quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Baliza do Benfica

"Svilar e Varela: um tratamento diferente para jogadores diferentes e em contexto diferentes, mesmo que quase todos insistam em vincar o contrário.
No início da época, Varela preparava-se para ser número 3, atrás de Júlio César e de mais um guarda-redes que haveria de chegar mas nunca chegou. Como tal, Júlio César começaria como número 1, com Varela promovido a 2 e Paulo Lopes a adiar a reforma. Mas Júlio César lesionou-se e Varela começou a titular, respondendo globalmente de forma positiva, mesmo sem convencer em absoluto (pelo menos a mim).
No entretanto, o Benfica agarra a oportunidade de contratar Svilar, uma grande promessa e coloca-o na equipa principal para crescer mais depressa. Seria o número 3. Quando Varela dá o frango no Bessa, Rui Vitória tinha uma alternativa óbvia e jogou-a, Júlio César. Mas os jogos em Basileia (sobretudo) e até na Madeira (o golo do Marítimo...), mostraram que o imperador perdeu qualidades: refugiado entre os postes, lento a ler o jogo e a reagir, frágil nos duelos. Restava Svilar.
Sim, nunca deveria ter surgido nesta fase como a opção mais lógica, deveria ter tido mais tempo para se preparar, mas, perante a realidade, Rui Vitória foi corajoso (era bem mais confortável manter Júlio César ou Varela...).
O critério? Simples: tendo 18 ou 58 anos, Svilar é guarda-redes com perfil de equipa grande, coisa que Júlio César já não é e Bruno Varela não me parece que alguma vez venha a ser, com todo o respeito por ambos.
O risco da inexperiência? Ninguém pode garantir que é maior do que em relação à permanência de Varela ou Júlio César na baliza, pelo que foi dado a ver. Por outro lado, há por aí outra confusão: um treinador não é obrigado a tratar da mesma forma todos os jogadores que erram, era o que faltava! Depende dos contextos, das alternativas e do grau de confiança no presente e futuro de cada jogador. 
Rui Vitória tem o direito de acreditar mais no A, no B ou no C e segurá-los ou retirá-los em função disso. Apostar em Svilar é, para mim, ganhar o tempo que poderia ser perdido com a aposta continua em Varela ou Júlio César."

Gonçalo Guimarães, in A Bola

A hora da verdade para a arbitragem

"Os árbitros avançaram com um pré-aviso de greve aos jogos da Taça da Liga e o presidente do Conselho de Arbitragem da FPF ameaça com greve de zelo às nomeações para todos os jogos. Na base deste levantamento de rancho está o clima que envolve o trabalho dos árbitros, caracterizado por uma suspeição sistemática que retira serenidade e limita às condições de trabalho.
Se ninguém tomar medidas práticas, a má situação que se vive hoje em dia terá apenas tendência a piorar. E essas medidas passam pela penalização dos infractores, daqueles que têm o dedo leve no gatilho da censura pública dos árbitros nas provas nacionais, mas que primam pelo silêncio num contexto de competições europeias. E qual é a diferença entre umas e outras? Na UEFA, as penas não só são muito mais pesadas, como são invariavelmente aplicadas; por cá, é dito o que dá na real gana de quem tem acesso aos microfones, sem quaisquer consequências. E nem sequer valeu a pena o esforço do presidente da FPF, que tentou colocar alguma ordem no hospício em que se transformou, a este nível, o futebol português. Fernando Gomes ainda foi ridicularizado, sendo comparada a sua intervenção ao discurso da miss Universo na hora de receber a coroa...
É preciso ser muito claro nesta matéria. O futebol português vive neste caldo de agressividade irracional por exclusiva vontade dos clubes. São eles que patrocinam as intervenções mais descabeladas e virulentas, foram eles que enveredaram por um caminho de terra queimada, na ânsia de ganhar esta ou aquela batalha, sem verem que estão a perder, todos eles, a guerra."

José Manuel Delgado, in A Bola

Derrota na Dinamarca

Bakken Bears 95 - 76 Benfica
24-14, 22-13, 21-29, 28-20

Mau jogo, muito má entrada... no final do 3.º período ainda conseguimos reduzir, chegámos a estar 'somente' a 7 pontos, mas depois voltámos a decidir mal...
Sendo que a arbitragem, principalmente quando o Benfica se aproximou, tornou-se no nosso principal obstáculo!!!

Mau sinal tendo em conta a possível qualificação... o adversário de hoje está perfeitamente ao nosso nível, vamos ver como decorrem os próximos jogos.

Mile Svilar: falta de sorte ou “batismo de fogo”?

