quarta-feira, 21 de março de 2018

Números e sonhos

"O FC Porto em 27 jogos teve 12 deles arbitrados por juízes da Associação do Porto, ou seja, 45%!

Benfica melhor
... E faltam 7 jornadas para terminar o Campeonato e 3 jornadas para o importante, mas não necessariamente decisivo Benfica - Porto. O Benfica passou com distinção em Santa Maria da Feira, dominando do primeiro ao último minuto, num relvado difícil como alguns poucos que ainda há em 2018 na principal competição portuguesa. Em termos de consistência de jogo, foi dos melhores encontros do Benfica, mantendo-se sempre por cima. A equipa está confiante, os seus movimentos são fluídos, os jogadores estão em excelente condição física e em forma apurada.
Curioso e talvez surpreendente depois de um primeiro terço do campeonato menos conseguido é o facto de o Benfica ter, à mesma 27.ª jornada, mais 3 pontos do que tinha na época anterior (igual número de empates, 5 e menos uma derrota, 1), com mais 14 golos marcados (71 contra 57), aparentemente com uma equipa com menos soluções do que antes. A diferença que explica a razão pela qual o Benfica não é líder está, pois, no melhor campeonato que o Porto está a fazer em comparação com 2016/17. Já quase estatisticamente relevante é a circunstância de Rui Vitória ter começado menos bem os três campeonatos que leva à frente da equipa e os terminar em notável ascendência.
Voltando ao jogo com o Feirense, alguns apontamentos: Raul Jiménez deve ser o melhor 12.º jogador não só do Benfica (a par com Mantorras, lembram-se?), como, creio, da maioria das equipas europeias. Desta feita, um autêntico furacão marcando o golo e desbloqueando o resultado meio minuto depois de ter entrado e fazendo uma brilhante e inteligente assistência para o golo de Rafa. O golo não foi por acaso, resultou da enorme determinação com que sempre entra em campo, sem amuos ou tergiversações por estar no banco, e com o instinto matador numa oportunidade em que a maioria dos jogadores nas mesmas circunstâncias não visaria a baliza. Rafa voltou a ser um desequilibrador. Marcou, expulsou e imprimiu sempre o fundamental num jogo de futebol que é a velocidade. Pena o azar dos remates aos postes e ainda alguma indefinição quando chega ao momento final da concretização. Pizzi voltou e, com ele, a geometria do passe e a boa visão de jogo colectivo. Às vezes, dá a ideia de que não é tão fundamental como isso, mas basta comparar com a falta que fez no jogo contra o Desportivo das Aves. Por fim, saliento André Almeida, que está um senhor lateral-direito, não apenas a defender, mas sobretudo a atacar e a assistir colegas. Pena que o seleccionador nacional não o tenha escolhido para os próximos jogos de Portugal. Sou de opinião que o mereceria, não só pela excelente forma que atravessa, como também por ser um jogador bastante útil pela sua polivalência.

Concentração arbitral
Dei-me ao trabalho de fazer uma pequena contabilidade da nomeação de árbitros no campeonato nacional. Por mera curiosidade pessoal. Mas confesso, agora, que fiquei algo surpreendido com alguns aspectos estatísticos, no que se refere aos juízes que arbitraram os jogos dos três grandes. Foi assim nas 27 jornadas já realizadas:
Distribuição dos árbitros por jogos dos 'grandes'
Benfica: Ass. Porto - 9; Ass. Lisboa - 5; Ass. Braga - 3; Ass. Castelo Branco - 3; Ass. Setúbal - 2; Ass. Évora - 2; Ass. Leiria - 1; Ass. Faro - 1; Ass. Vila Real - 1
FC Porto: Ass. Porto - 12; Ass. Lisboa - 4; Ass. Braga . 3; Ass. Castelo Branco - 3; Ass. Leiria - 3; Ass. Setúbal - 1; Ass. Évora - 1
Sporting: Ass. Lisboa - 8; Ass. Porto - 6; Ass. Évora - 4; Ass. Braga - 3; Ass. Castelo Branco - 3; Ass. Leiria - 1; Ass. Setúbal - 1; Ass- Faro - 1
Os números valem o que valem e, como todos sabemos, podem ser torturados até ao limite, neste caso em função do nosso subjectivismo e preferências clubistas. E bem sei que as Associações estão diferentemente representadas em termos de números de árbitros.
Deixo, apenas, aqui algumas perplexidades de, chamemos-lhes, assimetrias geográficas. O FC Porto em 27 jogos teve 12 deles arbitrados por juízes da Associação do Porto, ou seja, 45%! Já o Sporting é o preferido para nomeações de árbitros da associação geográfica de Lisboa: 8 em 27 (30%) e o menos contemplado com arbitragens do Porto. O Benfica é, dos 3 clubes, o único em que a Associação distrital a que pertence não ocupa o primeiro lugar, que é avantajadamente preenchido pela AF Porto. Haverá algum critério para assim ter sido ou é fruto do acaso? Podemos tirar alguma conclusão destes números ou estaremos a especular injustamente? Cada um que responda por si.
Curiosa é também a circunstância de só o Benfica ter sido escolhido para ser arbitrado por juízes de todas as Associações representadas. Uma única nota para o número de Castelo Branco (9 vezes) que se deve a um único árbitro: Carlos Xistra.

