sexta-feira, 30 de novembro de 2018

Para memória futura...

A novela dos últimos dias, envolvendo o nosso treinador, obriga-me a marcar posição:
- A forma como a decisão foi tomada, na minha opinião não é 'grave'! No dia de hoje, muito se escreveu sobre o feeling do Presidente, da 'luz'... inclusive em colunas de opinião dos jornais!
O Benfica é um clube democrático, mas existem decisões que têm que ser assumidas, por quem foi eleito para as tomar. Esta coisa das decisões colegiais é muito bonito, mas muitas vezes acaba por ser somente uma forma de afastar responsabilidades...
- Pessoalmente, acho que o Presidente tomou a decisão errada! Já o escrevi várias vezes: após a derrota do Jamor, com o Guimarães, em 2013, na saída do Estádio, fui o único no meu grupo de 'amigos' - incluindo muitos Benfiquistas que não conhecia de lado nenhum, mas que estavam tão agastados como eu, com tudo o que se tinha passado naquelas últimas duas semanas - que defendi a permanência do Judas no Benfica. Ainda antes de saber que o Presidente iria renovar-lhe o contrato, alguns dias depois!
A diferença, a grande diferença, é que apesar dos desaires daquele final de época, apesar de algumas derrotas, e de algumas más exibições, naquela altura, a equipa tinha um fio de jogo claro, ganhando ou perdendo, percebia-se que tínhamos uma equipa organizada... que dentro das muitas variáveis dentro de um jogo de futebol, iria ganhar a maioria dos jogos...
Algo que não acontece neste momento...
- Agora, tal como no início da actual época, a decisão está tomada... e até que exista uma alteração, é com este treinador que vamos a 'jogo'!!! Portanto, concordando ou não, como adeptos temos que empurrar a equipa para as vitórias... e não o contrário!

Bom jogo...

Benfica B 1 - 0 Estoril
Dantas


Regresso às vitórias, com um bom jogo, contra um adversário de qualidade... com mais uma arbitragem inquinada!!!
Demonstrámos mais uma vez, boa qualidade nas saídas de bola, e também soubemos defender bem quando foi preciso...

Destaco o regresso do Jota, após quase um 1 mês de fora...

A treta Calobote

"Nunca será demais relembrar, enquanto os Goebbels de algibeira persistirem no assunto, que o chamado caso Calabote é pura invenção.
Inocêncio Calabote foi irradiado da arbitragem por ser reincidente na falsificação de dados no relatório de jogo, e não por qualquer suspeita, quando mais culpa, relacionada com corrupção ou favorecimento. Acresce que os referidos dez minutos a mais no tal Benfica - CUF foram apenas quatro, e justificados, conforme consta nas crónicas de vários jornais, assim como duas das três grandes penalidades a favor do Benfica nesse jogo. Nem o técnico da CUF, então, encontrou motivos para criticar severamente Calabote (até mencionou uma falta na área por assinalar sobre Cavém). Só Pedroto e Pinto da Costa, passados trinta anos, descortinaram o impensável, porque nunca ocorrido. Basta consultar a imprensa de 23 de Março de 1959. Aproveite e leia as crónicas do Torreense - FC Porto, cuja vitória portista resultou no título nacional para os azuis e brancos.
Distam, entretanto, 59 anos, os suficientes para estabelecer uma regra: se passadas seis décadas, com quase sessenta edições do Campeonato Nacional e da Taça de Portugal disputadas e dez anos de e-mails roubados, descontextualizados e deturpados, os mentirosos continuam a evocar o 'caso' Calabote, tal só poderá significar uma conduta benfiquista irrepreensível ao longo de todos estes anos. E como colada à patranha Calabote surge sempre a treta do 'clube do regime', aproveite-se para pedir aos desonestos (vá lá, também aos ignorantes que se limitam a debitar a cartilha) para que se explique como o regime que protegeria um clube não se deu ao trabalho de proteger um árbitro que protegeria esse mesmo clube..."

João Tomaz, in O Benfica

A toupeira do e-toupeira

"Quem anda nos meandros do sistema judicial e quem ainda tem coragem de ser honesto sabe e confessa que, se algo existe nesse mesmo sistema judicial, é a injustiça e a irracionalidade. Nos processos em que me constituo como mandatário, exceptuando umas boas secções e uns excelentes funcionários como são os da 9.ª secção do DIAP de Lisboa, invariavelmente, quando elaboro requerimento com pedido de confiança dos autos, ou de obtenção de cópias por meios próprios na secretaria, a resposta é também invariavelmente - indeferido! Quer isto dizer que não aceitam o meu pedido e que, se quiser, que vá consultar em poucas horas de funcionamento uma enormidade de folhas do processo em condições sub-humanas, sem ter possibilidade de ter acesso a uma defesa minimamente condigna!
Confesso que estou a guardar todos os despachos de indeferimento para um livro que farei quando me reformar se lá chegar!
Existem alguns casos caricatos. Certo dia requeri acesso a um processo, pedindo confiança do mesmo por 48 horas, para poder fotocopiá.lo do meu escritório. O despacho foi de indeferimento, pois havia mais gente que podia precisar de o consultar - por acaso, no caso, até nem havia mais ninguém além do meu constituinte!
Então, de boa-fé, pensei que se requeresse o processo para ser examinado no meu escritório, desde as 16 horas e 30 minutos de sexta-feira (hora da abertura da secretaria) tal ser-me-ia permitindo, pois nesse espaço de tempo ninguém o poderia consultar.
No entanto, qual não foi o espanto quando a mesma procuradora indeferiu a confiança do processo, invocando que alguém o poderia querer consultar! Sem comentários!
O processo denominado E-Toupeira encontra-se neste momento na fase de instrução, ou seja, a fase a seguir ao inquérito. Regra geral, também nunca tenho acesso ao processo para poder defender condignamente os meus constituintes nem, muito menos, às gravações áudio das inquirições. Fazem-se requerimentos, e têm todos o mesmo destino - ou o indeferimento, ou nem resposta, ou um calvário para se ter as cópias.
Que fique também aqui bem explícito que existem, felizmente, muito juizes e funcionários com elevada qualidade e que saem deste marasmo!
Mas o que sai completamente da normalidade é como um processo denominado E-Toupeira, que investigou fugas de informação judiciais, afinal tem outra toupeira que saca (rouba) informação judicial a que, supostamente, ninguém tem acesso!
Eu não sei o que os meus digníssimos colegas mandatários pretendem fazer, se é que tudo isto não inquinaria de morte o processo, caso fosse julgado por um Tribunal Europeu! Eu sei que estamos em Portugal e isso não vai acontecer.
Mas ainda mais grave é o facto de no início do interrogatório do Dr. Paulo Gonçalves, o mesmo ter advertido e pedido que o áudio ficasse inacessível por cópia, até aos intervenientes no processo, o que se compreende.
A verdade, é que ele ficou acessível publicamente, a todos e por todos, por quem queira e até los mandatários, que assim podem estudá-lo ao fim de semana, fora do apertado limite das horas do expediente! Mas é um crime!
Os ficheiros que foram sacados ilicitamente foram os que constam (...).
Obter e divulgar isto é tão grave (ou mais) como os factos de que estão a ser objecto as pessoas acusadas no processo E-Toupeira, com a agravante de que nem se sabe se a acusação estará correcta!
Confesso que cada vez mais fico nauseado com tudo isto, e que um sistema completamente caduco e obsoleto, quase a implodir por dentro, para bem de todos os verdadeiros criminosos, cresce impune!
Ninguém tem a coragem de falar abertamente sobre isto, e percebe-se que em cada acto existe um objectivo individual e global! Está tudo condenado a ser uma farsa!
Como é possível que o que (...) esteja acessível a todos, por um simples clique na Internet e não aconteça nada?!
Sinceramente, creio que o sistema já não tem qualquer hipótese de ser arranjado. Existe uma canção dos ColdPlay que se intitula Fix You, mas quanto ao sistema judicial não se aplica de certeza absoluta.
De certeza que estarei na plateia a observar quando for inaugurado o novo campus de justiça junto ao Palácio da Justiça, a confusão que vai haver com a mudança dos processos e de toda a logística. Vão exisitir muitos processos que ficarão pelo caminho! Mas o crime da toupeira do E-Toupeira, esse não vai ter problema nenhum, porque ninguém descobriu nada de nada! Alguém se interessou?"

Pragal Colaço, in O Benfica

1 de Dezembro: feriado, mas porquê?

