segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Lixívia 4

Tabela Anti-Lixívia:
Benfica.............9 (-3) = 12
Corruptos..........10 (0) = 10
Sporting............10 (0) = 10

Uma daquelas jornadas estranhamente calmas, na Luz levámos com o irritante Bruno Paixão, que apitou vezes demais, mas sem erros graves... os jogadores também ajudaram.
Os Corruptos em Arouca normalmente não precisam de empurrões, a atitude da equipa da casa é sempre hospitaleira... algumas dúvidas em lances de fora-de-jogo para os dois lados, mas foram sempre bem decididos. O Capela mostrou muitos amarelos, mas sempre com o critério justo, algo que os Corruptos não estão habituados, e assim compreende-se alguns protestos!!!
Os Chorões em Vila do Conde, também com um visitado hospitaleiro, lá beneficiaram de mais um penalty (4.º em quatro jornadas, boa média!!!), após uma paragem cerebral do Wakaso!!!

Temos Clássico na próxima jornada, provavelmente vamos levar outra vez com o Jorge Sousa...!!!

Anexos:
Benfica
1.ª-Estoril(c), V(4-0), Tiago Martins, Nada a assinalar
2.ª-Arouca(f), D(1-0), Nuno Almeida, Prejudicados, (1-2), (-3 pontos)
3.ª-Moreirense(c), V(3-2), Jorge Ferreira, Prejudicados, (4-1), Sem influência no resultado
4.ª-Belenenses(c), V(6-0), Bruno Paixão, Nada a assinalar

Corruptos
1.ª-Guimarães(c), V(3-0), Veríssimo, Nada a assinalar
2.ª-Marítimo(f), E(1-1), Hugo Miguel, Nada a assinalar
3.ª-Estoril(c), V(2-0), Duarte Gomes, Prejudicados, (3-0), Sem influência no resultado
4.ª-Arouca(f), V(1-3), João Capela, Nada a assinalar

Sporting
1.ª-Tondela(f), V(1-2), Xistra, Prejudicados, Beneficiados, (0-1), Sem influência no resultado
2.ª-Paços de Ferreira(c), E(1-1), Manuel Oliveira, Nada a assinalar
3.ª-Académica(f), V(1-3), Bruno Esteves, Prejudicados, Beneficiados, Sem influência no resultado
4.ª-Rio Ave(f), V(1-2), Hugo Miguel, Nada a assinalar

Jornadas anteriores:
1.ª jornada
2.ª jornada
3.ª jornada

Épocas anteriores:

Assim se pacifica o futebol português

"Numa semana onde os grandes ganharam, não houve contestação a Bruno Paixão, João Capela e Hugo Miguel. Nem a Vítor Pereira...


Jornada com vitórias dos grandes, mais sofrida a do Sporting, dentro da normalidade a do FC Porto e com nota artística, a do Benfica. Ou seja, como os grandes ganharam não houve nem contestação nem polémica e ninguém falou de Bruno Paixão, João Capela ou Hugo Miguel, muito menos se ouviram os tambores da campanha histérica contra Vítor Pereira. E será bom, desde já, que as vozes mudas, sub-reptícias e anónimas que fazem campanha pela fragilização do presidente da Comissão de Arbitragem sejam desmascaradas. Haverá eleições daqui a um ano para os vários órgãos da FPF e as movimentações já se fazem sentir, umas mais recomendáveis que outras, mas todas com o mesmo sentido: prioridade é abater Vítor Pereira; e, de caminho, se for possível derrubar Fernando Gomes (e será que alguém se preocupa com o facto de estarmos perante alguém que está a realizar um percurso de excelência, dentro e fora de portas?), melhor ainda.