Champions: mais do mesmo
Nada de novo, nos quartos-de-final da Champions, competição glamorosamente destinada a atribuir títulos, dinheiro e honrarias aos do costume. Desta vez, lá estão 3 equipas espanholas (sem o Atlético de Madrid, que calhou na fava ao resistente Sporting na Liga Europa), 2 italianas, 2 inglesas e o obrigatório conjunto alemão do Bayern. Só falta o francês PSG. O melhor jogo (eliminatória, diria mesmo) foi o Juventus - Tottenham, com os italianos mais felizes e os ingleses mais empolgantes. Pessoalmente, gostei que a equipa de Turim tivesse passado por uma única e forte razão para continuar a ver jogar nesta competição o grande e eterno guarda-reeds, Gianluigi Buffon. Um senhor no mundo de fantasias e ardis que é o futebol contemporâneo. Pena não estar no Campeonato do Mundo depois da eliminação da sua squadra azzurra.
Repare-se a concentração das equipas nos últimos sete anos de Champions (ou seja, desde 2011):
Países representados nos 'Quartos' da Champions:
2011/12: Espanha(2); Alemanha(1); Inglaterra(3); França(0); Itália(1); + Shakhtar
2012/13: Espanha(3); Alemanha(2); Inglaterra(0); França(1); Itália(1); + Galatasaray
2013/14: Espanha(3); Alemanha(2); Inglaterra(2); França(1); Itália(0); + (0)
2014/15: Espanha(3); Alemanha(1); Inglaterra(0); França(1); Itália(1); + FC Porto
2015/16: Espanha(3); Alemanha(2); Inglaterra(1); França(1); Itália(0); + Benfica
2016/17: Espanha(3); Alemanha(2); Inglaterra(1); França(0); Itália(1); + (0)
2017/18: Espanha(3); Alemanha(1); Inglaterra(2); França(0); Itália(2); + (0)
Total: Espanha - 20 (35,7%); Alemanha - 11 (19,6%); Inglaterra - 9 (16,1%); França - 6 (10,7%); Itália - 6 (10,7%); Outsiders - 4 (7,1%)
Mais de um terço de equipas espanholas, este ano com o Sevilha a entrar depois de eliminar o Man United. A Itália é quase sinónimo de Juventus e o mesmo se diga do PSG em França. Fica-nos o prémio de consolação, pois que tirando os 'cinco', Portugal surge logo a seguir com duas entradas dos dois principais clubes portugueses.
Salvo qualquer tropeção nos sorteios (foi o caso do Real Madrid - PSG) não é preciso ser adivinho para saber quem atinge esta fase da competição. O resto é o warm-up dos favoritos e umas massas para arrecadar nas fases anteriores pelos outros clubes. Já lá vai o tempo em que equipas portuguesas, holandesas, escocesas, sérvias, romenas, etc. podiam aspirar a erguer a orelhuda.

Grande illiabum
O Illiabum Clube venceu a Taça de Portugal em basquetebol, derrotando, com todo o merecimento, o mais que favorito Benfica que havia afastado o FC Porto. Um feito histórico para o clube da minha terra natal Ílhavo, e do qual fui, até há meses, presidente da Mesa da Assembleia-Geral. Quis mais uma vez que o sucesso fosse contra o meu Benfica, tal como havia acontecido em 1992 na Supertaça. Seria a sua 21.ª Taça, mas para o Illiabum seria e foi a primeira! Não sei se a soma de todos os salários do Illiabum chegarão ao salário do jogador pior pago no plantel da Luz. Para vencer o campeão nacional foi necessária muita garra, determinação e engenho. O basquetebol de Ílhavo já há muito merecida este título inédito, depois de ao longo dos seus 74 anos de história ter conquistado muitos títulos nas categorias ao Illiabum Clube (sou o sócio n.º 137), ao actual e anterior presdientes Pedro Rosa Novo e Artur Aguiar. A semana passada havia jantado com este último e falámos da 'utopia' que seria a vitória ilhavense. Uns dias depois a 'utopia' tornou-se realidade.

Contraluz
- Frase: «Ninguém se compara a mim»
Ronaldo dixit. Fez-me lembrar Oscar Wilde quando disse (neste caso à polícia) que nada tinha a declarar a não ser o seu talento. Ronaldo é de facto quase incomparável, mas falta o quase.
- Decepção: Grandes jogos da equipa feminina de hóquei em patins do Benfica na final four da Liga Europa, onde perdeu na final com as espanholas de Gijon. Foi pena, mas o técnico e brilhante ex-jogador encarnado Paulo Almeida e a equipa pentacampeã nacional prestigiaram o SLB.
- Vergonha: Os petardos recorrentes.
Mas não será possível erradicar esta estúpida e cretina forma de apoiar uma equipa de futebol? As multas, claro está, pagas pelos clubes, leia-se pelos sócios que não atiram petardos, nada resolvem. Do lado dos apoiantes do Benfica que são useiros e vezeiros nesta prática não haverá maneira de prevenir estes abusos?"

Bagão Félix, in A Bola

Vitória difícil...

Benfica 27 - 22 Madeira SAD
(14-15)

Jogo mais complicado do que o resultado final dá a entender... Só a meio da 2.ª parte conseguimos passar para a frente, depois de muitos erros... 4 Livres de 7 Metros desperdiçados são demasiados!!!

Início da 2.ª fase, num campeonato com bases bastante desequilibradas! O 3.º lugar será o mínimo exigível, melhor do que isso será bastante positivo, na próxima jornada temos o jogo com os Lagartos, que poderá ser importante na definição das expectativas...!!!

O Benfica não tem importância

"Num país onde a lei impere, “safa-se” quem presta algum bem aos seus pares. Num país como Portugal, “safa-se” quem, pela sorte ou falta de escrúpulos, consegue traficar eficazmente a influência de que goza.