"Amanhã, dia 1 de Dezembro, é feriado, e sinto que devo partilhar com o leitor uma ignorância minha: apenas nesta semana descobri o verdadeiro motivo da comemoração nacional desta data. É triste, mas é a verdade. Até agora, estava ou convencido de que o primeiro dia do derradeiro mês do ano dava direito a celebração por se tratar do aniversário da inauguração do antigo Estádio da Luz, realizada em 1 de Dezembro de 1954. Pelos vistos, no mesmo dia, 314 anos antes, o povo português dava inicio a uma revolta contra a dinastia filipina que liderava o nosso país - o rei de Espanha era simultaneamente rei de Portugal. Afinal, o feriado realiza-se em honra deste acontecimento. Chocante, não é? É este tipo de lacunas na Constituição que me leva a questionar o futuro do nosso país. A mim e ao leitor que está, certamente, tão incrédulo como eu. Como pode o país andar para a frente se os governantes julgam que uma revoluçãozita está acima da inauguração do estádio onde brilharam Eusébio, José Augusto e Nené? Há com cada uma.
Calma, não vire já a página porque a aula de História não fica por aqui. Como já percebemos, o Benfica inaugurou o estádio, em pleno período de ditadura, numa data verdadeiramente simbólica que a República Portugal transformara em feriado em 1910.
O FCP, por sua vez, para estrear o estádio, elegeu o 26 de Maio, dia também significativo na história de Portugal. Em 1925, nesse dia, nasceu o meu tio-avô Bartolomeu e, em 1926, foi implantada uma ditadura militar, designada a partir de 1933 por Estado Novo. Como suponho que o FCP não terá seleccionado o dia em homenagem ao meu tio-avô Bartolomeu, então eu pergunto: qual era, afinal, o clube do regime?"

Pedro Soares, in O Benfica

Ganhar ou... ganhar

"As duas inesperadas derrotas diante do Belenenses e Moreirense deixaram o Benfica sem margem de erro na luta pelo título. 20 pontos em 10 jornadas são magro pecúlio para um verdadeiro candidato, e em mais de 40 anos só por uma vez - justamente na primeira época de Rui Vitória - o Benfica se sagrou campeão depois de início tão periclitante.
É verdade que o líder FC Porto já perdeu um jogo em casa, e também já perdeu na Luz. São precisamente esses resultados que nos mantêm na corrida. Mas não nos podemos ancorar no mal dos outros, nem esperar que voltem a vacilar. Temos de encontrar rapidamente o trilho dos triunfos.
Olhando para o calendário, verifica-se que disputamos 9 partidas até à deslocação a Alvalade, na terceira jornada da segunda volta. Ora, essas 9 partidas terão de se saldar por 9 vitórias e os correspondentes 27 pontos, para, então, sim, nos recolocarmos perto do lugar a que temos direito, e que o nosso fabuloso plantel amplamente justifica.
O primeiro jogo dessa série é já amanhã, no Estádio da Luz, frente ao Feirense. Lembrando a canção de Sérgio Godinho, é caso para dizer que se trata do primeiro jogo do resto do campeonato. Do primeiro jogo do resto da caminhada para a 'reconquista'. O passado é passado, e já não podemos mudá-lo. Podemos, sim, aprender com ele, e evitar os erros que conduziram àqueles duas derrotas, tão dolorosas como surpreendentes.
Mais do que ninguém, os nossos jogadores querem inverter o rumo dos acontecimentos, e mostrar que não desaprenderam de jogar desde o dia em que, no Jamor, podiam ter chegado à liderança isolada. Foi há apenas um mês..."

Luís Fialho, in O Benfica

Cortesia

"A actividade desportiva, como todos sabemos, desenvolve-se num contexto específico, e são conhecidas as paixões à flor da pele, as emoções, as alegrias e as tristezas, as angústias e as euforias. Nesta actividade, em que imperam os estados de alma, existem práticas próprias do ponto de vista da adequação social da oferta de determinados bens e produtos como forma de assistirem aos espectáculos desportivos. Seja por razões de natureza protocolar ou particular, a verdade é que é um facto público e notório, nas diferentes modalidades, por esse mundo fora, a oferta de convites para assistir aos jogos de futebol, andebol, basquetebol, futsal, hóquei em patins, voleibol ou a meetings de atletismo. Estes convites são destinados a representantes de instituições oriundas da vida desportiva, social, política, cultural e económica. Além dos representantes de instituições federativas e associativas, existem os convites para representantes de clubes, jogadores, ex-jogadores, agentes, parceiros e para os amigos. Tal como é prática corrente e socialmente aceite a oferta de produtos de merchandising. Quem nunca recebeu de oferta uma camisola do clube do seu coração, um cachecol ou uma bola? Quem nunca recebeu de oferta um bilhete de futebol? Trata-se de uma prática instituída e que está devidamente regulamentada a nível internacional - FIFA e UEFA - e a nível nacional - Liga e Federação Portuguesa de Futebol. O célebre caso dos vouchers é um bom exemplo de cortesia, situação que a UEFA arquivou por três vezes. Por isso, criminalizar este tipo de prática é injusto!
Considerá-la corrupção é absurdo!"

Pedro Guerra, in O Benfica

Perguntem às crianças quanto vale uma árvore

"Tendemos a olhar para a floresta sem os olhos da História, mas seria bom que o fizéssemos para podermos compreender alguns aspectos estruturais da nossa floresta e parte dos seus problemas.
Basta recuar ao inicio do séc. XX para encontrar descrições de um país agrário com uma floresta essencialmente autóctone povoada por carvalhos, soutos de castanheiros, pinhais, eucaliptos de grande porte, freixos nas zonas húmidas do Norte, sobreiros e azinheiras nas quase 'savanas' do Sul.
Mas não se pense que estava no seu estado natural ou selvagem. Longe disso, a floresta portuguesa era fortemente pressionada enquanto fonte de combustível para as cidades e a indústria e enquanto fonte de rendimento para uma economia agropastoril de subsistência que nela encontrava colecta sazonal de frutos, caça, limpezas de matos e madeira de rendimento a espaços de gerações. A pressão sobre a floresta foi de tal forma intensa e continuada por séculos, que em boa verdade Portugal não podia assumir-se como o país florestal que hoje, felizmente, ainda é.
Por isso mesmo, na I República, eram frequentes os apelos nacionais e as campanhas de florestação para contrariar esse estado de coisas. Os portugueses de então, a par com guerras globais e dívidas imensas para pagar, sabiam que há investimentos que não se podem adiar e que investir em educação ambiental produz duas vezes: quando uma criança planta uma árvore, ela cresce na floresta e no ser humano que a partir dali se desenvolve. Assim se fizeram anualmente, com grande sucesso e mobilização das escolas, sucessivas 'Festas da Árvore' com grande impacto na floresta e muito maior na opinião pública de norte a sul, nas cidades e nos campos. Depois, sobretudo na década de 40, a economia de subsistência da casa rural integrou de forma sistemática e estratégica o plantio de pequenos pinhais (as famosas 'bouças' do Norte) familiares cuja função era de entesouramento de valor a longo prazo uma vez que em 20 anos de faziam pinheiros comercialmente viáveis e em 40 atingiam um elevado valor de mercado. Era um verdadeiro pé de meia que apenas se mobilizava quando um investimento familiar, um casamento ou uma tragédia não deixavam alternativa. Abatiam-se as árvores de maior porte e logo se replantavam outras para as renderem ao serviço da geração seguinte. Por essa altura, os campos enchiam-se de lavouras, e as árvores que não de fruto ocupavam tão-só os piores terrenos. E esgalhavam-se as árvores para as guiar ao mesmo tempo que se colhiam lenhas, roçavam-se os matos e faziam-se neles as camas dos gados, depois convertidas em fertilizantes e regressando à terra. Tudo isto baixava a carga térmica da floresta, e os incêndios resultavam usualmente menores do que os que conhecemos nos nossos dias.
Podemos dizer que estivemos próximos de alguma sustentabilidade ambiental, mas na realidade estávamos bem longe da sustentabilidade social, e inevitavelmente deu-se a rotura. E foi assim que esse mundo ficou para trás com o que tinha de bom e com muito também do que tinha de mau na dureza das vidas. Deixou-nos de herança um admirável país florestal, mas passou! E não volta enquanto não se reinventarem novas formas de ordenamento florestal que norteiem os plantios e sobretudo novos usos de produtos florestais que consigam ir além das explorações hegemónicas de pinho e eucalipto, sem extinguir ou comprometer fileiras economicamente tão importantes como o papel ou o mobiliário mas dotando-as de alternativas e diversificando a indústria transformadora a jusante da floresta e sobretudo a criação de produtos inovadores e sustentáveis. A floresta precisa que a compreendamos e que saibamos retirar dela riqueza sem comprometer a sua integridade numa altura em que os riscos assumem proporções geológicas devido ao aquecimento global. Felizmente há muita investigação e planeamento em curso, surgirá certamente muita floresta programada com diferentes espécies resistentes e regeneradoras de biodiversidade. Pela nossa parte, enquanto Fundação de um clube com a responsabilidade social e a capacidade mobilizadora do Benfica, adoptamos a máxima inteligente daqueles primeiros republicanos. Por cada semente que uma criança deita, nascem dois seres: Uma árvore e um ser humano!
Senão, perguntem às crianças..."

