terça-feira, 12 de junho de 2018

O papão longe do telhado e Otto à pesca...

"Pela segunda vez o Benfica jogava a final da Taça Latina. Desta vez contra o grande Real Madrid, campeão da Europa, em pleno Estádio de Chamartín. E Di Stéfano era sincero: o árbitro foi amigo dos espanhóis.

No dia 23 de Junho de 1957, o Benfica estava em Madrid. Era, para alguns jornalistas, 'o modesto campeão de Portugal'. E acabara de enfrentar 'o campeão dos campeões europeus': Real Madrid.
Nesse tempo como agora: campeão dos campeões europeus! Com ponto de exclamação.
Era muito hábito portuguesinho diminuir as nosas virtudes e comparação com os méritos alheios. Parte de uma filosofia de vida meio bolorenta que fazia crer às pessoas que aquilo que os outros conquistavam com a facilidade dos eleitos exigia aos lusitanos o trepar de uma enorme montanha de esforço.
E, neste caso, podíamos falar de um Real Madrid vencedor da Taça dos Campeões, mas falávamos igualmente de um Benfica que já tinha conquistado a Taça Latina.
Era aqui que eu queria chegar: Taça Latina.
O Benfica disputava pela segunda vez a final da prova, depois de ter batido o Saint-Étienne na meia-final.
E, em seguida, Chamartín e o Real de Muñoz, Gento, Di Stéfano e Kopa ergueram-se na sua frente como um impossibilidade.
Na véspera, Otto Glória, o treinador encarnado enfrentara a imprensa espanhola: 'Claro que o Benfica pode perder assim como pode ganhar, e até pode perder por muitos golos. O Real também já perdeu recentemente com o Reims, que não é campeão de França, e toda a gente viu como joga o Saint-Étienne. Não temos nomes famosos, mas alguma coisa se há-de fazer. Medo de papões é que não temos. E as assobiadelas também não conseguirão inferiorizar-nos'.
A velha mitologia campestre deu o mote para a canção:
'Vai-te, papão, vai-te embora
de cima desse telhado
deixa dormir o menino
um soninho descansado'...
Não haveria papão.
Ninguém tomaria de assalto o telhado dos sonhos benfiquistas.

Nomes
Otto Glória dizia que o Benfica não tinha grandes nomes. Seria melhor afirmar que ainda não tinha grandes nomes. Essa final foi a primeira para alguns que viriam a surgir noutras: Ângelo, Cavém, José Águas, Coluna.
Foram grandes nomes da Taça dos Campeões Europeus.
Não vale a pena entrar aqui em suspense à moda de Hitchcook: o Real Madrid venceu por 1-0, golo de Di Stéfano.
Dificilmente teria sido de outra forma.
Havia aquele poder acima do querer. Como hoje em dia.
Juntou, nessa época, a Taça Latina à Taça dos Campeões.
Mas não foi fácil. Nada fácil. Mesmo com tudo a favor.
Leia-se o que escreveu um dos enviados-especiais da imprensa portuguesa, Luís Alves. 'Quando uma grande equipa, como é a do Real Madrid, orgulho do futebol espanhol, quase expoente do futebol continental, afagada pelo seu influente e escaldante ambiente, favorecida pela pusilaminidade, não intencional, do árbitro, e jogando contra um adversário que está em inferioridade numérica, não consegue impor o seu método e das satisfação aos seus adeptos no funcionamento do marcador, tendo de contentar-se com a espinhosa magreza de 1-0, só há que reconhecer que na sua frente esteve um autêntico conjunto, formado com mão de mestre, constituído por homens fortalecidos por uma personalidade que não sofreu uma beliscadura. E essa equipa, que ostentava o título de campeã de Portugal, não merecia o acolhimento hostil que lhe foi feito e muito menos os vatícínios que falavam de goleadas e de qualquer coisa parecida com uma representação completa de zarzuela como vimos em letra de forma'.
Inferioridade numérica do Benfica durante cerca de meia hora.
Zezinho foi a vítima: expulso por agarrar um adversário pela camisola.
Otto Glória: 'Para qualificar o árbitro só há uma palavra que eu não quero dizer'.
Mesmo contra dez, o Real Madrid sofre. José Águas, que desperdiçar duas excelentes oportunidades no início do encontro, não atina com a baliza de Juanito Alonso.
Otto desabafava: 'As duas equipas jogaram de cara erguida, à mesma altura'.
Perguntaram-lhe: 'Se o Otto Glória tivesse uma linha avançada daquela categoria?'
E ele, sorrindo: 'Com dois desses jogadores podia deitar-me à sombra, calçando bota larga. Ou então poderia ir à pesca'.
Di Stéfano, por seu lado, reconhecia, sincero: 'Para ganharmos ao Benfica reduzido a dez ainda precisámos de ajuda...'"

Afonso de Melo, in O Benfica

Uma oferta especial

"A história do álbum que eterniza uma das mais inesperadas e apoteóticas recepções ao Benfica além-fronteiras.

