distinguiram-se também como distintos professores universitários. Marx foi jornalista muito respeitado e “doublé” de um filósofo igualmente grande, concordemos ou não com as suas ideias. E poderíamos multiplicar os exemplos até ao “infinito”. O nosso Sampaio Bruno (1857-1915) era dono de uma padaria e, por vezes, vendia pão aos fregueses habituais do estabelecimento, seu e do seu irmão. No entanto, são muitos (e gente até de admirável fecundidade literária) os que o consideram o fundador da filosofia portuguesa. Um dia, Unamuno visitou o Porto com o fito primeiro de travar relações com Sampaio Bruno. Logo que chegou à Cidade Invicta, dirigiu-se à rua do Bonjardim, onde Bruno morava por cima da padaria da família e que era administrada pelo irmão do filósofo. “Unamuno entrou no estabelecimento e dirigiu-se a um sujeito grave, gordo, de lunetas que, de facalhão em punho, talhava meia quarta de pão a uma freguesa: “Sabe dizer-me onde mora o sábio escritor Bruno?”, perguntou o catedrático de Salamanca. O sujeito de lunetas embrulhou a meia quarta de pão, sacudiu das mãos a farinha triga, guardou o troco na gaveta e, pausadamente, avançou para o espanhol, dizendo numa vozita fina e tímida, que saía como um esguicho daquele corpanzil mole e pesado: Sou eu mesmo!” (Augusto de Castro, Fumo do meu cigarro, pp. 180/181).
A hostilidade, a respeito da Filosofia e da Epistemologia, radica no facto de aqueles dois saberes, por natureza, desinstalam e desestabilizam e portanto incomodam. Eu próprio a senti quando, na minha poligrafia dispersiva, comecei a sugerir a importância da epistemologia, no estudo da Educação Física e do Desporto. Acompanharam-me, nesses anos distantes, se bem me lembro, o Prof. Gustavo Pires, o Dr. Augusto Baganha, o jornalista Homero Serpa, o treinador de futebol José Maria Pedroto e ainda os Profs. Gonçalo M. Tavares, Abel Figueiredo e José Neto. Outros nomes deveria, aqui, acrescentar, como os brasileiros João Tojal, João Baptista Freire, João Paulo Medina e Anna Feitosa. Foram estes os nomes que, imediatamente, me ocorreram. Ao fim de 40 anos, é bem possível que o meu aterosclerótico esquecimento não me deixe chegar a outras pessoas que eu desejaria lembrar, aqui e agora. Dos adversários não me ocupo, mas agradeço-lhes o muito que me obrigam a estudar. Lastimando embora que muitos deles não cultivem a arte subtil de conversar, nem a nobre arte de escrever. O culto da linguagem, escrita ou falada, é uma das formas superiores da vida em sociedade. Não tenho dúvidas a este respeito, mormente num tempo como o nosso, em que a língua portuguesa, com a estulta pretensão de modernizar-se, já se confunde com o inglês e portanto desarticulou-se, está, também ela, ao serviço de um certo imperialismo, filho dileto daquele imperialismo que o nosso Papa Francisco tão certeiramente classificou: “Esta economia mata!”. Mas volto à hostilidade que rodeia a Filosofia e a Epistemologia. Porque a Filosofia não é científica? Mas se o espírito nasce da natureza, a Filosofia deverá, inevitavelmente, estabelecer os seus conceitos, a partir da natureza. Uma solução não tem sentido independentemente de uma problemática que, sem dispensar as ciências, não é unicamente científica. Uma solução não remete para uma psicologia do conhecimento, mas para uma ontologia da complexidade humana. E, aqui, o problemático é mais subjectivo do que objectivo, sendo tanto Ciência como Filosofia. Toda a imagem da realidade surge como biface: é científica e exprime-se em números e é, simultaneamente, filosófica e exprime-se em proposições.
O que pode fazer o filósofo, no desporto? O período axial (termo criado pelo médico e filósofo alemão Karl Jaspers, que aponta o período em que nascem o budismo, o confucionismo, a filosofia grega e em que o profetismo judaico já anuncia Jesus de Nazaré) que permite a resposta a esta questão, começou em Pierre de Coubertin e continua ainda hoje. O filósofo, no desporto, tem, em primeiro lugar, de saber onde está, ou seja, conhecer, melhor ou pior, a prática desportiva; depois, sugerir ao treinador principal que toda a investigação exige um método e, no caso do desporto, o método é o específico das ciências humanas, pois que não há jogos, há pessoas que jogam; por fim, com a consciência de nós mesmos e com a metodologia adequada, importa elaborar conceitos, em busca dos significados essenciais das coisas, dos factos e dos acontecimentos. A pergunta básica de toda a filosofia poderei assim resumi-la: o que é isto? Ou, melhor ainda: qual o conceito que mais fielmente me retrata a realidade e me transmite