Jorge Miranda, in O Benfica

Toni merece

"A personalidade e a energia de Toni, os seus fundamentos de carácter e as suas capacidades de entrega mental e física, como jogador e como treinador, fizeram dele uma das referências mais relevantes na história do Benfica a partir do último terço do séc. XX. Conheci-o, creio que em Outubro de 1967 (já lá vão mais de cinquenta anos...), numa das idas a Coimbra, no quadro das minhas recorrentes aventuras associativas daquele tempo de faculdade, num convívio proporcionado pelo meu grande amigo João Rodrigues com outros bons parceiros e colegas estudantes de Direito, Medicina e Letras, além de alguns dos mais emergentes jogadores da Associação Académica, como eram Vasco Gervásio, os manos Campos - Vítor e já também Mário -, o sereno Rui Rodrigues e, se bem me lembro, igualmente o mais circunspecto Artur Jorge, aos quais dessa vez, então, se juntava Toni.
Os nossos convívios haviam de prosseguir e desenvolver-se mais tarde (e muito mais frequentes e intensos), já no Benfica. Jogador de equipa dentro e fora do campo, Toni sempre jogou para a equipa. Foi, mesmo, o verdadeiro 'tractor' da equipa (para usar uma imagem que muito mais tarde, curiosamente, se lhe havia de colar ao destino...), já que era constantemente por ele que a força conjuntiva do Benfica se afirmava nos momentos mais difíceis e, em particular, nos jogos mais decisivos. Mas a sua atitude na relva não nascia ali: vinha-lhe de dentro, da sua natureza.
E desenvolveu-se de modo fulgurante na partilha do balneário, diante dos seus companheiros de jornada, dos quais cada um era mais brilhante que todos os outros. Na verdade, o 'miúdo-calmeirão' de Mogofores viria a impor-se naturalmente, primeiro pela generosidade do seu companheirismo e depois pela convicção do seu futebol, ao qual nunca faltou um precioso sentido de oportunidade e uma energia transbordante, constantemente servidos com responsabilidade e profissionalismo exemplares, com a sua atitude desportiva e leal, sempre positivo, sempre muito franco, mesmo nas horas em que teve de superar as maiores dificuldades pessoais.
Jogador e capitão do Glorioso e seu treinador-adjunto, treinador principal e director desportivo - o nosso único jogador e treinador por (muito) mais de uma vez campeão em ambas as qualidades -, é inquestionável que Toni faz parte da centenária histórica do Benfica, como um símbolo do próprio Benfiquismo. Por tudo isso. Toni merece o destaque que o nosso jornal lhe consagra nesta edição."

José Nuno Martins, in O Benfica

«Foi uma luz que me deu»

"Luís Filipe Vieira teve um feeling, depois de uma noite mal dormida. Rui Vitória é para ficar. E foi assim que, à revelia do que tinha sido antes decidido, o Benfica viveu um volte-face que fica para a história. Não foi a primeira vez que o presidente encarnado tomou decisões inesperadas e solitárias. Quando decidiu, depois de ter perdido tudo, renovar o contrato de Jorge Jesus, foi uma delas; e quando resolveu, depois de ter ganho tudo, não continuar com Jesus e trocá-lo por Vitória, foi a outra. Em ambas, apesar do caminho estreito e sinuoso que teve de percorrer, acabou por sair-se bem. Mas os tempos eram outros e como um homem é ele e a sua circunstancia, a de Vieira, à altura, era mais confortável, sem processos judiciais a reboque, sem toupeiras e emails a perturbar o quotidiano do Benfica e, até, numa vigência do BES com que se sentia confortável. Ao dia de hoje, a deicsão de Luís Filipe Vieira de manter (até quando não se sabe...) um Rui Vitória sucessivamente fragilizado, por exibições indigentes, resultados desprestigiantes e uma omnipresença de Jorge Jesus, tolerado pelo Benfica, afigura-se de risco elevado, quase tão elevado quanto fazer regressar, contra o sentimento de grande parte da nação encarnada, o actual técnico do Al-Hilal. Jesus é um grande treinador. Mas depois de tudo o que se passou entre ele e o Benfica, depois de tudo o que foi dito e depois de todos os processos que andaram em tribunal (e o que neles foi invocado...), um regresso à Luz seria uma falta de vergonha. De Jesus e do Benfica."

José Manuel Delgado, in A Bola

Montalegre

Desta vez, calhou ao Benfica a equipa do escalão mais baixo... não fosse a distância teria sido o sorteio mais indicado!!!
Se não houver alteração de datas, esta eliminatória da Taça de Portugal, será disputada entre um jogo nos Barreiros e a recepção ao Braga...
Espero que exista condições para o jogo ser disputado em Montalegre (se não houver neve ou gelo!!!)  e que não seja necessário mudar o jogo para Chaves ou outra cidade...

Aqui fica o calendário completo dos Oitavos de final da Taça de Portugal:
Corruptos-Moreirense
Boavista-V. Guimarães
Leixões-Tondela
Montalegre-Benfica
V. Setúbal-SC Braga
Aves-Chaves
Feirense-Paços de Ferreira
Sporting CP-Rio Ave

«Ser chamado de 'Toni do Benfica' é algo que não tem preço»

"No dia 8 de Setembro completou-se meio século desde que Toni se estreou com o Manto Sagrado. Daí para cá, foi também adjunto, treinador principal e ainda director desportivo. Numa grande entrevista ao Jornal O Benfica e à BTV, o homem que tanto deu ao Clube fez uma viagem pela sua história na Luz, mostrando também a sua indescritível fibra humana.

Qual o sentimento de cumprir 50 anos de Benfica?
Realmente são 50 anos de Benfica, mas vividos dentro são 34. Contudo, eu estive lá fora, cá dentro nos outros 16 que fazem os tais 50 desde essa estreia em Belém do Pará (Agosto 1968), no Brasil, numa digressão que durou mais de um mês. Dali ainda fomos para a Argentina, onde jogámos um torneio com o Santos de Pelé, River Plate, Boca Juniors e Nacional de Montevideu. E, claro, o Benfica apresentava Eusébio, Coluna, Jaime Graça, Simões, entre outros. Depois dessa digressão aconteceu a tal estreia oficial, no dia 8 de Setembro, frente ao Belenenses. Resumindo, foi há 50 anos que tudo começou neste clube. E, mesmo nos anos em que estive fora, estive sempre cá dentro.

É uma pessoa muito diferente daquela que aqui entrou pela primeira vez?
No meu primeiro jogo nunca imaginei que seria o primeiro de quase 400. Depois do Anadia, da Académica, equipas com horizontes completamente diferentes dos do Benfica. O grande desafio era saber se o potencial que tinha era suficiente. Sabia da grandeza do Benfica, mas quando entrei, fiquei a perceber o quão grande o Clube realmente é. E isto foi há 50 anos, e vejamos o que o Benfica cresceu. Mas naturalmente que trazia todos esses sonhos na minha bagagem: o desejo de vencer, a motivação e determinação.

Como foi entrar pela primeira vez naquele balneário, com tanto “monstro”?
Esse é o grande momento. A verdade é que antes de chegar ao Benfica já tinha jogado duas vezes contra o Clube, ambas pela Académica. Uma em Coimbra e outra na Luz, para a Taça de Portugal. Acontece que a primeira vez que entro no balneário, entro pela porta onde se encontravam a maioria dos titulares. Isto porque depois havia a parte dos equipamentos, o posto médico e a outra parte onde estava a maioria da malta das reservas. Pela mão do António Simões entro por aquele lado, e o meu cacifo fica na parte dos “monstros”. Esse respirar no espaço onde estavam figuras já naquela altura históricas, para mim era estar a viver o primeiro sonho. Para se ter uma ideia, só ao fim de um mês é que falei com o Eusébio. Tratava todos esses jogadores por senhores, era o senhor Coluna, o senhor José Augusto, por aí fora. Tudo por uma questão de respeito, mas claro que dentro do campo não era assim.

Qual foi o grande jogo pelo Benfica? E o pior momento?
Há um jogo frente ao V. Setúbal em que o Jornal “A Bola” classificou com 3+. A verdade é que as classificações eram de 0 a 3 e lembro-me de que por ser feriado, o jornal não saiu logo a seguir ao jogo, apenas mais tarde. Posso ir buscar o jogo em que me dá o primeiro campeonato, em Tomar. Não pela exibição, mas porque foi um dia que marcou. E depois, claro, há jogos que nos marcam, como o 1-3 com o Ajax, que foi um dia triste. Há tantos exemplos da vida que se podem ir buscar ao futebol. Quando estamos a perder por 0-2 e ganhámos 3-2… Há momentos na vida em que se está em baixo e depois há que lutar para que essa situação seja invertida. Os momentos bons e menos bons são vividos ao logo do futebol, assim como da vida.

E o último jogo como futebolista?
Lembro-me bem. Há uma placa levantada pelo Sr. Gaspar Ramos, em que sai o Carlos Manuel e entro eu, num jogo com o V. Setúbal. A verdade é que gostaríamos que chegasse o dia em que nos pudéssemos despedir daqueles que ao longo de uma vida nos bateram palmas, assobiaram. Muitos de nós, que fizemos um trajecto no Benfica, gostaríamos de ter tido esse dia. Eu senti que aquela partida seria a última, mas não o dia de poder dizer obrigado, nem de agradecer. Nós não temos essa cultura de jogos de homenagens. Mas lembro-me de que fui, enquanto jogador do Benfica, a Old Trafford fazer a despedida do Alex Stepney, guarda-redes que tinha defendido o remate do Eusébio, na final da Taça dos Campeões Europeus, em 1968. O estádio estava completamente cheio, pois lá há essa cultura de despedir.

