quinta-feira, 30 de novembro de 2017

Parasitas e cágados assassinos

"Quem gosta de futebol sabe que, entre o nosso olhar de fora e as decisões dos treinadores, há sempre enormes discrepâncias. Os treinadores lidam com coisas que nem imaginamos. Equilíbrios políticos nos balneários. Lesões e falsas lesões. Negócios ínvios. Afirmações de poder. Depois, por vezes, inventam mais do que Deus dá. Os excessos de pressão levam a isso. Os excessos de auto-estima, também. Não vou recordar mais do que o desastre decidido por um técnico de qualidade extra, Jorge Jesus, ao colocar David Luiz, na esquerda a marcar Hulk. Lembram-se?
Estamos, hoje, na véspera de um escaldante FC Porto-Benfica. Tem toda a razão Rui Vitória, quando evoca o triângulo virtuoso: jogadores, treinadores, árbitros. São estes agentes, e apenas estes, que podem arrancar o futebol das garras dos parasitas que o têm sequestrado nas últimas décadas. Para o entregar à sua razão final – os adeptos.
Não esperemos que, nas palavras de hoje, Sérgio Conceição ou Rui Vitória sejam brandos ou vácuos. A missão dos líderes técnicos, na véspera de um grande jogo é deixarem ideias no ar. A pairar luz sobre o seu exército e a cair tempestade sobre as forças adversárias. Quanto melhor, mais assertivo, for o discurso de cada um dos técnicos, mais promete o duelo sobre a relva, aprazado para amanhã. 
Cada um dos técnicos tenderá a incluir no seu discurso figuras de estilo, destinadas à interpretação da terceira equipa em campo. O terceiro vértice do triângulo definido por Rui Vitória. Triângulo, cuja descodificação, Sérgio Conceição subscreveria na íntegra, não estivesse em véspera de um grande duelo.
Todos os homens do futebol sabem que tudo, num grande clássico, se deveria passar entre o triângulo confinado por jogadores, treinadores e árbitros. Com as paixões a pulsar nas bancadas do estádio e nas televisões de todo o Mundo em Português.
São os parasitas, os cágados, regurgitantes em torno deste maravilhoso fenómeno, o futebol, que o estragam e tornam azedo. Irão matá-lo, se deixarmos.
Muito pior do que um técnico, ou um jogador que não aguenta a pressão, e assim fica negativamente na história de um clássico; muito pior do que um árbitro medroso, que por isso grava o seu nome a negativo na memória colectiva – mesmo na dos vencedores –; muito pior do que tudo o que possam fazer quaisquer agentes do triângulo virtuoso definido por Rui Vitória; muito, muito piores, do que tudo isso, são a acções dos senhores de cinzento, que estão no futebol, nas suas tribunas ou túneis, como poderiam estar no boxe ou no póquer, só para poderem vender resultados condicionados. E com isso julgam achar que ganham a vida. Mesmo que com isso matem lentamente a paixão. E, com ela, a dimensão mágica do jogo."

Cemitério de elefantes

"Júlio César, guarda-redes do Benfica, decidiu colocar ponto final na sua relação com os encarnados. Aos 38 anos, tricampeão em Portugal (81 jogos de I Liga disputados), depois de ter sido pentacampeão de Itália ao serviço do Inter de Milão (228 jogos realizados na Série A), clube com que se sagrou campeão europeu, sendo eleito melhor guarda-redes da UEFA em 2009/10 e contando no currículo com 87 internacionalizações A pelo Brasil, Júlio César terá entendido não estar nas melhores condições para prosseguir a sua aventura na Luz.
O futebol português deve estar agradecido a uma grande figura do panorama internacional, como Júlio César, pelo que de bom mostrou entre nós, especialmente na primeira temporada, e pela visibilidade externa que deu ao nosso campeonato. Júlio César despede-se de Portugal, como fizeram no passado monstros sagrados das balizas como Ferenc Meszaros, Joseph Mlynarczyk, Peter Schmeichel, Michel Preud'homme, num caminho que também estará a ser trilhado por essa lenda do futebol mundial que dá pelo nome de Casillas. Na simbologia do cemitério de elefantes, Portugal teve muito gosto em recebê-los. Embora a busca dos nossos clubes esteja essencialmente virada para promessas susceptíveis de serem potenciadas, não será demais lembrar a importância que grandes jogadores em fim de carreira têm assumido no futebol nacional, de Teófilo Cubillas a Salif Keita, passando pelo incontornável Pablo Aimar. Não é por este tipo de contratações que os clubes lusos se têm dado mal. O problema é quando contratam jogadores estrangeiros indiferenciados, por razões abstrusas..."