Feita esta nota, tendo em vista a volatilidade da polémica relativa à arbitragem, conjuntural, maioritariamente rasteira e inevitavelmente oportunista, devemos abrir espaço para a semana europeia que amanhã abre portas com o Benfica-Astana. Portugal precisa de pontos UEFA, os desafios do futuro próximo são exigentes e há que lutar com todas as forças para manter os 2+1 na Champions de que actualmente dispomos. Na ronda desta semana, é evidente que o Benfica é favorito (pena é que não tivesse alterado a ordem dos jogos porque actuar em Astana a 25 de Novembro é um congelador anunciado) e o FC Porto vai ter em Kiev a primeira prova de fogo da temporada. Ali se saberá, perante um adversário que tem subido de produção nos últimos dois anos, qual o estado de prontidão da equipa de Lopetegui. Na Liga Europa há um duelo de qualidade em Alvalade entre Sporting e Lokomotiv de Moscovo (curiosidade, José Couceiro já treinou as duas equipas), o SC Braga, ferido pela escorregadela no Estoril vai à República Checa a casa do Liberec, justificar uma candidatura à passagem à fase seguinte da prova e o Belenenses, convalescente da goleada na Luz (Ventura, deixa lá, eu sofri lá oito e o enorme Jorge Martins levou com sete nas Antas...) irá jogar sem nada a perder em Poznan (bonita cidade e excelente estádio). Aos cinco magníficos pedem-se pontos UEFA!.

Aqui se coloca a questão do tempo e do espaço...
«A Académica fez hoje, de longe, o melhor jogo da época. Fomos uma equipa personalizada e forte na organização ofensiva.»
José Viterbo, treinador da Académica
Ao fim de quatro jogos a Académica ainda não pontuou, marcou um golo e sofreu dez. José Viterbo, herói da recuperação na temporada passada, mesmo assim, consegue encontrar razões de esperança no futuro. Precisa de tempo e de espaço para provar a sua tese. E aqui nasce o problema: até que ponto o que mostrou ser capaz de fazer no passado influencia o (seu) futuro?

(...)
Um fim de semana da 'bella Itália'
Uma final do US Open entre as italianas Flavia Pennetta e Roberta Vinci (vitória de Pennetta, fantástico ponto final numa carreira de prestígio) e um triunfo de Aru na Vuelta, marcaram um fim de semana de sonho do desporto italiano, que tem ainda a 'squadra azzura' no Europeu de de basquetebol...

CR5
Longa a seca de Cristiano Ronaldo e ainda na última edição da 'Quinta da Bola', na Bola TV, tive a oportunidade de manifestar a minha preocupação pela alergia do prodígio madeirense ao fundo das redes contrárias. Seria uma questão física? Haveria algum problema psicológico? Ou Madrid já não seduzia CR7? Boas perguntas, todas e cada uma delas respondidas em Barcelona pelo 'sete' merengue. Cinco golos ao Espanhol acabaram com a crise, o 'ketchup' não queria sair do frasco mas acabou a inundar o prato. Com cantavam os Supertramp, 'crisis what crisis'?"

José Manuel Delgado, in A Bola

O melhor evento

"Já por diversas vezes neste espaço de opinião tenho defendido uma maior proximidade entre o Desporto e o Turismo. Entendo esta ligação como estratégica, para um país que cresce de forma sustentada como destino turístico e tem no desporto um factor de agregação e orgulho.
Estive em Albufeira na grande festa anual do Turismo organizada pela Publituris, onde foram entregues os Portugal Travel Awards 2015. Apesar da tutela actual do turismo ligar pouco ao desporto, foi muito interessante perceber que os agentes do sector escolheram a final da Liga dos Campeões como Melhor Evento do Ano realizado em Portugal.
A Liga dos Campeões em Lisboa no ano do centenário da FPF foi um extraordinário sucesso e uma das maiores organizações desportivas e económicas que o país teve oportunidade de receber na sua história recente. As receitas directas e indirectas - quer em receitas de turismo, na arrecadação de impostos, quer na projecção de Lisboa e Portugal como destino turístico de excelência - foram, em eventos de curta duração, praticamente inigualáveis. Foi ainda o evento desportivo mais visto no mundo em 2014, transmitido para mais de 200 países, com uma audiência global estimada em cerca de 165 milhões de pessoas, envolvendo 380 milhões de telespectadores, além da pacífica invasão espanhola. São números impressionantes e fazem alguma justiça em relação à dimensão do evento e do seu retorno económico, bem como o impacto no turismo.
A FPF deu enorme contributo às contas públicas e ao desenvolvimento de um destino turístico de qualidade e excelência. Este reconhecimento dos profissionais do turismo não tem comparação com a indiferença da tutela do sector que nem apareceu na festa no Algarve."

