sexta-feira, 5 de maio de 2017
O tribunal do video
"Tudo a favor do videoárbitro, como é evidente; mas estaremos nós culturalmente preparados para o aceitar?!
Devem todos os que andam no futebol, e também os adeptos, naturalmente, entender que o videoáritro vai ser um instrumento para ajudar os árbitros a cometer menos erros. E vão os árbitros ser ajudados pelo videoárbitro e, por isso, conseguir cometer menos erros. Isso parece claro e facilmente compreensível.
O que não podem é todos os que andam no futebol, e também os adeptos, naturalmente, fazer do videoárbitro um instrumento de mais polémica, mais controvérsia, mais desconfiança, mais acusações, mais insinuações, mais suspeições. É preciso compreender que o essencial do videoárbitro não é eliminar do jogo o erro do árbitro; é, repito e sublinho, ajudá-lo a cometer menos erros. O que é bem diferente.
Não sou, nem nunca fui, contra o videoárbitro, entenda-se; mas tenho dúvidas que estejamos culturalmente preparados, no futebol português, muito em particular, para aceitar que vamos deixar de conviver com o futebol de sempre para passarmos a conviver com um novo futebol, aceitando um videoárbitro como penso que ele deve ser aceite.
Custa-me ouvir, por exemplo, falar do videoárbitro como se ele fosse pura e simplesmente eliminar todos os erros do jogo; é atirar areia para os olhos dos adeptos. É demagogia, é irresponsabilidade.
Cabe sobretudo aos dirigentes dos clubes, e das restantes entidades que regulam o futebol, e até aos treinadores, passar a mensagem correcta: o videoárbitro servirá para tentar ajudar os árbitros a julgarem e a decidirem melhor, dando naturalmente com essa melhoria, mais justiça ao jogo, mais verdade, porventura, a alguns resultados, mas não vai o videoárbitro ser o salvador de todas as pátrias do futebol.
Somos latinos, temos o sangue quente, como todos os latinos, e temos culturalmente maior tendência para gostar muito mais do nosso clube do que de futebol. E como gostamos mais do nosso clube do que de futebol distorcemos mais facilmente o que vê a cor dos nossos olhos, consoante sejamos mais encarnados, mais verdes ou mais azuis.
Pior do que isso: boa parte dos mais destacado do nosso futebol facilmente encontra na arbitragem o bode expiatório ideal para eventuais erros na gestão desportiva do clube que defendem. Todos sabemos que os árbitros não são todos muito bons, tal como o não são todos os treinadores ou todos os jogadores. Achei piada, a propósito, ao que disse recentemente Luís Figo sobre a reflexão que fez quanto ao papel de treinador, que o levou aliás a seguir, como se sabe, outro caminho: «Há treinadores muito bons que nunca chegam a ter sucesso, e há treinadores vulgares e até maus que conseguem ganhar muito coisa». Elucidativo.
Volto à questão do videoárbitro e à reflexão segundo a qual sou levado a concluir que a medida agora anunciada para a próxima época não vai acabar com o insuportável clima de escárnio e mal dizer que tem tomado conta do palco onde flutuam apenas Benfica, Sporting e FC Porto.
Vale a pena pensar, então, no seguinte: se hoje é muitas vezes tão contestada a nomeação de determinado árbitro para determinado jogo, o que podemos supor que vai acontecer na próxima época? Vai contestar-se a nomeação do árbitro... e a nomeação do videoárbitro, que vai ser um papel desempenhado também por um árbitro.
Em vez de uma... podemos passar a ter duas contestações por jogo. Muito possível e lamentável se assim acontecer.
Mais: nunca será demais explicar a toda a gente como vai funcionar o videoárbitro para que ninguém se deixe enganar por eventuais ilusionistas da «verdade desportiva».