O “caso” anda nas bocas do pequeno mundo português: segundo crê o Ministério Público, um técnico de informática do Instituto de Gestão Financeira e Equipamento da Justiça, de seu nome José Silva, terá passado ao Benfica, na pessoa do advogado Paulo Gonçalves, uma série de informações acerca de processos judiciais envolvendo o clube e os rivais Sporting e Porto, a troco de camisolas e bilhetes para assistir a jogos do Benfica. A juntar à festa, a PJ acredita que José Silva será apenas um elemento de uma rede de “toupeiras” do clube da Luz no sistema judicial português.
Como seria de esperar, jornais, rádios e televisões agarram-se à notícia como Marcelo Rebelo de Sousa a uma velhinha a ser filmada, e quase não há dia em que o assunto não seja discutido para além da saciedade e ponto de saturação.
Como também seria de esperar, o foco da atenção mediática é o Benfica: como é que a imagem do Benfica é afectada, quais as consequências para a “reputação” do Benfica (sendo a reputação dos clubes de futebol e dos seus dirigentes a que é, a consequência mais provável será a de toda a gente ver confirmada a percepção que já há muito tem), qual o futuro de Luís Filipe Vieira na presidência do Benfica, como é que a equipa do Benfica reage ou deixa de reagir perante o sucedido, e se o Benfica poderá ou não ser despromovido. Mas, ao contrário do que jornais, rádios e televisões parecem pensar, o Benfica não tem importância nenhuma.
Que ninguém me interprete mal: não acho que, a ser verdade aquilo que o Ministério Público diz que aconteceu, o Benfica e os seus responsáveis envolvidos não devam ser penalizados, ou que aquilo de que se suspeita não é grave. Mas, ao contrário do que a atenção mediática dá a entender, a instituição envolvida neste caso que é realmente importante e relevante para o país não é um clube de futebol, por muitos adeptos que eventualmente tenha. É o sistema judicial. O que nos devia preocupar neste “caso” não é o que poderá acontecer ao Benfica por ter comprado alguém para lhe revelar segredos de justiça a troco de camisolas e bilhetes ou um emprego para o sobrinho, mas o facto de poder ter havido quem, no seio do sistema de justiça, se tenha vendido em troca de camisolas e bilhetes ou um emprego para o sobrinho. Aliás, tanto a concentração de preocupações no Benfica como a ninharia pela qual o funcionário do sistema judicial se corrompeu mostram bem como a cultura do “pequeno favor”, da “cunha”, da “ajudinha”, do “fazer um jeitinho”, está enraizada no país e no Estado.
A facilidade com que alguém (alegadamente, é sempre preciso dizer para não ofender consciências) se corrompe, e a indiferença com que o país encara essa facilidade, só se excitando em defesa do “clube do coração” ou em ataque ao “rival”, mostram como a corrupção, em Portugal, é encarada com normalidade e amplamente praticada por todos ou quase, do político mais poderoso ao mais insignificante cidadão que tem de resolver um problema “nas Finanças”: quem tenha o número de telefone da pessoa certa, quem seja primo da pessoa no sítio certo, quem possa fazer o favor certo a quem no futuro lhe possa retribuir, “safa-se”. Num país onde a lei impere, “safa-se” quem por habilidade ou sorte presta algum bem aos seus pares. Num país como Portugal, “safa-se” quem, pela sorte ou falta de escrúpulos, consegue traficar eficazmente a influência de que goza.
Razão tinha Vasco Pulido Valente quando, há uns anos, escrevia que “Portugal só ‘funciona’ pela corrupção”: da sua forma “alta”, discutida e lamentada pelas “classes conversadoras”, à sua variante “baixa”, que todos tendemos a tolerar por julgarmos irrelevante, a corrupção é a essência do sistema português, o mecanismo que o acciona, o alicerce que o segura. O problema, implícito nas aspas de Pulido Valente, é que um país que “funciona” pela corrupção é um país que não pode nunca funcionar realmente."

O copinho de leite...

"King Kong chegou a pesar cerca de 180 quilos. Mas Singh esteve-se nas tintas e ergueu-o no ar como uma pena...

O King Kong não era para brincadeiras. Não estou a falar do macacão pendurado no alto de Empire State Building, agarrando Fray Way com uma mão e sacudindo aviões com a outra como se fossem mosquitos incomodativos. Falo de um menino que nasceu na Hungria lá pelos inícios do século passado e foi crescendo sem parar até pesar cerca de 180 quilos, não deixando por isso de ser um tipo bonacheirão que concitava a simpatia de toda a gente.
Chamava-se Emile Czaja e, aos 18 anos, tornou-se lutador daquela luta livre que, hoje em dia, é conhecida por wrestling e que em Portugal se designou durante muito tempo como luta livre americana.
Czaja veio a Lisboa em 1953, mas primeiro explico que a alcunha de King Kong se lhe colou à pele quando fez o papel equivalente num filme indiano meio manhoso datado de 1945. Nada de supinamente estranho já que a Índia se tornara, nessa altura, uma das mecas da luta livre, de tal forma que o bom Emile enfrentou o paquistanês Hamida Pahalwan em Bombaim perante uma incrível multidão de 200 mil pessoas!
No Parque Mayer não cabiam certamente 200 mil pessoas. Mas o combate foi anunciado com pompa. «A sala vai ser pequena para conter o público ávido de emoções fortes. O campeão de Portugal e da Europa, José Luís, defrontará o campeão do mundo, King Kong. José Luís está numa forma magnífica. Mas King Kong não é para brincadeiras!» Estão a ver? O que é que eu dizia?
José Luís, natural de Monchique, tinha um sistema de treino curioso: dava cabeçadas contra o tronco de uma palmeira de forma a reforçar a força do golpe. E também tinha uma alcunha: O Pastelão. Certa vez, por uma questão de mulheres, fez uma espera ao grande Tarzan Taborda em frente à Casa Campião, assim mesmo com i, na Rua do Amparo, à Baixa lisboeta. Um destes dias falarei aqui dele e de outros valentes como ele, Lobo da Costa, Mateus ou o Ruivo, por exemplo.
Para já King Kong.
Acabaria por entrar em vários outros filmes indianos, geralmente fazendo o papel dele próprio.
Tinha uma barba imponente, quase tão imponente como o seu corpanzil avantajado. «O público que viu combater King Kong contra Degomme e Garnier nunca julgou que estava ali ‘alguém’ da luta livre lá porque este lutador tem uma barba fora do normal», li numa reportagem do Diário de Lisboa. «De certo irá fazer José Luís comer as passas do Algarve».
Assustador, convenhamos.
Mas, como já disse, Emile era um bonzão pachorrento e com paciência para aturar chatos do calibre de Darah Singh. Como o nome indica, Darah Singh é sikh e, morreu velhinho e muito considerado pelo seu trabalho como ator de cinema, realizador e político. Na sua juventude chegou a pesar 127 quilos e a ter uma peitaça de 130 centímetros de diâmetro.
Há uma fotografia que se tornou emblemática dos combates entre os dois calmeirões: Singh está encavalitado nos ombros de King Kong tal como o macacão se encavalitou no alto do Empire State; desfere-lhe golpes do pescoço e no cachaço; por seu lado lado, Emile aguenta bovinamente o ataque do seu adversário. Não fica explícito quem sairá vencedor de tão estúpida contenda. Mas a calma do húngaro é admirável, digna de um daqueles búfalos de água que se multiplicam pelos arrozais de Kerala.
A foto é datada: 12 de dezembro de 1952. Um dos grande acontecimentos da luta livre indiana de todos os tempos. O próprio Pandita Nehru era esperado para assistir ao embate, mas faltou. O público que se apertava como sardinhas em lata em redor do ringue da cidade de Bahtgaon, não longe de Nova Delhi, nem queria acreditar quando Dahra Singh desceu dos ombros de King Kong e resolveu erguê-lo no ar, acima da cabeça, como se fosse uma pena. Uma pena de cerca de 180 quilos! Ouviram-se ohs! de admiração. E um ou outro palavrão em hindi ou urdu.
Dhakar Pehalwan foi testemunha ocular do acontecimento. Muitos anos mais tarde diria: «Foi um dia importante para nós. Não apenas por causa do combate. Também por causa da inauguração da luz eléctrica na cidade. Singh começou a rodar King Kong lá no alto. E King Kong gritava de medo, incapaz de imaginar o que ia acontecer-lhe».
Darah Singh foi magnânimo com o seu opositor. Viria a pousá-lo simplesmente no solo depois de o árbitro o ter dado como vencedor. Emile podia não ser para brincadeiras, mas sentiu que o tinham usado como um joguete. Encolheu os ombros e seguiu a sua vida, faceiro como até aí.
Pahelwan era o responsável por fornecer ao vencedor aquilo que ele mais desejasse no final daquele esforço bruto. Singh tinha sede e quis beber leite. «Levei-lhe um balde que continha aí uns dez litros. Encostou-o à boca e despejou-o de golada».
No meu tempo de escola diríamos que Darah não passava de um copinho de leite."

