sexta-feira, 17 de março de 2017

Acidentes, 112 e André Almeida

"Benfica cumpriu sem sobressalto o objectivo de vencer o Belenenses e continua em primeiro. Grande jogo desse grande profissional de nome André Almeida. No Benfica quando acontecem acidentes, mesmo antes do 112, lembram-se do André Almeida.
O FC Porto não teve dificuldades em Arouca e continua colado ao primeiro. Vai ser assim, como sempre escrevi, quase sem pontos perdidos a luta pelo título até ao fim. O FC Porto foi eliminado da Liga dos Campeões no dia do sorteio. Por muito que nos custe há alguns adversários que são hoje inacessíveis aos clubes portugueses. Podemos negar a realidade ou vender fantasias, mas isso não fará de nós nem lúcidos nem inteligentes.
Enquanto andamos entretidos nas rivalidades de paróquia, perdemos mais um lugar na Liga dos Campeões, depois se verá quem e como se pagam as contas. Pode até ser divertido, mas também não é lúcido nem inteligente. Talvez o terceiro classificado da próxima época perceba isso com muita facilidade.
Grande vitória do Mónaco e uma surpresa sem tamanho a do Leicester. Veremos quem vai à final com o Bayern nesta liga milionária.
Vamos a Paços de Ferreira, este sábado, como o objectivo de ganhar e de chegar ao clássico em primeiro lugar. Num terreno tradicionalmente complicado, contra um adversário aguerrido, iremos ter que resolver um nono dos problemas que nos esperaram rumo os objectivos do tetra. Sim, são mesmo nove finais. Nesta altura, a margem de erro é zero para os candidatos ao título, o Benfica tem que disputar todos os jogos no limite, sob pena de não chegar ao objectivo. No Benfica acorda-se a pensar no Campeonato e na Taça; e deitam-se a pensar no Campeonato e na Taça, talvez porque seja esta a forma de ganhar Campeonato e Taça. Obcecados pelo profissionalismo e determinados pela ambição."

Sílvio Cervan, in A Bola

André Almeida

"Quando, na pré-temporada, referi uma estatística curiosa acerca de André Almeida e o seu primeiro golo na equipa principal do Benfica, no programa 'Uma Semana do Melhor', da BTV, estava longe de imaginar que repetiria a graça passadas duas semanas. Mais ainda que, por superstição, o voltaria a fazer durante a época. E hoje à noite não poderei deixar de evocá-la novamente. O futebol também é isto: um conjunto alargado de credos irracionais que integram e caracterizam a nossa relação individual com o clube dos nossos afectos.
André Almeida só à 6.ª temporada na equipa A se estreou nos marcadores. Do conjunto de jogadores que haviam marcado apenas um golo pelo Benfica, somente seis participaram em mais partidas: Eurico, Alfredo, Malta da Silva, Jacinto Marques, Cruz e Bento. O segundo golo chegou também na pré-temporada. Com dois golos, era dos os jogadores com mais desafios que o polivalente André Almeida: Alberto e Samuel. Quando se estreou a marcar em competições oficiais, nos quartos-de-final da Taça de Portugal frente ao Leixões - o terceiro tento da sua conta - não tinha um único futebolista, entre todos os que marcaram três, precisado de mais jogos que o André Almeida para fazê-lo. E agora foi o quarto. Só Gustavo Teixeira, Félix, Ângelo e António Bastos Lopes, com 4 golos cada, representaram mais vezes o Benfica na equipa principal.
Por vezes há quem julgue erradamente que menorizo André Almeida ao referir esta curiosidade, não se apercebendo certamente que todos os nomes evocados são grandes da história do futebol do Benfica. Incluindo o do André, pela sua qualidade, polivalência, profissionalismo, espírito de grupo e títulos conquistados."

João Tomaz, in O Benfica

Assobios

"Gosto muito de assobiar. Faço-o quase todas as manhãs, antes, durante e depois do duche. Às vezes porque fiquei com uma musica na cabeça desde a noite anterior. Outras porque tenho temas recorrentes a que gosto de voltar quando estou contente, como o 'Glorioso SLB' do Estádio da Luz, o 'Depois do Adeus' do Paulo de Carvalho ou o 'Three Little Birds' do Bob Marley. E depois o assobio acompanha-me durante todo o dia, chegando até a contagiar quem me rodeia, em casa e no trabalho. O acto de expirar sons através da boca é uma capacidade humana que me agrada. Há um leque variado de assobios que podem ser utilizados por todas as pessoas. Podemos assobiar para chamar um animal doméstico, para alertar alguém do local onde estamos no meio de uma multidão e até podemos assobiar para protestar contra políticos corruptos ou perante uma falta que fica por marcar contra a nossa equipa.
E depois há os outros assobios mais difíceis de entender. Um é aquele famoso silvo melódico de ar que pode ser considerado piropo, logo crime. Outro é o assobio que vem das bancadas protestando contra jogadores da nossa própria equipa. Na primeira parte de um jogo de 90 minutos, com a nossa equipa a ganhar, a liderar o Campeonato e a lutar pela Taça de Portugal, com mais de 53 mil nas bancadas depois de um derrota pesada na Europa?
Querem criticar, força: o SL Benfica é uma democracia, e todos podem falar, mas, agora a sério, assobiar os nossos jogadores durante uma partida? É tramada esta coisa de o assobio poder ser praticado por todos os seres humanos, sejam eles dotados ou não de inteligência."