Hermínio Loureiro, in A Bola

PS: Seria assim tão difícil, referir que a Final da Liga dos Campeões em Lisboa, decorreu no Estádio da Luz?!

“Quando saiu no jornal que o Benfica me queria, pensei que era mentira. Sou o Maradona agora, queres ver?”

"A época do melhor jogador do mundo de futsal não poderia ter começado - lá está - melhor: bisou na conquista da Supertaça espanhola pelo Inter Movistar, já depois de ter completado 30 anos, idade que o atormenta. Nascido e criado Ricardo Filipe da Silva Braga num bairro social no Porto onde aprendeu a jogar até com laranjas, passou a Ricardinho quando começou a brilhar no futsal, no Benfica e lhe disseram que ia ser “o melhor desta merda toda”. Jogou no Japão e na Rússia, mas é em Madrid, onde foi campeão na época passada, que se sente melhor

- A Bola TV comprou os direitos da Liga espanhola de futsal. É por tua causa?
- Acho que é uma das causas, claro [risos]. É muito bom para mim e acho que para todos os portugueses também porque podem acompanhar a melhor liga do mundo todas as semanas.

- Vens a Portugal muitas vezes?
- Este ano vai ser mais complicado, porque vamos ter muitas competições, a nível de clube e de seleção, porque temos o Europeu e o apuramento para o Mundial. No ano passado, como jogava à sexta-feira, ia quase todos os fins de semana a casa. Mas este ano acho que vai ser o contrário, infelizmente.

- Gostas de viver em Madrid?
- Gosto muito. Aliás, já não me vejo a fazer vida fora de Espanha. Acho que é a primeira vez que sinto isto. Já vivi no Japão e na Rússia mas aqui sinto-me em casa, fui muito bem recebido. A verdade é que já tenho aqui muitos amigos e passo as minhas folgas cá, a conhecer Madrid. Quando tenho mais tempo vou a casa ver os meus filhos, mas quando não é possível falamos todos os dias pelo Skype. Ajuda a parecer que estou mais próximo.

- E o teu castelhano, que tal?
- Está muito melhor. Eles dizem que estou no top 5 dos estrangeiros que passaram pelo clube [risos]. Adaptei-me rapidamente. Já no Japão também, estudei japonês durante três meses e foi muito difícil, mas já dava para ir sair e pedir qualquer coisa. Claro que agora em Espanha é mais fácil, o idioma é parecido. Também sou uma pessoa que gosta muito de aprender e não tenho vergonha nenhuma de falar e ser corrigido, por isso facilitou. No início gozavam um bocado, "no entiendo nada" [risos], porque nós usávamos o tal portunhol, mas agora já não.

- E cumprem religiosamente a sesta?
- Fazem mesmo e eu já apanhei esse problema [risos]. É incrível, porque antes gozava com eles. Íamos para estágios e quando acabávamos de almoçar eles queriam ir dormir e eu ficava acordado as duas ou três horas que tínhamos de descanso, porque não estava habituado, mas eles com uma facilidade enorme adormeciam e eu ficava sem saber o que fazer. Mas com o tempo... até o café com leite já tomo, já não tomo o café português, portanto é tudo uma questão de hábito.

- Estiveste em Lisboa há pouco a jogar contra o Benfica e o Sporting, na Masters Cup, e marcaste seis golos. Foi perfeito?
- Perfeito era ter jogado com a camisola do Benfica [risos]. Custou-me imenso marcar ao Benfica, acho que foram os únicos golos que não festejei... Até no bairro festejava sempre.

- Como é que tens essa ligação ao Benfica se antes eras do FC Porto?
- É verdade, é uma coisa rara, porque costumamos dizer que não se muda de clube, ainda por cima de um rival para o outro, não é? Mas é simples. Nunca fui fanático, desde que tive aquele problema com o futebol, que foi jogar até aos 13 anos e depois no FC Porto dizerem-me que era pequeno demais. Quando fui para o Benfica, com 16 anos, comecei a criar uma ligação. Cresci ali como atleta e pessoa e fui criando raízes, criou-se dentro da mim a mística do que era o Benfica. Estive dez anos e meio lá por isso acho que foi normal isso acontecer, comecei a ver jogos em futebol, andebol, basquete, hóquei em patins... Criei amigos e o Benfica ficou dentro de mim.