"Baptismo de fogo.
Mile Svilar conseguiu, na passada semana, ser figura central na imprensa desportiva por dois motivos completamente antagónicos: ser o mais novo guarda redes a competir numa Liga dos Campeões e, paradoxalmente, ser “o” responsável pela derrota do Benfica.
A acção que o levou a pedir desculpas aos adeptos e a, manifestamente, demonstrar a sua frustração e descontentamento no final do jogo, enquanto, numa elevadíssima manifestação de fair-play, era confortado pelos colegas do Manchester, viria a ser capa de muitos jornais que, rapidamente, se apressaram a “crucificar” um “miúdo” de 18 anos e o treinador que escolheu apostar na sua integração.
Curiosamente, não me lembro de ver uma única capa a “crucificar” este ou aquele avançado do Benfica, dada a sua ineficiência em concretizar uma dada jogada de ataque (logo, a errar de igual forma).
Em boa verdade, a posição de guarda redes é, possivelmente, das mais ingratas e das menos valorizadas no contexto dos desportos colectivos (qualquer um deles) e o futebol não é excepção.
A título de exemplo, será de senso comum que, para sempre será recordado o golo do nosso avançado Eder como o grande protagonista da vitória no Euro 2016 e, dificilmente as pessoas recordarão, daqui a uns anos, o número de defesas que o nosso guarda-redes Rui Patrício efectuou, não só em contexto de grandes penalidades (contribuindo fortemente para o acesso à final) mas, na final propriamente dita, permitindo que a equipa pudesse continuar em condições de disputar uma vitória (recorda-se?), assegurando que o resultado fosse 1-0 e não 1-4/5/6.
Pode-me falhar a memória, mas não recordo que tenha sido dada especial visibilidade a este atleta (curiosamente, na imprensa internacional, surgiu um artigo sobre o seu perfil... em Portugal, nem por isso), que tenha sido entrevistado em exclusivo pela imprensa ou tenha sido convidado para ir à televisão.
E isto, não é de todo uma critica, é sim meramente uma constatação que resulta da consequência de se tratar de uma posição com menor visibilidade (comemora-se, tradicionalmente, os golos e não as defesas feitas...) onde, de facto, é muito mais difícil ser bem-sucedido e onde o insucesso é, muitas vezes, vivido de forma solitária, como se de uma modalidade individual se tratasse (como aconteceu com o “escrutínio” da imprensa e dos adeptos, que Svilar sofreu).
Paradoxalmente, e por estas mesmas razões, é a posição onde se encontram mais frequentemente os atletas mais robustos do ponto do vista mental pois, por todas as razões expressas (e algumas outras não discutidas), necessariamente, precisam “crescer” mais cedo, amadurecer mais rápido pois, o lado mental tem, certamente, um peso elevadíssimo na sua capacidade em lidar com o erro e o insucesso, com o qual tem que se confrontar vezes sem conta, bastando para o efeito, ligar a televisão.
Por esta razão, lidam diariamente com o “peso” das suas decisões (treinando “responsabilidade” numa base diária), são extraordinariamente orientados para o treino e para a optimização de todas as variáveis que potenciam a elevação dos seus níveis de eficiência, uma vez que, um erro seu, será visível a toda uma gigante audiência... de igual forma, vivem numa espécie de “fio da navalha” onde, entre a ansiedade de execução e a necessária calma para a eficiência do gesto técnico, precisam ser “mestres” no respeita à sua capacidade de regulação emocional e de “prontidão” para a acção.
A sua notoriedadeserá, invariavelmente, determinada pela sua capacidade em lidar com a pressão, com o sucesso, o insucesso e o erro... e pela forma como, consistentemente, após um erro, conseguem reagir no momento a seguir “como se” nada se tivesse passado e o resultado permanecesse a zero.
De facto, o que determina a grandeza de um atleta (independentemente da sua posição) não será a variável “erro” (se comete ou não erros... só não comete quem se encontra em frente à televisão), mas sim a forma como reage, no instante imediatamente a seguir, a este mesmo erro.
“É uma questão mental onde, a cada momento, independentemente do que se esteja a passar, estás no “momento zero” e permaneces calmo. Pura e simplesmente, não queres saber dos erros (em jogo)”. Neuer
Por todas estas razões, o grande obstáculo de um guarda-redes não é o avançado, a chuva/sol ou o colega (que, por vezes, compete anos a fio em busca do seu lugar)... é sim, ele próprio.
É a sua capacidade em lidar com as emoções que sente quando joga, com o medo de errar, de ser “culpado” da derrota da sua equipa (como se tal fosse possível... como se, vitoria ou derrota, não resultassem do esforço conjunto de todos...), de perder a titularidade, de se magoar fisicamente (ou de magoar seriamente um adversário), de se sentir envergonhado... e de tantos outros “de’s”...
Svilar é ainda um “miúdo”, um miúdo com uma coragem gigante que o impulsiona para aceitar um imenso desafio que, quem maioritariamente o critica, jamais ousaria aceitar e, partilha com tantos outros colegas de posição, daquela irrequieta insatisfação que o faz querer mais e melhor (ou, simplesmente, não estaria à altura do jogo seguinte)...
Por esta razão, e com os adequados recursos emocionais (que possuirá ou poderá vir a adquirir), rapidamente entenderá que, muito possivelmente, o episódio com o Manchester se poderá transformar no derradeiro “baptismo de ferro e fogo” que o alavancará para uma carreira de sucesso na próxima década...
Afinal, de inícios difíceis e contestados está a “história” desportiva repleta e, não tendo isso atrapalhado a carreira do nosso actual nº1 (igualmente contestado em 2007/8), pode até ser um bom indicador para Svilar, do que o futuro o possa aguardar.
Assim consiga usar este episódio para se centrar ainda mais em si, na sua capacidade de desenvolver esforço e, acima de tudo, e numa posição tão facilmente invisível ou criticável, permanecer consciente do que o leva a desfrutar do jogo (enfim, a ser Feliz)."