José Manuel Delgado, in A Bola

Sporting e Benfica intocáveis até perto do intervalo

"Após a realização de 12 jornadas, os rivais da Segunda Circular estão praticamente lado a lado na perseguição ao líder FC Porto, já que apenas 1 ponto separa leões e águias, com vantagem para a formação de Alvalade. Contudo, as semelhanças entre o desempenho das duas formações não se ficam por aí, sendo de destacar que têm exactamente o mesmo número de golos sofridos (8) com a particularidade de somente terem encaixado 1 no decorrer da primeira parte. Mais: em ambos os casos o golo dos adversários aconteceu ao minuto 43!
Dito de outra forma, Sporting e Benfica são praticamente intocáveis até ao descanso, isto apesar das águias, paradoxalmente, terem visto o Sp. Braga marcar-lhes um golo na primeira metade logo da ronda inaugural (Hassan). O jogo, contudo, terminaria com o triunfo dos lisboetas (3-1). Mais sorte teve Rafael Costa, do Moreirense, o único a bater Rui Patrício antes do intervalo, na jornada 7. É que esse golo valeu 1 ponto aos cónegos, já que o encontro fechou com uma igualdade (1-1).
FC Porto, Marítimo, Rio Ave e Boavista também apresentam defesas bastante sólidas na primeira parte, já que somente encaixaram 2 golos. Curiosamente, tanto estes quatro emblemas como Sporting e Benfica sofrem mais golos na segunda parte, período em que o melhor registo pertence a FC Porto e Sp. Braga (3 golos sofridos).
Os rivais lisboetas (a exemplo de Marítimo e Rio Ave) já encaixaram 7 golos na segunda metade, com a particularidade dos leões sofrerem todos na derradeira meia hora (6 no último quarto de hora). Mas, verdadeiramente inesperado é perceber que neste período Sporting e Benfica não perdem só para FC Porto e Sp. Braga, mas também para o... Feirense.
A equipa de Santa Maria da Feira (que foi batida 13 vezes na etapa inicial, o pior desempenho da Liga a par do V. Guimarães) só concedeu 4 golos após o descanso, num registo deveras improvável. O Estoril, com 15 golos sofridos na segunda parte, é a formação que mais vacila após o reatamento, sendo que V. Setúbal (14) e Portimonense (13) não estão consideravelmente melhor.

Sabia que...
» O Estoril vai em 6 jogos sem marcar? Apesar do nulo fora diante do Marítimo, a equipa continua débil na finalização.
» Jonas foi o sétimo jogador a conseguir facturar num mínimo de 10 jornadas seguidas na história do campeonato ? Antes do goleador brasileiro do Benfica, também Peyroteo (1937/38 e 43/44), Julinho (49/50), António Teixeira (53/54), Edmur (57/58), Azumir (61/62) e Fernando Gomes (84/85) tinham cometido tal proeza.
» O Portimonense terminou um jogo sem sofrer golos? Os algarvios conseguiram fechar a baliza no triunfo caseiro perante o Tondela (2-0).
» O V. Setúbal vai em três rondas seguidas com jogadores expulsos ? Nuno Pinto foi a última vítima, depois dos também defesas Vasco Fernandes e César.
» Esta foi a terceira jornada sem penáltis? Antes, nas rondas 1 e 7, também se verificara o mesmo cenário."