Quem é o Toni do actual plantel do Benfica
O meu padrão de exigência foi sempre muito alto. Eu era um jogador, do ponto de vista físico, possante. Do ponto de vista técnico evoluí para patamares bastante razoáveis. Tinha visão periférica do jogo. E compreendi o jogo numa altura em que o Benfica, para além da qualidade técnica, tinha também jogadores de grande qualidade tática. E isto elevou o Benfica para patamares bastante altos, pois tinha jogadores tática, técnica e fisicamente muito evoluídos. Eu não tinha a qualidade técnica de um atleta como o Vítor Martins, um jogador que andava sempre com a cabeça levantada e com a bola nos pés, mas tinha essa visão de jogo. Sabia jogar curto e longo. Nessa altura não havia o chamado 6, era o médio box-to-box, tal como era o Shéu. Acabei por fazer meios-campos com Jaime Graça, Coluna, Shéu, Vítor Martins, Vítor Baptista e até com o Eusébio. Chegou a existir um meio-campo com Toni-Eusébio-Simões para que lá na frente pudessem jogar Vítor Baptista, Jordão e Nené. Ao longo destes anos têm passado jogadores de grande qualidade pelo meio-campo do Benfica. Há um jogador de quem eu gosto muito, o Fejsa. É uma espécie de âncora à qual a equipa se agarra em termos de equilíbrio defensivo e tem sido determinante. Houve uma altura em que comparavam o Javi García comigo, mas ele jogava muito para o lado e para trás. Eu sou do tempo em que, quando se passava a linha do meio-campo, um passo para trás era um coro de assobios.

Qual o melhor jogador com quem jogou?
Tive o privilégio de jogar com muitos grandes jogadores. Há um que se mete logo de lado. O Eusébio é uma figura incontornável. Aquilo que mais me custa é comparar no tempo o Cristiano Ronaldo e o Eusébio. Não tem lógica. Além da qualidade de finalizador tinha também uma visão de jogo e uma capacidade de passe espectacular. Depois houve Chalana. Eu tenho uma frase, enquanto capitão, que foi “passem a bola ao menino, ele resolve”. E, atenção, ele tem menos treze anos do que eu, portanto estava no fim, e ele estava a começar. Com uma finta de corpo tirava dois adversários da frente. Tinha passe, visão de jogo e drible. De seguida, Humberto Coelho, que jogava em qualquer equipa do mundo. Um central de grande qualidade. Joguei com tantos grandes jogadores: Simões, Jaime Graça, José Augusto, João Alves, Nené ou Jordão. Mas, para mim, Eusébio é a figura máxima.

Falemos agora do seu lado mais pessoal. O Toni (do Benfica) todos conhecem. Quem é o António José Conceição Oliveira?
Ser chamado de “Toni do Benfica” é algo que não tem preço. Enche-me a alma e de orgulho. O António José Conceição Oliveira é alguém que ao longo da sua vida tem procurado defender valores e princípios que me foram transmitidos pelos meus pais. Depois fui bebendo os valores e princípios dos clubes por onde passei, desde o Anadia, passando pela Académica e, por fim, no Benfica. Sou frontal, solidário e penso que absorvo muitas das coisas boas que o futebol tem. Dentro de uma microssociedade que é o balneário desenvolve-se a amizade, a solidariedade e a vontade de vencer. Ou seja, tudo isso se enquadra nos tais valores e princípios que me têm guiado e que depois vão para o homem, o pai, o avô. Isto tudo contribuiu para uma sociedade mais justa.

“O maior desafio era provar que era capaz de o fazer”

Quando nasce o Toni treinador?
Comparando com o que é hoje a formação do treinador, no meu tempo foi muito mais por autodidatismo. Hoje há mais meios à disposição que permitem haver uma melhor preparação para se ser treinador. Eu tentei preparar-me o melhor possível, mas julgo teria já, ao longo do período em que fui capitão, algumas qualidades que poderiam fazer de mim treinador. O maior desafio era provar que era capaz de o fazer. Esse senti que o consegui. Considerava que tinha capacidade de liderança, tinha conhecimento, embora hoje tivesse de melhorar a comunicação, pois é tão ou mais importante que o conhecimento do jogo. Desde os tempos do senhor Mortimore e do capitão Mário Wilson, eu já ia retendo algumas coisas dos seus conhecimentos em cada treino. E já passaram uns 40 anos.

Como adjunto, qual o técnico que o marcou mais?
Eu termino a minha carreira como jogador e fico como adjunto do Baroti, juntamente com o Fernando Caiado. Depois, chega o Eriksson em 1982. Mais novo do que eu, mas com ideias sobre o jogo e treino muito simples. Isso acabou por motivar muito os jogadores, por esses meios de treino que simplificavam o jogo. Há um pormenor que mostra isso mesmo. Quando treinávamos havia à volta do campo umas torneiras de água para regar o relvado. Mas quando começávamos a treinar, as ordens que vinham era para fechar as torneiras para que não se pudesse beber água. Então o Eriksson arranjou um bidão para cada jogador para que se pudesse beber durante os treinos. Claro que teve a sorte de ter grandes jogadores. No ano antes de vir para o Benfica tinha ganho a Taça UEFA com o Gotemburgo, de onde acaba por trazer o Stromberg. Chega aqui e diz que íamos ganhar a Taça UEFA. Eu pensei: “este vem embalado”. Mas o certo é que acabámos por chegar mesmo à final com o Anderlecht. Foi um treinador que marcou mais pelos aspectos psicológicos do que propriamente com o treino. Uma das coisas mais importantes é que os jogadores acreditem no que têm à sua frente, que vão com o líder para todo o lado. É esse o papel que o treinador tem, e eu sentia, enquanto adjunto e antigo colega de muitos daqueles jogadores, que todos se sentiam motivados. Eram processos simples, mesmo com a barreira da língua em que eu ajudava traduzindo. As palestras não eram mais de que 10/15 minutos. Eu falava cinco minutos sobre a equipa adversária, e ele completava.

Como se dá a passagem para treinador principal?
A minha história no Benfica faz-me lembrar o período do Clube entre 1994 e 2000, em que andámos em navegação à vista, até que encontrou um rumo. E eu andei também um bocado em navegação à vista, com alturas conturbadas financeiramente. Acabei por substituir o treinador que veio para o lugar do Eriksson, um dinamarquês, o Ebbe Skovdahl. Ele sai, e nesse ano vamos à final da Taça dos Campeões Europeus com o PSV, em 1988. Eu fico um treinador interino, aquilo não correu nada mal, e levo o Benfica a uma final da principal competição europeia 20 anos depois. Depois há uma hipótese de ir para o PSG, tive uma reunião com eles antes da final, mas, como fizemos essa campanha, a direcção da altura resolveu apostar em mim, ficava baratinho. A época 1988/89 lá foi andando, e fomos campeões. Eu ganho o campeonato, mas “eles” lá acharam melhor fazer regressar o Eriksson. Até há uma história curiosa. Marcam uma reunião com o Eriksson, ele liga-me para eu o ir buscar ao aeroporto. Eu lá o fui buscar e depois acabo por estar na conversa em que ele é convidado para o meu lugar. Ser campeão e depois passar para adjunto é a primeira bazucada que dou nos pés. Actualmente era impensável. Mas, pronto, era o Benfica.

E depois volta para técnico principal…
Em 1992/93, o Tomislav Ivic sai, e volto a pegar na equipa. Ficámos em segundo e ganhámos a Taça de Portugal. Em 1993/94 é aquele ano em sai o Pacheco e o Paulo Sousa, esteve para ir o João Pinto, o Rui Costa e o Isaías. Eu não sabia se começava ou não a época até que aquilo lá se equilibrou. Ganhámos o campeonato, mas eu já tinha a sentença feita, outra vez. Mas já não podia ficar como adjunto. Mas aquilo que me movia era provar a mim mesmo do que era capaz, e fui capaz. Claro que senti que se perdoa sempre menos a quem é da casa. A verdade é que nenhum treinador é consensual, e havia aquela história de o Toni não ser treinador para o Benfica, e isso a mim ainda me dava mais força. Diziam que eu era defensivo… pois é, mas no ano dos 3-3 frente ao FC Porto, dos 4-4 em Leverkusen e dos 3-6 em Alvalade, era eu que estava no banco. Procurei sempre que as minhas equipas fossem sempre equilibradas, ofensiva e defensivamente. Esse foi sempre um factor que me guiou. Sem nunca descurar o espectáculo. Se eu puder ganhar por 5-4, é melhor que vencer 1-0. Prefiro ganhar a jogar bem, mas se tiver de vencer por 1-0 a jogar mal, não há problema, pois um treinador é sempre escravo do resultado, já dizia Mário Wilson.