- Essa nega que te deram por supostamente seres demasiado pequeno achas que também acontecia hoje? O Messi é o que é e tem 1,69m.
- Tenho amigos no futebol e já trocámos muitas conversas sobre este tema, e a verdade é que também tem muito a ver com o treinador que apanhas. Lembro-me que jogava no Cerco do Porto e num jogo contra o Salgueiros ganhámos 4-1 e marquei os quatro golos. E estava lá um treinador do FC Porto, era o Frasco, que me convidou para ir jogar para lá. No ano seguinte fui, mas o treinador já não era ele, era outro, que gostava de jogadores fortes e altos, tinha uma ideia diferente da formação. Para mim foi uma desilusão, se calhar para ele agora também. Foi um sonho perdido.
- Onde começaste a jogar?
- O meu pai é do Cerco e a minha mãe de Fânzeres, e eles juntaram-se e foram viver para Fânzeres. E eu comecei a jogar lá, num largo no meio da rua que tinha uns bancos onde os velhotes descansavam, e usávamos a parte de baixo a fazer de balizas. Ficávamos horas a jogar, futebol ou futsal ou lá o que era aquilo. Aí não interessava nem peso nem tamanho nem nada. Depois fomos viver para Gondomar, devia ter uns 8 anos. Aquilo era um bairro social, mas para nós era como um condomínio fechado de grandes condições, porque tinha um ringue [risos]. Íamos para lá todos os dias. Até no dia do baptizado de um primo fui para lá e rebentei os sapatos todos. A minha mãe queria-me matar. Era um miúdo reguila que só queria jogar à bola e não havia horários para isso.

- Então aprendeste a fintar na rua, no ringue, de ténis, de sapatos...
- O meu pai trabalhava no mercado abastecedor do Porto e trazia muita fruta para casa. Eu pegava nas laranjas e nas maçãs para jogar, porque não havia dinheiro para bolas, infelizmente. Começava a fazer truques em casa e levava muita porradinha dos meus pais, porque a fruta não era para estragar [risos]. Mas aquilo para mim era uma coisa redonda e dava para brincar. Ainda este fim de semana estive em Gondomar e estavam laranjas em cima da mesa. E o meu pai disse: “Se fosse há uns anos, já estavam as laranjas todas no chão.” Começaram-me a vir as lágrimas aos olhos. O tempo passa, e hoje em dia os miúdos não valorizam nada disso, só querem computadores e não sei que mais. Até com meias e fita-cola eu jogava. Claro que na minha altura não havia YouTube para ver fintas, mas ia vendo o que os mais velhos faziam, porque jogava sempre com rapazes de 24, 25 anos, tinha eu 14 e 15, e aprendi à força com eles. Claro que quando começava com brincadeiras eles não achavam muita piada [risos].

- Como era a vida no bairro?
- Nunca tive problemas. Mas somos três irmãos, e o mais velho está preso, há sete anos. Porque no bairro há de tudo e és tu que tens de escolher o teu caminho. Mas, atenção, não tenho vergonha nenhuma, o meu irmão continua a ser um exemplo para mim. Isto para te explicar que sempre fui muito feliz no bairro. Não tinha sapatilhas, o vizinho do 2º esquerdo trazia-me umas sapatilhas; se tinha as meias rotas, o senhor do lado dava-me umas meias... Hoje, acho que a maioria das pessoas nem conhece os vizinhos. Eu conhecia todos e ainda agora vou lá e sou para eles como um ídolo, mas chego lá e sou igual para todos. Vou ao mesmo café, tenho os mesmos amigos, falo com os mesmos senhores mais ou menos velhos, vejo os pequeninos que já cresceram...Aliás, há pessoas que trabalham comigo agora, nas minhas redes sociais, e o meu motorista, que são do meu bairro.

- Quando eras miúdo, o que é que querias ser?
- Sempre quis ser jogador. Também me alimentavam isso, porque desde pequeno chamavam-me Maradona, e eu nem sabia quem era. Tive de perguntar ao meu pai.