Depois de Bruxelas, o râguebi vai continuar a tapar os olhos?

"O que se passou no Bélgica-Espanha não é uma surpresa. A modalidade a nível mundial deve mudar, exige-se que mude

É recorrente ouvir-se que o râguebi é uma modalidade ímpar, carregada de valores únicos, praticada pelos melhores, dirigida por visionários. No dia 11 de Março, em Madrid, celebrou-se uma vitória da selecção espanhola, que praticamente deixava “nuestros hermanos” no Mundial 2019, que será disputado no Japão. O rei de Espanha desceu ao relvado; o jornal Marca, no dia seguinte, deu a capa a este "inevitável" apuramento. Pois bem, os espanhóis esqueceram-se de um detalhe: o râguebi mundial não é bem aquilo que diz ser, nomeadamente no que toca aos domínios e poderes instalados. 
Os responsáveis pelo râguebi espanhol esqueceram-se que a modalidade é dirigida, a nível mundial, por um clube privado, onde só alguns têm acesso. Onde os franceses, não tendo o peso merecido na World Rugby, transferem as suas frustrações para a Rugby Europe, responsável pela gerência na Europa, onde elegem ou fazem eleger personalidades que estão fora da órbita de britânicos e irlandeses, e que lhes serão obedientes nos momentos certos. A eleição de Octavian Morariu, infelizmente com o apoio de Portugal, e a forma como este romeno gere o râguebi europeu é ilustrativo do conservadorismo como a modalidade se apresenta no panorama mundial.
Bastava ao espanhóis olharem para o lado e verem a história de Portugal. Recuar a 1996, quando a selecção nacional, comandada por João Paulo Bessa, foi humilhada perante uma arbitragem italiana que após o jogo frente à Roménia foi “premiada” com umas férias no Mar Negro. Ou ir ao apuramento para o Mundial 2011, onde a equipa portuguesa, liderada por Tomaz Morais, foi obrigada a realizar um jogo decisivo com a Rússia num campo sem condições mínimas. Ou ir ao recente Japão-Portugal, na final do Junior World Trophy, interrompido (e não reatado) a 12 minutos do fim, quando os jovens portugueses, treinados por Luís Pissarra, mostravam capacidade para anular a vantagem japonesa. Se os espanhóis tivessem feito esse trabalho de casa, saberiam que a Roménia esteve em todos os mundiais de râguebi e que senhor do râguebi europeu é romeno.
A nomeação de um árbitro romeno para o Bélgica-Espanha só surpreende aqueles que continuam a achar que tudo começa e acaba com o apito do árbitro. Um jogo estranho, uma arbitragem estranha. A Espanha perdeu, a Roménia volta a marcar presença num Mundial e no final cenas nunca vistas a este nível, com os jogadores espanhóis de cabeça perdida. Aquilo que se passou em Bruxelas é, de facto, uma derrota em toda a linha da modalidade, mas não é uma surpresa. O râguebi mundial deve mudar, exige-se que mude.
Devemos ser a única modalidade colectiva que não tem um Campeonato da Europa. O modelo existente adopta o espírito do clube fechado (Torneio das Seis Nações) onde só os mais poderosos podem estar. Ninguém sai, ninguém entra. A Geórgia, por exemplo, não tem acesso à competição, pese embora as constantes demonstrações de valor desportivo. Competições europeias masculinas de clubes? Só para alguns. Diga-se, em abono da verdade, para quase todos desses alguns. Competições europeias femininas de clubes? Nem pensar.
E o que dizer sobre os critérios de apuramento para o Mundial, alterados à medida dos interesses da World Rugby? A este respeito, veja-se o que aconteceu após 2015. Depois de saber que a Geórgia tinha conseguido, por mérito desportivo, o apuramento para o Mundial 2019 – em cada edição, os 12 melhores estão automaticamente classificados para a competição seguinte -, a World Rugby alterou as regras previamente estabelecidas e retirou um lugar à Europa, oferecendo-o às selecções do Pacífico. Estranhamente, ou talvez não, a Rugby Europe foi conivente. Ironicamente, sem estas alterações não teria existido toda esta polémica que mancha a modalidade: Roménia e Espanha estariam apuradas para o Mundial 2019; o adversário de Portugal no play-off seria a Rússia.
Podemos também falar sobre o número de selecções que participam no Mundial - vinte, numa clara intransigência ao aparecimento de novas nações. Em 2007, aquando da presença de Portugal no Mundial de França, discutia-se a passagem para 24 selecções. Para condicionar a discussão, a World Rugby (à época IRB) lançou a ameaça da redução para 16. Que tenha conhecimento, apenas Portugal se pronunciou quando o secretário de Estado da Juventude e do Desporto da altura, Laurentino Dias, dirigiu uma missiva ao presidente da IRB manifestando o seu profundo desagrado com a eventual redução.
O râguebi é um desporto profundamente conservador. Desculpem-me os mais puritanos, mas o videoárbitro foi apenas uma ilusão de óptica. Devemos ter orgulho nessa opção, mas se olharmos para a modalidade verificamos que é uma gota num extenso mar. Quem mostra a sua indignação com o futebol, pelas polémicas envolvendo Blatter e Platini, pode acreditar que as linhas do râguebi não são muito diferentes.
O episódio de Bruxelas é triste em toda a linha. São os interesses a falar mais alto. Mas que consequências haverá disto tudo? O que mais será preciso para haver uma revolta na Europa? O râguebi vai continuar a tapar os olhos? Quais as consequências disciplinares para os espanhóis que tiveram um comportamento que nada dignifica o desporto?
Não tenho respostas para as questões colocadas, mas posso antecipar que no decisivo Espanha-Portugal, vai sobrar para nós..."