Tem noção de que havia um “fantasma” Toni após a sua saída?
O futebol desencadeia sentimentos e paixões. O adepto vive de resultados e tem memória curta, pois, quando as vitórias não surgem, acabam logo por torcer o nariz. Mas é normal quando um treinador sai e sai a ganhar, e quando os que se seguem não ganham, seja recordado.

Qual foi o melhor jogador que treinou?
Que pergunta injusta, mas diria o Chalana, que eu já apanho numa fase complicada, depois da lesão. O futebol quando é jogado por artistas desta estirpe é muito mais bonito. Mal jogado é um desporto muito mau, mas quando é jogado por jogadores como Chalana…. Era um dos eleitos.

Uma história que nunca tenha contado…
Vou contar duas. Uma é referente ao Eusébio. Aquele remate que ele faz no final do tempo regulamentar da final com o Manchester (1968) e que poderia dar a vitória ao Benfica faz com ele tenha de ser operado. Nós íamos a uma digressão e, fruto de estar no contrato, ele tinha de entrar nesses jogos. Na Argentina, onde íamos ter um jogo, era inverno, e antes de ele entrar em campo era-lhe retirado líquido do joelho. Eu tinha 20 anos, e aquilo marcou-me muito. Nunca mais me saiu da cabeça essa imagem. Isto porque jogar com o Eusébio dava um cachet, jogar sem ele era outro. A outra história também tem que ver com essa digressão. No intervalo de um dos jogos, um elemento da direcção do Benfica entra no balneário e diz para ninguém entrar para a 2.ª parte. O intervalo era de um quarto de hora, e já passavam 25 minutos, e nós sem entrar. A razão é que ainda não tinha sido pago o cachet, então tiveram de andar a retirar o dinheiro das bilheteiras e só quando a direcção do Benfica recebeu o dinheiro é que nos foi dito para entrar.

O Benfica neste ano será campeão?
No ano passado senti que o Clube tinha um desafio muito grande pela frente, que era o Penta. Contudo, a saída de alguns jogadores e um jogo que não correu nada bem não o permitiram. Por isso partimos para esta época que todos os benfiquistas apelidamos de “Reconquista”. Porém, tivemos um primeiro objectivo que foi muito importante do ponto de vista financeiro e desportivo, a entrada na Liga dos Campeões. Esse apuramento pode-nos ter custado, em um ou outro jogo, alguns pontos, mas espero que não nos tenha afastado do nosso grande objectivo desta temporada. Sou muito pragmático e sei que a história do Benfica foi feita com as conquistas das Taças dos Campeões Europeus, mas sei também que nesta altura, do ponto de vista económico, há equipas que dão poucas hipóteses. Por isso espero que o Clube ganhe tranquilidade, que é muito importante, para que a equipa possa responder ao desafio. Acredito sempre até ao último dia.

Qual a sua opinião sobre Rui Vitória. É o homem certo?
Quem lidera tem de tomar decisões, como o presidente e o treinador, e é sempre dos alvos preferidos dos adeptos. Cada um deles dá o melhor para que a equipa possa seguir o seu caminho. Portanto, acredito em relação às opções do presidente que já definiu que Rui Vitória é o homem para o projeto. Todos os treinadores têm momentos menos bons, e Rui Vitória também os teve, mas tem demonstrado uma grande coerência. Quando os resultados não aparecem, há sempre contestação, mas esse não é o caminho a seguir.

O mundo do futebol é fértil em conhecimentos, mas muito parco em amizades. Quais aqueles que considera os melhores amigos do futebol?
Ao longo da minha carreira sinto que recebi muito dos adeptos do Benfica, mas também considero que fui mais transversal. Em função de saber ganhar e perder, de valorizar o adversário e conquistar o respeito e admiração, não só daqueles que tu defendeste, mas também o adversário. E eu sinto que ganhei esse respeito e admiração, fruto desse saber estar. Com defeitos também, não sou nenhum anjo. Muitas vezes me dizem que não são adeptos do Benfica, mas têm por muita admiração por mim, pelo respeito que tenho pelos outros. Isso é muito enriquecedor."

Vieira bem, Vieira mal

"O que fica da conferência de imprensa do presidente encarnado, no fim de vinte e quatro horas demasiado barulhentas

Antes de mais, um aplauso.
O que Luís Filipe Vieira fez esta quinta-feira merece um louvor. O presidente encarnado decidiu encerrar vinte e quatro horas tumultuosas na vida do Benfica com uma conferência de imprensa, na qual deu a cara, respondeu a todas as perguntas e não procurou bodes expiatórios.
O normal nestas situações é, cada vez mais, haver uma declaração sem direito a perguntas. Em casos muito esporádicos jura-se a pés juntos que é tudo mentira e atira-se as culpas para cima dos jornalistas, esses mentirosos compulsivos, dizem eles, que nunca escrevem a verdade.
Luís Filipe Vieira não fez nada disso. Disse que as notícias eram verdadeiras, que Rui Vitória esteve praticamente despedido e que a responsabilidade pelo mortal à retaguarda era dele.
Deu a cara e o peito, ficando agora à espera das balas. Foi corajoso e sério.
Para lá disso, a ideia que fica é que deixou Rui Vitória a queimar em lume brando. Por que esteve ele, afinal, praticamente despedido? Provavelmente porque naquela altura se pensou que já não era um treinador capaz para o Benfica. O que o fragiliza perante jogadores, adeptos e adversários.
Mas há mais.
Luís Filipe Vieira disse que duas das coisas que pensou durante a noite de meditação no Seixal é que, por um lado, se optasse por um treinador interino poderia «chamuscar» esse nome para o futuro e, por outro lado, não é fácil arranjar um treinador para o projecto do Benfica em 48 horas.
Rui Vitória tornou-se, desde esta sexta-feira, uma segunda escolha, portanto. Ainda que o presidente repita que continua a acreditar nele, que ele continua a ser o homem certo no lugar certo e que Jorge Jesus também esteve com um pé fora do Benfica, nada se torna mais importante do que aquelas palavras em forma de letrinhas pequeninas no final do contrato: as palavras que no final contam, porque não foi possível escondê-las.
Uma coisa é certa, portanto: no final destas vinte e quatro horas de rebuliço e barafunda, sobra a impressão que o Benfica ficou ainda pior.
Nada do que aconteceu nesta narrativa do sai, não sai, se calhar sai mesmo, afinal fica, beneficiou o clube, o ambiente em torno da equipa ou o sentimento de estabilidade que Vieira tanto preza.
O que nos permite regressar à conferência de imprensa para dizer que o presidente encarnado acertou na forma, mas falhou no conteúdo.
O saldo, esse, é negativo."

O direito de imagem dos praticantes desportivos profissionais

"Os desportistas profissionais, designadamente os futebolistas, são verdadeiros "role models" ou heróis para os seguidores e fãs apaixonados. Ademais, nenhuma realidade se implementou com a força e universalidade do desporto, principalmente quando percebemos que a FIFA congrega mais nações que a própria Organização das Nações Unidas (ONU).

O desporto é hoje uma actividade económica altamente lucrativa e o desporto anda de mão dada com a publicidade. No que aos direitos de imagem dos jogadores diz respeito, haverá que distinguir os direitos de imagem colectivos dos direitos de imagem individuais. No primeiro caso, e em conformidade com a legislação aplicável, os direitos de imagem são implicitamente transmitidos pelo jogador ao Clube ou à S.A.D., aquando da celebração do contrato desportivo.
Já a exploração patrimonial do direito de imagem individual não é cedida com o contrato de trabalho, este direito permanece na esfera do desportista, podendo ser objecto de cedência. Tornou-se, assim, necessária a criação dos chamados contratos de cedência de imagem.
O direito à imagem alcançou uma posição relevante no âmbito dos direitos da personalidade, graças ao extraordinário progresso das comunicações e à importância que a imagem adquiriu no contexto publicitário. A título de exemplo, recentemente, foi noticiado que, entre 2011 e 2014, Cristiano Ronaldo lucrou 138 milhões de euros em direitos de imagem, resultado dos anúncios que fez para marcas como a Nike, Coca-Cola, Emirates ou Tag Heuer e o próprio reconhece que tem de ser um exemplo fora e dentro do relvado.
Como se percebe, com a acentuada mediatização e mercantilização do desporto, converteu-se a imagem dos desportistas em objecto de comércio jurídico. As empresas que exploram a imagem dos jogadores, o Clube ou a S.A.D. utilizam a notoriedade do jogador, para campanhas de marketing e publicidade, divulgação de marcas, atracção de patrocinadores. Estes direitos de imagem estão também presentes nos contratos de transmissão dos eventos desportivos, nos contratos de patrocínio, nas licenças ou acordos de "merchandising", nos contratos em que os atletas são "Brand Ambassadors", etc.
O que muitas vezes não se percebe nestes negócios milionários é que os contratos de imagem também proliferaram como uma forma de contornar a fiscalidade, simulando-se e reduzindo-se a retribuição do contrato de trabalho e incrementando-se a remuneração acordada para o contrato de cedência de imagem, por questões de maximização fiscal e engenharia tributária.
Isto mesmo foi discutido em recente Seminário de Direito do Trabalho Desportivo, promovido pela Associação de Jovens Juslaboralistas e Associação Portuguesa de Direito Desportivo, na cidade do Porto, onde tive o gosto e a honra de participar como orador.
Um evento gratuito e aberto ao público em geral, onde se discutiram problemas relativos com cláusulas ou pactos de opção; as cláusulas de rescisão ou liberatórias; a CAP e o reconhecimento da desvinculação desportiva dos jogadores, bem como notas sobre a tributação de sociedades e praticantes desportivos."

