Cronometragem

"O futebol parece estar – finalmente! – aberto a fazer alterações nas suas regras, de que a adopção do vídeo-árbitro terá sido a mais significativa, pese embora a dificuldade em se afirmar.
Também as alterações na cronometragem são já admitidas como indispensáveis.
Com a paragem do cronómetro – e a contagem do tempo real do jogo –, deixávamos de assistir ao ridículo de algumas compensações, escassos 3 ou 4 minutos em jogos em que a bola esteve em movimento pouco mais de uma hora (ou nem isso).
Todavia, entendemos que pecam por defeito as duas soluções que vemos mais defendidas, quer a que limita o rigor ao tempo de compensação (variável, critério do árbitro), quer a que o fixa nos últimos 10 minutos.
É pacífico que durante a 1.ª parte há menos anti-jogo, pelo que será de manter a actual compensação pelo árbitro; mas defendemos que toda a 2.ª parte tenha cronometragem exacta, feita de forma independente do árbitro (como nas modalidades de pavilhão), sendo normal que o tempo extra não exceda 15 minutos.
Assim, em regra, o tempo real de cada jogo (incluindo o intervalo) não ultrapassará as duas horas, perfeitamente compatível com a programação televisiva.
E, certamente, seria dado um golpe fatal no anti-jogo que campeia por esses campos fora, com o esférico atirado para a bancada, as lesões simuladas, as substituições arrastadas, as decisões contestadas e a marcação das faltas demorada até ao extremo – tudo a redundar no exagero de provocar a exibição de cartões, a justificar novos e ainda maiores atrasos; e o espectáculo sairia reforçado, sem necessidade de refrear o natural entusiasmo na festa dos golos, sob a qual incidem rígidas e desajustadas medidas punitivas.
Acresce ainda que, com a cronometragem exacta e o relógio à vista de todos, os primeiros beneficiados serão os próprios jogadores que, dentro do campo, não têm noção do avanço dos minutos; as intervenções do VAR não sofriam pressão de urgência, como agora acontece; e, para a cronometragem rigorosa, os meios necessários serão os mesmos para 5, 10 ou 45 minutos."

A revolução desnecessária

"Contra a tendência e filosofia do futebol, procura-se incutir em Portugal um modelo que nem os seus criadores convenceu.

Dei por mim, há uns dias, a dar com uma partilha de um colega jornalista no Twitter acerca do Légia de Varsóvia. Não. Isto não é um artigo sobre o futebol polaco, ou o campeonato polaco, por muito que a competição seja uma das menos valorizadas da Europa e mereça mais amor. O post era acerca do facto do Légia se ter tornado no primeiro clube do Mundo a agrupar as suas camadas jovens por idade biológica e não idade cronológica como sempre foi habitual e regra no futebol. A discussão é cada vez mais forte, mas foi o Légia a equipa que deu o primeiro passo. Nem todo o ser humano se desenvolve da mesma forma e com a mesma velocidade e, no caso do futebol, nem todos os jogadores beneficiam desportiva e fisicamente de competir contra atletas exclusivamente das suas idades.
Esta linha de pensamento começou a ser cada vez mais presente no novo milénio e foi algo que permitiu que países como a Alemanha, a Espanha, a Bélgica e a França dessem um salto significativo na qualidade das suas academias jovens e se reconstruissem futebolisticamente ao ponto de se terem tornado quatro das principais potências do futebol Mundial. Com um ajuste muito simples e que países como a Inglaterra passaram a emular de há uns anos a esta parte: desligar o chip da idade cronológica e oferecer estímulos diferentes a jogadores em fases de maturação diferentes. De uma forma prática, estas federações reorganizaram-se e começaram a disputar torneios sub qualquer coisa com jogadores do escalão sub anterior. Os Sub-16 jogavam nos Sub-17, os Sub-17 nos Sub-18, os Sub-18 nos Sub-19 e por aí fora. Ou seja, jogadores mais novos passaram a jogar contra atletas mais velhos, mais cedo. Maturando mais rapidamente, crescendo desportiva, pessoal e fisicamente.
Nada disto deve ser dogmático e daí a ideia do Légia em agrupar atletas pela sua idade biológica. O Légia tornou-se a primeira equipa a fazê-lo como filosofia, mesmo que alguns clubes já o fizessem internamente em casos pontuais. Num artigo publicado pela Vice em 2016, o antigo responsável pela formação do Southampton FC explicava porque razão o clube colocou Alex Oxlade-Chamberlain a treinar fora do seu escalão, não com jogadores mais velhos, mas com jogadores mais novos. “Chamberlain atingiu um ponto em que não estava propriamente em risco de ser dispensado, mas havia uma decisão a tomar pois era demasiado pequeno e frágil para jogar contra atletas do seu escalão etário. Decidimos que ao invés de o colocar a jogar num escalão acima, ele iria treinar com atletas mais novos um ano”, explicou James Bunce. O técnico assegurou que a decisão fez maravilhas à confiança de Oxlade-Chamberlain que assim passou a jogar contra atletas com uma fisionomia semelhante e podia finalmente desenvolver-se tecnicamente sem ser “smashed off the ball”.
Oxlade-Chamberlain é um exemplo em muitos de jogadores que demoraram o seu tempo a crescer porque a própria natureza o decidiu. Um exemplo de que nem sempre é justo jogar contra atletas de idade cronológica semelhante, não porque maturaram cedo demais, mas porque demoraram a maturar. Quando Chamberlain cresceu e ganhou corpo, estreou-se pela equipa do Southampton. Tinha 16 anos. O resto é história. É hoje internacional inglês e joga numa das melhores equipas do país. 
Vem tudo isto a propósito de mais uma revolução desnecessária no futebol português e que acima de tudo parece contrariar a lógica e a tendência das metodologias de treino atuais. Quer, a FPF, incutir um modelo semelhante ao inglês de um campeonato sub-23, competição que já recebeu sinal positivo de clubes como o Sporting, o SC Braga ou o Rio Ave. É certo que tal competição não implica a desistência das equipas B, mas será um contrassenso se esses mesmos clubes terminarem com as suas equipas B, que competem em escalões profissionais, para obrigar os seus jovens jogadores a disputar uma competição restritiva.
Desde que as equipas B regressaram ao futebol português em 2012/13, Portugal foi vice campeão europeu sub-21 em 2015, vice-campeão europeu sub-19 em 2014 e 2017 e, claro, campeão da Europa sénior em 2016. Em poucos anos Portugal venceu ou esteve nas decisões das grandes competições de selecções como nunca conseguira estar em tão curtos espaços temporais. Pelas equipas B passaram internacionais seniores recentes como Paciência, Bruma, Gelson Martins, João Cancelo, André Silva, Renato Sanches, Ricardo Pereira, Gonçalo Guedes, Bernardo Silva, Nélson Semedo ou André Gomes. Outros estarão na calha, com vários internacionais jovens por Portugal a contarem já preciosos minutos em ambiente profissional porque essas mesmas equipas B disputam competições profissionais como a segunda liga. Nem todos os jogadores beneficiam de jogar um escalão acima, é certo, mas a experiência diz que são muitos aqueles que disso tiram partido. Desistir das equipas B para disputar um campeonato etário é, por isso, um retrocesso no bom que tem sido feito no futebol português nos últimos anos.
Depois... há a questão do modelo. Que a segunda liga precisa de uma reformulação profunda, poucos devem duvidar. Comercialmente não é de todo apelativa e em termos organizacionais, com várias jornadas a meio da semana com horários a meio da tarde, roça o aberrante. Num país com dificuldade em ter assistências em estádio ao fim de semana, pouco ou nenhum sentido faz jogar-se a meio da semana e a meio da tarde. Promovido pela FPF como um modelo vencedor, emulando a Premier League 2, ou Premier League Sub-23, a verdade, é que tal modelo continua a ser debatido como profundamente defeituoso por Inglaterra. Com um impacto mediático e desportivo nulo, a Premier League 2 foi apenas um modelo de recurso encontrado pelo organismo britânico face à recusa dos clubes da Football League em aceder à colocação de equipas B, ou Sub-23, nos campeonatos profissionais. No máximo, a Premier League conseguiu encaixar equipas Sub-23 no Football League Trophy, competição que era disputada apenas pelas equipas da League One e Two (não confundir com a League Cup), medida que destruiu por completo a competição e afastou os adeptos dos estádios nos encontros da mesma ao ponto da discussão actual estar muito próxima da sugestão de extinção da competição.
Aquele é visto como um modelo a seguir pelos dirigentes portugueses, não é mais do que um campeonato de reservas das reservas em Inglaterra. Os melhores jogadores sub-23 são emprestados para equipas da Football League e na PL2 competem jogadores que procuram recuperar de lesões, bem como os miúdos que não encontram espaço em ambiente profissional. Serve o Manchester United de exemplo. Último classificado da 1ª divisão da PL2, tem neste momento emprestados em equipas profissionais os melhores jogadores jovens do clube. Fosuh-Mensah está no Palace, Tuanzebe e Sam Johnstone no Aston Villa, Andreas Pereira em Valência, James Wilson no Sheffield United, Dean Henderson no Shrewsbury Town, Regan Poole no Northampton Town, Demetri Mitchell no Hearts, Charlie Scott no Hamilton Academical e Matt Willock no St. Johnstone. Para um clube que tira verdadeiramente proveito da competição, como o fez o Everton na temporada passada, muitos mais são aqueles que dela pouco proveito tiram.
O modelo inglês tem muito que deve ser apreciado, mas a nova revolução que parece querer incutir-se no futebol português parece ser uma revolução desnecessária. O que não funciona em Inglaterra, dificilmente funcionará em Portugal. Olhar para a capacidade de organização, competitividade e comerciabilidade? Façam o favor. Dificilmente uma competição secundária é tão rica e bem estruturada quanto a Inglesa. Mas não a nível de competições jovens nacionais e internas. Não, aí, ainda andam às apalpadelas. O futebol português e principalmente as divisões secundárias precisam de uma arrumação, mas este dificilmente será o caminho."