Na época 1966/67, o Benfica foi convidado a participar, pela primeira vez, na Taça das Cidades com Feira. A jornada inaugural, repleta de emoção, ficou eternizada numa oferta especial.
A estreia do Clube na competição ocorreu na Bulgária, a 26 de Outubro de 1966, frente ao também estreante Spartak Plovdiv. A viagem até Plovdiv foi «uma da mais longas deslocações da sua 'história europeia'» - «muitas horas no ar, e muitas horas em aeroportos de escala» - mas o inesperado júbilo com que foi recebido animou a comitiva e anulou o cansaço. Desembarcaram «no meio de uma 'chuva' de flores, de aplausos, de pedidos de autógrafos» e os «momentos de apoteose» multiplicaram-se nos dias seguintes.
Durante três dias, «o povo de Plovdiv (...) 'enlouqueceu', vibrou, entusiasmou-se com a visita do Benfica». E os «encarnados» comoveram-se com tamanha demonstração de afecto, sobretudo com «a presença de uma bandeira portuguesa (...) e a voz de Maria Clara» (cantora portuguesa), com que o Spartak brindou o Benfica no Estádio 9 de Outubro.
No dia do jogo, surpreendeu igualmente os portugueses ver que os acessos aos vários sectores do estádio eram controlados por mulheres que, segundo a imprensa, «distribuem os espectadores com a mesma eficiência dos homens mas com muito maior simpatia».
Cerca de um mês depois, foi a vez do Spartak vir disputar a 2.ª mão a Lisboa, a 22 de Novembro. «Um nevoeiro densíssimo atrasou o início do jogo, e colocou mesmo em perigo a realização do desafio». Mas, depois de algum tempo de espera, «o espesso véu do nevoeiro» levantou-se e tudo decorreu como planeado, e ao som de música búlgara, no Estádio da Luz.
Findas as duas mãos, o Benfica venceu a eliminatória e assegurou a presença nos oitavos de final da Taça das Cidades com Feira. Houve então lugar para o convívio e a troca de lembranças. No banquete, no restaurante Folclore, «Joaquim Ferreira Bogalho (presidente do Benfica) procedeu à entrega de lembranças a todos os componentes da comitiva búlgara». Entre outras coisas, «ofereceu garrafinhas de vinho do Porto, pacotes de café, conservas». O Spartak retribuiu com álbum, ilustrado à mão, com 54 fotografias da presença do Benfica em Plovdiv.
Esse álbum encontra-se actualmente no arquivo do Centro de Documentação e Informação do Sport Lisboa e Benfica."

Mafalda Esturrenho, in O Benfica

Obrigações - Títulos Obrigacionistas

"Enquanto uns não pagam as obrigações na data do seu vencimento, o que configura o primeiro incumprimento em Portugal de emissões obrigacionistas emitidas por SAD, outros emitem novas emissões obrigacionistas mesmo tendo vendido receitas futuras(íssimas) no valor de 100 milhões. Assim, a FC Porto SAD emitiu um empréstimo obrigacionista no valor de 35 milhões de euros.
É curioso que mesmo quem subscreve as obrigações, que foram emitidas a uma taxa de juro de 4,75%, não lê nada de nada do prospecto. Vejamos o que as pessoas deviam ler e o que está lá escrito!

2.1 Riscos gerais relativos ao emitente e à sua actividade
Deverão ser consideradas as informações relativas aos factores de risco específicos do emitente e da sua actividade, nomeadamente.
1. Os capitais próprios do emitente são negativos.
O capital próprio individual da FC Porto SAD tem vindo progressivamente a diminuir nos dois últimos exercícios e, a 30 de Junho de 2017, tal como aprovado em Assembleia Geral realizada em 27 de Novembro de 2017, é de -€70.343.293, face a um capital social de €112.500.000. O capital próprio individual conforme balanço referente a 31 de Dezembro de 2017 é de -€98-123-157 (objecto de revisão limitada e não auditado), traduzindo esta situação a perda de mais de metade do capital social, pelo que o conselho de administração deverá efectuar os procedimentos previstos nos artigos 35.º e 171.º do CSC conforme referido no relatório de gestão).
Nos termos do artigo 35.º do CSC, 'resultando das contas de exercício ou de contas intercalares, tal como elaboradas pelo órgão de administração, que metade do capital social se encontra perdido, ou havendo em qualquer momento fundadas razões para admitir que essa perda se verifica, devem os gerentes convocar de imediato a assembleia geral ou os administradores requerer prontamente a convocação da mesma, a fim de nela se informar os sócios da situação e de estes tomarem as medidas julgadas convenientes.'
Na convocação da assembleia geral, o conselho de administração terá em conta as medidas que entender convenientes para o cumprimento da legislação aplicável, devendo ser feita referência, nomeadamente, à possibilidade de dissolução da sociedade; redução do capital social para montante não inferior ao capital próprio da sociedade nos termos legais aplicáveis e à realização pelos sócios de entradas para reforço da cobertura do capital.
À presente data, o Conselho de Administração ainda não procedeu à convocação da Assembleia Geral nos termos do artigo 35.º do CSC, estando a ponderar a melhor forma de o fazer em cumprimento da legislação aplicável.
Existe um desequilíbrio financeiro e económico, sendo o passivo corrente superior ao activo corrente, o que pode condicionar a actividade da FC Porto SAD, nomeadamente as aquisições e vendas de direitos desportivos de jogadores e o orçamento salarial.
Na sequência de prejuízos incorridos nos últimos anos, em 31 de Dezembro de 2017, o capital próprio encontra-se negativo (sendo por isso aplicáveis as disposições do artigo 35 do Código das Sociedades Comerciais) e o passivo corrente é bastante superior ao activo corrente. Tal como mencionado na nota 3, as demonstrações financeiras foram elaboradas no pressuposto da continuidade das operações, prevendo-se a manutenção do apoio financeiro das instituições financeiras e outras entidades financiadoras, nomeadamente através da renovação e/ou reforço das linhas de crédito existentes, bem como o sucesso futuro das operações de alienação de direitos de inscrição desportiva de jogadores, tal como previsto nos orçamentos de exploração e tesouraria, o qual é essencial para o equilíbrio económico e financeiro do Grupo e para o cumprimento dos compromissos financeiros assumidos.
São os revisores de contas que o dizem, mais ninguém.
Qual foi a medida encontrada? Ficar a dever mais 100 milhões sobre património que ainda não tinham!"