Tome nota, caro leitor, sobre alguns aspectos da nova medida:
- só o árbitro pode recorrer ao videoárbitro, podendo, é verdade, o videoárbitro dar indicações ao árbitro, sugerindo-lhe uma decisão ou aconselhando-o a ir ele próprio ver as imagens no monitor de TV que deverá passar o próprio árbitro a dispor junto ao 4.º árbitro; mas só o árbitro continuará a ser soberano na decisão;
- o videoárbitro só terá intervenção em quatro acções do jogo: foras-de-jogo em lances que resultem em golo; disciplinar no caso de cartões vermelhos por falta grave que o árbitro, em campo, não identifique; trocas de identidade - o árbitro mostrar cartão ao X e dvia tê-lo mostrado ao Y -, e por fim, os controversos e tantas vezes subjectivos lances de penalty.
Quanto à bola que entra ou não na baliza, já não será necessária intervenção humana porque só a tecnologia se encarregará de dizer ao árbitro se foi ou não golo.
Peguemos apenas nos controversos e tantas vezes subjectivos lances de grande penalidade para esclarecer o seguinte: se o árbitro não sentir, porventura, dúvida em determinado lance não recorre ao videoárbitro; o mesmo acontecerá se o vídeoárbitro também não tiver dúvida - não dará igualmente qualquer indicação ao árbitro. Acontece que em casa, qualquer adepto vai poder continuar a considerar que o lance era para penalty. E quem diz o adepto, diz comentador; e quem diz comentador, diz dirigente!
Agora pense o leitor numa outra situação possível: o árbitro recorre ao videoárbitro, o videoárbitro tem dúvida, o árbitro vai ver pelos seus próprios olhos ao tal monitor e... mantém que o lance não é para penalty ou mantém que é; em casa, o adepto, o comentador ou o dirigente continuam a considerar que é ou não é, mas ao contrário da decisão do árbitro. O que vai o portuguesinho da Silva fazer? Criticar ainda mais o árbitro, acusando-o de não querer ver mesmo tendo à frente dos olhos... a as imagens da televisão! Polémica a dobrar, insinuações a aumentar, suspeições a triplicar.
E já nem falo das imagens poderem não esclarecer claramente o árbitro (que não tem de julgar como o adepto, que regra geral vê apenas o que lhe interessa...) ou dos possíveis casos, legítimos, de o árbitro ficar com uma opinião diferente do videoárbitro.
Em resumo, tudo a favor do videoárbitro, como é evidente; mas é necessário que nos preparemos culturalmente para aceitar que mesmo com videoárbitro vão continuar a existir erros humanos. E diferente interpretações. E subjectivas decisões.
Nesta paróquia onde tantos ralham e muito poucos têm realmente razão, não vai ser fácil explicar ao estimado adepto que as nomeações dos árbitros e dos videoárbitros serão sempre feitas com a boa intenção de contribuir para um bom futebol; que os árbitros e os videoárbitros continuam a ser os árbitros que vemos todas as semanas e não robots infalíveis; e que não valerá a pena exigirmos que tudo seja perfeito porque isso mesmo distorce o espírito de um jogo no qual também os jogadores iludem/enganam os árbitros, e têm por vezes treinadores que os estimulam a isso e dirigentes que os condenam por não o fazerem.
O espírito do jogo move-se também pelo erro (de todos), pela discussão saudável à segunda-feira, pela rivalidade bem entendida; o futebol é um jogo de paixões, de emoções, de luta, de contacto físico, de esperteza e inteligência na forma como se procura superar o adversário no ar ou junto à relva. Não é um jogo de computador.
Por tudo isso, devemos, no fundo, reflectir no seguinte: se vamos ter videoárbitro nos jogos para termos mais polémica, é melhor assumirmos a nossa incapacidade de tornar esta indústria de espectáculo mais competitiva, mais equilibrada e mais rentável.
Tudo a favor do videoárbitro, como é evidente, enquanto instrumento de auxílio aos árbitros e não enquanto instrumento para satisfazer os mais demagogos dirigentes ou os mais incompetentes gestores. Acredito, porém, que antes da medida anunciada do videoárbitro (numa clara tentativa de sossegar o futebol...) muitas outras coisas precisam urgentemente de ser alteradas no futebol português.
A começar por afastar do futebol todos aqueles que o caluniam ou o fazem mergulhar constantemente (e muito ruidosamente) num mar de suspeições, insinuações ou acusações não provadas.