Espírito de (uma) Missão

"A representação nacional é sem dúvida um dos momentos mais altos da carreira de qualquer desportista.
No calendário internacional de cada modalidade são já inúmeras as oportunidades em que Atletas, Treinadores, Equipas Multidisciplinares, Oficiais, Árbitros e Juízes levam consigo a bandeira nacional.
No entanto, nos eventos multidesportivos, à nossa bandeira acresce uma dimensão distinta, uma dimensão de equipa, uma dimensão de colectivo, uma dimensão de país, uma dimensão de missão. 
Para além dos Jogos Olímpicos de Verão e de Inverno, o calendário olímpico inclui hoje em dia tantos outros eventos que se organizam sobre a égide do Comité Olímpico Internacional, tais como os Jogos Olímpicos da Juventude de Verão e de Inverno, os Jogos Europeus, o Festival Olímpico da Juventude Europeia, de Verão e de Inverno, os Jogos Mundiais, os Jogos Mundiais de Praia, os Jogos do Mediterrâneo e os Jogos do Mediterrâneo de Praia.
A participação nas Cerimónias de Abertura e de Encerramento de um qualquer destes eventos torna presente a sua dimensão, a partilha entre modalidades, a partilha entre países e muitas das vezes representa também uma experiência que leva o trabalho, o esforço e a dedicação a novos patamares. 
Muitas das virtualidades destes momentos são vividos nas “Aldeias Olímpicas”. A partilha de um espaço comum fora de competição onde não existem influências de raças, de crenças políticas ou religiosas e longe dos holofotes da comunicação social, permite a cada um dos participantes um registo mais informal onde se constroem amizades, onde se trocam experiências, onde se priva com as referências de cada modalidade, onde se conhecem as semelhanças e as diferenças entre os caminhos, os desafios e a preparação de cada um.
Também a concentração dos melhores Atletas nacionais das diferentes modalidades desperta o interesse da comunicação social, tornando a atenção mediática sobre cada uma das Missões mais uma experiência para aqueles em que o acompanhamento e o reconhecimento da opinião pública não é tão presente como seria desejável.
Mas a Missão de Portugal é também a soma dos sonhos e das missões individuais de cada um. A exigência dos processos de preparação e das provas de qualificação, quando traduzida na selecção para a integração de uma Missão é, por si só, uma recompensa de um percurso dedicado ao desporto. 
A possibilidade de disputar o momento singular de cada uma destas competições, a possibilidade de lutar pela entoação do hino nacional no final de cada prestação move cada um dos participantes do movimento olímpico.
E é esta exclusividade, esta singularidade de cada um destes momentos, que se encontra reservada a um conjunto restrito de atores, que inspira Atletas, Treinadores e todos aqueles se envolvem na preparação, na participação e na representação nacional nos diferentes palcos.
É por tudo isto, com orgulho de Portugal, com espírito de Missão, que em cada uma destas oportunidades vamos construindo a nossa história olímpica."

quinta-feira, 29 de novembro de 2018

Crime, digo eu

"É uma imagem que não me sai da cabeça: aquela mãe a cobrir a cintura do pequeno filho com engenhos pirotécnicos, para assim entrar tranquilamente no Estádio Monumental, na final da Libertadores, sem ser revistada.
Mãe?!
Pelo menos, e entretanto, foi condenada a dois anos e oito meses de prisão, com pena suspensa (onde é que eu já vi isto?), mas fica desde já impedida de entrar em recintos desportivos. Cá como lá, tenho dúvidas que isso aconteça. A investigação está no início, mas o ideal mesmo seria ficar impedida de ver o filho. Porque uma mãe que faz isto, não merece o filho que tem.
O episódio foi um de muitos que marcou a final da Taça Libertadores, que entretanto acabou adiada. Agora que nem sequer se vai realizar na Argentina, mas já lá vamos.
O autocarro da Boca Juniors foi barbaramente atacado por adeptos do River, mas sabem qual a capacidade do Estádio Monumental? É o maior da Argentina, com mais de 60 mil espectadores. E sabem quantos foram os adeptos que provocaram o caos? Identificados foram trezentos, os mesmos de sempre, dizem na Argentina. E sabem que mais? Já ganharam! Entre avanços e recuos o jogo acabou mesmo por não se realizar naquele dia e essa foi para eles a grande vitória. E quem é que perdeu? Todos os outros que não viram aquele que deveria ser um dos melhores espectáculos do Mundo.
Um deles chama-se Gabriel Hugo Lanza, era sócio do River mas deixou de o ser: «Rendo-me, não consigo mais. Este país é uma merda; estes políticos são uma merda; o fanatismo é uma merda». Esta publicação no Facebook tornou-se viral e por isso esta decisão radical ficou conhecida, mas de certeza que Gabriel não foi o único a tomar esta atitude.
A segunda mão vai agora jogar-se em local incerto, a 8 ou 9 de Dezembro. Parece que a cidade de Doha no Catar reúne as preferências. Certo mesmo é que não será no Monumental onde Pablo Pérez, um dos jogadores atingidos no ataque ao autocarro do Boca, garantiu que não jogava: «Não vou jogar num campo onde posso morrer. Se jogássemos e ganhássemos matavam-me. Tenho mulher e três filhas. A mais velha abraçou-me a chorar quando cheguei a casa.»
Sabem que mais? Já não quero saber. Jogue-se onde se jogar, já não vou ver. Perdi o interesse. Já não me interessa!"

A loucura verde e as mulheres brancas

"Cravan gostava de suicidar-se. Tinha uma carta sempre no bolso. Sussurava aos amigos: «Je mangerais ma merde». Desapareceu

Fabian Avenarius Lloyd podia não ter medo nenhum de andar à porrada mas não estava virado para combater na I Grande Guerra. Por isso, como se diz popularmente, pôs-se ao fresco. E neste caso a expressão é do maior realismo: arranjou um barquito à vela e atirou-se ao mar de Salina Cruz, ali em Oaxaca, no México, decidido a só sair dele quando chegasse à foz do Rio de La Plata, na Argentina, bem longe dos campos da Flandres onde as papoilas de John McCrae cresciam por entre cadáveres. A mulher, Mina Loy, embarcara dois dias antes num navio. Estava grávida e o casal não tinha dinheiro que chegasse para duas passagens.
Mina gostava do mar. E do azul. Escreveu um poema sobre o Mediterrâneo:
«The monstrous sapphire
lies in her lavish dowry
Crowned by Casinos
et with Provençal
olives
and spears to the mistral».
Era uma boémia por natureza, uma daquelas almas livres que trazem consigo um pedaço de papel para atirarem poesias ao vento. Esperou por Fabian em Buenos Aires e esperou em vão. Há quem diga que o mar o levou. E há quem garanta que não.
Vendo bem, Mina não esperou por Fabian. Esperou por Arthur. Seis anos antes, Fabian mudara de nome em homenagem à sua amante de então, Renée Bouchet, natural da aldeia francesa de Cravans. Ficou Arthur Cravan. E os seus versos eram torrenciais:
«Prendre tous les trains et tous les navires
Forniquer toutes les femmes et bâfrer tous les plats
Mondain, chimiste, putain, ivrogne, musicien, ouvrier, peintre...».
Como seria de esperar de um casal de poetas levaram a vida à beira do precipício. E o precipício de Arthur foi o mar. Morreu aos 31 anos, cedo, mas não foi um cadáver bonito. Porque nunca foi cadáver. O corpo de Cravan pode ter sido engolido por uma onda colérica do Atlântico mas ele era suficientemente criativo para inventar mais uma vida. Já o tinha feito e prometera aos amigos voltar a fazê-lo. «Tenho vinte países na minha memória e carrego as cores de centenas de cidades na minha alma». Adorava representar suicídios. Era agressivo, insultuoso, andava com uma garrafa de absinto no bolso do casaco junto com uma nota de despedida. E garantia que no dia em que se matasse deixaria a carta embrulhada no mesmo pano em que embrulharia os testículos.
Foi pela mesma altura que Cravan e o mar se tornaram num só futuro e passado ao mesmo tempo que Almada Negreiros ordenou:
«Despe-te da farda
desenfia-te da Impostura
e põe-te nu, ao léu
que ficas desempregado!».
Arthur desempregado da guerra. Nunca vestiria uma farda! Queria escolher os seus próprios inimigos e os seus aliados. Viveria entre os factos e acontecimentos virtuais, dono da sua própria biografia. Uma fatal pluralidade, chamou-lhe. Lia poemas para o público em cima de um palco, equilibrado numa perna só, e apresentava-se: «I’m Arthur Cravan. Poet & Boxer!». Tirava a camisa, mostrava a peitaça, esticava os músculos e sussurrava, em francês, a língua que usava com os íntimos: «Je mangerais ma merde».
É muito fácil escrever sobre Arthur Cravan. Aliás ele escreveu-se sem pruridos: «Dancing, fucking, boxing, walking, running, eating, swimming». Eu gosto de escrever sobre Cravan e sobre os milhares de episódios que se empilharam desacertadamente sobre a sua vida curta, ou talvez não. Ele endeusava Oscar Wilde, não por acaso seu tio, e Jack Johnson, outro Arthur, o Gigante de Galveston, o primeiro negro campeão do mundo de pesos pesados. Em Abril de 1916, nas Canárias, à míngua de tostões, nem sabia viver de outra forma, desafiou Jack Johson para um combate combinado e aguentou-se como pôde. Ganhou que chegasse para rumar a Nova Iorque. E ter, como já vimos, outra existência e, também, o final dela e das outras todas. O seu descaramento era suficiente para se intitular Campeão da Europa. E para ficar ao lado de Jack quando este se viu perseguido pelas autoridades americanas. Motivo? «Immoral purposes!».
Jack Johnson era igualmente descarado. Tão descarado que só teve mulheres brancas, de Alma Toy a Etta Terry Duryea, de Lucille Cameron a Irene Pineau. Coisa que o estúpido puritanismo não aceitava de bom grado. Foi acusado de viajar com mulheres brancas entre Estados com objectivo de comportamentos imorais. Se esta acusação era absurda, o facto de usar as companheiras como saco de pancada não era brincadeira nenhuma. Foi condenado a um ano de cadeia. Fugiu. Esteve sete anos a combater pelo planeta até que decidiu aceitar os doze meses de reclusão na penitenciária de Levenworth. Quando lá chegou, Cravan já era o fantasma eterno. Tinha escrito:
«Deixando as dívidas para trás
Rebolei como um ovo na verde loucura da relva...».
Talvez a sua loucura fosse verde. Verde-absinto."