Pragal Colaço, in O Benfica

Sporting: o naufrágio

"Quando, em meados de maio, Fernando Santos anunciou os 23 jogadores que iam participar no campeonato do mundo da Rússia, o Sporting era de longe o clube mais representado, com quatro atletas entre os eleitos. O FC Porto e o Benfica tinham apenas um. Menos de um mês volvido, são zero os jogadores da selecção que pertencem aos quadros de Alvalade.
Com a entrega das cartas de rescisão unilateral de William Carvalho, Gelson Martins e Bruno Fernandes, que se juntam às anteriores de Rui Patrício e Podence, terão voado qualquer coisa como entre 60 e 80 milhões de euros dos cofres do clube. Ou até mais - basta recordar que há dois anos João Mário foi vendido ao Inter de Milão por 40 milhões (mais 5 por objectivos), e que todos, Bruno de Carvalho incluído, estavam convencidos de que Gelson ia bater esse recorde e tornar-se a venda mais cara da história do clube.
Há uma agravante: o Sporting precisava deste dinheiro como de pão para a boca. Se a situação do clube já era dramática, agora tornou-se desesperada. Já não é apenas a próxima época que está comprometida, está em jogo o próprio futuro do clube.
No centro disto tudo encontra-se o inevitável Bruno de Carvalho. Se até há pouco tempo se vinha mostrando um grande negociador, nos últimos dois meses estragou tudo com a forma desastrosa como geriu o processo. Começou por culpabilizar os jogadores pelos maus resultados. Depois, diz-se, ameaçou-os com represálias por parte das claques. “Atiçou, diversas vezes, a ira dos adeptos contra mim”, disse Rui Patrício. Face aos incidentes de Alcochete, em vez de se colocar intransigentemente do lado das vítimas, disse que os jogadores é que tinham começado tudo na Madeira. Para cúmulo, anteontem ameaçou Patrício e Podence de lhes colocar um processo-crime. E ontem, na brincadeira, desafiou outros a rescindirem. Por uma vez, fizeram-lhe a vontade.
Bruno cometeu um erro tremendo ao declarar guerra aos jogadores. Já se percebeu que perdeu com estrondo. Mas não foi só ele que perdeu; ao manter-se teimosamente na sua, arrastou o clube para o fundo. Pior era impossível."

Um narcisista não se demite

"O tipo de personalidade antissocial é descrita, no manual de diagnóstico das perturbações mentais americano (DSM), como um comportamento caracterizado por um padrão global de desrespeito e violação dos direitos dos outros. No detalhe, acrescenta-se a falsidade e o mentir repetidamente para obter lucro ou prazer.
No caso do "querido líder", há um agir por impulsividade traído pela incapacidade de planear antecipadamente porque, provavelmente, é dotado de um quociente de inteligência que não ultrapassa os dois dígitos. Acresce a ausência de empatia e uma arrogância ímpar. A irritabilidade e agressividade estão contidas numa armadura de ferro que faz parecer uma criatura ponderada. Na verdade, um falso calmo.
A psicopatia em causa funciona alimentada por uma estrutura narcísica da personalidade, protegida pela fantasia de grandiosidade, autoimportância e êxito ilimitado - apimentado pela desrealização - característica de um ser que segue tudo menos o que é esperado na lógica social. Acredita que é especial e único logo, só compreendido por seres ilustres e galácticos.
Tudo indica que a liderança actual do Sporting só poderá ter um fim se for a mal. Teme-se portanto, que o momento triste ainda poderá estar longe de terminar. Mas o verde é de esperança e os sportinguistas vão resistir e sair de pé deste momento difícil da sua história."


PS: Este artigo foi escrito no dia 18 de Maio!!!

E vão seis

"No Sporting não há certezas sobre nada, mas a dúvida maior assenta sobretudo no que poderá vir a ser a próxima temporada de futebol.