“O que se passa no Universo Porto da Bancada é um crime cometido semanalmente”

"1. Um director de comunicação deve dar entrevistas a jornais? Se sim, porquê?
Um director de comunicação numa entidade com as características de um clube com a dimensão global do Sport Lisboa e Benfica assume muitas vezes o papel de porta-voz da instituição, sendo natural que dê entrevistas sobre temas da actualidade aos mais variados órgãos de comunicação social. Mas os principais protagonistas mediáticos de um clube devem ser o presidente, os órgãos sociais, os treinadores e os atletas.

2. Dado o seu passado profissional, o director de comunicação representa um papel, ou melhor, é forçado a representar um papel público quando assume funções para chegar aos seus adeptos?
O vínculo [Luís Bernardo foi jornalista e assessor] que tenho ao SLB é no âmbito de uma prestação de serviços, através de uma empresa de comunicação na qual sou administrador. Sou profissional com mais de 20 anos de direcção de diferentes entidades ao nível de comunicação, nunca fui nem sou forçado a fazer qualquer papel imposto que contrarie a minha vontade. No Benfica não se entende este cargo como uma espécie de animador ou instigador.

3. Ainda consegue retirar prazer ao ver um jogo de futebol?
Claro que sim.

4. Assume alguma responsabilidade nesta escalada verbal que se assiste em alguns programas de TV?
Nunca me viram a responder a jornalistas e comentadores e tenho procurado manter um registo institucional na comunicação do clube.

5. Qual o envolvimento dos presidentes na elaboração destas estratégias de comunicação?
O presidente define as grandes linhas de orientação em todas as áreas relevantes do clube, e depois a concretização dessa estratégia e a gestão do dia a dia é feita pelos profissionais dos diversos sectores. 

6. Os treinadores estão a par e/ou são chamados a envolverem-se?
Existe uma articulação entre a comunicação institucional e o futebol, respeitando-se claramente as naturais especificidades de cada área. Aqui não é necessário haver recados ou clarificações sobre, por exemplo, quem fala em nome do futebol do clube.

7. Porquê a existência de programas de televisão como “Chama Imensa” e “Universo Porto da Bancada”?
O “Chama Imensa” é um programa que existe há três meses na BTV e está em linha com diferentes programas de análise aos jogos do fim de semana. É perfeitamente natural e justificável a sua existência, desde que a denúncia de determinadas situações não seja o único fundamento para a sua existência.

8. Programas como estes fazem parte de uma estratégia comunicacional? Com que objectivo? E que dividendos se retiram daqui?
Não podemos comparar um programa que há mais de um ano faz da sua essência o ataque sistemático a um outro clube rival com um programa como o “Chama Imensa”, que só esta semana esteve a abordar especificamente um conjunto de informações que entendeu tornar públicas.

9. Tem noção que a agressividade deste tipo de comunicação está a prejudicar o futebol português?
Quando um programa que existe tem como base uma suposta informação roubada a outro clube e se divulga troca de correspondência privada está tudo dito. É um crime cometido semanalmente.

10. Qual o papel que os directores de comunicação devem tomar para contribuir para a pacificação do actual estado do futebol português?
Muitas vezes fomos acusados até de demasiada descrição e sobriedade. Essa atitude até foi apontada como um defeito, mas partia da convicção de que perante o descontrolo dos nossos rivais mais tarde ou mais cedo tudo se tornaria insustentável. Por outro lado, temos a lucidez de fazer uma autocrítica em determinadas situações. Ainda recentemente houve um tweet pouco feliz da nossa parte, que indirectamente afectou um árbitro que é respeitado pela sua honestidade e integridade, que foi o caso do Artur Soares Dias.

11. Já foi retirado algum patrocínio ao clube face ao tipo de comunicação que está a ser praticada?
Por outro lado, algum patrocinador já se manifestou incomodado com este tipo de estratégia? Apesar do ruído e clima gerado, até hoje ainda nada ocorreu.

12. Os presidentes da Liga e da Federação Portuguesa de Futebol já falaram consigo ou recomendaram algum tipo de atitude?
Penso que no meu caso tal não é necessário e, como tal, talvez por isso, nunca ocorreu.

13. As intervenções nas redes sociais por parte dos directores de comunicação contribuem também para alimentar o clima de crispação do futebol português?
Não tem sido essa a minha atitude, infelizmente outros têm outras opções. O resultado não é bom.