o sentido do que estou a investigar?... No desporto, é a motricidade. Eu criei, sem esquecer os meus inúmeros limites e condicionalismos, uma definição de motricidade humana: é a energia do movimento intencional e em equipa da transcendência. Canta o Caetano Veloso que “Se você tem uma ideia incrível, é melhor fazer uma canção./Está provado que só é possível filosofar em alemão”. É evidente que a minha definição de motricidade humana não significa a posse de uma absoluta certeza. Significa, sim, que tenho um caminho para investigar e que sei também que nunca o poderei caminhar sozinho, nem chegarei alguma vez à claridade matinal de uma certeza indiscutível. Embora o desporto (e a dança) seja uma obra humana e sejam seres humanos que perpetuam a história do desporto (e da dança). E o filósofo acrescenta: e qual o sentido do desporto (e da dança), na história da humanidade.
Há mais de 40 anos, me parece (veja-se o meu livro, Desporto em Democracia, Seara Nova, 1976) que o ser humano não pode definir-se como substância estática, pois que o ser da mulher e do homem é um fazer- se, um tornar-se, um transformar-se, mas com pontos de referência axiológica, pois que há um vínculo iniludível, entre a História e os valores, donde nascem a civilização e a cultura. A prática desportiva e a dança, pela sua qualidade intrínseca, são movimento intencional e, porque o ser humano as faz num surto incoercível de valores, transformam-se num espaço de civilização e cultura e de poesia e de sonho. Quem tem um mínimo de consciência histórica descobre, na História, um processo contínuo de humanização, através de um contínuo processo de aprendizagem, onde se movimentam o desporto e a dança. Julgo não ser excessivo acentuar a diferença entre o que é justo, por imperativos de uma ordem moral, e o que é justo por imposição legal. As metas axiológicas do desporto e da dança, embora algumas estridências de sinal contrário, mostram-nos que o ser do homem (e da mulher) é o seu dever-ser. “(…) somos testemunhas de um formidável aumento das atividades financeiras e bolsistas, de uma aceleração da velocidade das operações económicas que funcionam, agora, em tempo real, de uma explosão fenomenal de volumes de capitais, em circulação no planeta. Desde há muito tempo, a sociedade de consumo estabelece-se, sob o signo do excesso, da profusão de bens: o que é ainda amplificado através dos hipermercados e dos centros comerciais cada vez mais gigantescos e que oferecem uma série de produtos, de marcas e de serviços pletóricos” (Gilles LIpovetsky, Os Tempos Hipermodernos, Edições 70, Lisboa, 2018, p. 57). Acentua-se, no tempo em que vivemos, a ambiguidade já pressentida por Ortega y Gasset, sobre as sociedades de massas.
De facto, as pessoas vivem mais anos, a tecnologia produz bens que tornam mais agradável a existência, a sociedade do conhecimento dá-nos “lato sensu” a informação necessária, debruando as imagens soturnas do terrorismo com a vida fantástica dos mais célebres jogadores de futebol e artistas de cinema. Todavia, as desigualdades crescem entre os homens e as nações, os bens que a tecnologia produz não chegam a todos, a informação passa por aí ao serviço de certos interesses e as bombas atómicas mais mortíferas estão na posse de verdadeiros psicopatas. Cícero ensinava que educar significa libertar o futuro (o estudante) da tirania do presente. Mas apontando sempre valores de forte carácter axiológico, que resultem de reacções emocionais, mas também de juízos lógicos de conhecimento dos mais nobres objectivos da história humana. Ora, estes valores descobrem-se no nascimento do desporto moderno. No processo de criação e construção da prática desportiva, a competição conjuga-se com o espírito lúdico e é dos desempenhos físicos (da nossa corporeidade) que pode visionar-se a vida espiritual do atleta. O ser humano é interioridade e exterioridade, “bios” e “logos”, como convém a matéria que se faz espírito. Como desconhecer que a escola necessita do desporto, não tanto para ajudar ao nascimento de campeões, individualistas e narcisistas, mas para galvanizar a vivência das virtudes humanas, que (repito-me) emergem da génese do desporto moderno? É o ser humano, com o pleno conhecimento dos seus limites, o objectivo primeiro do treino e da competição desportiva. Tanto na Escola, como no Lazer, como na Saúde, como no Espectáculo Altamente Competitivo. E ainda como Ciência e Filosofia, como Ética e como Política. No dia em que assim o entendermos, torna-se fácil o papel do filósofo, no mundo do desporto. Porque todos sabem o que é o essencial…"