A saúde mental no desporto de alta competição

"A recente entrevista dada por André Gomes à plataforma digital “Panenka” deu uma visibilidade inquestionável, em Portugal, a um dos temas que maior debate cientifico tem alimentado internacionalmente: a saúde mental no Desporto de Alta Competição.
Tocou-nos de “outra forma”... porque é “um dos nossos” e pela nobreza do seu ato de coragem ao se fragilizar perante os seus adeptos.
Curiosamente, reconhecendo este mesmo ato, esta mesma massa de adeptos devolveu o seu apoio numa estrondosa e unânime ovação, aquando da sua entrada em campo – algo que devemos recordar, se quisermos quebrar o estigma associado a este tipo de questões.
De facto, o tema da saúde mental no desporto tem ganho cada vez maior visibilidade por duas vias: resultados provenientes da evidência cientifica em território nacional (dados apresentados pela Sociedade Portuguesa de Psicologia do Desporto, em 2017) e internacional (por mero exemplo, o estudo de Gulliver, Mackinnon, Griffiths, Batterham & Stanimirovic, em 2015, sobre os atletas de elite australianos) que, de uma forma global, apresentam a mesma tendência (que acompanha a generalidade dos estudos internacionais), no que respeita à prevalência de ausência de saúde mental na população de atletas, com valores aproximados de:
- cerca de 46,6 % apresentarem sintomatologia de doença mental;
- entre 27% a 43% com sintomatologia depressiva; - 33% com perturbações de sono;
- entre 16% a 18% de perturbações de stress e ansiedade social.
O relato directo de atletas que, tal como o futebolista português, vêm a público narrar a sua história, com o intuito claro de dar protagonismo (positivo) a esta questão, no sentido de ser integrada naquelas que deverão ser as preocupações de indivíduos, clubes e organizações.
André Agassi, Iniesta, Di Maria, Michael Jamieson, Simone Biles, Kevin Love, Per Mertesacker, Michael Phelps são apenas alguns dos nomes de “enormes” atletas que, inspirando milhares de jovens e gerações futuras, aprenderam a guardar para si, e desde cedo, todo o sofrimento que, de igual forma, também estava presente no seu quotidiano e que, como não poderia deixar de ser, apenas aguardava uma “oportunidade” para se manifestar.
Ainda que o tema da saúde mental deva ser abordado com extremo cuidado na população de atletas, uma vez que algumas das “alterações” que podem vir a sofrer (ex: sobretreino), podem apresentar sintomatologia muito parecida com a doença mental (ex: depressão), o que poderá resultar em “falsos positivos” (ou seja, diagnósticos errados), o facto é que, desde cedo, estão sujeitos a condições de stress elevadíssimo.
Curiosamente, também por esta razão, seria até de esperar que se observasse uma prevalência maior na população de atletas, contudo, segundo a APA (American Psychological Association), tal não acontece, acompanhando, tendencialmente, os registos da população normal.
Por outras palavras, apesar do seu desenvolvimento (enquanto pessoas e atletas) ocorrer num contexto onde a pressão e o stress estão presentes numa base diária pois, a competição (com colegas e adversários) é também ela diária e semanal, “degladiando-se” não só com a frustração resultante de desempenhos menos bem conseguidos mas também de relações nem sempre funcionais (com colegas, treinadores, directores e outro staff), a evidência científica não os distingue negativamente da população geral.
Contudo, dado o contexto desportivo do alto rendimento “vender” (implícita ou explicitamente), desde sempre, uma imagem de “excelência”, “saúde”, e de pessoas que alcançam um funcionamento quase que perfeito, os atletas acabam por assumir um (perigoso) voto de silêncio, onde tudo o que possa “fragilizar” a sua imagem deva ser preservado do público, muitas vezes das suas famílias e, em última análise, de si próprios (negando a sua existência).
Paradoxalmente, a escolha da exposição da sua condição, que muitos atletas optaram por fazer é de facto, e em si mesma, um acto revelador não de fragilidade mas de uma gigantesca força e a procura de ajuda (profissionais devidamente acreditados para o efeito) resultará, inevitavelmente, no reforço (e não na fragilização) da sua confiança.
Por cá, em 2017, assistimos a uma inovadora (e desejável) parceria entre o Sindicato de Jogadores de Futebol Profissional e a Sociedade Portuguesa de Psicologia do Desporto que, reunindo esforços e conhecimento científico na área, lançou o projecto “Saúde Mental” que pretende ser um dos vectores a dar resposta a este tipo de problema, criando uma estrutura de suporte para os futebolistas interessados.
Resta saber, que palavra terão a dizer os clubes e os próprios Atletas, face às estatísticas apresentadas (prevalência de quase 50% de perturbação psico-emocional) que, de uma forma muito clara, evidenciam uma “lesão invisível” que compromete tão massivamente como uma lesão física, a performance e bem-estar dos atletas.
É porque, em boa verdade, alta performance (numa perspectiva de carreira e não para o jogo do fim de semana) implica, necessariamente, elevadíssimos padrões de saúde Física e Mental."