14. Se nos anos 80 e 90 os clubes tivessem as suas próprias televisões e as redes sociais já existissem, o que hoje se passa, passar-se-ia nessa altura?
Muitas das discussões de café e entre amigos têm agora uma oportunidade de serem ampliadas através das redes sociais de acesso livre e noutros espaços mediáticos. Não é possível comparar realidades diferentes, nos termos e nos ritmos.

15. Os directores de comunicação dos clubes falam com os comentadores desportivos para os preparar antes dos debates?
Não passemos esse atestado de menoridade à grande maioria dos comentadores. Agora, estou sempre aberto para dar esclarecimentos sempre que sejam solicitados."

Não é fácil ser Rui Vitória

"Não me lembro de um treinador com tantos caminhos condenados a serem becos sem saída.
Se o homem tem a coragem de apostar num guarda-redes pós-adolescente, o rapaz constipa-se, perde cinco quilos e sai da baliza. E quem entra? O rapaz que semanas antes tinha ardido na fogueira do maior pecado capital dos donos das redes, a fogueira do 'frango'.
E agora? Se jogar Bruno Varela no Clássico e errar, Rui Vitória - é a ele que me refiro - será crucificado por ter deixado no banco o mais prometedor dos guarda-redes da nova geração.
Se jogar Svilar, e o erro surgir, então Vitória terá de responder pela segunda crucificação de Varela em público.
Não é fácil ser Vitória e eu não queria estar no lugar dele.
Este é o exemplo maior de uma equipa cheia de nós. Alguns cegos.
O 4x3x3 veio para ficar? Parece que sim. Ora, o que fazer então a Pizzi? Joga Samaris ao lado de Fejsa? O grego tem respondido muito bem. Mas o português aparentou uma leve melhoria contra o Vitória de Setúbal.
E Krovinovic, não inscrito na Europa? Tem de jogar, sim. Falta falar de Filipe Augusto, tantas vezes elogiado e excluído por Vitória.
Mas mais difícil é escolher os alas. Diogo Gonçalves passou de titular para a bancada, Rafa idem aspas, Gabigol é mais forte noutras noites. Restam Salvio, Cervi e Zivkovic. Quem cai?
Não é fácil ser Rui Vitória.
Mais fácil é saber que Jonas, o melhor do campeonato, está lá para ser titular, seja qual for o antídoto escolhido. Tem mais bola na posição-9? Sim. Mas mantém os níveis de eficácia altíssimos.
Com os resultados tremidos, as opções tímidas em várias unidades e as lesões recorrentes, não é nada fácil vestir a pele de Rui Vitória e escolher a equação certa para não perder o campeonato já na sexta-feira.
Acima de tudo isto, numa análise a justificar mais espaço, está a qualidade do futebol do Benfica. Ou a falta dela. E aí, caros senhores, não há guarda-redes ou médio que lhe valha.
Não é fácil ser Rui Vitória, o cavalheiro da palavra. Confesso: é preciso um sangue frio sobre-humano para manter a compostura nas salas de imprensa e analisar alguns dos mais tristes episódios da história recente do Benfica. Bessa, Basileia, Moscovo, mas também Vila do Conde, Portimonense (na Luz), tudo pedaços de temporada demasiados pobres.
E Rui, de olhar sereno, a tudo reage com a serenidade dos intocáveis. E a certeza do auto-conhecimento.
Será, afinal, assim tão exigente ser Rui Vitória?"

De que saber é o método?