“Chamavam-me o pé de chumbo. Tinha ranho no nariz, mordia a língua e ninguém passava por mim, mas não tinha técnica”

"- É de onde?
- Da Madragoa, fui menino do bairro, sou bairrista. O meu pai trabalhava no arsenal do Alfeite e a minha mãe na fábrica da Renault, fazia bobines para os automóveis.

- Quando nasceu já tinha irmãos?
- Já tinha um irmão, Acácio Miguel Andrade, quatro anos mais velho.

- Quais são as primeiras memórias da infância?
- Os meus amigos do bairro. O Facebook trouxe coisas muito boas, como o poder conviver, falar, comunicar com esses colegas que já não via há tantos anos. Tenho recebido mensagens de alguns amigos de infância do bairro e às vezes quase fico com a lágrima no olho, porque foram eles que também me ajudaram a crescer. Tenho um grande carinho por essas pessoas.

- O típico miúdo que jogava à bola na rua.
- Sim, às vezes mesmo sem bola, era de papel colado com fita cola e jogávamos à palmadinha. Jogávamos nas portas das vizinhas que ficavam doidas connosco por causa do barulho que fazíamos. Quando a bola batia na porta era golo, por isso imagine, aquilo era um barulhão (risos).
- Era traquina?
- Não, era um miúdo como os outros, que gostava de se divertir, brincalhão como sou hoje em dia. Era um miúdo de bairro, da Madragoa, cheguei a participar numas marchas populares e tudo.

- Na família já havia alguém ligado ao futebol?
- Não. O meu irmão, passados alguns anos, começou a jogar no Desportivo Domingos Sávio, era eu ainda muito pequenino, nem sabia o que era futebol de 11, ligava pouco. Na altura o meu futebol era o do bairro.

- Quando era pequenino, torcia por que clube?
- Era muito influenciado pelo meu pai e irmão, sportinguistas ferrenhos. A minha mãe é benfiquista. Não tenho problema nenhum em dizer que era sportinguista.
- Como é que se dá a ida para o Domingos Sávio e com que idade?
- Salvo erro com 11 anos. Foi o meu primeiro ano de infantil. Aprendi muito. Não sabia o que era um fora de jogo. Aprendi a jogar numa posição. Quando somos pequenos e começamos a jogar à bola, temos sempre todos a mesma posição: avançado. Toda a gente gosta de fazer golos. Eu não tinha jeito para avançado. Fiz um ano de adaptação num clube de que me orgulhei muito de representar. Foi o primeiro e o primeiro marca-nos sempre. Depois na sequência de vários jogos fui-me adaptando, as pessoas começaram a ver que eu tinha jeito e garra. No final desse ano fui representar o Sporting, em 1985/86, nos infantis de segundo ano.

- Passou por aquele processo das captações?
- Não, não. Entrei logo e recordo que deram equipamento e bolas ao Domingos Sávio pela minha saída.

- Quem foram os primeiros treinadores no Sporting?
- O mister César Nascimento e o Osvaldo Silva. Tenho muitas saudades desses senhores que me ajudaram, que me fizeram crescer, tenho tantas palavras para lhes agradecer.
- Quando chega a Alvalade já vai com posição em campo definida?
- Não, mas jogava sempre cá atrás. Era raçudo, de ranho no nariz, mordia a língua, não gostava de perder, ficava aborrecido e chorava, gritava com os meus colegas. Lá está, isto de ser de bairro e estar habituado a jogar com os miúdos traquinas, também aprendemos alguma coisa dessas coisinhas de agressividade. A partir daí meteram-me a defesa central. Eu era alto e fiquei como central até aos juvenis e juniores. Recordo-me de uma história com o mister Osvaldo Silva e com o mister Nascimento, por causa do nome.

- Conte.
- Nós tinhamos de ter um nome no futebol, e então perguntaram-me o nome completo. Chamo-me Luís Filipe. E eles “Não, Luís Filipes há muitos". Oliveira, também há muitos... Andrade... Andrade. "Olha, ficas Andrade. Ficas conhecido por Andrade”. E o mister Osvaldo Silva ainda disse: “Andrade não, pé de chumbo”.

- Pé de chumbo?
- Pé de chumbo porque eu era agressivo mas a nível de técnica, tinha muita dificuldade. Aprendi muito com o Sporting e outros clubes, mas principalmente na formação do Sporting evoluí muito na técnica. Mas era muito agressivo.
- Agressivo como?
- Nunca foi por maldade. Era agressivo de dizer a quem estava perto de mim que era melhor do que ele. Melhor no sentido de que para ele passar por mim, tinha que ser melhor do que eu. E eu não aceitava que alguém fosse melhor do que eu, porque lutava, lutava para ser melhor do que os outros. Antigamente treinávamos e jogávamos no pelado e o pelado com aquelas pedrinhas doía muito. Tive de aprender a fazer carrinhos no pelado. E fazia. E havia miúdos com a mesma idade do que eu, que tinham medo de cair e parecendo que não, nós que o fazíamos, impúnhamos esse respeito, os outros ficavam um pouco intimidados. 