Agita-se o universo sportinguista sem que seja possível prever quando irá terminar a turbulência que actualmente se vive para as bandas de Alvalade agita uma família que deixou claramente de estar unida.
A vaga tem aumentado todos os dias, mas ontem assumiu proporções impensáveis quando mais quatro jogadores assumiram a sua vontade de abandonar o Sporting Clube de Portugal rescindindo os seus contratos com a alegação de justa causa.
Pese embora o facto de se tratar de um processo cujo desfecho vai levar anos (o reputado advogado Garcia Pereira, especializado em questões de trabalho dizia ontem que vão ser necessários pelo menos dois anos para que o processo chegue ao fim), há outros danos que, no imediato, vão abater-se sobre o clube com largas repercussões a curto e a médio prazo.
Neste momento, no Sporting não há certezas sobre nada, mas a dúvida maior assenta sobretudo no que poderá vir a ser a próxima temporada de futebol: não há treinador, escasseiam os jogadores, e dinheiro para promover contratações também não viaja por aquelas bandas.
Bruno Carvalho não se demite, ou melhor, deu ontem um novo tom ao seu discurso. “se os jogadores voltarem atrás nas suas decisões de abandonar o clube, mas continuando a vestir a camisola do leão”, apresenta a sua demissão.
Nada disto é visível no horizonte mais próximo, ou seja, nem os atletas renunciarão ao abandono do Sporting, nem o presidente deixará de exercer funções por sua expressa vontade.
Mas, atenção, depois de algumas reacções de sócios e adeptos em Alvalade, após mais uma insensata conferência de imprensa, começa a pairar a ideia segundo a qual a pressão sobre Bruno Carvalho vai aumentar significativamente nos próximos dias. Ou, nas próximas horas.
Tudo depende da possibilidade, ou não, de nesta terça-feira chegarem a Alvalade novas cartas de rescisão de outros jogadores que, segundo se sabe, também não desejam continuar de leão ao peito."

Está tudo maluco?

"Na sequência da escalada de tensão entre elementos dos órgãos sociais do Sporting Clube de Portugal, bem como entre os seus adeptos, com alguns dos anteriores indefectíveis de Bruno de Carvalho a pretender tirar-lhe o tapete, o universo leonino tem conhecido uma agitação nunca de antes registada.

Esta foi apenas uma das muitas expressões bombásticas que o presidente do Sporting, Bruno de Carvalho, utilizou recentemente numa das suas quase diárias aparições televisivas. Destinava-se a mesma a caracterizar a actuação daqueles, e são muitos, que põem em causa a sua legitimidade para continuar a liderar o projecto leonino, indelevelmente marcado pelos tristes acontecimentos dos últimos meses, que culminaram nas agressões aos jogadores da equipa de futebol perpetradas em pleno centro de estágio em Alcochete.
Na sequência da escalada de tensão entre elementos dos órgãos sociais do Sporting Clube de Portugal, bem como entre os seus adeptos, com alguns dos anteriores indefectíveis de Bruno de Carvalho a pretender tirar-lhe o tapete, o universo leonino tem conhecido uma agitação nunca de antes registada, com sucessivas trocas de acusações e constantes apelos a um conselho directivo, liderado por Bruno de Carvalho, para que se demita e dê a voz aos sócios, para que estes possam relegitimá-lo ou deixá-lo definitivamente cair.
De um lado, aparece a mesa da assembleia geral, liderada por Jaime Marta Soares, que pretende, fazendo uso de competências que lhe são estatutariamente conferidas, agendar uma assembleia geral destitutiva, que faça cair o que resta, e já não é muito, do conselho directivo leonino. Do outro, Bruno de Carvalho, que resiste estoicamente, contra tudo e contra todos, fazendo finca-pé em não abandonar a nau sportinguista, nem que para isso tenha que “torcer” as regras estatutárias e convocar assembleias gerais que procurem legitimar decisões tomadas ao arrepio da lei.
Do ponto de vista jurídico, e é apenas esse que nos interessa, Bruno de Carvalho não tem qualquer razão. Na realidade, analisemos, à luz dos estatutos do Sporting Clube de Portugal, os motivos invocados por Bruno Carvalho para querer permanecer no cargo, para contestar o agendamento de uma assembleia geral extraordinária por parte de Jaime Marta Soares e para nomear uma comissão transitória da mesa da assembleia geral do clube: advoga Bruno de Carvalho que Jaime Marta Soares não tem legitimidade para convocar a referida assembleia geral, porque o mesmo terá renunciado ao cargo. Ora, de acordo com o artigo 37º dos estatutos do Sporting Clube de Portugal, em caso de cessação antecipada do mandato dos titulares dos órgãos sociais, mantêm-se os mesmos em funções até à tomada de posse dos sucessores. Ou seja, ainda que Jaime Marta Soares tenha, efectivamente, apresentado a sua renúncia ao cargo de presidente da mesa da assembleia geral e a mesma tenha produzido efeitos (de acordo com o artigo 39º dos estatutos a renúncia do presidente da MAG deverá ser apresentada ao presidente do conselho fiscal e disciplinar), o mesmo continuaria, até à tomada de posse dos seus sucessores, em funções. Este aspecto é, aliás, reforçado pela leitura do disposto no artigo 39º dos estatutos, que refere que se a renúncia constituir causa de cessação do mandato da totalidade dos membros do órgão (e, neste caso, tendo em conta o disposto no artigo 37º, e registando-se renúncia, não só do presidente, como da vice-presidente, como se anuncia ter-se verificado, haveria cessação do mandato da totalidade da MAG) a referida renúncia só produzirá efeito com a tomada de posse dos sucessores, salvo se, entretanto, for designada comissão de gestão ou de fiscalização. Ora, defende Bruno de Carvalho que a anterior MAG já cessou as suas funções, uma vez que a renúncia produziu efeitos com a designação, por parte de Bruno de Carvalho, de uma comissão transitória da MAG, a qual determinou a cessação de funções da anterior MAG.
Acontece que, como é bom de perceber, através da leitura do artigo 56º dos estatutos do Sporting Clube de Portugal, o conselho directivo não dispõe de competências para nomear a qualquer comissão transitória da MAG, como, aliás, já terá entendido, pretendendo, agora, introduzir, em assembleia geral extraordinária, convocada por um órgão sem legitimidade, fazer passar uma alteração estatutária que venha sanar a ilegalidade entretanto cometida.
Uma leitura, ainda que superficial, dos actuais estatutos do Sporting Clube de Portugal permitirá a qualquer aluno do primeiro ano de uma Faculdade de Direito perceber que as referidas comissões de gestão e de fiscalização só poderão suprir transitoriamente a ausência de conselho directivo ou do conselho fiscal e disciplinar, de acordo com o disposto no artigo 41º dos estatutos, sendo a sua designação da responsabilidade do presidente da assembleia geral e não do conselho directivo. Assim, verificam-se, aqui, dois vícios: primeiro, a assembleia geral não pode se substituída por uma comissão de gestão e de fiscalização; segundo, as comissões de gestão e de fiscalização, a serem designadas para transitoriamente superar a situação resultante da cessação de mandato de conselho directivo ou de conselho fiscal e disciplinar, só podem resultar de uma decisão do presidente da MAG.
Resta, pois, saber se o facto de o presidente da mesa da assembleia geral, Jaime Marta Soares, ter, eventualmente, renunciado ao cargo lhe retiraria legitimidade para lançar mão dos poderes que os estatutos lhe conferem, nomeadamente de convocar uma assembleia geral extraordinária. Ora, os estatutos do Sporting Clube de Portugal, máxime, no seu artigo 43º, nada dispõem sobre uma eventual perda de legitimidade do presidente da MAG, ainda que demissionário, para convocar uma assembleia geral. Na realidade, esta pode, de harmonia com o disposto nos artigos 51º e 52º, por iniciativa do presidente da MAG, ser convocada, não necessitando, ao arrepio daquilo que tem sido dito e repetido pelo presidente do conselho directivo, ser requerida por sócios efectivos, no pleno gozo dos seus direitos, com o mínimo de 1.000 votos.
E, de acordo com a alínea d) do nº 1 do artigo 51º dos estatutos, a assembleia geral extraordinária pode votar a revogação com justa causa do mandato dos titulares dos órgãos sociais.
Fácil é, assim, concluir, através de uma leitura atenta dos estatutos do Sporting Clube de Portugal, de que lado está a razão do ponto de vista meramente legal. Longe de nós nos aventurarmos sobre quais as razões extrajurídicas que devem prevalecer. É matéria que cabe aos sócios do Sporting Clube de Portugal decidir. Assim, a sua soberania seja permitida pelos órgãos sociais."