"Se bem penso, já há muito venho dizendo que os treinadores portugueses não sabem mais do que os bons treinadores doutros países. Afadigam-se alguns articulistas em tentar provar que os êxitos dos nossos treinadores, no estrangeiro, se devem à sua preparação científica, incomparável em relação à preparação científica dos treinadores doutros países, designadamente europeus. Na relação entre as pessoas (e portanto na relação treinador-jogadores) não há só necessidade de ciência, mas também de respeito, de arte, de valores. Temos uma identidade que nos faz um povo de fácil convívio, de comunicação atraente, de rápida compreensão de culturas e tradições alheias (o nosso povo o diz: “cada povo, com seu uso; cada roca, com seu fuso”). Não é porque sabemos mais que somos melhores treinadores, mas porque não copiamos figurinos estranhos à nossa maneira-de-ser, porque somos genuinamente nacionais, não escondemos a solidez e a fundura das nossas raízes e, daí, a nossa simpatia e generosidade e compreensão – que nem todos os povos têm, com tamanha nitidez, como aliás a filosofia e a antropologia nos ensinam. Para não fatigar quem tem a bondade de ler-me, cito o Padre João Ferreira, no seu livro Existência e Fundamentação Geral Do Problema Da Filosofia Portuguesa: “O temperamento português já foi repetidas vezes analisado por etnólogos e caracteriologistas nacionais e estrangeiros, como: Mendes Correia, Jorge Dias, Gonzague Reynold, Paul Descamps e também por alguns escritores, como Ramalho Ortigão, Joaquim de Carvalho, Cruz Costa, Afonso Botelho, Cunha Leão, etc. Segundo os estudos feitos, convém-se em anotar que o português é essencialmente dotado duma alma feminina, poética; é humano e doce (…), mais sensível do que racional (…), sentimentalista, idealista, galã, sociável, de fácil adaptação, etc.” (p. 148).
No futebol (e no desporto em geral) por força do cartesianismo, até há cinquenta ou sessenta anos atrás, a mente e o corpo consideravam-se como duas substâncias realmente distintas, podendo existir uma sem a outra. Assim, para o estudo do corpo, a fisiologia, a biologia bastavam. Quem falava do corpo como produto cultural e social? Muito poucos! O corpo, aliás, surge aos olhos dos estudiosos com um estatuto paradoxal: ora é um objecto entre os outros, o corpo-instrumento; ora é o lugar concreto onde a vida subjectiva se manifesta. Maurice Merleau-Ponty distingue o “corpo objecto” do “corpo vivido”. O “corpo objecto” é o organismo, o corpo tal como o estudam e analisam os cientistas; o “corpo vivido” é o corpo-sujeito, que as ciências descuidam, frequentemente. Vale a pena ler o poema “Lágrima de Preta” de António Gedeão, para entender-se rapidamente o que pretendo dizer: “Encontrei uma preta / que estava a chorar, / pedi-lhe uma lágrima / para a analisar. / Recolhi a lágrima / com todo o cuidado / num tubo de ensaio / bem esterilizado. / Olhei-a de um lado, / do outro e de frente: / tinha um ar de gota / muito transparente. / Mandei vir os ácidos / as bases e os sais, / as drogas usadas / em casos que tais. / Ensaiei a frio, / experimentei ao lume, / de todas as vezes / deu-me o que é costume. / Nem sinais de negro, / nem vestígios de ódio. / Água (quase tudo) / e cloreto de sódio”. De facto, uma lágrima não se resume ao que a análise laboratorial nos diz. Para além da água e do cloreto de sódio, pode haver, numa lágrima, amor, ódio, alegria, saudade, oração, êxtase, admiração, dor, sofrimento. Enfim, um número incontável de sentimentos que não cabem nas análises que nos chegam dos laboratórios. Os cientistas de pendor positivista não deverão esconder que há mais mundo, para além da biologia.