- Como era na escola?
- Gostava muito de estar com os amigos (risos).

- Baldava-se às aulas?
- Não, se eu faltasse às aulas, o meu pai, ai meu Deus (risos). Os meus pais controlavam muito e ainda bem. Mas na escola era o suficiente, nunca fui um aluno de grandes notas.

- Quando era criança o que respondia quando lhe perguntavam o que queria ser em adulto? 
- Veterinário, tenho uma adoração por animais.
- Tinha animais em casa?
- Não tinha em minha casa porque não tinhamos condições para os ter dentro de casa, mas o meu avô morava e ainda mora em Alzejur, onde tinha uma quinta grande, chamada o Ponto Alto. E tinha lá cães, gatos, vacas, bezerros, galinhas, perus, porcos, coelhos. Todo o tipo de animais. E eu fui-me habituado a lidar com eles nas férias da escola. Afeiçoei-me aos animais e gostava muito de lá estar. Por isso queria ser veterinário.

- Quando é que passa a sonhar em ser jogador de futebol, lembra-se?
- Recordo-me que a minha primeira viagem fora foi já a representar o Sporting, nos infantis, num torneio da CEE em 1985/86. Foi a minha primeira viagem de avião, a Bruxelas. Jogámos uma final, salvo erro com o Milão, e ganhámos 2–1. Quando regressámos, foi uma grande festa. Eu nunca tinha ganho nada. Ser infantil, ganhar uma taça, foi um prestígio enorme. Era só fotógrafos quando chegámos, havia pessoas para nos receber, além dos nossos pais. Aquilo foi, “Eh pá, somos assim tão importantes?” A partir daí, dessa primeira taça, foi um gostar cada vez mais forte, uma ambição maior e claro como todas as crianças sonham em ser jogador de futebol, eu não fui excepção. Aquela vontade em ser veterinário rapidamente passou.

- Nessa altura quem eram os seus ídolos?
- O Maradona. Também me lembro da “laranja mecânica”, a selecção da Holanda que foi campeã da Europa. Esses jogadores captaram-me a atenção.
- E portugueses?
- O Carlos Manuel, sem dúvida. Era a minha referência e ainda tive a oportunidade de jogar ao lado dele.
- Cumpria os períodos de descanso ou fazia uma vida normal de adolescente?
- Tive uns pais que me ajudaram sempre a alimentar-me bem, a descansar, a ser o mais coerente e honesto possível. Os miúdos do bairro, quando não temos algo mais para fazer, estamos na rua até à uma, duas da manhã, e eu não podia ficar até tão tarde porque no dia a seguir tinha jogo e tinha que descansar. Não quer dizer que tenha perdido essa infância, que não perdi, mas também não fiquei a ganhar mais por isso. Como é que eu vou explicar…

- Sente não desfrutou de tudo o que tinha para desfrutar na adolescência por causa do futebol? 
- Exactamente, porque tinha o compromisso com o clube, comigo próprio, com os meus pais e tinha a escola ainda.

- Estudou até quando?
- Tinha feito os 18 anos e ainda estava no 11º ano, com muita dificuldade. Entretanto, tive a felicidade de ser chamado à selecção. Fui ao Mundial de sub-18, na Austrália.

- Esse Mundial não correu bem pois não?
- Não. Era um país totalmente diferente, com horários diferentes. Mas acima de tudo o pior era o clima, não estávamos habituados. Falo por mim. Era uma humidade impressionante.

- Quem foram os seus companheiros de selecção ao longo dos anos?
- Porfírio, Litos, Kennedy, Costinha (guarda redes do Sporting), Nuno Gomes. Apanho o Dani e o Nuno Gomes nos Jogos Olímpicos de Atlanta, pelos Sub-21, em 1996. Fizemos uma grande prestação, ficámos em 4º lugar.

- Quando o futebol começou a ser uma coisa mais séria como é que os seus pais reagiram? 
- Apoiaram-me, mas sempre com o intuito de não largar a escola. Só chumbei quando comecei a ir à selecção. Com os estágios de uma, duas semanas, perdíamos a matéria, e acompanhar depois aquilo não era fácil. Não havia as facilidades que há hoje. Também estávamos mais concentrados no futebol, a pensar no próximo jogo, no adversário. Entretanto também faço o meu contrato profissional com o Sporting, tinha 17 anos.

- Lembra-se do que fez ao dinheiro?
- Para ser muito sincero, não me recordo. Não sei se foi o meu pai que guardou, se fez a gestão, se fui eu que guardei…
- Nem se houve alguma coisa que quisesse comprar?
- Graças a Deus sempre fui um menino que teve tudo, dentro das possibilidades que os meus pais me podiam dar. Tinha roupa, comida, casa, mas não tinha computadores, bicicletas, não tive nada disso. E vou ser muito sincero, não me fez falta, porque o que eu queria era estar com os meus amigos. Estar com os amigos, jogar à bola com eles, conviver, era tudo para mim. Mas há uma história que quero recordar. Eu quando era infantil apanhava três transportes para ir treinar ao estádio do Sporting. Ia sozinho. Ia treinar de manhã e estudar à tarde. Estamos a falar com 12/13 anos. Apanhava o 49 até ao Rato, depois o metro, saía em Entrecampos e ainda tomava o 47 para as Galinheiras, que passava perto do estádio do Sporting. Hoje em dia não deixo o meu filho fazer isso.

- Quando estreia como sénior, já está no Estoril Praia ou ainda no Sporting?
- Quando passo a júnior no Sporting, vou fazer o Campeonato do Mundo de sub-20, na Alemanha, em 1993. Mas não me correu muito bem. Houve coisas que me marcaram pela negativa.

- O quê?
- O próprio jogo com a Alemanha não me correu bem. Recordo-me de um lance em que houve vários ressaltos, a bola bateu-me na cara, amorteceu para o avançado da Alemanha que fez golo. Perdemos esse jogo e fiquei um pouco marcado pela negativa. Quando cheguei do Campeonato do Mundo, esta foi a transição de júnior para sénior, tinha que regressar ao Sporting. Disseram-me que no Sporting o plantel estaria fechado, salvo erro ficou o Ângelo e o Porfírio no plantel sénior, que também tinham ido ao Mundial. Eu seria emprestado ao Estoril Praia, que jogava na I Divisão.
- Quem era o treinador que tinha o plantel fechado no Sporting?
- Salvo erro era o professor Carlos Queiroz.

- E quem era o treinador do Estoril Praia quando foi para lá?
- O Fernando Santos, que é o meu padrinho de casamento. Dei-me logo bem com ele. O mister Fernando Santos disse “ó miúdo joga aí a defesa esquerdo” e eu jogava a defesa esquerdo. Sou uma pessoa desinibida, não me deixo intimidar por ninguém, tentei a minha sorte e mesmo sabendo que não era a minha posição eu jogava. Eu queria era jogar, queria era uma oportunidade no futebol sénior.

- Lembra-se do primeiro jogo como sénior?
- Lembro, ainda para mais porque substituí o meu ídolo, o Carlos Manuel. Foi na Madeira. 