- Não havia YouTube...
- Nem computador, quanto mais [risos]. O meu pai explicou-me quem ele era, e pensei que era uma responsabilidade enorme. Para mim, girava tudo à volta da bola. Na escola chamavam os meus pais porque eu estava sempre a jogar e depois chegava às aulas todo suado e mal conseguia escrever, a pingar os cadernos. Diziam aos meus pais para me chamarem a atenção, mas para não me proibirem de jogar, porque podia ter futuro.

- Lembras-te dos primeiros trocos que ganhaste?
- Lembro-me perfeitamente da história toda, se quiseres que te conte. Ainda é longa.

- Conta.
- Treinava no Miramar, nos juvenis, juniores e seniores.

- Como é que é?
- Tinha 15 anos e treinava, das 20h às 24h, com os juvenis, os juniores e os seniores. E quem me levava a casa era o André Lima [ex-jogador e treinador do Benfica], no seu Opel Corsa cinzento, lembro-me perfeitamente [risos]. Com os juvenis jogava só jogos mais difíceis, porque normalmente jogava nos juniores e os seniores para mim eram uma espécie de prémio, estar só a treinar com eles era muito bom. E então o que é que aconteceu: há um Miramar-Freixieiro, numa quinta-feira, em que o André Lima é expulso, o Israel é expulso e um guarda-redes é expulso.E nós tínhamos jogo a seguir, sábado, contra o Famalicense. Na sexta-feira, o treinador disse-me que eu estava convocado para o jogo dos seniores e eu fiquei logo todo a suar. Já nem consegui dormir nessa noite. Acho que já dormi com a mochila às costas, para não me esquecer [risos] Combinei com um colega para me ir buscar à rotunda do Freixo, que eram 35 minutos a pé desde a minha casa. Fui a correr o caminho todo, porque estava com medo de me atrasar, mas cheguei lá uma hora antes [risos]. Quando chegámos ao campo, eu todo suado e eles a gozar: “Já estiveste a jogar, Ricardo?” Nunca pensei que fosse entrar, porque eram oito seniores e eu, pensava que estava ali para fazer número. Até que começamos a perder e eu penso logo para mim "agora é que não jogo mesmo". Mas o treinador de repente diz: "Ricardo, anda". Só que na altura havia um outro jogador que se chamava Ricardo, por isso quando ouvi o nome, não me mexi, pensava que era para aquele rapaz. E ele volta a chamar e os outros começam a empurrar-me: "anda lá". E eu pensei "estamos a perder e eu vou lá para dentro fazer o quê?" Entrei... Olha, o Maradona marcou com a ‘mão de Deus’ e eu acho que foi Deus que me deu a mão para marcar três golos. Ganhámos 4-1, mas o treinador tirou-me antes de o jogo acabar, porque disse que eu estava mais branco do que a parede [risos]. Isto para chegarmos então ao que perguntaste: no final, o presidente deu-me um cheque. “Isto é um prémio pelo teu jogo.” Agora imagina, eu nunca tinha tido dinheiro na minha vida - infelizmente a minha mãe, coitadinha, só me dava o que podia para eu levar para a escola, que era uma moeda grande, cinzenta, de 50 escudos - e ele dá-me um papel, o que para mim não era nada. Guardei aquilo e quando cheguei a casa dei à minha mãe, disse-lhe que não sabia bem o que era. E ela pega no cheque e começa a chorar: "Ó filho, isto é dinheiro. São 250 euros." Fiquei muito orgulhoso por poder ajudar os meus pais.