A grande herança

"Há dias, no contexto do campeonato mundial de sub17 a decorrer na Índia, um dos últimos gigantes a despertar, fascinado, para o fenómeno planetário do futebol, apareceu num dos vários canais desportivos aqui no Brasil um jovem repórter, tomado por um rubor súbito da surpresa, escancarando um indisfarçado contentamento pelo facto de ter encontrado, ali em tão remotas e improváveis paragens, vários cidadãos nativos expressando-se numa português capaz de fazer corar a muitos que o têm como língua materna. E acrescentava, com um comovente garbo de iniciante, que Goa, onde acabara de se alojar a selecção brasileira,, tinha sido possessão portuguesa (ele disse colónia, quem sabe se num ínvio remoque de um difuso ressentimento) até 1961.
É claro que não houve uma única menção a Nheru que, pela calada da madrugada e aproveitando-se deslealmente de tão gritante assimetria de forças em confronto, obrigou o desamparado Vassalo e Silva a uma inglória e dolorosa claudicação. Trata-se, porém, de uma omissão significativa: como se, implícita, estivesse a universal convicção, tingida por uma ideologia do tiro, de que a razão está sempre do lado do colonizado, esquecendo, no caso vertente, que nem a Índia era uma colónia de Portugal (fora-o de outros|) nem Goa era em rigor uma colónia no sentido pejorativo do termo: a esmagadora maioria dos goeses desejavam continuar portugueses – mas foram amordaçados em tão exótica e ousada pretensão pelo cio expansionista de um governo que mal tolerava ter como vizinha a diferença. E, nesse sentido, não é mera curiosidade estatística o facto de termos em Portugal na liderança do governo um primeiro-ministro cujo pai nasceu em Goa (Orlando da Costa).
Mas sigamos em frente, que o mais interessante da reportagem está para vir. Em jeito de triunfal confirmação de tão imprevista descoberta, o jovem repórter brasileiro, ufano do seu troféu, exibia, à continuação, uma entrevista que, afinal, era um testemunho, talvez até um manifesto cultural, com um colega goês que, expressando-se num irrepreensível português, capaz de deixar orgulhoso o próprio Camões que bem conheceu aquelas paragens – nem sequer um traiçoeiro sotaque a denunciar-lhe a lonjura! - teceu um dos mais comoventes elogios a Portugal e ao povo português e à sua maneira tão particular de se relacionar com a diferença.
Dizia o insuspeito jornalista goês (eles fazem questão de se afirmarem goeses, que não propriamente indianos):”nós aqui, em Goa, que foi território português até 1961, vivemos uma situação cultural muito especial” - singular, acrescento eu. “...há aqui católicos, hindús e muçulmanos e todos vivem em perfeita harmonia: esta a grande herança que recebemos de Portugal”. E, incluindo nesta referência o povo brasileiro, que as boas maneiras ficam sempre bem, desejou sorte à sua jovem selecção e prognosticou duas coisas: sucesso e apoio dos goeses. Comovente, sem dúvida!
E dei comigo a pensar, com uma lágrima indiscreta a aflorar ao canto do olho: se nada mais tivéssemos deixado em Goa como marca indelével da nossa presença, isto teria sido já o suficiente para nos deixar orgulhosos e de consciência tranquila. De facto, pensava eu, Portugal é muito mais que esta faixa rectangular nos confins da Europa, uma mera porção de território: Portugal é, antes do mais, uma ideia, se calhar, uma emoção que, qual átomo de Régio, se soltou por esse mundo fora, numa espécie de suspiro pelo infinito. O português debruça-se sobre o parapeito da mítica janela do Oceano e espreitou e não cessa de espreitar mundo e mais mundo – mas não para dele se apoderar, para sacar, mas para dar-se. Dar-se na íntima e genuína disponibilidade para o diálogo cálido dos corações.
Por isso há o Brasil, esta obra-prima da arquitectura dos afectos, que logrou esta dinâmica concertação das diferenças na vivência unitária desta “amorável” pátria. E aí está essa Goa, na sua invejável ‘harmonia dos contrários”, a confirmar a nossa histórica e singular aptidão para a arte das simetrias. Portugal: terra de geógrafos da Alma! Portugal: a “Mátria” de todas as nossas pátrias – incluindo esta que é a nossa, Portugal!"