- Ele disse-lhe alguma coisa de que se recorde?
- Não me recordo das palavras, mas tenho quase a certeza absoluta que me desejou muita sorte e disse-me para ajudar a equipa que precisava de força. Sempre foi uma pessoa excepcional.
- Esteve três épocas no Estoril Praia, sempre emprestado?
- Faço um final de época excelente pelo Estoril e sendo jogador do Sporting começo a ser disputado por vários clubes, um deles o Beira-Mar. E fiz o meu primeiro erro como jogador.

- Qual?
- Assinei por dois clubes. Tinha 19/20 anos. A ambição era tanta, que por vezes a gente não pensa. 

- Tinha empresário nessa altura?
- Não tinha empresário, era o meu irmão que me ajudava.

- Assinou por que clubes?
- O Beira Mar quis chegar a acordo comigo e assinei. Mas eu era jogador do Sporting, emprestado ao Estoril. Quando passei a palavra às pessoas do Estoril, eles disseram, “Não, tu daqui não sais, tu vais assinar por nós” e assinei. Aí comecei a aperceber-me o que o dinheiro faz. Não é comprar as pessoas, mas seduz. A verba do Estoril ainda foi mais alta do que a do Beira Mar. Foi um pulo, fiquei a ganhar bem naquela altura, não me recordo do valor mas sei que era um valor muito elevado.

- Como é que “descalçou a bota” de ter assinado pelo Beira-Mar e pelo Estoril?
- Os dirigentes do Estoril falaram com os do Beira Mar e do Sporting e os três chegaram a acordo. Isto foi o meu primeiro erro e fiquei muito desiludido comigo próprio, ao assinar pelos dois clubes. Não aconselho ninguém a fazê-lo porque acima de tudo está a nossa honestidade e quando assinamos temos que cumprir. O dinheiro falou mais alto. E não só, o dinheiro e a localidade. Preferia continuar na zona de Lisboa.
- Nessa altura já namorava?
- Já.

- Com a sua actual mulher?
- Sim. É uma história...

- A sua mulher é a Rita Vilas Boas, ex-mulher do Jorge Cadete. Como é que a conheceu?
- Conheci a minha mulher na casa de uma amiga. Muitas pessoas acham que eu tive culpa no divórcio.

- Quando a conheceu ela ainda era mulher do Cadete?
- Já estava separada dele e tinha uma filha com ele, a Andreia, que na altura tinha 3 anos.

- Alguma vez o Cadete veio pedir-lhe satisfações?
- Não, nunca falámos sobre o assunto. Também não sei se foi ele que quis o divórcio, se foi a minha mulher, se chegaram a acordo, não sei nem me interessa. Sei que estou feliz como estou, casado, bem casado, com uma família linda. Mas imagine o que aconteceu, capas de revista e isto e aquilo, e divórcio do Cadete, Andrade, Cadete, porque o Jorge jogava no Sporting e eu era emprestado pelo Sporting, chegámos a ter confrontos, joguei contra o Sporting nessa altura, portanto veja lá.

- Havia muita tensão no ar?
- Para mim era um jogo como qualquer outro. Mas temos tendência de querer mostrar ao clube que nos empresta que também podíamos lá estar. Que temos qualidade para isso. E foi um pouco isso, não era por causa da pessoa em causa, nunca joguei por ser A, B ou C. Foi sempre a minha maneira de ser, a minha maneira de encarar o jogo, dar o meu melhor. Naquele caso, era um jogo de marcação homem e a homem e ele calhou-me, portanto houve picardia, houve ali uns pequenos toques, toda a gente se apercebeu e claro no dia seguinte no jornal comentava-se.

- Incomodava-o?
- Incomodava-me a mentira.

- E surgiram muitas?
- Apareceram mentiras no sentido de me ter metido no relacionamento, de já estar junto com a minha mulher na altura em que eles eram casados. São coisas que não são verdade e o que temos de fazer é: “Entra por um ouvido e sai pelo outro”. Temos de seguir com a nossa vida. Foi isso que fiz, segui com a nossa vida.

- Desde que conheceu a Rita Vilas Boas até se casarem passou quanto tempo?
- Nós casámos em 1997, no ano em que nasceu a minha filha, três anos depois de nos conhecermos. Fizemos a lua de mel, na Disneyworld, nos EUA, antes de casarmos.

- Quando assina pelo Estoril mais duas épocas, ainda tinha esperança de um dia voltar ao Sporting? 
- Sim. Cheguei a ser chamado pelo professor Carlos Queiroz para fazer alguns jogos particulares pelos seniores do Sporting, contra uma equipa americana salvo erro, e fiz um jogo excelente. Mas pronto, não deu.

- Nunca o questionou, nunca lhe perguntou porquê?
- Não, nunca questionei, nem ele, nem nenhum treinador, porque é que jogava ou não jogava. Era pessoa para trabalhar e esperar pela oportunidade.
- Entretanto ficou as duas épocas no Estoril, como é que se dá depois a passagem para o Estrela da Amadora?
- Em 1994/95 o Fernando Santos sai do Estoril e quem fica é o Carlos Manuel e... só um parêntesis, o Carlos Manuel quando o Fernando Santos começou a encaixar-me no meio-campo do Estoril, teve um comentário engraçado. Virou-se para mim e diz “Miúdo, queres jogar?” E eu a pensar: “O Carlos Manuel está a falar comigo?” Respondi: “Sim, claro que quero”. E ele: “Ganhas as bolas e só passas para mim que eu resolvo” (risos). A partir daí foi o que fiz, roubava as bolas e entregava ao Carlos Manuel (risos).

- Estava a falar da passagem para o Estrela da Amadora...
- O Fernando Santos estava a treinar o E. Amadora e chama-me. Peço ao Sporting para continuar a minha dispensa, porque tinha vários anos de contrato com o Sporting. Vou para o E. Amadora, faço uma época excelente, faço uns os Jogos Olímpicos (Atlanta) interessantes.

- A propósito de JO, lembra-se de alguma história engraçada dessa altura?
- Uma das situações engraçadas... Chegámos a Miami e ficámos num hotel que tinha um lago enorme, então a primeira coisa que alguns colegas queriam fazer era andar de jet ski no lago (risos). Íamos disputar os quartos de final com a França. Só que pronto, a juventude... nós não pensamos, queremos é diversão, porque também vimos cansados do campeonato e depois chegamos ali para outra competição completamente diferente, e queremos um pouco de divertimento.

- E andaram de jet ski?
- O Nelo Vingada disse logo: “Mas que é isso? Jogamos depois de amanhã contra a França e vocês querem andar de jet ski? Estão malucos”. Claro que ninguém andou (risos).