É moda, no nosso tempo, falar pouco do ser humano e mais e muito mais de normas, de regras e de conjuntos significantes. Por isso, na antevisão dos jogos de futebol, há quem não precise mais do que o 4x4x2, ou o 4x3x3, ou o 4x3x2x1, ou o 3x5x2, para um prognóstico de um jogo de futebol. Lembrando Péguy, “digamos a verdade, toda a verdade, só a verdade, brutalmente a verdade brutal, fastidiosamente a verdade fastidiosa, tristemente a verdade triste”. Com efeito, para mim, a única noção precisa e coerente de cientificidade, no Desporto, não é a que decorre dos métodos das ciências naturais, Não há, aqui, um modelo de cientificidade “a priori”. O ser humano é a unidade de uma complexidade. Há, nele, diversidade e complementaridade. Há, nele, e sirvo-me agora do que aprendi, em Edgar Morin: o princípio da unidade complexa, próprio de qualquer sistema; o princípio da inseparabilidade da ordem e da desordem, da organização e da desorganização, já que os eco-sistemas não se alimentam apenas de ordem; o princípio da complexidade lógica, ou o princípio da conceptualização complexa, que nos impõe o recurso a macro-conceitos, tais como: ordem-desordem, todo-partes, uno-múltiplo, causa-efeito, indivíduo-espécie, indivíduo-sociedade, sujeito-objecto, etc., etc.; o princípio da incerteza, pois que a incerteza é típica do pensamento complexo, tantos são os dados indispensáveis a ter em conta. Muito mais há a dizer sobre esta extensa problemática. Permito-me agora, fundamentado ainda em Edgar Morin, adiantar os quatro grandes princípios orientadores do treino desportivo: formar pessoas capazes de organizar os seus conhecimentos, mais do que armazenar as ordens emitidas pelo treinador, quero eu dizer: o treinador diz o que é preciso fazer, mas é a maneira-de-ser do jogador que as faz (e aqui o treinador não chega); ter sempre presente, em todas as situações, a condição humana, como dizia Rousseau: “o nosso verdadeiro estudo é o da condição humana”; aprender a viver, através da prática desportiva, pois que, na alta competição desportiva os problemas clássicos da vida são observados de forma amplificada e agravada; é a metodologia específica das ciências hermenêutico-humanas a metodologia do treino desportivo.
De que saber é o método? No que ao Desporto diz respeito, o saber é o de uma ciência hermenêutico-humana. É portanto, no meu modesto entender, pré-científico, ou pseudo-científico, interpretar o atleta em termos unicamente físicos, ou biológicos. A humanidade da pessoa ultrapassa muito (muitíssimo) a sua animalidade, não a suprimindo embora. É diminuta a diferença entre o aparelho cognitivo do chimpanzé e o do homem. A diferença encontra-se no número de neurónios e na reorganização do cérebro. Reside, aqui, a emergência das qualidades humanas irredutíveis, que se conhecem por pensamento e por consciência. É porque tem uma desconhecida dimensão espiritual que o fenómeno humano surge, como um novo fenómeno, no planeta Terra. De facto, para o bem e para o mal. Com maligna impertinência, o mal aí está, ilimitado e com defensores exaltados e acriminiosos. Mas o bem também nos rodeia. Também há sábios, heróis e santos, na História. Também há mentalidades superiormente aparelhadas, capazes de implementar e conceber instituições, como a Ciência, a Cultura e o Desporto nos revelam. O “homo ludens” não o descobrimos unicamente, nas várias formas de Jogo e de Desporto. Joga o cientista, quando investiga e o filósofo de ampla inteligência teorizadora e o literato novelista e romancista. Criar, para o “homo sapiens” é sempre jogar – jogar com o mítico e o racional, com a tradição e a utopia, com o mágico e o simbólico. É da síntese de tudo isto que o novo surge, tantas vezes inesperado, tantas vezes maravilhoso. Assisti, pela televisão, ao Valência-Barcelona da última jornada do campeonato espanhol. E não esqueço o passe do Messi ao Jordi Alba, que fez o golo do Barça. Foi um passe de 30 ou 40 metros, que chegou ao seu destino, ao Jordi Alba, com uma precisão milimétrica. É preciso saber jogar, para executar um passe tão perfeito. Só que não há jogos, há pessoas que jogam. Quanto mais humanos formos, melhor entenderemos o jogo."

Vitória na Roménia

Zalau 2 - 3 Benfica
22-25, 25-18, 25-27, 25-22, 10-15


Excelente vitória... com o Mrdak em grande! 23 pontos, somente em três Set's, pois após a confirmação da qualificação, foi para o banco 'descansar'!!!

Na próxima eliminatória vamos defrontar os Austiacos do Holding Graz... se tudo correr normalmente, parece que vamos voltar a encontrar o Ravena lá para os Quartos!!!