O léxico presidencial, no ‘‘desporto’’

"A semântica é importante, porque é através das palavras que transmitimos as nossas ideias, ou seja, aquilo que queremos transmitir a terceiros com uma certa fiabilidade

A Sociologia do Desporto tenta, e temos tentado, esforçadamente, explicar a diferença entre o conceito de Desporto e desempenho Profissional, no âmbito de uma actividade desportiva.
O Homem começou por não ter tempo senão para trabalhar, lazer... zero. Era a jornada de 14 a 16 horas/dia.
Só muito mais tarde é que começou a ter algum tempo livre, e aí, nasceu o dito desporto de rua, rudimentar, com regras de ocasião e sem conhecimento de qualquer natureza, era só para passar o tempo, não tinha objectivos de outra ordem.
Só com a “invenção” da Escola nasce a actividade desportiva de natureza pedagógica e educativa... 
Quer isto dizer que é o Desporto com fins educativos, pedagógicos e de saúde, e sem que a sua prática seja remunerada, aquilo a que se chama Desporto.
Aqueles trabalhadores de modalidades desportivas, não são desportistas, nem tão pouco atletas, são apenas, e só, trabalhadores. Um bom, e fácil exemplo é o taxista; quando trabalha é um trabalhador, e quando, em férias, entra num “rally”, é um desportista.
Confundir os dois planos é pura ignorância, e seria bom que figuras públicas não cometessem esse erro!
A Presidência da República, ou o Presidente, comentaram, publicamente, a morte de um adepto de um clube de futebol, fazendo depois considerações erróneas, acerca de como deve ser a vivência, no âmbito do “Desporto”, só que referia-se ao “Futebol Profissional”, que não é Desporto, é tão-só o trabalho de alguns que se dedicam ao futebol a troco de dinheiro, não são desportistas ou atletas, são apenas trabalhadores do desporto.
Seria bom que, o “Assessor da Cultura” do Palácio de Belém, lesse, às 4ª feiras, semana sim, semana não, a crónica da “Sociologia do Desporto”, no âmbito Sócio-Político, no jornal “i”.
Aí podia aprender alguma coisa e impedia que o Presidente produzisse afirmações completamente erradas, e mais, que induzem, os cidadãos, em erro, o que não é apropriado vindo do “Palácio Presidencial”...
No “Correio da Manhã” o mesmo erro, quando um ilustre cronista, jurista, em 24/Abril/17, chama Desporto ao Futebol Profissional!
A semântica é importante, porque é através das palavras que transmitimos as nossas ideias, ou seja, aquilo que queremos transmitir a terceiros com uma certa fiabilidade.
Descurar este objectivo é falhar a finalidade da linguagem quando esta quer traduzir, ou relatar, uma realidade, um facto, com uma exatidão rigorosa. A mesma palavra não pode ter dois significados diferentes, a menos que usemos uma linguagem figurada como aquela, extraordinária, que deu um prémio a um colega nosso na 4ª classe da “I.P.”, quando um Mestre Escola desafiou o aluno mais inteligente da turma a construir uma frase, e a transmitir uma ideia, usando só a mesma palavra várias vezes. Eis que ele disse: “Óh sopa, sopa na sopa”; ou seja “Óh empregada (criada) não quero sopa” .Brilhante, mas isto não é português, isto é calão e linguagem figurada.
Mas para falar de “desporto” é preciso saber a diferença entre praticar desporto, como ato cultural, ou trabalhar no desporto e viver dele como fonte de rendimento e forma de sustento! São coisas distintas, não são iguais, e chamar desportista ao Ronaldo é ofendê-lo porque ele é, sim, o profissional de futebol mais virtuoso que apareceu até hoje.
É um génio, um grande artista, pago ao preço do ouro. Quando fizer o que faz sem qualquer remuneração aí será um desportista. Esta a diferença."

Suplente de luxo

"Jesus ficou surpreendido por não ser campeão com 86 pontos mas Vitória corre o risco da falhar o penta com 87.

No último sábado, em Santa Maria da Feira, Jiménez substituiu Grimaldo. O costume, substitui sempre alguém. Muito raramente sucede o contrário, ser ele o substituído. Li ontem em A Bola que apenas por uma vez foi titular nesta Liga, com o Marítimo, à oitava jornada, empate 1-1, e que no universo das competições em que o Benfica aparece na presente temporada o nome do avançado mexicano só foi inscrito na formação titular no último dia de Outubro do ano passado, quando as águias defrontaram o Manchester United para a fase de grupos da Liga dos Campeões, uma participação humilhante e nunca vista, que se traduziu em zero absoluto.
No jogo com o Feirense, Raúl Jiménez precisou de menos de um minuto para descobriu a solução para a vitória encarnada.
Outra vez ele, afinal. O que contribui para adensar o mistério. Sabe-se que os treinadores não gostam de ser questionados, muito menos contrariados. Reclamam a posse da razão e olham para os praticantes como servos que devem obediência ao único senhor com poderes para fazer a destrinça entre os actores principais e os que constroem a carreira sentados no banco. Sem direito a perguntas, sob risco de intromissão no trabalho do mister, como se não existisse autoridade de arranjar dinheiro para os ordenados, treinadores incluídos, quer se ganhe, quer se perca.

