sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Vida real

"Há menos de um mês vim aqui criticar a bazófia de quem, na altura, comandava a classificação do campeonato nacional de futebol. Escrevi-vos sobre pessoas que incham como sapos, que atiram foguetes antes do tempo, que desvalorizam os adversários e só olham para o seu umbigo. São os mesmos que caem no insulto fácil e que cospem para o ar como se a gravidade não existisse.
Pois bem, desta vez somos nós que estamos à frente. E não me vão ouvir dizer que 'está no papo' ou que 'somos os imbatíveis' ou ainda que 'o nosso treinador é o melhor do mundo'.

O que tenho para dizer sobre esta chegada com estilo à liderança não é diferente do que tenho dito noutras temporadas. A diferença é que, à semelhança da anterior, tudo no SL Benfica deve ser pensado como colectivo e não como individualidade. Assim, se por acaso algum adepto adversário - no café, no trabalho, na jardim - quiser falar do actual estado de coisas, temos de ser claros. Não, não 'está no papo'. O êxito só surge depois do trabalho, e nesse campo, não tenho dúvidas de que o Glorioso está capacitado. Não, não 'somos imbatíveis'. Ninguém nos derrota em saber estar calados nos momentos certos e somos, sem dúvida, imbatíveis a festejar em Maio no Marquês de Pombal e um pouco por todo o planeta. Não, o nosso treinador 'não é o melhor do Mundo'. Ainda. Mas pode vir a ser se continuar nesta senda de conhecimento do futebol, responsabilidade, civismo, saber estar, respeito pelos adversários, pelos adeptos e, especialmente, pelos jogadores com quem trabalha.
Rui Vitória é o melhor treinador que o Tricampeão pode ter. E é com ele que quero chegar a este e outros títulos. Passo a passo e sem bazófia. Como deve ser."


Ricardo Santos, in O Benfica

Miss Piggy - Parte II

"(...)
Muitas pessoas me telefonaram a interpelar quem era afinal a Miss Piggy.
É evidente que não vou poder dizer peremptoriamente quem é a Miss Piggy. Sobre esta matéria existe uma piada muito interessante.
Antigamente, podíamos dizer mal de tudo, excepto do presidente do Conselho e afins. Hoje, podemos dizer mal do presidente do Conselho (República) e afins, mas não podemos dizer mal de mais ninguém!
O Estado Português passa a vida a ser condenado no Tribunal Europeu. A coisa funciona desta forma. Os tribunais portugueses condenam as pessoas por difamação, ofensa ao bom-nome, honra e mais um enxurrado de coisas idênticas. Ora, quem tem de pagar é o que violou esses pretensos direitos. Mas este recorre até ao Tribunal Europeu, aí ganha, e o Estado é condenado a pagar ao 'condenado' a verba que ele pagou ao queixoso, ou seja, quem paga são os contribuintes. Mas isto tem alguma lógica!
É que a Miss Piggy (que por acaso na minha rábula é um homem) passa a vida a ameaçar com isto e aquilo, e os processos que mete por pretensa violação do bom-nome, honra e mais umas botas, afinal, quem os vai pagar no fim são os contribuintes.
No final, o tal tipo que se fez de ofendido recebe o guito, fica rico, e quem paga são os contribuintes!

Mas vivemos onde?"


Pragal Colaço, in O Benfica

O mestre da bazófia

"Há duas faculdades que temos de reconhecer ao actual treinador do Sporting.
A primeira é a de, por via de uma hábil gestão de expectativas e/ou de rumores, ano após ano, Julho após Julho, fazer subir o seu próprio salário até níveis muito pouco compatíveis com a realidade do futebol português, e, sobretudo, com a realidade de um profissional que, aos 62 anos, apenas alcançou títulos significativos num dos clubes onde trabalhou.
A segunda é a de, por arte e engenho seus, ou por sortilégio das circunstâncias, conseguir dos presidentes que o contratam, padrões de investimento nos plantéis igualmente acima daquilo que é comum no nosso país, e daquilo que é, ou foi, concedido a diferentes treinadores desses mesmos clubes em momentos anteriores e posteriores – aconteceu entre 2009 e 2015 no Benfica, repete-se agora no Sporting.
As caríssimas equipas de que este técnico dispôs enquanto esteve na Luz, e de que dispõe em Alvalade, quer em termos de investimento, quer quanto a custos com a massa salarial, não têm paralelo na história dos dois rivais lisboetas. Tivessem idênticos meios, e muitos outros treinadores teriam podido encher o peito, e a boca, em conferências de imprensa, como génios de uma lâmpada que, todavia, não acende para todos com semelhante grau de luminosidade.
Quando andou por cá, uma envolvente estrutural de topo permitiu-lhe aproveitar bem os recursos, traduzindo-os em títulos. Veremos o que a sua suprema sapiência consegue até final da carreira, enquanto nos vamos divertindo com declarações que outrora nos faziam sentir desconfortáveis, ou até mesmo envergonhados."