O mais difícil cromo da bola

"O Mundial da Rússia só chega esta semana, porém os autocolantes da Panini, menos elusivos que as estações do ano, há algum tempo que já cá estão para pôr os pais a fingir que é para os filhos

Um dos grandes inconvenientes de chegar à meia idade sem filhos é não ter uma boa desculpa para coleccionar cromos. Os filhos, desde o momento do nascimento, fornecem ao homem adulto, ocidental e com um acentuado lado juvenil o pretexto mais conveniente para continuar a comprar carteirinhas e encher cadernetas com fotografias de jogadores de futebol. Sem o remorso da desculpa esfarrapada, a febre volta a cada dois ou quatro anos, caso seja um purista de Mundiais ou lhe junte também os Europeus.
Nem sequer é preciso que os filhos se entusiasmem no vício – um pai que se preze sabe que os vícios são maus e caros e não se devem legar de ânimo leve –, basta a sua existência para justificar o perdurar da mentira. Nenhum adulto compra, realmente, cromos com afinco e preenche com esmero a caderneta por causa do seu recém-nascido que ainda mal viu o mundo ou do adolescente degenerado que só sabe jogar “Call of Duty” com os amigos na Playstation.
Antes pelo contrário. Os filhos são desculpa, mas não há desculpa para deixar um pirralho de três anos mexer numa caderneta. Se quer colar cromos tortos, riscar, pintar, rasgar, que tenha caderneta própria. E mesmo aqueles que já sabem dar valor a um cromo bem colado, mesmo esses só têm direito aos repetidos – primeiro está a colecção do pai que é para o filho, depois a do filho.
Os cromos Panini das grandes provas futebolísticas de selecções fazem parte do imaginário humano desde a primeira caderneta comercializada pelos irmãos Panini para o México 70 – curiosamente a única em que figura a taça Jules Rimet porque nesse ano o Brasil conquistou o seu terceiro título e levou-a para casa. Ainda este ano se comercializou em leilão online uma dessas cadernetas, completa e autografada por Pelé (com respectiva foto comprovativa do rei a segurá-la), pela módica quantia de 12.038 euros.
John Crace dizia em 2010, no “Guardian”, que se trata de uma actividade “cara, frustrante” e “completamente viciante”, em que se paga 0,90 euros por cada carteirinha de cinco cromos e acaba-se sempre com uma montanha de jogadores repetidos e uma enorme frustração por tanto se tardar a encher a caderneta.
Se alguém tivesse a sorte de lhe sair sempre cromos diferentes em cada carteira adquirida, completar a colecção de 682 autocolantes (cresceu incomensuravelmente desde os 288 da primeira, tal como o Mundial; no México eram 16 selecções, na Rússia vão ser 32) custaria mais de 123 euros. Mas isso nunca acontece.
Paul Harper, professor da Escola de Matemáticas da Universidade de Cardiff, fez o cálculo e estabeleceu que no Reino Unido completar a caderneta do Rússia 2018 da Panini custa uma média de 773 libras (880 euros). E isso quando se consegue, quando não se tem de recorrer à compra de cromos avulsos no mercado negro ou pela internet (há anos que perto da estação do Rossio, em Lisboa, se trocam, se vendem e se compram cromos). O que acrescenta mais uns quantos euros ao custo.
Todos sabemos dos cromos mais difíceis da bola. Nas colecções da Panini sempre se disse que havia jogadores impossíveis, as dores de cabeça de todas as cadernetas. Feitos, lá está, para que os incautos coleccionadores continuem a comprar carteirinhas e a engordar os cofres da empresa – a Panini vai garantindo regularmente que todos os cromos têm o mesmo número de exemplares impressos e comercializados.
No Reino Unido, alguém testou a teoria de Paul Harper e comprou 1000 carteiras de cromos e mesmo assim não conseguiu completar a colecção, ficou a faltar o elusivo Radja Nainggolan. Vingança dos deuses em nome do belga que nem sequer foi escolhido por Roberto Martínez para o Mundial e já anunciou a decisão de abandonar a selecção.
De acordo com a experiência do site MusicMagpie, o símbolo da Federação Portuguesa de Futebol figura entre os mais raros, com uma hipótese em 5000 de obtê-lo. Por cá, segundo um “especialista” (na verdade, um adulto que colecciona, mas não tem filhos para se justificar), o Nainggolan não parece assim tão difícil. Uma vista de olhos por alto no site Troca de Cromos mostra que não aparece na maioria da lista de faltas, embora também não surja nos repetidos.
Entre os mais custosos estão, sim, os símbolos das federações, não só da portuguesa, e há até quem faça especulação. Os cartazes das cidades organizadoras, Neymar e o cromo 00, o logótipo da empresa (Giuseppe Panini gostava de enigmas e quebra-cabeças e criou palavras cruzadas com o pseudónimo Paladino, daí o cavaleiro do símbolo), também se encontram entre os frutos mais evasivos dos coleccionistas portugueses.
“Parei de gastar dinheiro em cerveja, deixei a bebida, em vez disso comecei a coleccionar estes cromos”, dizia Dave, um homem nos seus trintas, durante um evento de troca de cromos em Manchester, citado por um artigo do “Guardian” de 2016. Até o argentino Carlos Tévez chegou a aparecer, quando ainda jogava no City, chapéu enterrado nos olhos em busca de cromos. E nessa altura ainda não tinha nascido o filho, mas já tinha duas filhas, o que até para um coleccionador machista já serve como álibi para arranjar mais uma caderneta."