Em 2016, no seu primeiro ano ao serviço do Sporting, Jorge Jesus surpreendeu-se por ter somado 86 pontos e não conseguir ser campeão. Creio que entendeu, mas deu-lhe jeito fazer de conta de maneira a evitar uma explicação pormenorizada para as causas do fracasso de um plantel que era manifestamente mais forte do que os outros. O que falhou então? Distraiu-se na gestão dos chamados detalhes: fartou-se de empatar e de empate em empate diante de opositores de inferior condição social foi deixando de acumular os pontos suficientes para chegar ao final na liderança.
Este ano, creio que vai calhar a Rui Vitória ficar de boca aberta pela surpresa, sem palavras para justificar o 'não penta', apesar dos 87 pontos, quantos alcançará se empatar com o FC Porto e triunfar nas restantes jornadas que lhe faltam cumprir, incluindo o Sporting, em Alvalade. É uma simples hipótese, embora plausível, dado acreditar que, com a linha de meta à vista e o calendário teoricamente mais acessível, Sérgio Conceição vai impor um regime de alerta máximo a todos os seus jogadores.

Raul Jiménez deve  estar cansado de ser suplente. É natural. Mais de quinze minutos em campo já lhe dá para fazer uma festa, como aconteceu no sábado, o que reflecte o défice de confiança que Rui Vitória nele tem depositado.
Na iminência de campeonato perdido, a situação do avançado mexicano deve ser trazida à colação. Não pelo golo que apontou ao Feirense, mas, sobretudo, pelo que está para trás, limitando-me, no entanto, aos exemplos mais recentes, e confessando desde já parecerem-me estapafúrdios quaisquer argumentos que se pretendem esgrimir ao nível do ordenamento táctico para justificar a sua condição de figura subalterna.
Jiménez sujeita-se a tudo. Até João Carvalho lhe passou à frente, um jovem cheio de qualidades, quem sou eu para afirmar o contrário, mas a quem falta alma e mais alguma coisa, pois quem procura afirmar-se e responde como ele tem respondido é porque não será tão virtuoso para ser notado em patamar competitivo tão alto.

Em Paços de Ferreira, no tal jogo em que Rui Vitória descobriu que os seus jogadores são animais de competição, a verdade é que só o foram verdadeiramente depois de Jiménez ter saído do banco, o seu lugar habitual: foi ele o artífice da reviravolta ao intervir na construção dos três golos benfiquistas.
Diz o povo que mais vale cair em graça do que ser engraçado. Talvez Jiménez seja só engraçado.
Rui Vitória é quem manda e detém total liberdade para tomar as decisões que, no seu entendimento, melhor servem os interesses do Benfica. Deve convir, porém, que, sobretudo no nosso mercado, é pouco curial arrastar a desvalorização de um activo que custou ao clube mais de 20 milhões. É o chamado suplente de luxo. Em Inglaterra, Espanha ou Itália é normal, em Portugal é uma extravagância."

Fernando Guerra, in A Bola

PS: O Guerra é um cronista independente... concordo muitas vezes com ele, mas desta vez, voltou a cair num erro que 'cai' muitas vezes!!! Quem o lê, sabe, que não gosta do Jesus, e gosta do Vieira, e que não gosta do Rui Vitória!!! Entre outros gostos e desgostos...!!!
Algo totalmente legitimo, mas muitas vezes acaba por construir as suas crónicas, exclusivamente na base do preconceito!!!
O Raul é de facto um suplente de luxo, mas aquilo que o Guerra se esqueceu de referir, é que o jogador que está a jogar na posição do Raul, chama-se Jonas!!! E está a fazer uma das melhores épocas de sempre, como ponta-de-lança do Benfica...!!!
Sendo ainda perfeitamente defensável, a teoria de que alguns jogadores, dão o seu melhor, quando 'saltam' do banco... o Raul não é o primeiro!!!
Aquilo que deve ser realçado, além das qualidades futebolísticas do Raul, é o seu enorme profissionalismo e espírito colectivo... algo que o Raul tem demonstrado... Sem o conhecer pessoalmente, parece-me ser um rapaz com enorme carácter...!!!