- Estava a dizer que quando vai para o E. Amadora faz uma boa época...
- E quando chego dos JO o Sporting chama-me e eu pensei que podia ser a minha oportunidade de regressar ao Sporting. O treinador era o Waseige. Regressamos praticamente todos, eu, o Porfírio, Nuno Valente, Costinha, Rui Jorge, Pedro Barbosa, Oceano, Sá Pinto, era uma equipa de muitos portugueses. Não fiz a pré-época porque aqueles que regressaram dos JO não fizeram a pré-época e foi um pouco prejudicial para mim, no sentido em que o treinador me conhecia pouco. Ele só me conhecia de ver alguns jogos e todos sabemos que os jogos... só passa a imagem daquele que passa a bola. Por vezes o nosso posicionamento e a nossa maneira de estar no campo não aparece dentro daquele quadrado ou rectângulo, como queiram chamar. A informação pode ter sido boa, mas se calhar não foi a suficiente para eu conseguir um lugar na equipa do Sporting.
- O que é que aconteceu?
- Entretanto estamos a chegar a dezembro e o Sporting não contava comigo, estávamos na Taça UEFA, não tinha jogado nem um segundo. Comecei a ir abaixo, a ficar muito desiludido. Só treinar não era para mim. Tudo bem que representava um grande clube mas o jogar é mais importante. Vieram falar comigo e disseram-me que o Vítor Manuel, treinador do Belenenses, estava interessado em mim. Nem pensei duas vezes. Está interessado? Vou já embora amanhã. E assim foi. Fui representar o Belenenses ainda em dezembro.

- Fez uma boa época?
- Fiz um final de época excelente no Belenenses.
- E surge o Benfica.
- Exactamente, o Benfica e outros clubes interessados. Tive um clube da Coreia.

- Já nessa altura?
- Já. O Rui Esteves foi nessa altura. Houve uma negociação para mim e para o Rui, só foi o Rui, eu não fui porque entretanto aparece-me o Benfica, e claro que não vou trocar uma Coreia pelo Benfica. Houve observação da parte do Benfica e recordo-me que nessa altura o FC Porto estava muito forte, tinha o Jardel, e há um Belenenses-FC Porto em que eu marco o Jardel. Nós ganhámos 1-0. Foi um jogo muito difícil, muito falado, porque eu agarrava muito o Jardel e ele não fez golo. Era um jogador que estava habituado a fazer golos em todos os jogos. Nesse próprio dia recebo um telefonema de um dos responsáveis do Benfica, que foi falar com o meu empresário, na altura era o Paulo Barbosa. 

- Qual foi a sua reacção?
- Fiquei admiradíssimo porque o Benfica era um clube que qualquer jogador gostava de representar e para mim foi um orgulho. Claro que disse que sim ao empresário, nem sabia a verba. “Vamos já assinar”. O Paulo é que disse: “Calma Andrade, vamos negociar”. A partir daí houve comentários na imprensa de que já tinha assinado pelo Benfica, o que era falso, não tinha ainda assinado. Lembro-me que vou fazer um jogo ao Estádio da Luz e faço uma excelente exibição, marquei o João Vieira Pinto que era sempre o meu carrasco quando jogava contra o Benfica, era sempre o jogador que eu marcava individualmente, e o Manuel Cajuda substituiu-me. Só depois percebi o porquê. Substituiu-me para eu ser aplaudido. E não é que o Estádio da Luz me aplaudiu, sendo jogador do Belenenses.
- Sendo sportinguista de coração, gostou de representar o Benfica?
- Representei o Benfica com muito orgulho e até hoje tenho uma admiração muito grande pelo clube. Não só enquanto o representei, mas pelo tratamento que me deram enquanto homem, enquanto jogador, enquanto ser humano, e hoje tenho orgulho em dizer que vou ao Estádio da Luz de cabeça levantada, sabendo que dei tudo o que tinha para dar.

- Mas houve uma altura que foi emprestado ao SC Braga...
- Foi na altura do Heynckes. A minha história é tão comprida, é tão grande... Ainda houve aqui uma coisa que me passou, foi o jogo de apuramento da selecção para os Jogos Olímpicos. Nessa altura eu jogava no E. Amadora...

- Conte.
- Fizemos o apuramento com a Itália, no Estádio da Luz. Eu tinha de marcar o Del Piero, que era um jogador de topo, de selecção A, que só foi chamado para esse jogo da selecção olímpica, porque a Itália precisava de empatar ou ganhar para ser apurada para os Jogos Olímpicos. Ganhámos 1-0, golo do Porfírio. Fiz um jogo de que muita gente fala ainda hoje. As coisas saíram-me muito bem. Consegui anular o jogador mais endiabrado, mais criativo da selecção italiana, e a partir daí também olhavam para o Andrade de outra maneira.
- Esse foi o jogo mais marcante da sua carreira?
- Provavelmente.

- Entra no Benfica com Souness.
- Exactamente.

- Lembra-se do primeiro jogo que fez com a camisola do Benfica?
- Lembro, porque foi marcante para mim em várias vertentes. O jogo que foi, a data em que foi e o resultado e a competição em que foi. Ou seja, venho de uma lesão contraída na pré-época, consigo recuperar, há baixas no nosso plantel, vamos jogar a Liga dos Campeões, com o PSV, eu ainda não tinha representado o Benfica a não ser em jogos de preparação. O jogo foi a 30 de Setembro, a data do meu aniversário, e ganhámos 2-1. Isto tudo foi marcante, foi o início de muita coisa boa. Senti que entrei numa outra etapa da minha vida. Senti-me útil, senti que as pessoas contavam comigo. Joguei a central e fiz dupla com o Ronaldo, o brasileiro. Fiz um excelente jogo, marquei um grande jogador, Van Nistelrooy. Na Liga dos Campeões nessa altura só passava o 1º. Ganhámos nessa quarta-feira, no domingo fomos jogar a Guimarães e fiz um jogo excelente outra vez. A partir daí sei que fui sempre uma opção válida para o treinador. Ora jogava de início, ora entrava, mas sempre uma opção na convocatória.
- Quem eram os seus concorrentes nessa altura?
- Eu era polivalente, jogava em várias posições. Joguei a defesa direito, a central, a meio-campo. Era um pouco aquilo que o André Almeida agora faz. Naquela altura tive um concorrente muito forte, o Okunowo, nigeriano que vinha da selecção, e não me deixei intimidar. Sei que me estavam a encostar um pouco para defesa direito porque na selecção eu jogava também do lado direito.

- Onde é que preferia jogar?
- Sem dúvida no meio-campo. A 'seis'. Era ali que me sentia confortável e hoje em dia quando jogo com amigos é a posição que me faz lembrar grandes jogos, grandes momentos.

- Tinha algum truque, alguma coisa que fizesse sempre porque sabia que ia condicionar os adversários?
- Acima de tudo concentração. Eu não desviava o meu olhar, não estava preocupado se estava muita gente na bancada, se o árbitro apitava bem ou mal, acima de tudo estava focado no meu objectivo. E o meu objectivo quando me davam alguma tarefa individual, era anular a peça fulcral da equipa adversária. Muitos treinadores pediam-me para anular o jogador mais criativo, que mais desequilibrava. Sempre consegui levar a água ao moinho.
- Foi chamado muitas vezes de sarrafeiro. Era justo?
- No futebol temos de estar preparados para as críticas positivas e negativas. Sempre fui um jogador que jogava no limite. E o meu limite era: eu tinha que ser melhor que o adversário. E para ser melhor do que ele eu tinha que correr mais, ganhar mais bolas, estar mais concentrado e só assim conseguiria ter um jogo positivo. Eu tinha pouca técnica. A minha mais-valia era ser raçudo e manter a concentração. Eu vivia muito o jogo. Às vezes passava a bola, mas eles já não passavam (risos). Estou a brincar. Sou assim, bem-disposto. Não quero mal a ninguém.

- Mas já admitiu que era um jogador agressivo.
- Há uma coisa que eu fazia, falava muito. Chamava muito a atenção dos meus colegas, no sentido de construção, de ajudar, não de dizer mal.