Ricardo Santos, in O Benfica

Os mal-amados

"Se, num estádio com 60 mil pessoas, 200 assobiarem freneticamente, e 59800 permanecerem em silêncio, o barulho da minoria ecoará no relvado com um nível de decibéis muito para além da sua representatividade. É assim que se estabelecem equívocos, rapidamente usados pelos rivais, e pela comunicação social, para derramar o sangue de que se alimentam.
Alguns benfiquistas não entendem que, ao vaiar um dos nossos, estão a dar armas ao adversário. Os jogadores são seres humanos, têm sistema nervoso, sentem emoções, e no futebol, como no desporto em geral, como na vida, a auto-confiança é determinante para um bom desempenho. Ao ser apupado, o jogador executará pior, pois a pressão e o medo de errar irão tolher a sua vontade. Perde ele, perde a equipa, e perdem os adeptos, num ciclo que nem sempre é fácil inverter.
A exigência faz parte do ADN encarnado, e é hoje, felizmente, marca de todo o universo do Clube. Só os melhores podem estar no Benfica. Mas, no que toca aos atletas, cabe ao treinador materializar essa exigência nos treinos e nos jogos, com base em informação de que os adeptos nem sempre dispõem.
Quem entra em campo vestido com o “Manto Sagrado”, é automaticamente credor da nossa vénia, e do nosso apoio incessante. Só assim faz sentido enchermos as bancadas da Luz. Só assim nos realizamos como verdadeiros benfiquistas.
No passado, nomes como Cavém, Nené, Vítor Paneira, Nuno Gomes ou Óscar Cardozo, foram vítimas de facções de assobio fácil. É quase revoltante lembrá-lo.
Agora, há também um ou dois “eleitos” que padecem da mesma sorte. É tempo de acabar com esta triste tradição."

Luís Fialho, in O Benfica

Bienvenido!

"Desde o principio desta semana o Sport Lisboa e Benfica tem um novo Director Clínico. Trata-se do Dr. Lluís Til Pérez, um conceituadíssimo médico de nacionalidade espanhola que terá a missão de liderar todas as áreas desportivas e da Clínica Benfica. Formado em Medicina e Cirurgia e com o mestrado em Gestão da Saúde pela Universidade Autónoma de Barcelona, Lluís Til Pérez apresenta um curriculum notável, destacando-se os seus conhecimentos em Medicina da Educação Física e do Desporto e Ortopedia e Traumatologia, especialidades que muito irão contribuir para dotar o nosso Clube de um Departamento Médico ao nível dos melhores do Mundo. O seu percurso profissional fala por si. Destacaria o facto de ter dirigido o prestigiadíssimo Centro de Alto Rendimento de Sant Cugat, em Barcelona, onde esteve durante 20 anos. Em 2003, ingressou no FC Barcelona como responsável médico da equipa principal de futebol. Um desafio que lhe foi lançado por Ramon Canal, prestigiado Director Clínico do Barça. Três anos depois, assumiu as funções de Director Médico para o Futebol da Academia, e em 2013 ficou responsável pelos serviços médicos de todo o Futebol e Modalidades de um dos maiores clubes do Mundo.
Aos 51 anos, após ter estado ligado à conquista de 29 títulos do Barça (3 Mundiais de Clubes, 4 Ligas dos Campeões, 3 Supertaça Europeias, 8 Ligas, 4 Taças e 7 Supertaças),  aceitou um novo desafio - dirigir o Grupo Benfica. Será o responsável máximo pelo Futebol Profissional, Futebol Formação e Modalidades. Lluís Til Pérez sucede a um outro grande médico e académico, o Dr. João Paulo Almeida, cuja competência, dedicação, humanidade e lealdade são por demais conhecidas."