Aquela altura do ano em que ver anúncios de futebol é um prazer. Como estes

"Quão bom, bonito, inspirador é esta altura da vida, em que o Mundial está aí à porta e tudo quanto é marca associada ao futebol nos quer impressionar e começa a fazer anúncios? A resposta é difícil de quantificar, dadas as emoções que vídeos como estes despertam nos adeptos (e, arriscamos, até em quem não gosta assim tanto de bola)

Por fim, o longo e sentido suspiro que, ciclicamente, dura quatro anos em quem nutre algum carinho por futebol e, por arrasto, sofre das maiores ressacas desta vida, está a terminar. O primeiro jogo do Campeonato do Mundo, a prova das provas, é já esta quinta-feira e a espera que dura desde 2014 está a dias de ser satisfeita.
Mas há bastante tempo, por certo, que já se estava a mexer quem muito pode lucrar e beneficiar com isto de andarem muitos tipos a correr, entre duas balizas e dentro de um rectângulo de relva, atrás de uma bola, pelo bem dos seus países.
Há marcas de chuteiras, roupa desportiva, carros, electrodomésticos, auscultadores, cerveja e outros afazeres, em nada relacionados com futebol, que aproveitam a visibilidade da competição (a FIFA estima que 3.2 biliões de pessoas tenham assistido ao último Mundial) para se promoveram. Limarem a sua imagem junto do público, dar a conhecer um certo produto ou oferta, ou, simplesmente, fazerem coisas bonitas, inspiradoras e facilmente apreciáveis, só porque sim.
Este ano, por exemplo, a Federação Portuguesa de Futebol optou por utilizar os próprios recursos e construir um anúncio de apoio à selecção nacional, cheio de imagens motivacionais que se misturam com ditados e expressões populares portuguesas. Está aqui e, em baixo, ficam outras quatro amostras de como estamos na melhor altura do ano para nos sentarmos, termos um qualquer tipo de ecrã à frente e apreciar o que o melhor a publicidade nos tem para oferecer.