Por uma Liga com verdade desportiva

"O balanço da 1ª volta da Liga 2018/19 fica marcado por um conjunto de erros de arbitragem de uma dimensão que há muitos anos não se via. Muitos deles inexplicáveis e incompreensíveis.
O que habitualmente se verifica é que, entre eventuais benefícios e perdas, acaba por haver um equilíbrio no final das contas, entre equipas que lutam pelos mesmos objectivos. Na actual temporada isso não acontece. Pelo contrário: desta vez existe um clube que tem beneficiado sistematicamente de erros a seu favor.
Situação reconhecida pela esmagadora maioria dos analistas e que coloca em causa a verdade desportiva desta competição.
Outra evidência é que, no confronto directo entre os principais candidatos ao título, não se tem afirmado a superioridade de quem surge destacado na liderança. Bem pelo contrário. Trata-se, pois, de uma liderança muito alicerçada em erros sucessivos em momentos decisivos de jogos, a que não será alheio todo o clima de pressão, ameaças e coação dirigidos a diferentes agentes desportivos. 
Neste quadro, mais se torna urgente que, de forma transparente, se faça um balanço e se tornem públicos os 9 erros que recentemente foram assumidos.
Ao nível do VAR, assistiram-se inclusive às mais incríveis decisões, onde mesmo com a ajuda de diversos ângulos e imagens, houve quem não visse o que toda a gente viu.
Esperamos que, na segunda volta, esta dualidade de critérios e protecção absurda a um clube termine para que todos estejam em igualdade de circunstâncias e assim, com verdade desportiva, possam lutar pelos seus objectivos.
O Sport Lisboa e Benfica também assume os seus erros quando eles existem. E não nos custa reconhecer o mérito dos adversários. Demonstrámos isso mesmo já esta época, nos jogos que não conseguimos vencer.

PS: O Benfica voltou a vencer a Taça da Liga de Futsal, derrotando o Sp. Braga, na final, por 3-0. A equipa de Joel Rocha repete o título conquistado na época passada e confirma assim o excelente momento que atravessa e que atinge expressão máxima nas 16 vitórias conseguidas em 16 jornadas da Liga Sport Zone."

2.ª Taça da Liga

Benfica 3 - 0 Braga


Estamos a jogar a um nível muito elevado. Jogos praticamente perfeitos, consequência óbvia de muito trabalho, nos treinos... e nem as habituais 'habilidades', nem os esquemas elaborados pelos treinadores adversários, nos têm conseguido parar... Grandes!!!
Mas ainda falta muito caminho, para chegar ao título mais importante da época!