Pedro Guerra, in O Benfica

Energumenia

"Diz o dicionário que energúmeno é o seguinte em vários significados:
1. (Antigo) Pessoa dominada pelo demónio. = Possesso
2. (Figurado) Pessoa que, dominada pela paixão, tem atitudes ou comportamentos excessivos.
3. (Figurado) Fanático intolerante.
4. (Pejorativo) Pessoa considerada ignorante ou muito básica. = Boçal.
Podemos escolher o significado mais antigo, o figurado, ou podemos escolher o pejorativo, que afinal é aquele que retrata a maioria dos ditos cujos.
É tão fácil sugestionar as pessoas a dizerem aquilo que queremos que digam, desde que o sugestionador seja uma pessoa sem escrúpulos.
A discussão sobre o papel da imitação na ontogénese da criança aparece em contextos teóricos que tentam explicar os mecanismos de estruturação da representação (cf. Wallon, 1979, 1986a; Piaget, 1975; Piaget e Inhelder, 1980). Esta discussão inicia-se com a dificuldade de se chegar a um acordo conceptual sobre o que é imitação.
A criança observa activamente os outros que a atraem, há uma tendência de se unir a eles numa espécie de participação efectiva. Daí se formam os ingredientes básicos do processo imitativo: uma constelação perceptivo-motriz ou uma plasticidade constituem-se numa espécie de modelo íntimo, agrupando impressões diversas e esparsas no tempo, numa fórmula global. Esta fórmula, em seguida, tende a transformar-se, a efectivar-se no meio físico, em termos sucessivos, para compor o desenrolar do acto imitativo. Aparentemente, não existe problemas nesta transformação se se conceber a ordem dos gestos está implicada no esquema do registo dos mesmos. Mas não é bem assim que se interpreta o modelo: ele é concebido como um conjunto, como algo organizado que corresponde a uma impressão global. Visto desde modo, constitui-se num problema o facto de esmiuça-lo em seus termos sucessivos. O êxito de uma imitação é conseguido quando os gestos se articulam com uma topografia e um momento, integrados na realização da totalidade.
Mentalidade desta é notória quando se tem o descaramento de afirmar que 'Sentimos as armadilhas. Se não existissem, seríamos líderes destacadíssimos'."

Pragal Colaço, in O Benfica

Sem Europa e a perder equipas em março, também pelo que Sporting e Sp. Braga não fizeram

"Os dois maiores fracassos ajudam para já a ficar sem uma presença na Liga dos Campeões de 2018/19.

Meados de Março, e não há equipas portuguesas nas provas europeias.
Dramaticamente, já se perdeu uma em 2018/19, na Liga dos Campeões. De três Portugal passou a duas. De duas directas, o campeão passará a entrar na fase de grupos e o segundo classificado na terceira pré-eliminatória, e com o play-off ainda pelo caminho.
Benfica ou FC Porto dificilmente podem aspirar a melhor do que os oitavos de final na Liga dos Campeões, a não ser que se conjuguem muita felicidade no sorteio com tempos de fragilidade de algumas das principais equipas. Não aconteceu, e Dortmund e Juventus foram claramente mais fortes.
A limitação é um sinal dos tempos. De serem clubes vendedores, de não conseguirem manter vários anos jogadores de grande qualidade e também referências sobre as quais construir as futuras equipas. De acordo com o recente relatório do CIES – Observatório do Futebol mudar pouco está ligado a um maior sucesso. Se isso foi comprovado nos campeonatos nacionais pelo mesmo estudo, facilmente se estende para as provas continentais.
Também o Sporting, por fazer parte das equipas com menor ranking, teria à partida, saindo de um pote 3, dificuldades em seguir para os oitavos de final. Real Madrid e (novamente) o Dortmund são e foram muito superiores. Sim, houve a exibição leonina no Bernabéu, mas a qualidade individual foi fundamental também nesse jogo.
O fracasso leonino vem com o Legia. A depender de um empate, perdeu na Polónia e nem se apurou para a Liga Europa.
É essa a competição, face à presença massiva das melhores equipas na Liga dos Campeões, que tem sido, e deverá continuar a ser, a praia dos portugueses. Onde pode de facto chegar mais longe, e até lutar por um título. Aconteceu recentemente com o Benfica, um pouco mais atrás com FC Porto e Sp. Braga.
Não é, por isso, normal que Portugal não tenha, nesta altura, uma equipa na Liga Europa.
O que nos leva também ao Sporting de Braga. Com Gent, Shakhtar e Konyaspor somou apenas uma vitória, frente aos turcos, e caiu na fase de grupos. Também os minhotos fracassaram, e não confirmaram o crescimento que, ao fim destes anos, já lhes é exigido.
Com menores ambições, o Arouca obrigou o Olympiakos a um prolongamento, depois de eliminar Heracles, o que deve ser sublinhado pela positiva. O Rio Ave caiu perante o Slavia Praga graças a um golo marcado em Vila do Conde pelos checos. Ficaram pelas pré-eliminatórias, mas a expectativa não pode ser ainda da mesma ordem de grandeza que acompanha os restantes «colegas» europeus. 
Portugal perdeu uma equipa, e partirá no próximo ano muito atrás da Rússia, sexta classificada e com três formações na Liga dos Campeões a partir de 2018/19. Isto porque fica sem os dois pontos de vantagem que tinha adquirido em 2011/12 – a partir daí fez sempre pior que a Rússia –, e a distância ainda pode aumentar porque Rostov e Krasnodar ainda continuam em prova.
A recuperação imediata será complicadíssima, e os próximos tempos adivinham-se muito difíceis. É necessário recuperar terreno o mais depressa possível, ou seja, continuar a estar nos oitavos da Champions e ir longe na Liga Europa."