Afonso de Melo, in Sol

Entre os anos e as horas

"Koweit – O escritor brasileiro Lúcio Cardozo sobressaltou-se no dia em que fez 40 anos: “Não sei como isto foi acontecer. Logo a mim, que tenho um talento tão grande para ser criança!”
Há 20 anos, o Toni estava no Dubai e eu estava lá com ele. Salvo erro, precisamente por esta altura. Era colaborador do Carlos Queiroz na selecção dos Emirados. Estavam também o Costa, e o Meszaros, e o Rolão Preto, e o Catoja, que nunca largava a viola.
Não sei se é por causa da bola (há lá algo mais infantil do que uma bola?!), mas a gente, quando se junta, tem um certo talento para ser criança. Crianças com histórias e com memórias. Não se pode dizer que a tarefa dos responsáveis pela selecção dos Emirados fosse muito exigente na altura. Períodos de estágio e observação de jogadores. Poucos: a qualidade não abundava. Uma viagem a Abu Dhabi para ver um jogo, outra um pouco mais longe, na fronteira do Omã, a Al Ain, onde o Nelo Vingada e o António Simões treinavam o clube.
O Carlos e o Toni eram vizinhos, num prédio na zona de Deira, janelas largas para um mar infinito. Dávamos uns passeios de barco, para lá de Jumeirah, até àquele lugar em que o edifício em forma de vela de Burj El Arab se ergue num perfil sem igual. Depois, em casa, eles discutiam pagamentos em atraso. Sentados no sofá, faziam contas dos meses que a federação lhes devia. Estava um dia de sol que estalava as vidraças, tínhamos combinado ir à praia, privada, claro, a exigir cartão de sócio. A Manuela, mulher do Toni, atenta ao que diziam, olhava o azul das águas do Golfo. Depois, pôs fim ao debate: “Mas vocês querem receber a que propósito se não fazem nada?”
Passava da meia-noite em Salmiya, no 12.o andar do Toni aqui no Koweit. Esperávamos pelo River Plate-Boca Juniors que não existiu. E desfiávamos lembranças pela madrugada com a sensação de que os anos passam tão depressa e as horas tão devagar..."

A senhora do 9D

"Manama - Quando a senhora sentada a meu lado no voo da Gulf Air que nos trouxe do Koweit ao Bahrein soltou um grito, percebi que tinha estado demasiado absorto nos atropelos onírico-sexuais de Jonathan Littell em “Uma História Antiga”. Olhei para ela com um pouco mais de atenção e vi até ao fundo dos seus olhos absolutamente negros um brilho horrorizado. Depois, o avião repetiu o mergulho, e o sabor do chá de menta veio-me à boca por via daquele tal fenómeno das mudanças de temperatura que provocam o aumento do dióxido de carbono. A senhora do lugar 9D voltou a gritar. 
Reparei que havia gente a rezar, sei lá eu a que deus se não acredito em nenhum. Não me passou pela cabeça ter medo. Nem coragem. Nem coisa nenhuma se não observar o que se passava em redor com a curiosidade própria dos que, de vez em quando, têm a possibilidade de assistir ao momento em que a espécie humana está à beira de borrar as calças, imagem muito grotesca para aqueles que ainda têm fé na espécie humana. De alguma forma, passar a vida em aviões e dar demasiada importância ao tempo que faz lá fora torna-se tão incongruente como um Vasco da Gama que enjoasse.
Desconheço por completo a resistência dos materiais aeronáuticos perante a violência das tempestades, mas creio serem bastante mais fiáveis do que os da nau São Gabriel mesmo que estivéssemos a abanar por todos os lados, da popa à proa, e a receber jactos de luz dos relâmpagos como se o tal deus dos meus companheiros do voo GF 214, entre a Cidade do Koweit e Manama, estivesse entretido a tirar-nos fotografias com uma câmara equipada com flash. Nem poderia fazê-lo de outra forma: o céu estava escuro como breu.
Guimarães Rosa gostava de dizer que mais vale cair de um sonho do que de um terceiro andar. Ora, 35 mil pés de altitude ficarão ligeiramente acima de um terceiro andar mas consideravelmente abaixo de um sonho. Neste caso, um pesadelo.
Nunca tive medo, pânico, fobia, nervoso miudinho ou qualquer um desses sentimentos que costumam ser associados a aviões, mas é óbvio que, se um dia tiver de tombar lá do alto dentro de um, gostaria que a pessoa no lugar a meu lado não fosse um gordalhão parecido com o Bud Spencer a suar em bica das mãos peludas. Até porque haveria uma possibilidade bastante espontânea de ele querer dar-me a mão nesses segundos definitivos.
Voltei de novo a minha atenção para a senhora do lugar 9D, a meu lado. Não lhe senti nenhuma necessidade de me dar a mão, até porque as levava juntas e agarradas uma à outra como se tivessem a vida lá dentro. Já não gritava, mas murmurava qualquer coisa volta e meia e eu não percebia onde é que ela queria chegar. A casa, certamente.
Senti um certo alívio por me terem arranjado um lugar ao lado de uma mulher bonita numa situação de eventual emergência, dispensando-me do Bud Spencer, do Kirk Douglas, do Gian Maria Volonté e até do senhor general Ramalho Eanes, todos eles companhias menos estimulantes num momento desgraçado.
A senhora do 9D cheirava a flores e senti que isso era ligeiramente tétrico. O avião foi descendo, lá como pôde, entre trancos e barrancos, e os seus olhos eram olhos compridíssimos de criança, com uma tristeza perdida que parecia não encontrar lugar por onde sair. Podem escrever-se poemas sobre olhos assim.
Não sei se já vos disse que a senhora do 9D era linda de morrer, se o termo vem a propósito. Estava completamente vestida de negro. Vi-lhe uma lágrima que não desmentia a verdade assustadora do sal. Um véu tapava-lhe a testa, descia-lhe pelo nariz, abrindo fendas para os olhos, prendia-se por detrás das orelhas e fazia-lhe desaparecer a boca e o queixo e o pescoço. Quando aterrámos, sorri-lhe, cúmplice.
Posso não ter visto, mas ela sorriu-me de volta."

Benfiquismo (MXIX)

"Despedido", "perdoado", "despedido" novamente...!!!

Boa vitória, mas ainda falta a 2.ª mão...


Benfica 3 - 0 Iraklis
25-15, 25-23, 25-23


Resultado enganador, o 1.º Set foi fácil, mas os outros dois foram equilibrados e no 3.º estivemos quase sempre em desvantagem... Na Grécia não será fácil... Hoje decidiu o Rapha!!!

quarta-feira, 28 de novembro de 2018

Benfica, primado do poucochinho...