Os Genes Argentinos
Os argentinos têm um especial e peculiar talento para anúncios relacionados com futebol. Apelam sempre, mas sempre, ao que não é palpável e mais mexe connosco, apontam à alma e vão em busca do sentimento.
Por isso dão à luz anúncios como este, da revista Olé, onde um casal norueguês visita uma clínica de fertilidade, é-nos sugerido que escolhem um dador argentino e a sugestão confirma-se pela forma como o eventual filho se comporta na infância - anormalmente emotivo para a estereotipada frieza nórdica.
"Exigem Menos de Deus"
A Quilmes tem uma longa tradição a manter, quase como um legado publicitário que lhe cobra em exigência a cada grande competição em que a selecção argentina jogue. A marca de cerveja já foi inventora de muitos e inspiradores anúncios (há anos, por exemplo, pôs Deus a falar com os argentinos) e, agora, decidiu colocar Oscar Ruggeri, campeão do mundo com a Argentina, em 1986, no meio de um relvado, com um chapéu de chuva.
O estádio está à pinha de gente e o antigo futebolista começa a dialogar, e responder, com alguns adeptos que vão criticando os jogadores da selecção argentina. O discurso que lhe sai da boca, claro, é do tipo que nos faz sentir capazes de mover uma montanha ao pontapé depois de o ouvirmos. 
Brasileiragem
"Olhem onde vocês estão! É para chegar lá e passar por cima! É para dar a vida! Isto é o Brasil, é sem medo! Esta camisa aqui tem história!".
É com estas frases a serem gritadas e exclamadas, com tudo, que acaba este anúncio que, uma vez mais, a Nike preparou para o Brasil e a sua selecção. É tão típico associarmos a famosa marca desportiva com o país da ginga que, lá para o meio, até há uma referência ao que aconteceu há 20 anos, quando saiu um dos melhores anúncios de sempre destas fases pré-Mundial.


Uma Mixórdia de Tudo Um Pouco
Luzes berrantes, sons intrusos e agressivos, muita coisa a acontecer ao mesmo tempo. Em minuto e meio de confusão organizada, a Adidas resolveu misturar muitas estrelas que patrocina (futebolísticas e não só) para criar uma campanha alusiva ao futebol, sim, mas também à nova linha de chuteiras (as maiores marcas criam modelos específicos para o Mundial) e roupa.
A mensagem, mesmo que pareça transmitida aos repelões, é uma de união, arrojo e desafio ao status quo.


O Factor Zlatan
Bom, Zlatan a ser Zlatan e a ter piada a sê-lo. É um filme feito e repetido, desta vez, pela Visa, que imaginou um cenário em que o carismático sueco, hoje a gozar dos derradeiros momentos da carreira nos LA Galaxy, nos EUA, revela ao mundo que vai tentar qualificar-se para o Mundial - jogando sozinho contra o mundo.
Islândia
Este anúncio é uma colagem de pedaços de história do futebol islandês: os três rapazes a bateram uma bola na praia de areia escura, algures na década de 40, formam uma alusão aos Jónson, os primeiros três irmãos a jogarem juntos numa selecção; Albert Guðmundsson assina pelo Arsenal em 1946; depois, Ásgeir Sigurvinsson, que viria a tornar-se no jogador do ano da Bundesliga, pelo Estugarda, corre até ao quarto para resgatar as chuteiras, antes de a erupção de um vulcão cobrir de lava a cidade de Eldfell.
Estes e outros episódios históricos, aliados a figuras marcantes do futebol islandês, compõem o anúncio que a Icelandair dedica à selecção do país pequeno, inóspito e gélido que volta a estrear-se numa grande competição.

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Os privilégios de Ronaldo

"Numa reportagem sobre um treino da Selecção portuguesa, ouvi estupefacto o jornalista explicar que Cristiano Ronaldo não se tinha treinado como os outros - pondo-se de fora, evitando os choques, não se esforçando na procura da bola. E tudo isto de uma forma ostensiva e com o aval da equipa técnica.  
Pensei que isto não fosse possível.
Sempre admiti que nem todos os jogadores dessem o máximo nos treinos, até para evitar lesões que os pusessem fora da equipa. Mas isso acontecer às claras, à vista de todos - colegas e treinadores -, é chocante.
Compreenderia a situação se Ronaldo estivesse a recuperar de uma lesão e tivesse receio de piorar. Ou se fosse poupado pelo facto de, nesta época, ter mais jogos nas pernas do que alguns colegas. Ou se fosse mais velho e precisasse de mais descanso. Mas nada disto se passa. William Carvalho veio de uma lesão e treina como os outros. Bruno Fernandes fez mais jogos do que Ronaldo e treina como os outros. E Pepe é mais velho do que Ronaldo e treina como os outros. O que justifica, então, a poupança de Ronaldo?
Justifica-se pelo facto de ter mais estatuto e teoricamente ser mais imprescindível do que os outros. É como se o seleccionador dissesse: “Todos os outros podem magoar-se que não vem daí mal ao mundo, o Ronaldo é que não pode”. Ou seja: os outros são dispensáveis, Ronaldo é indispensável. 
Ora isto num grupo tem um péssimo efeito. Os colegas até podem compreender, até podem aceitar pacificamente a situação, mas subconscientemente isso destrói o espírito de grupo. E diminui a autoestima de cada um - porque se sente pouco importante, descartável, sendo obrigado a treinar no duro enquanto um colega está de fora a descansar.
É por estas e por outras que as vedetas por vezes estragam as equipas. E é por estas e por outras que José Mourinho tem por vezes conflitos com as vedetas que treina. Mourinho quer que eles sejam iguais aos outros - e eles querem ter um estatuto diferente.
Compreende-se que uma estrela, que ganha muitos milhões por ano, que tem o lugar na equipa garantido, queira evitar situações que possam atirá-la para fora da competição ou mesmo acabar-lhe com a carreira.
Também é natural que os mais novos, que querem mostrar-se, que querem conquistar um lugar no onze principal, se esforcem mais, arrisquem mais.
Tudo isto é natural. Mas tem de ser feito com discrição. Não pode ser ostensivo. Não pode colocar uns na situação de filhos e outros na de enteados. Não pode haver os têm de esforçar-se para jogar e os que mesmo sem treinar jogarão sempre.
Fernando Santos tem dito repetidamente que jogam os melhores. Um dia que deixe Ronaldo no banco, ou substitua Ronaldo durante um jogo por estar a jogar mal, acreditarei verdadeiramente nisso. Até lá, julgo que nem todos são iguais. E isso é muito mau sob todos os pontos de vista."