Luís Fialho, in O Benfica

A propósito dos dez anos do Seixal

"É apenas pela via da formação que o futebol português pode manter-se entre os melhores do mundo. Embora seja preciso complementar o trabalho de base com uma prospecção atenta e com aquisições cirúrgicas, é na criação de talentos que reside, através de uma aposta continuada e coerente nas academias, aquilo a que  muitos chamam, lá fora, o milagre português. Escrevo estas linhas a propósito dos dez anos do Caixa Futebol Campus e do extraordinário trabalho que o Benfica tem levado a cabo na última década. Mas seria injusto se não referisse a excelência de Alcochete ou do Olival, o labor de tremenda qualidade levado a cabo, por exemplo, em Braga, Guimarães ou Funchal, os exemplos de sucesso recentes que vieram de Barcelos ou Vila do Conde e da consciência que vai tomando forma noutros clubes que ainda carecem de infraestruturas para a necessidade urgente de não ficarem pelo caminho. Mas que fique bem claro que o futebol não é um caso de sucesso em Portugal por obra do acaso, por uma sorte qualquer ou porque nascemos ensinados. No futebol, ao contrário do que acontece com a generalidade das modalidades, há uma prospecção continuada, meios físicos de treino e uma enorme competência por parte dos técnicos, que deixaram há muito para trás a fase empírica que marcou a formação noutras décadas.
Hoje, o Benfica poderia ter uma equipa made in Seixal capaz de lutar por títulos: Ederson; João Cancelo, Lindelof, Rúben Dias e Yuri Ribeiro; Bernardo Silva, André Gomes, André Horta e Renato Sanches; Gonçalo Guedes e José Gomes. Quem diria, há dez anos, que isto seria possível?"

José Manuel Delgado, in A Bola

Ovo de Colombo

"No décimo aniversário da academia do Benfica, recupera-se aqui a fórmula que melhor assenta ao futebol português: formar bem e vender melhor ainda!

Este texto esteve para intitular-se 'A fórmula', porque é disso que vai tratar, embora fosse potencialmente menos chamativo. E talvez menos adequado, porque aquilo que os clubes portugueses andam há anos a pôr em prática é uma espécie de fórmula mágica que permite actos de alquimia pura, como fazer deles competitivos a nível internacional, sem a matéria-prima gourmet dos endinheirados. Ou seja, aquilo que define a expressão 'Ovo de Colombo' - uma solução aparentemente simples para um problema complicado.
Ao anunciar lucros e receitas históricas, o administrador da Benfica SAD Domingos Soares de Oliveira enunciou a fórmula e até quem a usou anteriormente com evidente sucesso: 'No nosso modelo, à imagem do que o FC Porto fez durante alguns anos, é muito importante realizar mais-valias com a venda de jogadores, para pagar bons salários e fazer investimentos (...)'.
Rivalidades à parte, a receita é simples e 'pronto a vestir', serve a qualquer 'cliente'. Complicado é concretizar a transformação do chumbo em ouro, porque se de há uns anos a esta parte o 'economês' passou a integrar a linguagem do futebol, dando até a sensação de se ter apropriado dela e do próprio fenómeno, este continua a reduzir-se à sua expressão mais simples: a bola que entra é quem mais ordena e dela dependem todos os economistas, alquimistas e até donos de aviários."

João Araújo, in O Jogo

Mais do mesmo?

"Os Jogos do Rio já eram. Uso o pretérito imperfeito porque se tivesse usado o perfeito, diria que os JO/16, já foram. Relacionar JO com gramática não é tão louco quanto parece. Os gregos foram pioneiros no estudo da estrutura da língua e nos Jogos. Porém, seja qual foi o tempo - perfeito ou imperfeito - o certo é que da trilogia Desporto/JO/Portugal, raramente tem resultado algo que satisfaça aqueles para quem sucesso significa pódio, medalhas ou, vá lá, diplomas. Curiosamente, querem gramática quer em desporto, tendemos para nos atrasarmos: quanto à primeira, só no século XVI alguém se preocupou com a arte; e em desporto tem sido difícil estar em dia com o que se sabe e vai fazendo em países do nosso nível e possibilidades. Basta comparar expectativas com resultados, interpretar justificações e agir em caso de falhanço evidente. Mas, tirar satisfações e responsabilizar alguém não está no nosso ADN.
Por mais que evite, surge-me logo a lenda de Sísifo. E não por haver desportos onde é evidente que iremos passar mais quatro anos a empurrar promessas montanha acima mas porque, como ele, há quem julgue que pode enganar os deuses do Olímpo que, em Tóquio, não perdoarão. Mais um ciclo e aí vêm eleições a todos os níveis. Já abundam promessas vagas e pouco objectivas. É ler, ou ouvir, candidatos. Desde a classe política à dos dirigentes federativos, passando pelos técnicos. E no final, se não forem eles a desaparecer por lhes restar algum pudor, quem pediu, ou pedirá, satisfações?
O que os deuses quiseram mostrar a Sìsifo e raramente retiramos da lenda, é que os mortais não têm liberdade de escolha. Também nós não podemos escolher a sociedade em que vivemos, nem os meios humanos e técnicos de que dispomos e que, em várias áreas, não sabemos rendibilizar. Mas isso não justifica admitir, desde o início de um ciclo olímpico, os objectivos meramente qualitativos que já por aí andam e que, tal como na olimpiada anterior, nunca comprometem que os faz."

Jenny Candeias, in A Bola

Benfiquismo (CCXXVIII)

Chico Buarque rodeado de Estrelas...!!!