quinta-feira, 15 de outubro de 2015

O grande inimigo que recusa existir

"Entende-se, agora de forma muito mais clara, a estratégia de Bruno de Carvalho. Diabolizar o Benfica, tirar o seu presidente da comodidade de um silêncio que, em si mesmo, desvaloriza o discurso do presidente do Sporting e o remete, com algum desprezo, para a categoria de ruído e obrigar o inimigo, já não se pode falar de adversário, para uma guerra total, onde o Sporting poderia ter mais a ganhar do que a perder.
A evidente dificuldade de Bruno de Carvalho é que o Benfica leve o seu discurso excessivo e pretensamente demolidor suficientemente a sério para contrapor, para contra-argumentar, para discutir. O presidente do Sporting entende, e com razoabilidade, que uma coisa é discutir com um representante incendiário que quanto mais se repete menos é escutado; outra coisa seria chamar para o teatro de guerra o comandante do inimigo. Porque, aí, sim. Aí teria, de facto, uma guerra a sério para travar e ganhar.
Ora é, precisamente, a inexistência física de um inimigo que descredibiliza o discurso. Bruno sabe disso e é essa a razão que o leva a ultrapassar tudo o que se possa esperar de bom senso e caricaturar o ataque e as suas razões. O desafio é total, passa todos os limites da urbanidade e até da tradição leonina. Bruno acha que é o mal menor. O fim justifica todos os meios. Nem esconde o jogo. Ele próprio já reconheceu que representa um papel e que, em sua opinião, tem sido eficaz. Mais eficaz será se o Benfica desesperar e aparecer em palco. Enquanto Vieira ficar em silêncio e achar o inimigo desprezível, só resta a Bruno radicalizar-se. Corre um risco: deixar de ser credível aos olhos do seu exército."

Vítor Serpa, in A Bola

5 elogios... 3 a sócios do Benfica, 1 do Sporting e 1 do Porto

"Nélson Semedo: quem o vê julgará que está ali há algumas épocas. Porque joga, e faz jogar, como se já tivesse sido campeão do Mundo...

Neste tempo de interlúdio de futebol a sério, daquele que nos põe a discutir, a torcer por uma das equipas (que sensaboria isto da Seleção Nacional, onde todos puxamos para o mesmo lado, onde tudo é penalty a nosso favor - mesmo os que não são - e onde o que nos beneficia não é escrutinado por ninguém), tentarei homenagear quem, por força de decisões ou de exemplos, me impressionou nestes últimos dias.

Fernando Santos
1. A primeira homenagem não poderia deixar de ir para Fernando Santos. Chegou à Selecção Nacional, com o ferrete de um castigo de oito jogos e com alguns arautos da desgraça a preverem o pior. Foi capaz de nos cativar a todos. Com uma tranquilidade impressionante, com a disponibilidade de assumir todos os compromissos em benefício de uma ideia de «equipa de todos nós», tomando decisões de puro bom senso e de equilíbrio.
Não deixou, mesmo assim, Fernando Santos de ser fiel às suas convicções, ao seu modelo de jogo (tantas vezes criticado), à capacidade ímpar de juntar experiência (ou veterania, mesmo, nalguns casos) com a irreverência da juventude.
Não precisou de disfarçar ou de armar em líder intransigente, nunca o tendo ouvido a levantar a voz. Assumiu-se, verdadeiramente, como o pacificador que Portugal precisava, depois de tantos anos de gestão pelo conflito.
Muitas vezes, no futebol, temos a leitura de que quem assim age tem (quase) tudo para perder. Fernando Santos teve tudo a ganhar.
E venceu.
Como tinha vencido na Grécia, onde - ouvi de um dirigente de uma equipa grega que jogou com o Benfica, há uns anos - deixou mais saudades do que Otto Rehhagel, o treinador do Europeu de 2004... o do nosso descontentamento. Com uma pontinha de sorte (quem não precisa dela???) mas venceu... em Portugal. E, para além de ter vencido em Portugal, venceu com Portugal, o que é ainda mais difícil!

Fernando Gomes
2. Uma segunda palavra para Fernando Gomes, que foi audaz suficientemente para apostar em Fernando Santos. Talvez porque o conhecesse, mas, ainda assim, uma aposta de risco.
O treinador que tinha escolhido para ser o seu Seleccionador Nacional encontrava-se a braços com um castigo pesadíssimo. Pesado e que, no limite, a não ter nenhuma diminuição, levaria a que Fernando Santos ainda hoje estivesse à espera do último jogo para poder voltar ao banco de Portugal.
Com um castigo para cumprir, Fernando Gomes desenhou uma estratégia. Escolheu gente competente para defender as suas escolhas e... ganhou. Ganhou na FIFA, ganhou em Portugal.
Apostou num homem, apostou numa estratégia! - coisa rara neste País, onde quase todos tentam não assumir riscos ou convicções, para poderem continuar a desempenhar os cargos onde se encontram. Numa maneira muito portuguesa de quase todos serem defensores de... convicções alheias.
Fernando Gomes arriscou e ganhou, a que consolidou a sua posição à frente da FPF e, com isso, o aumento das críticas de uns quantos lá para... os lados de onde ele veio!