O mau exemplo que querem que seja o rubgy

"Em Inglaterra o rugby, como outros desportos, é um desporto de massas. Não de elites. É praticado por ricos, pobres e membros da classe média, como qualquer desporto deve ser

Na passada semana o “Observador” publicou um artigo de opinião de Pedro Barros Ferreira sobre a situação do rugby nacional onde vocifera toda uma filosofia retrógrada e elitista sobre a modalidade, em particular sobre os malefícios das consequências dos incidentes de um jogo da meia final do campeonato principal sénior que opôs a Agronomia ao Direito.
Diz o “antigo internacional”, é assim que se apresenta ao público – embora o tenha omitido do currículo que apresentou aos eleitores da freguesia a que se candidatou nas últimas eleições autárquicas não sem se esquecer de divulgar que era adepto do Sporting Clube de Portugal e da Selecção Nacional (presumo que de futebol) - que a “saloiice portuguesa” na construção de complexos desportivos levou a que provincianos, sem massa crítica e conhecimento da modalidade, criassem variados clubes de rugby e, imagine-se, reclamassem assento nas Assembleias Gerais da Federação Portuguesa de Rugby.
Tal despeito, sugere o omitido antigo internacional, não promove a separação entre “o trigo e o joio” inquinando a tradição portuguesa de uma modalidade que crescia à base de relações familiares. Para justificar o “trigo” dá, erradamente, o exemplo de Inglaterra e das 90 mil pessoas que assistem aos “Reds and Whites” (alcunha da selecção inglesa) em Twickenham porque “jogaram o jogo”.
Nada mais falso. E é aqui que reside o erro de todo o pensamento do amanuense elitista correndo o risco de já lhe ter dado uma importância que ele manifestamente não tem. Em Inglaterra a cultura desportiva faz parte dos curricula escolares, tal como fazem as artes cénicas, as artes musicais, as tecnologias e a ciência. Aos jovens britânicos é incutida desde cedo a importância do desporto e são as próprias escolas que promovem isso mesmo. Aliás, os campeonatos universitários de rugby em Inglaterra são acompanhados por milhares de pessoas, têm cobertura televisiva nacional e até internacional, como é caso da Varsity Cup.
Em Inglaterra o rugby, como muitos outros desportos, é um desporto de massas. Não de elites. É praticado por ricos, pobres e membros da classe-média. Tal como qualquer desporto deve ser. Mas não é apenas em Inglaterra. É assim em França, onde jogam tantos lusodescendentes de famílias humildes e que se viram forçadas a emigrar à procura de uma vida melhor, na Austrália, na África do Sul e em tantas outras neo-potências do rugby como são caso a Geórgia, a Roménia, a Itália ou a Argentina, estas últimas com créditos já firmados.
O sucesso do desporto, de qualquer desporto, não se pode confinar a um núcleo fechado de filhos, primos e sobrinhos de ex-jogadores. Se o rugby pretende ser reconhecido, contar com mais patrocinadores, com mais apoios do Estado e com melhores condições tem de se massificar. Tem de chegar a todos. “Saloios” e “Urbanos”. Eu sei, por que sou pai de dois jogadores, que para um ex-atleta, mesmo que internacional por omissão, custa muito ver miúdos sem tradição familiar na modalidade jogarem melhor, empenharem-se mais e amarem uma modalidade que, até há uns bons anos, lhes estava “vedada”. Sei bem o que se sente uma determinada elite quando pais, variadíssimos pais de norte a sul do país, dedicam o seu tempo e os seus recursos nos convívios juvenis, na organização das equipas, nas suas deslocações ao estrangeiro para ganharem mundo e conhecerem outras realidades, na integração de centenas de miúdos e, em tantos casos, no seu acompanhamento fora do campo e dos clubes.
Olhar com elitismo para uma modalidade desportiva é reservá-la ao insucesso. O rugby, se quer ser grande em Portugal, e tem condições para isso, não é excepção. Ver a felicidade dos miúdos da Galiza, quase todos eles pobres, ganharem um jogo ao Belenenses, à Agronomia ou ao CDUL é a melhor expressão do sucesso e do rumo que uma modalidade pode ter. Ver o Guimarães, o GDA, os Tubarões da Costa, o Elvas e tantos outros a marcar presença em todos os torneios provavelmente sem apoios para tal é sinónimo de que nos devemos unir, todos, sem complexos elitistas em prol do crescimento da modalidade. Já para não referir o projecto “Rugby com partilha” junto de reclusos e o rugby adaptado para jovens com necessidades especiais.
O rugby está a democratizar-se. Há muito por fazer, há muito que já devia ter sido feito. O país não é Lisboa e ainda bem que assim o é. Pensar o contrário e querer o contrário recorrendo a argumentos falsos não é um bom contributo à modalidade nem tão pouco uma demonstração de respeito para com centenas de jovens atletas, pais, treinadores e dirigentes deste país. O rugby precisa muito dos “saloios”, porque se depender apenas dos “urbanos” já percebemos onde vai parar."