Como não lamentar o que ouvimos esta semana de Fernando Gomes, administrador da SAD do FC Porto (com responsabilidades óbvias) ao insinuar a existência de «mais alguma coisa» e não apenas erro humano nas alegadas más decisões que alguns árbitros possam ter tido (e tiveram!) em prejuízo dos portistas?! Se existe mais alguma coisa, é preciso prová-lo. Se fica provado, o árbitro deve ser irradiado. E se não fica? Irradie-se o dirigente. Haja coragem!"
João Bonzinho, in A Bola
A Casa do Gaiato
"Porventura, o leitor, sabe quem foi Américo Monteiro de Aguiar? Não faz sequer uma pequenina ideia? Não? E se eu lhe disser, por exemplo, que toda a sua obra e vida foi dedicada a acolher, educar e integrar na sociedade jovens com passado problemático? Começa agora a ver uma luzinha ao fundo túnel, não é verdade? Pense só mais um bocadinho. Nunca ouviu falar na Casa do Gaiato? Vê como descobriu! É, sim senhor, é o célebre Padre Américo cujos princípios voltaram a ver a luz do dia, depois do lamentável clima de guerra de palavras e actos no meio desportivo nacional. Mas, perguntará o bom leitor, com toda a propriedade, o que tem a ver o Padre Américo com tão lamentáveis episódios que alguma imprensa estrangeira não hesitou em cobrir de ridículo? Se pensar um bocadinho, verá que tudo tem a ver. Com efeito, depois daquelas cenas tristes da gente vá do meu bairro - foram rios e rios de tinta e cuspo que correram pelos media deste cantinho à beira-mar plantados - assistimos, hoje, a verdadeiros actos de redenção colaborante por parte de alguns dos principais intervenientes em tão lamentáveis incidentes, postura essa a que, certamente, não é estranho o fervor religiosos actualmente sentido e decorrente da visita a Portugal do Para Francisco. Todas as propostas que, desinteressadamente, foram apresentadas por tão magníficos personagens, reflectem a filosofia sempre defendida pelo Padre Américo ao longo de toda uma vida, consubstanciada no lema de que «Não existem rapazes maus».
Mas se, eventualmente, por mero acaso, voltarem a tais comportamentos perversos e desviantes, temos a garantia, pelo menos, de que, um pouco por todo o País, existirá sempre uma Casa do Gaiato para reeducar os prevaricadores. Bem haja, Padre Américo!"
Sérgio Abrantes Mendes, in A Bola
Comandar?!
"Ao longo da História, e um pouco por todo o Mundo, as lutas para chegar ao poder têm intervenientes com visões diferentes do exercício dessas lideranças. Basta observar as eleições presidenciais francesas, perceber o posicionamento de Macron e Le Pen em relação à UE ou as hesitações de Mélenchon para não dar indicação de voto na segunda volta, para ficarmos esclarecidos sobre a forma como pretendem chegar à liderança do país. O sistema presidencialista francês, como todos os sistemas democráticos, mais presidencialistas ou parlamentares, obrigam a escolhas. Por vezes não se trata da opção que mais gostamos, é a possível no momento, e como tal a menos penalizadora. Contudo, há questões em que não se admite essa hipótese, como quando se trata de optar entre a liberdade e o totalitarismo.
No futebol também todo o processo implica escolhas. Não há uma única via para se chegar ao objectivo, seja o da competição, seja de um dos competidores. Para se conseguir melhorar a Liga é necessário perceber que só elevando o nível de todos os concorrentes se poderá atingir esse objectivo. Na verdade, o comportamento dos que pensam em reduzir todos os outros a um nível inferior, para poderem ganhar sempre, tem como consequência não criar valor global na competição. Ou seja, eles próprios se prejudicam pela sua reduzida visão.