Cristiano Ronaldo
3. Não sou - como se sabe - um fã incondicional de Cristiano Ronaldo. Muito especialmente por causa dos que, não ganhando nada em Portugal, há muitos anos, se socorrem da sua imagem para venderem... o que não são. Com o desespero tão grande como o de alguém que, em dificuldades na água, se agarra a uma boia. Pobres diabos...
Mas, arranjemos a distância que não nos leve a confundir a apropriação do actual criador pela criatura e sejamos capazes de reconhecer a fantástica impressão que, na semana passada, me causou a imagem de CR7. Uma imagem que vale por milhões de palavras.
Ao ser homenageado, pelo Real Madrid, por se ter tornado o maior marcador do clube (em pouco mais de metade dos jogos de que Raúl precisou para marcar os mesmo golos), como pudemos constatar pelas capas dos jornais da capital espanhola do dia em causa, Cristiano Ronaldo aparece rodeado dos seus colegas de equipa.
Só que... Só que, nessa fotografia, está espelhada a diferença entre ele e os outros.
Bem sei que era ele o homenageado. Mas Cristiano Ronaldo apareceu, ali, de fato e gravata, ao lado dos outros... vestidos como sempre.
Sem quaisquer preconceitos, Cristiano Ronaldo tem noção do que representa e do que vale a sua imagem. Como tem noção do que representa a sua opção por não ter qualquer tatuagem. Repito, sem preconceitos, mas com a ideia de ter percebido a importância de ser mesmo ele. Sem ceder ao mais fácil, aos maus exemplos, ao que de vulgar se vai percebendo coexistir num balneário de uma equipa de futebol.
Pelas origens, talvez CR7 tivesse tudo para ser... como a maioria! De quem tinha tudo para se perder e soube como se ganhar e ser um exemplo.
Nunca o cumprimentei sequer. Por isso, o meu à vontade para dizer o que digo. Aqui fica o registo.
Rendido.

Bernardo Silva
4. Bernardo Silva podia ter passado ao lado de uma grande carreira, como tantos que, na hora deles, se perderam porque alguém, com responsabilidades, se preocupou em os deixar - mesmo - cair. Bernardo Silva teve alguém que tudo fez para que não fosse agarrado, na hora em que, formando-se a personalidade e o caráter, se dá corpo ao jogador.
Soube, todavia, ter a força que só aos predestinados está reservada para acreditar que, longe do clube onde adoraria vencer, seria capaz de esbofetear - com luvas vermelhas - quem se tinha preocupado, não só em o não reconhecer, mas, também, em o achincalhar.
Reencontrado o tempo e o espaço, há coisas que são inelutáveis. Como os rios que não podem ser detidos, no seu curso para o mar, também a qualidade futebolística de Bernardo Silva não foi parada pela indiferença - fundada numa zona de conforto bem menos exigente - de nada nem de ninguém.
Chegou, agora, para ficar, à Selecção Nacional. Comum a vontade de ganhar imensa, para que um dia, possa voltar ao clube do seu coração. O único onde poderá voltar, com toda a ânsia de ganhar, a que acrescerá a de ganhar... à Benfica.
Porque ele é um dos nossos. E terá de voltar para corrigir tanta injustiça cometida sobre quem, sendo um dos nossos, foi prejudicado por quem só pensava nele.

Nélson Semedo
5. O que ficou acima dito, poderá ser dito, também, para Nélson Semedo (a quem desejo uma rápida recuperação). Eu sei que há uns meses ia ouvindo - de quem de direito - que o Nélson seria o futuro defesa direito do Benfica... já no próximo ano.
Não chegou, para ele, sê-lo do Benfica. A ambição, a vontade, a raça, o querer, a disponibilidade... tudo isso fez dele uma aposta ganha. Quem o vê a jogar, poderá julgar que está ali há já algumas épocas. Embora nós saibamos que está ali há... dias.
Porque joga, e faz jogar, como se já tivesse sido Campeão do Mundo e da Europa, como se tivesse vencido tudo o que haveria para vencer. Assim, por certo - espero - que ficará muitos anos no Benfica. E agora vamos a Taça, com respeito e com tudo, porque, amanhã, o Vianense merece. Para que... não haja Taça, pela nossa parte, até ao Jamor."

Rui Gomes da Silva, in A Bola

Entre Cucujães e Mérida

"Recordo Cucujães dos meus tempos de jovem quando a sua equipa de basquetebol (do Clube Desportivo de Cucujães) ia jogar a Ílhavo com o meu clube, o Illiabum.
Por causa de Carrillo - e segundo ouvi - parece que vai haver uma guerra, por enquanto ainda surda, entre o simpático Atlético Clube de Cucujães que milita na 1ª Divisão distrital de Aveiro e o estremenho Mérida que, de falência em falência, se vai metamorfoseando e lá vai fazendo pela vida na 2ª Divisão B espanhola. É que ambos querem ficar com o peruano, livre como um passarinho a partir do Ano Novo. Ao que consegui apurar, o seu coração balança descompassadamente entre a freguesia de Oliveira de Azeméis e Mérida da Extremadura espanhola. Nem o Clube Recreativo da Caála do Huambo, nem o Sporting Clube de Portugal foram capazes de seduzir o sul-americano. Entre amigos meus, sócios ou simpatizantes do clube leonino, uns desabafam que «quem caála consente», e outros mais direccionados replicam perante a quase inevitável perda do jogador («doyen a quem doer») «por que não te caálas?». Sinceramente, espero que o Cucujães, caso venha a ficar com os direitos económicos e desportivos do jogador (esta coisa de um jogador se poder partir em fatias, sempre me fez muita confusão...), não os transfira do cuco para a águia, nem que seja - como sói dizer-se - a custo zero.
Primeiro, porque no SLB há muito melhor do que Carrillo. Segundo, porque já se sabe o que são comissionistas a dar cabo da cabeça de atletas. Terceiro, porque não queremos prejudicar o Cucujães. 
Enfim, mas o melhor mesmo é que Carrillo vá para a (linda) Mérida."

Bagão Félix, in A Bola