Futebol e jornalismo: sinto muito, mas estão enganados

"Nuno Espírito Santo disse outro dia que era preciso mudar as regras: não pode haver dupla punição. Ou seja, um jogador não pode ser expulso quando é assinalado penálti.
Naturalmente discordo.
Ora já se percebe por esta introdução que vou falar da relação dos clubes com a imprensa, certo? Gosto muito de ser directo nas minhas abordagens.
Faço-o a propósito de dois episódios recentes.
Por um lado, Jorge Jesus não gostou que o assessor de imprensa pedisse perguntas apenas sobre o jogo em Tondela, na sequência de uma resposta sobre o ranking da UEFA. «Estamos a falar de futebol, pá», atirou-lhe o treinador.
Por outro lado, Manuel Machado acusou Tiquinho Soares de ingratidão, quando este já lhe tinha agradecido numa entrevista ao Porto Canal. «Tem uma audiência reduzida no quadro das grandes antenas nacionais e escapou-me», defendeu-se o treinador.
Os casos são iguais: partem de uma obsessão desmedida por controlar a informação que chega aos jornalistas, e por arrasto à opinião pública.
Esta obsessão não é de hoje. Tem pelo menos vinte anos e começou na insistência do FC Porto em fechar-se ao exterior. Depois disso todos os clubes acharam que estava no controlo sobre a informação o segredo do sucesso.
Curiosamente os anos mais felizes do FC Porto aconteceram com Mourinho e Villas-Boas, dois treinadores que abriam o clube à imprensa. Mas sobre isso ninguém tem interesse em reflectir. Faz sentido, sim senhor.
Enfim, em frente.
Voltando à obsessão dos clubes por controlar a informação, importa dizer que é uma obsessão incentivada pelos próprios adeptos. Que frequentemente defendem uma austeridade ainda maior na relação com os meios de comunicação social.
Nada mais errado, claro.
Os clubes precisam da comunicação social. A exposição mediática é que lhes dá dinheiro: os contratos publicitários, os patrocínios, a valorização da marca.
Hoje em dia são verdadeiras multinacionais, que movimentam milhões de euros: que não chegam, seguramente, das quotas dos sócios e dos bilhetes de jogos.
Chegam dos patrocínios, valorizados pela imprensa, chegam das vendas de jogadores, promovidos pela imprensa, chegam da Liga dos Campeões, que é um exemplo de como se deve trabalhar com a imprensa.
Fechar as portas do clube à imprensa é desvalorizar a marca e desbaratar bons contratos.
É uma evidência gritante: um espaço publicitário vale mais quanto mais vezes é visto.
Se um clube não deixa os jogadores aparecer, se não há entrevistas, se os treinos são fechados, vai naturalmente haver menos matéria jornalística e menos exposição do clube. 
As televisões vão encher-se de comentadores incendiários, a rádio vai dar menos notícias e a imprensa online mostrar menos vezes os patrocinadores.
Os jornais, que não podem sair em branco, vão concentrar-se noutros assuntos, muitas vezes marginais e desinteressantes na perspectiva dos próprios clubes.
Parece-me óbvio.
Os próprios jogadores perdem valor comercial: uma empresa que os patrocine, por exemplo, não vai valorizar o veículo publicitário que eles podem ser se não aparecem com a marca. Uma publicação ou outra no instagram não chega para rentabilizar a aposta.
Por isso vale a pena voltar atrás, para sublinhar que a imprensa precisa tanto dos clubes quanto os clubes precisam da imprensa.
Se não fossem os jornalistas, o futebol não seria muito diferente do hóquei em patis ou do ciclismo: modalidades que há setenta anos despertavam grande curiosidade nos adeptos, que perderam espaço na imprensa e que hoje têm um interesse marginal.
Porque não foram promovidos devidamente junto das massas.
O que o Sporting fez, através do assessor, e o que o FC Porto faz não prejudica só os meios de comunicação social: prejudica os próprios clubes.
Basicamente estão a esvaziar de interesse o conteúdo que fornecem aos jornalistas. Seja através do controlo das perguntas, seja através da distribuição da matéria (geralmente desinteressante) através dos meios próprios, de audiência reduzida e quase marginal.
Pelo caminho perdem espaço na imprensa e desvalorizam a marca que representam.
Por isso, sim. Sinto muito, mas estão enganados."