"De Munique não chegaram boas novas para a nação encarnada. A equipa de Rui Vitória continua anémica, muito longe do exigível a quem ainda na Champions com outras responsabilidades para além do cumprimento do calendário. Não há dúvida de que os últimos dois anos na liga milionária não contribuíram em nada para o prestígio do Benfica, com exibições a anos-luz de outras equipas de águia ao peito que, entre 1961 e 2014, ganharam o respeito da Europa, participando em dez finais da UEFA.
Mas chega de chorar sobre o leite derramado e passemos a questões menos nostálgicas e mais práticas.
O Benfica precisa de uma solução, porque o estado das coisas não é compatível com as obrigações do clube, nem externas nem internas. Pouco importará se essa solução será encontrada, ou não, num quadro que mantenha Rui Vitória como homem do leme. Importante é que tem a responsabilidade de tomar decisões na casa encarnada tenha bem interiorizado que o caminho que está a ser trilhado não é compatível com o investimento realizado no plantel, onde há jogadores pagos a peso de ouro que estão votados ao mais absoluto ostracismo e outros que mais não são do que sombras tristes daquilo que valem. Na equipa do Benfica, ao dia de hoje, falta confiança e sobram dúvidas. Certeza única e indesmentível é o desencanto dos adeptos, que se tem traduzido por inúmeras manifestações de desagrado. E sendo verdade que um clube não pode ser dirigido de fora para dentro, não é menos verdade que há realidades que se metem pelos olhos dentro. Segue-se o Feirense. Balão de oxigénio ou mais um passo rumo ao vazio?"

José Manuel Delgado, in A Bola

Exclusão do Futebol da redução da taxa do IVA é um atentado à moralidade politica

"Os Deputados do hemiciclo aprovaram a redução do IVA para 6% em todos os espectáculos culturais, incluindo as touradas, deixando de fora o Futebol.

A Assembleia da República aprovou a redução do IVA para 6% em todos os espectáculos culturais, incluindo as touradas, deixando de fora, conforme se temia, o Futebol.
Ficamos todos, assim, a saber que os senhores Deputados comparam o futebol profissional e o desporto em geral a espectáculos de carácter pornográfico ou obsceno, já que passa a partilhar com estes a excepção de aplicação da taxa máxima de IVA (23%).
A decisão agora tomada, que exclui o futebol da extensa redução do IVA, é um atentado à moralidade política, já que não só estabelece a referida comparação, como também expõe ao País um exemplo do que é não honrar compromissos assumidos e penalizar quem muito se sacrificou, sem reclamar, num momento de austeridade, muito difícil para Portugal.
Até 2012, o desporto partilhava com a música a aplicação da taxa mínima de IVA, contribuindo para cumprir o estabelecido no n.º 1 do artigo 79.º da Constituição da República Portuguesa: todos têm direito à cultura física e ao desporto. A exclusão da redução do IVA para os espectáculos desportivos é, desta forma, também, uma profunda contradição com aquilo que estabelece a Constituição. 
Portugal percebeu hoje que os valores civilizacionais da maioria dos Deputados na Assembleia da República excluem o Desporto, ostracizam o Futebol e não privilegiam a honra do compromisso assumido. É uma péssima imagem para o País, com prejuízos para o Desporto, o Futebol Profissional e a sociedade portuguesa em geral. Um desrespeito para com os milhões de portugueses que, semanalmente, vão aos nossos estádios, ocupando o seu tempo com um espectáculo criado exclusivamente pelas instituições desportivas.
Se há outros espectáculos que, embora muito pouco unânimes na adesão aos mesmos, recorrem à tradição cultural para justificar a redução do valor do IVA, o que se poderá dizer do futebol? Que não tem tradição na sociedade portuguesa, que é um exclusivo de uma região do país? É um absurdo!"

A (de)formação no futebol

"(...) «este modelo competitivo tem jogado no sentido oposto ao melhor estímulo para a evolução: a dificuldade, a competitividade» (...)

Os resultados recentes das equipas nacionais, ao nível da formação, parecem um indicador claro do excelente trabalho que se está a fazer em Portugal nesse sentido. E sendo que há mérito na forma como temos aproveitado melhor alguns dos futuros talentos nacionais, a maior fatia desse mesmo mérito é dos clubes que trabalham diariamente com os jogadores. Poderia começar por falar dos jogadores que se destacam de forma evidente e só aparecem nos sub-20 ou sub-21, ou no modelo que observa fundamentalmente quem não precisa de tanta observação (com foco nos clubes “grandes”), mas parece-me mais urgente falar das lacunas do nosso modelo competitivo.
Olha-se para as selecções nacionais e as convocatórias são, naturalmente, dominadas pelos jogadores do Benfica, do Porto e do Sporting. Afinal, é neles onde a maior parte dos melhores jogadores está concentrada. E é precisamente aí que reside o grande demérito da Federação. O modelo competitivo permite que os “clubes grandes” monopolizem a qualidade, e não obriga a que se aperte muito o critério na hora de se escolherem os jogadores. Isto é, as equipas mais poderosas - por terem melhores condições financeiras - têm a possibilidade de inscrever um número de equipas igual ao número de campeonatos que há para disputar no mesmo escalão, e ao nível das Associações de Futebol inscrevem-se equipas no mesmo campeonato pelo número de séries.
Podemos culpar os clubes por não estarem a dar o melhor estímulo ao nível de competitividade aos jogadores por inscreverem tantas equipas, mas os clubes defendem-se dizendo que têm o melhor modelo de treino para evoluir os jogadores, os melhores treinadores, e as melhores condições estruturais. Já para não falar que se eles não o fizerem, a equipa A, B, ou C vai fazê-lo e eles não querem correr o risco de perder talentos para os rivais. E é neste modelo que faltam normas que nos permitam chegar mais longe nas condições que oferecemos aos nossos jovens jogadores para evoluírem.
Olhemos, por exemplo, para os defesas ou para os guarda-redes das equipas de maior nomeada. A maior parte das equipas que os defrontam, pela diferença abismal de qualidade, está tão convencida que vai perder e que não pode lutar pelo resultado que joga apenas para evitar um resultado avolumado. Ou seja, fecham-se perto da sua baliza o jogo inteiro, com linhas defensivas de seis elementos, ou duas linhas de cinco elementos, com o objectivo único de retardar ao máximo os golos sofridos. Porque é certo que vão sofrer golos, e é quase certo que vão sofrer muitos, aparece a necessidade de se defenderem de um resultado muito desnivelado. Afinal, estamos num país onde os resultados na formação contam imenso, não é?!
Acaba por ser contraproducente para os guarda-redes e para os defesas das equipas grandes passarem o ano inteiro onde apenas em quatro, cinco, ou seis jogos, são colocados à prova. E no resto do tempo o que fazem? No jogo, não têm situações defensivas, perto da sua área, em volume suficiente para desenvolverem as suas capacidades; e sequer são obrigados, jogando alto, a proteger a profundidade de forma rigorosa e a sobressaírem nos duelos defensivos, porque o adversário tem tão poucas situações para sair, e tem os jogadores todos tão longe dos defesas e do guarda-redes, que dificilmente se sentem ameaçados. Como é que se desenvolvem os aspectos defensivos destes meninos, a defesa da baliza dos guarda-redes, a concentração e o rigor, se os erros que cometem dificilmente são penalizadores?! Com esta margem enorme para errar, sem penalização, o estímulo acaba por ser muito fraco na maior parte do tempo.
O mesmo é válido para os aspectos ofensivos. Estamos a falar de uma esmagadora maioria dos jogos onde o guarda-redes e os defesas não são pressionados quando têm a bola, e apenas têm que passar ao colega que está sempre livre sem qualquer risco. O maior risco é a sua própria execução, e eles também sentem que mesmo errando não haverá grandes consequências. A construção limita-se às situações em que têm todo o tempo e espaço para decidir o lance. Como é que estes jogadores aprendem a jogar com o risco de perderem a bola e a situação acabar num golo ou num lance de finalização? Como é que se tornam mais capazes de jogar sob-pressão se nunca são pressionados? Como é que aprendem a conviver com o erro?
Este modelo competitivo tem jogado no sentido oposto ao melhor estímulo para a evolução: a dificuldade, a competitividade. A transFormação do nosso modelo é fundamental para sermos mais capazes, e conseguirmos mais regularmente aproveitar e estimular melhor mais talentos nacionais. E para tal basta que no topo da cadeia se faça uma limitação no número de equipas que cada clube pode inscrever em cada escalão (duas), e uma limitação no número de jogadores inscritos por escalão (por exemplo, entre juvenis A e juvenis B, cinquenta).
Disto poderá resultar a necessidade de criação de protocolos com outras equipas, ou na criação de equipas com outros nomes por parte dos “grandes clubes”. A primeira situação seria a ideal para o desenvolvimento das equipas menos abastadas; a segunda situação, não sendo tão boa para esses clubes, continuaria a permitir um estímulo melhor para todos os jogadores, uma vez que seriam muito mais o número de vezes que todos os jogadores teriam que enfrentar jogadores melhores, com estratégias mais arrojadas para tentar vencer e não apenas para evitar perder."