- Picava os adversários.
- Sempre.

- Como é que se pica um adversário?
- Quando vamos para dentro de campo já sabemos como é o nosso adversário, se é dos que não gosta de ser picado, se é mais do género "não me chateies, para mim está sempre tudo bem". Se fosse um adversário do género de eu beliscar o braço e automaticamente virar-se e queria conflito (risos)... O truque é distrair o adversário. Enquanto o adversário estava a chamar-me nomes, a ameaçar-me, a dizer "não vales, isto e aquilo", não estava concentrado no jogo. São pequenos pormenores que fazem a diferença, ter o adversário sempre preocupado comigo e não com a bola.
- Era tudo pensado.
- Era a maneira de tirar a concentração, mas nunca faltei ao respeito ao adversário. Nunca. Só tentava tirar a concentração, isso era importante. Hoje em dia muitos jogadores também fazem isso e ainda bem que fazem. Porque futebol é um jogo de espertos.

- Ou seja, não o incomodava chamarem-no de sarrafeiro.
- Não. Eu sabia aquilo que fazia, a maneira como entrava. Se não me falha a memória, nunca lesionei um colega e adversário meu. Era duro mas sabia fazer as coisas para não magoar. Era duro no sentido de bola, bola, bola. Tive uma vez um lance infeliz, recordo-me agora. Num Benfica-Marítimo. O jogo estava quase a acabar e vem uma bola bombeada, eu vou saltar, salto fora de tempo e levo o meu cotovelo à cara de um jogador do Marítimo. Vi perfeitamente que aquilo não era meu, senti-me incomodado. Foi das poucas vezes que me senti incomodado com aquilo que fiz de negativo. Foi instintivo, mas sei que o magoei. E acabei por oferecer-lhe a minha camisola e um pedido de desculpa, que já tinha pedido no campo. Fiz questão de ir ao balneário do adversário entregar-lhe a camisola. Não sei se ficou contente com a minha camisola ou não (risos).

- Sabe quantos cartões vermelhos levou ao longo da carreira?
- Não me recordo de levar muitos vermelhos. Era um jogador que, com os anos, com o tempo fui sendo um pouco marcado pelos árbitros.

- Porquê?
- O porquê não sei. Mas eu não iria mudar a minha maneira de jogar, no sentido de agressividade, mas de uma agressividade normal, nunca numa de magoar ninguém. Sei perfeitamente que havia da parte dos árbitros uma perseguição ao Andrade. Os árbitros também fazem análises, estudam, fazem observação e abordagem de lances para saber o que é para cartão amarelo ou vermelho, e chegou-me aos ouvidos que havia muitos lances analisados em que estava o jogador Andrade. Parece que não, mas os próprios árbitros ao analisarem lances daqueles, talvez ficassem de pé atrás comigo. Se tinham que analisar que analisassem equipas e jogadores que não jogavam em Portugal. Não estou a dizer que andavam atrás de mim no sentido "dás uma porrada levas um amarelo", não é isso, mas a verdade é que já não tinha tanto à vontade para entrar como entrava nos primeiros anos.

- Mas diz que nunca alterou a sua maneira de jogar.
- Não, nunca alterei porque sei perfeitamente que entrava duro mas nunca com a intenção de magoar. Era a minha maneira e foi assim que também ganhei respeito dos adversários. Um respeito no sentido de "ele é forte, ele vai disputar a bola para ganhar."

- Qual foi o seu adversário mais difícil?
- Eu tenho várias histórias com o João Vieira Pinto. Antes de ser meu colega no Benfica, eu tinha grandes duelos com ele. Chegámos a pegar-nos, com ofensas. Isto porquê? Porque quase todos os treinadores que apanhei, quando jogávamos contra o Benfica, pediam-me para marcar o João V. Pinto, que era o jogador que desequilibrava no Benfica. É normal que nos primeiros jogos, na minha abordagem ao João V. Pinto, as coisas não saíssem como eu queria. Eu também era de ranho no nariz, de morder a língua e dizer "tu podes ser muito bom jogador, mas caramba para seres melhor do que eu vais ter de correr mais do que eu". Este era o meu pensamento. E sei perfeitamente que por vezes entrava já fora do tempo, mas, repito, sem intenção de magoar. A minha maneira de jogar e de estar na vida nunca foi de magoar ninguém.

- Alguma vez chegaram a vias de facto?
- Nunca, era mais a nível verbal (risos).

- Como foi quando se encontraram no Benfica?
- (Risos). Há uma história engraçada. Quando vou para o Benfica, fizemos uma peladinha e eram os jogadores que escolhiam a equipa e o João V. Pinto disse logo "o Andrade fica na minha equipa" (risos). Fui muito bem recebido pelo João, ele é uma jóia, é um homem do futebol sabe muito bem o que quer e sabe separar as coisas. Aliás, cheguei a passar férias com ele, portanto...

- Quando chega ao Benfica sentiu-se realizado?
- Sinto-me realizado, sinto que o meu trabalho estava a dar frutos, a ser reconhecido, porque para conquistar o lugar num onze temos de treinar durante a semana arduamente e era o que eu fazia, trabalhava, trabalhava para que o meu dia chegasse. E o meu dia chegou inesperadamente, através da lesão de um colega meu, mas o futebol é isto, as oportunidades muitas vezes surgem através de lesões e castigos de outros.
- Como dizia há pouco, as coisas pareciam estar a correr bem mas na época seguinte é emprestado ao SC Braga. Porquê?
- Há mudança de treinador. Mas nunca tive nenhum episódio com nenhum treinador, posso estar de cabeça levantada. Quem me dispensa para Braga é o Heynckes. Quando chego está o Souness, depois fica o Shéu por uns jogos, depois o Heynckes.

- Ele deu-lhe alguma justificação?
- Disse só que o plantel estava preenchido. Nós podemos não concordar mas temos de respeitar. E fiz-me à vida. Houve interesse do SC Braga, do Manuel Cajuda, e fui para lá, fiz uma grande época. Foi uma das minhas melhores épocas.

- Foi sozinho ou com a família?
- Sempre com a família e com os meus cães todos. Sete cães. A Rita era criadora de boxers. Tinha um canil. Eu já gostava de animais e mais ainda fiquei a gostar com o que vi e aprendi. E cheguei a passar cães em concursos. A Rita teve duas cadelas campeãs do mundo. Mas já não temos o canil porque a vida não permite. Agora só temos dois cães. Uma boxer e um buldogue francês. A Lola e o Boss. Cheguei a fazer criação de pássaros, mas também deixei, não tinha tempo.

- Foi fácil a adaptação a Braga?
- Não foi fácil porque apanhei um ano muito chuvoso. Tive alguma dificuldade principalmente com os animais. As minhas filhas também já estudavam. Mas semana após semana fomos fazendo a nossa adaptação. As coisas também estavam a correr bem no futebol e isso ajudou.

- Já estava no SC Braga quando o Pedro Lavoura faleceu num acidente de automóvel?
- Estava. Chego a Braga, vou para estágio e, curiosamente, fico no mesmo quarto do Pedro. Não o conhecia bem, começámos a falar, falámos de carros, ele tinha um Porsche. Lembro-me de lhe ter dito que ele tinha de ter cuidado com a velocidade. E uma semana depois ele morre na sequência de um acidente. Foi um ano difícil. Ainda para mais, a pedido do Cajuda, como não havia outro defesa esquerdo, fui eu que o substitui nessa posição. Fiz quase meia época a defesa esquerdo. Lembro-me também de outra morte, a do Fehér, que conheci em Braga. Quando ele faleceu eu estava em Espanha. Foi complicado. Liguei logo para o Hélder, que me foi pondo ao corrente de tudo. Chocou-me muito. Eu tinha estado com ele em Braga e no Benfica, dava-me muito bem com ele.