Estes comportamentos, nos diferentes países, na versão macro, ou nos diversos sectores de actividade, como o futebol, numa versão micro, têm consequências nefastas. A diferença entre mandar e comandar resume-se, talvez de forma muito redutora, mas verdadeira, em exercer o poder com ou sem conhecimento. Esse é o maior problema das nossas elites dirigentes, pouco humildes, para aceitarem o contraditório. Não é por se fazerem muitas reuniões que se consegue provocar alterações de comportamento de quem não tem respeito pelos adversários. Dos que só querem mandar mas não sabem comandar!"
José Couceiro, in A Bola
O videoárbitro e o que nos falta
"Não sou dos que pensam ser o videoárbitro o remédio para todos os males do futebol português. Mas também não embarco na onda de desconfiança dos que o olham de lado, recusando-lhe méritos ou negando a ideia de que pode ajudar a resolver, pelo menos, parte dos problemas. Acho que o melhor a fazer é dar-lhe o benefício da dúvida. Esperar, analisar os resultados e fazer-lhe uma análise mais consistente. Dito isto, devo dizer que acredito tratar-se de passo muito importante para um futebol mais transparente. E com menos ruído. Porque não eliminando o erro, vai reduzir, se calhar até de forma significativa se for usado de forma inteligente, os jogos resolvidos por lances mal avaliados pelos árbitros. E isso dará aos dirigentes menos moral para utilizarem a arbitragem como bode expiatório para os seus próprios falhanços.
Continuará, é certo, a haver discussão - e os clubes até terão um novo alvo par disparar. Mas esse é um problema que não pode ser resolvido pelo videoárbitro. Para atacar essa faceta - a mais feia - do futebol português só há um caminho: regulamentos mais duros. Já toda a gente percebeu. A pergunta é: estão todos a remar para o mesmo lado? Face ao que se viu esta semana a resposta é óbvia: não! E o que se viu esta semana? Que as propostas apresentadas não passaram (como acontece com tudo...) de mais uma forma de os clubes atacarem os rivais. E não é esse o espírito certo para abraçar tamanha empreitada.
A solução? Os clubes não podem ter todo esse poder nas mãos. Não podem (ou não deviam poder) legislar em causa própria. Porque enquanto o puderem fazer, não há videoárbitro (por mais méritos que tenha) que nos valha. Mas se juntarmos videoárbitro e castigos a sério talvez a coisa mude de figura. Tenhamos a esperança. Um já aí está, o outro talvez não demore."
Ricardo Quaresma, in A Bola
Disciplina deve estar na FPF
"Depois da excelente decisão da FPF de fazer avançar o videoárbitro, a questão da reformulação disciplinar volta à ordem do dia. Indo directo ao problema de fundo, e porque há demasiados interesses próprios subjacentes ao sentido de voto nas AG da Liga de Clubes, aquilo que faz realmente falta é retirar a disciplina do âmbito da Liga, uniformizando os regulamentos e conferindo a tutela à FPF.
Ao contrário de outras opiniões, não creio que a Liga de Clubes deva desaparecer. A sua missão na organização dos campeonatos profissionais e na promoção de tudo o que tiver a ver com a indústria do futebol é importante e faz todo o sentido que estas estejam entregues aos clubes. Não é à FPF que cabe a definição da evolução do modelo de negócio e é bom que cada macaco fique no seu galho. Por maioria de razão, não devem ser os clubes a meter prego e estopa em questões disciplinares, porque é mais do que sabido que não conseguem evitar uma parcialidade que acaba por inquinar o produto final.
Antes de cada clube andar por aí a propagandear a sua alteração, melhor, melhor será se tomar forma um movimento que vise devolver à FPF a exclusividade em matéria disciplinar.
Volto a uma ideia que tenho repetido amiúde nos últimos tempos: há boas práticas, por esse mundo fora, no futebol, que nunca foram implementadas em Portugal. Tenho a certeza de que o futebol profissional no nosso país pode ser muito melhor, fora das quatro linhas. E ninguém melhor do que a FPF, que tem dado sobras provas de competência e modernidade, para cumprir esse desígnio."
José Manuel Delgado, in A Bola
"Data" !!!
Conhece o método que nos ajuda a #FormarAGanhar! (via @WiredUK) pic.twitter.com/fV3RoEcIoG
— SL Benfica (@SLBenfica) 5 de maio de 2017