Nada de confusões

"Afadigam-se alguns a perguntar-me: “Afinal, qual é o seu clube?”. A minha resposta é sempre a mesma: “O Belenenses!”. Só que não sei se as pessoas entendem porque sou do Belenenses e não de qualquer um dos “três grandes”. O Belenenses, se vale, e muito, pelo que já fez, no desporto nacional, não vale menos, pelo que, para mim, significa. Do Clube da Cruz de Cristo era o meu pai, eram os amigos do meu pai e era a rapaziada que eu acompanhava, não em turismo contido e bisonho, mas em sadias gargalhadas e loucas correrias, pelos bairros lisboetas da Ajuda e de Belém. Hoje, os paradigmas surgem com um carácter holístico e pan-relacional. Em criança e rapaz, o meu mundo também era, mais coisa menos coisa, holístico e sistémico, melhor dito: era uma rede de sólidas relações, onde cada ser depende do outro e alimenta o desenvolvimento do outro, comungando todos do mesmo princípio e do mesmo fim. Desde muito novo, mesmo sem conhecer o Descartes, eu cheguei à conclusão, que o “penso, logo existo” não se compaginava com o “inconsciente colectivo” da minha rua, da minha casa, da minha vida airada. Até que… comecei a trabalhar, no Arsenal do Alfeite. A Anna Feitosa publicou um livro encantador, Eu também vou florir na Primavera (Chiado Editora, Lisboa, Dezembro de 2017). Depois de o ter saboreado e lido, concordei com o Aquilino Ribeiro: “Sem a natureza, ar, árvores, comparsas, bichos, o homem não existe”. A Anna Feitosa escreveu, possuída de uma ternura secreta, que não a larga nunca: “Esta árvore sabe pôr-se frondosa e florida. Sabe fazer folhas enormes em forma de coração e sabe fazer cachos de flores em arranjos magníficos e na primavera sabe encantar o mundo e o ambiente. Esta árvore sabe também ser discreta e passar despercebida. Esta árvore sabe a lição do Eclesiastes – tudo no universo tem o seu tempo certo” (p. 92).
E, no tempo certo, com 19 anos de idade, ingressei no Arsenal do Alfeite. Portugal vivia então sob o jugo salazarista. Ora, quando se impede a liberdade das pessoas e se não aceita a sua criatividade; quando se condena um ser humano a repetir, fielmente, a “voz do dono” e não se reconhece portanto que a liberdade e a criatividade são valores sagrados – não há progresso, não há desenvolvimento que resistam. Vivi, em pleno salazarismo, quarenta e um anos. E ainda hoje lastimo que, num Estado que se dizia nacionalista e católico, fossem tão evidentes as limitações das liberdades. A censura, o regime corporativo, o combate ao pluripartidarismo, a elaboração da Concordata, o império colonial, a guerra em África, os inúmeros presos políticos – são prova insofismável de que o Estado Novo era mesmo uma ditadura. Também não escondo que a grande maioria dos bispos portugueses, liderados pelo Cardeal-Patriarca, D. Manuel Gonçalves Cerejeira, não tenha denunciado nunca a opressão e a violência do regime. É evidente que D. António Ferreira Gomes, bispo do Porto, os sacerdotes demissionários do Seminário dos Olivais, o Padre Felicidade Alves e um reduzido número de padres e leigos combateram a imoralidade do salazarismo mas, no casos dos padres e dos leigos, sem o apoio dos seus bispos! A “imoralidade do salazarismo”? Sim, porque o ser humano desponta, como um ser moral, principalmente quando respeita o seu semelhante, na sua autonomia; quando defende os interesses dos outros, mesmo quando esses interesses não coincidem com os seus. Até, no conhecimento científico hodierno, os paradigmas têm um caráter holístico e sistémico. Explicam-nos o universo, não como uma justaposição de coisas, mas como uma rede maravilhosa de relações. E, nesta imensa totalidade, como já o referi acima, cada ser é indispensável para os outros seres…
E, sem liberdade, a pessoa pode durar, mas não vive. E, se não vive, não pode ter saúde. Cito de cor, uma frase de Viktor Frankl que eu li já não sei onde: “Nós, médicos, passamos a vida a dizer aos doentes: faça exercício físico, não coma açúcar, não coma sal, etc. E esquecemo-nos de lhes dizer que o primeiro factor de saúde é este – que a vida tenha sentido, para nós”. Não se nega que um exercício físico pode ser um indiscutível factor de saúde. Só que o sentido da vida é o primeiro. Com um exercício, unicamente físico, com uma medicina, unicamente orgânica, aprendemos a durar; com o sentido da vida, aprendemos a viver. O positivismo, que dessora os programas universitários, o que anda a defender, por aí, não passa de um individualismo pretensamente aristocrático e pouco mais. Um cientista famoso, se examinarmos com cuidado o que ele diz e o que ele faz, é sempre um filósofo da condição humana. A pureza integral de Minerva não se destina a fazer “especialistas” mas “homens cultos que sejam especialistas” e por esta razão muito simples: é a cultura que nos dá o sentido da especialidade. O “especialista”, sem cultura é um “novo bárbaro”, assim como um palavroso, que se julga culto, e desconhece as grandes aquisições da ciência do seu tempo, não passa de um analfabeto, mesmo que este analfabetismo possa transformar-se, principalmente na vida partidária, num requisito de promoção social. Faleceu, há poucos dias, o meu amigo, Dr. Camacho Vieira. Relembro como ele me falava do seu colega de república, em Coimbra, o escritor e médico João de Araújo Correia: “Tinha uma invulgar formação médica, que acompanhava de uma leitura constante dos grandes escritores”. E dizia ainda, sempre enamorado da ciência e da arte: “O João foi um novo Júlio Dinis”.
Portanto, nada de confusões: não sou, nem benfiquista, nem portista, nem sportinguista. Mas também não sou nem antibenfiquista, nem antiportista, nem antisportinguista. Nasci na freguesia da Ajuda, em Lisboa. Nasci belenenses, vou morrer belenenses. Mas, como não vejo inimigos nos adversários do meu Clube, eu delicio-me em salientar o muito que o país deve aos “três grandes” e a todos os que, não sendo tão grandes em número de sócios e de vitórias, são igualmente grandes, no amor pelo desporto e por aqueles valores morais, sem os quais não existe mesmo desporto. Mas, assim como o Sol morre hoje para ressuscitar amanhã, acreditemos que amanhã… poderá ser melhor! No entanto, como não quero ser um antepassado (e um antepassado de mim próprio) continuo a pleitear por um desporto que seja, não só ciência, mas também sabedoria, quero eu dizer: uma teoria da formação do ser humano. E, por fim, que também se estude como um pretexto para falarmos de um tempo em que vivemos e somos. E, porque o mundo (e o nosso mundo) não é unidimensional, o desporto que dele nasce não o é também. Assim, figuras exemplares do desporto não podem limitar-se ao Ronaldo e ao Messi, ao Mourinho e ao Guardiola, ao Federer e ao Nadal e aos outros mais mediáticos desportistas de elite. Desportista exemplar é o que faz da práxis desportiva uma práxis formativa. Aqui, não haja também confusões: o Desporto nada tem a ver com uma sonolenta aula de doutrina, porque o desporto é movimento intencional da transcendência, que é física, social e moral. O Desporto é jogo e movimento e agonismo e instituição e projecto. E também transcendência, mas de ampla e cordial respiração humanista."