- A propósito de Benfica. Regressa à Luz na época seguinte com o Toni, depois ele sai, entra Jesualdo Ferreira, que dá lugar ao Camacho. De todos os treinadores com quem trabalhou qual o marcou mais?
- Todos eles. Mas há aqui uma referência. Duas das pessoas com quem adorei trabalhar, e que infelizmente já não estão presentes, foram o César Nascimento e o Osvaldo Silva. Foram eles que disseram "tu tens talento, tu podes ir longe". Foram eles que acreditaram. E depois há uma pessoa pela qual tenho grande admiração, não é por ser meu padrinho de casamento, mas que me marcou muito e acompanhou a minha transição de júnior para sénior, que é o Fernando Santos. Acreditou em mim e disse-me que se trabalhasse e fosse responsável eu iria trabalhar ao mais alto nível.

- É supersticioso?
- Sou. Tenho que entrar sempre com o pé direito e benzer-me. Já é de infância. E entrar alinhado sendo número ímpar. Nunca ser nem o segundo ou quarto ou sexto a entrar. Mas havia outros assim. 
- Como surge a ida para o Tenerife?
- Eu tinha mais dois anos de contrato com o Benfica. E o mister Camacho disse-me que eu iria ter menos possibilidades de jogar, não ia ser um jogador regular, ia ter poucas oportunidades, porque ele foi buscar jogadores para a minha posição. E eu pensei, por muito que goste do Benfica, há uma coisa de que gosto mais, que é jogar. E como gosto de jogar o melhor que tinha a fazer era procurar outra oportunidade. Eles próprios aconselharam-me a sair de Portugal para ter uma experiência nova. Cheguei a acordo com o Benfica e fui à procura de outro sonho. Uma vez mais com a família.

- E os cães?
- (risos) Não, desta vez ficaram com os sogros.

- Já tinha o seu filho?
- Tinha acabado de nascer. O Ricardo nasceu em 2003. Uma das imposições que fiz foi assinar só por um ano, porque não sabia se me iria adaptar.

- Como foi, adaptou-se bem?
- Ao princípio não foi fácil. O Ricardo era bebé. E agora, pediatra? E agora, a 1ª classe da minha filha do meio, a Inês? A mais velha, a Andreia, desenrascou-se, porque é muito inteligente, tinha já uns 13 anos. Infelizmente não fiz pré-época e cheguei lá a duas semanas de iniciar o campeonato. Fiz o primeiro jogo e lesionei-me. Houve uma quebra.

- Que tipo de lesão?
- Tive uma contractura ou ruptura muscular. Mas consegui recuperar e voltei à normalidade. A família entretanto já estava adaptada. Eles receberam-nos muito bem.

- Correu bem o resto da época?
- Correu, mas eu não queria continuar.

- Tinha a ver com o futebol?
- Não era o futebol, era a vida. Não me identificava muito com a ilha. Para vir a Portugal demorávamos um dia, porque não havia voos directos. Por outro lado, não havia muito que fazer naquela zona e de 15 em 15 dias estava sempre a viajar. O problema nas ilhas é que se está sempre a viajar. Não me agradava.
- Vem para Portugal.
- Sim, venho para Portugal na perspectiva de continuar a jogar, sabendo que a idade já era outra e aqui em Portugal, como todos nós sabemos, a partir de certa idade já somos velhos.

- Que idade tinha nessa altura?
- Em 2004 tinha 31 anos. Mas, como estava a dizer, cheguei cá, queria jogar e entretanto fiquei na expectativa de arranjar clube, andei a treinar no Estoril, o treinador era o Lito, de quem sou amicíssimo e pedi para treinar. O Estoril nessa altura estava na I Liga. Comecei a dar algumas entrevistas e quando as pessoas souberam que andava a treinar no Estoril surgiu o contacto da Académica e do Nelo Vingada, que já tinha sido meu treinador na selecção e conhecia muito bem aquilo que eu poderia render à equipa. Fui a aquisição do mês de dezembro da Académica, na qual me encaixei bem e fiz um bom final de campeonato.

- Depois vieram as lesões mais graves.
- Sim, foi aí que tive a minha primeira grande lesão, grande no sentido de operação. Eu nunca tinha sido operado até aos 31 anos. Tive de ser operado ao joelho, tinha falta de cartilagem. Tive que fazer um enxerto, mas parece que as coisas não correram bem. Forçaram muito o meu joelho na recuperação, deviam ter-me dado mais tempo de repouso a seguir à operação. Ganhei líquido no joelho. Aquilo começou a inchar e tinha de tirar líquido com uma seringa. Não conseguia andar quase. Sentia uma agulha no joelho, às vezes nem queria andar, preferia ficar o dia todo deitado. Foi das situações mais complicadas.

- Estava sozinho em Coimbra?
- Estava. Foi logo no início do segundo ano, foram seis meses de recuperação mas acabei a fazer um jogo espectacular na Académica.

- Como é que surge o Chipre?
- O Chipre naquela altura andava muito à procura de jogadores portugueses que tivessem um bom currículo, que era o meu caso. Tinha um bom currículo e dele fazia parte o nome Benfica. Eles nem me conheciam, para ser muito sincero, nem é pelo valor, é mesmo pelo nome dos clubes grandes. Fui ao Chipre, gostei da proposta e por lá fiquei. A família foi toda.

- Esteve lá quanto tempo?
- Nem chegou a um ano. Estive de Agosto a dezembro.

- Veio embora mais cedo?
- Falta de pagamento. Deram-me excelentes condições para estar com a família, não tenho razão de queixa, boas condições a nível de treino, boas condições para o jogo, mas não pagavam…

- Os miúdos ficaram numa escola internacional?
- A Inês fez trabalhos através da internet. A minha mulher conseguiu falar com uma das professoras que dava trabalhos para ela fazer. Foi ensino à distância. A Andreia já não foi, só foi o Ricardo e a Inês. O Ricardo ainda era pequenino, tinha uns 3 aninhos. A Andreia ficou cá com os meus sogros. 

- Como era o Chipre em termos de futebol?
- Era fraco. Não tem nada a ver com o nosso futebol. Não quer dizer que agora não esteja mais evoluído, mas é diferente, não tem aquela emoção. Por vezes pensava "estou aqui só por estar, não estou aqui com vontade, com a convicção de que posso fazer mais e melhor". Era viver um dia de cada vez à espera que o campeonato chegasse ao fim.
- Quando vem, tem noção de que seria difícil retomar o futebol ao mais alto nível?
- Sim, claro. Construí a minha casa na Charneca da Caparica há muitos anos e como o treinador do Pinhalnovense era o Nascimento, que foi adjunto do Cajuda, lembrei-me: “E se fosse dar ali uns pontapés na bola?”. Fiquei lá a treinar, mas como eu não treino só por treinar, quando viram a minha aplicação nos treinos viram que afinal eu não estava velho. Mas deixe-me dizer uma coisa, fiquei impressionado com a realidade que encontrei.

- Como assim?
- Até aí não estava habituado nem tinha noção do que eram os jogadores/trabalhadores ou trabalhadores/jogadores. Sempre joguei como profissional e nunca tinha tido a noção do que eram os clubes das divisões inferiores. Quando estamos lá em cima, não estamos preocupados, nem vamos ver ao jornal que clube é este e aquele. É uma outra realidade do profissional para o amadorismo. Jogadores que para sobreviverem têm que trabalhar, e o jogar à bola é só um bichinho, uma maneira de descansar um pouco o cérebro do trabalho.

- Pagavam-lhe alguma coisa?
- Pagavam mas não era nada de outro mundo, era mais no aspecto do combustível e das portagens. Mas lá fiquei, fiquei até ao final do ano e depois lá está, o Andrade não quis deixar e continuei. Ainda fui para o Olivais e Moscavide, Odivelas, depois o Loures e depois o Odivelas outra vez já como treinador.

- Custava-lhe pensar em arrumar as botas?
- Custava. Isto é um vício, é um bichinho que está dentro de nós e que nunca queremos perder. É o balneário, os treinos, o convívio com os colegas, o jogo das cartas antes dos encontros, é a adrenalina do jogo.
- Quando é que chegou a altura em que disse para si, por muito que me custe vou ter mesmo que por as botas a um canto?
- Entretanto quando vou para o Odivelas, já não queria jogar e a convite de um dos directores, o António Sousa, vou para lá. O treinador era o Paulo Fonseca, que tinha jogado comigo no Belenenses. O Paulo falou comigo: “Bora lá, vens dar aqui uma ajudinha a este clube, vá lá, mais um aninho não custa nada”. E eu lá fui mais um ano.

- Gostou de trabalhar com o Paulo Fonseca?
- Muito. O Paulo teve de trabalhar muito para chegar onde chegou, ninguém lhe deu nada, o mérito de um treinador é este, trabalha, mas trabalha sem favor. As oportunidades que teve são mérito dele, isto para dizer que nem todos têm mérito de chegar onde estão.

- Está a falar de quem?
- Não interessam os nomes, interessa é que há alguns que sem mérito chegam onde chegam.
- Está a dizer que há treinadores na Liga Portuguesa que estão sobrevalorizados?
- Acho que todos merecemos uma oportunidade. Acho que uns têm mais facilidade em treinar na I Liga do que outros, que também já deram provas de que são bons. Aliás, estamos aqui a falar, mas não sou eu, estou a falar de outros treinadores que conheço e que têm tanto ou mais valor do que alguns que estão na I Liga. O porquê disso, aí já não sei, depende da gestão de cada clube. Mas isto é a opinião de um mero espectador e de um cidadão que esteve muitos anos a jogar à bola e conhece muita gente. Acho que outros deviam ter essa mesma oportunidade, como eu também mereço essa oportunidade, é isso que procuro.

- Como é que se torna treinador?
- Começo a dar formação mas também jogo à bola. Em 2010/11, quando vou para o Loures, já tinha começado a treinar uma equipa de pequeninos, de futebol de 7, no Odivelas.

- Tinha feito algum curso?
- Tinha o 2º nível. A partir daí fiquei com o bichinho de treinar. Torno-me coordenador técnico, trabalho no Centro Escolar Republicano Tenente Valdez e no Odivelas, e acabo por deixar de jogar em 2012/13. Senti que para ser treinador de uma equipa sénior não poderia ser treinador-jogador. Tinha que optar, ou jogador ou treinador. Como jogador já tinha uma certa idade e já não podia dar mais do que aquilo. Tive de optar e deixei de jogar. Repare, quando estava no Odivelas treinava miúdos e seniores. Foi uma grande aprendizagem. Para mim, um treinador para poder estar na I Divisão não tinha que ter só o 4º nível, tinha que percorrer todos os caminhos, tinha que passar pelas distritais também. Porque não?
- Já tem o 4º nível?
- Não, não tenho. Tenho o 2º e infelizmente inscrevi-me no 3º mas não consegui entrar. Se me pergunta porquê, nem eu sei. Com os anos que tenho de futebol, aquilo que aconteceu com o Silas, aconteceu comigo também. Não quero alimentar muita polémica em relação a isso, mas fiquei muito desiludido, porque com os anos em que joguei e representei o país, não só a nível nacional mas também a nível internacional, devia poder ter acesso.

- Mas porque é que isso acontece?
- Não sei. Tenho esta experiência toda enquanto jogador e treinador, o que é preciso mais? Não sei. Mas pronto, para o ano vou inscrever-me outra vez.

- Sem esse nível não consegue treinar nenhuma equipa da I Liga?
- Não. Consigo estar no banco. Há treinadores da I Liga que não têm o 4º nível, portanto aqui a questão não é essa. Aqui a questão é que temos que estar sempre dependentes de um treinador de 4º nível.

- Nunca lhe passou pela cabeça fazer outra coisa?
- Vou ser muito sincero, enquanto jogador nunca me passou pela cabeça sequer ser treinador de futebol.

- Quando pensava no futuro o que é que se via a fazer então?
- Quando estamos bem e temos uma vida estável, não pensamos no futuro.
- Para além de ser treinador agora, o que é que faz mais?
- Trabalho na escola profissional Agostinho Roseta, há sensivelmente 8 anos.

- Como é que isso surgiu e porquê?
- Começa com as Novas Oportunidades. Eu e a minha mulher inscrevemo-nos, em 2014, para fazer o 12º ano. Como não era fácil, porque eu já treinava o Odivelas, pedi ajuda à tia da minha mulher, que era directora da Escola Profissional Agostinho Roseta. Havia lá uma professora de português que me ajudou. Depois acabei por ficar lá a trabalhar.

- Faz o quê?
- Faço várias coisas, dou apoio aos alunos e aos professores. E sou treinador do Atlético da Malveira. 

- Gostava de ser professor?
- Houve outros tempos em que me passou pela cabeça tirar o curso de professor de educação física. Mas agora já não tenho tempo para pensar nisso.

- O que faz a sua mulher actualmente?
- Trabalha numa pastelaria perto de casa. Mas o objectivo é dar mais apoio aos filhos, que eu não consigo dar por falta de tempo.

- Os filhos que idade têm e o que fazem?
- A Andreia tem 27 anos, a Inês tem 21 e o Ricardo tem 14 anos. A Andreia tirou gestão e trabalha na Siemens, a Inês está no 3ª ano do curso de design e o pequenino está no 9º ano e joga futebol na Charneca da Caparica.

- É tão bom como o pai?
- É melhor. Está em fase de aprendizagem. Estou satisfeito com o desempenho e progressão dele. 
- Qual o jogador que mais o marcou?
- O Preud'homme. Um grande profissional, quer nos treinos quer nos jogos. Foi um exemplo. O Figo é outra referência, foi um dos melhores do mundo. Só de pensar que joguei com um dos jogadores que foi considerado um dos melhores do mundo para mim é um orgulho. Ainda por cima há pouco tempo tive a oportunidade de jogar na China num evento promovido por ele.

- Ainda é reconhecido na rua?
- Sou, sobretudo pelas pessoas de mais idade e pelos “fanáticos” do Benfica. E gosto de ser reconhecido.

- Qual foi a maior loucura que fez?
- Nunca fui pessoa de loucuras. Uma vez ofereci um carro à minha mulher, um Renault Mégane descapotável. De resto investi na minha casa e na educação dos meus filhos."