- Pouco depois ligaram-te do Benfica. Acreditaste logo?
- Achas? Aquilo até saiu primeiro no jornal: “Benfica quer Ricardinho”. Comecei-me a rir-me, claro. Sou o Maradona agora, queres ver? Pensei que era mentira. Passados três ou quatro dias, ligaram para os meus pais. Quer dizer para o meu pai, que ele é que tinha telemóvel. E quando ele me diz aquilo comecei logo a chorar, nem sabia se era felicidade ou medo de falar com eles. Os meus pais na altura faziam-me uma coisa muito boa: diziam que eu é que tinha de decidir o que queria, não tomavam decisões por mim. O meu pai dizia: "Se um dia bateres com a cabeça na parede, é por tua culpa, não é por minha. Mas eu vou estar aqui para te ajudar". Quando o Benfica me ligou, eu já ganhava 750 euros, lembro-me perfeitamente, e o engenheiro Luís Moreira ofereceu-me 1900 euros. Aquilo era um câmbio impressionante, como dizem os espanhóis. Na altura a minha mãe não trabalhava e o meu pai acho que ganhava uns 500 euros. Eu, ingénuo, perguntei se aquele dinheiro fazia muita falta à família, e eles disseram que sim. E eu disse que ia, apesar de querer ficar com os meus amigos, na minha cidade e no meu bairro. Já ganhava 750 euros, por isso para mim já estava rico [risos]. Por incrível que pareça, nos primeiros dois anos no Benfica, eu ficava com 50 euros, o resto mandava tudo para os meus pais, para ajudar. Ficava com aqueles 50 euritos e ia ao Porto de vez em quando, de boleia com o André Lima ou o Arnaldo, ainda por cima eles não me deixavam pagar nada, porque eu era o menino deles. Mesmo assim houve uma altura complicada, antes de ir para o Benfica, porque o Freixieiro apareceu-me em casa com uma mala com cinco mil euros. É algo que não se deve fazer, mas pronto, já se fez. Para um miúdo do bairro ver cinco mil euros à frente dele... Mas a minha mãe rejeitou, disse que éramos pobres mas éramos humildes e tínhamos palavra, já tínhamos dito que ia para o Benfica. E fui.

- Como é que te safaste sozinho em Lisboa, com 16 anos?
- Só queria voltar para o Porto. Há coisas do caraças, porque agora sou um viajante, adoro viajar, mas naquela altura não. Lembro-me de que no dia em que me fui embora estava o bairro todo à porta de minha casa, tudo a chorar, porque para eles Lisboa era a 50 horas dali. Parecia que ia para o Japão ou o caraças [risos]. "Ai nunca mais te vamos ver, o nosso menino" e estava eu a duas ou três horas de comboio, não é? No Benfica ainda tinha de aprender e jogava pouco. O mister Alípio Matos perguntou-me se estava triste, e eu disse-lhe que me queria ir embora, porque jogava pouco. Ele respondeu: “Aguenta, miúdo, porque vais ser o melhor desta merda toda” [risos].

- Vivias com quem?
- Vivia em Caneças, no cu de Judas, numa casa do engenheiro Luís Moreira, com o André Lima e com o Arnaldo, o que para mim foi uma salvação, ensinaram-me muito. Ajudaram-me a fazer com que os meus 50 euros parecessem cinco mil euros [risos]. Até parece mal contar isto, mas passei a ir pela primeira vez ao shopping, aquilo para mim era um espanto e eles riam-se de mim, porque eu olhava para tudo, não estava habituado.

- Cozinhavas?
- Não, não, nós tínhamos um patrocínio na altura de uns restaurantes em Caneças e em Loures e íamos lá. Ainda hoje não sei cozinhar [risos].

- E com as miúdas, davas-te bem?
- Por acaso acho que sempre me dei bastante bem [risos]. Porque a minha maneira de ser, assim brincalhão, sempre me safei muito bem. Em Lisboa ainda me custou um bocado ao início, porque com aquele sotaque era mais difícil [risos]. Também fui aprendendo com os mestres André e Arnaldo [risos]. Aliás, a minha mulher - infelizmente hoje em dia estamos a pensar separar-nos - é de Lisboa.

- Quando estavas no Benfica também houve aquela história de ires experimentar o futebol 11, mas depois não se concretizou.
- Infelizmente. Abriu-se uma porta e veio um camião e pôs-se à frente, é o que eu costumo dizer. Entendo que as pessoas que estão nos jornais queiram dar as notícias antes do outros, mas quando isso saiu no jornal, antes do tempo, o Benfica fez marcha atrás, até porque era um ano em que não ganhou nada e estar a arriscar pôr um jogador de futsal no futebol se calhar os adeptos não iam achar muita piada. A ideia era fazer tudo em sigilo mas infelizmente não foi possível. Mas isso fez-me ganhar ainda mais força para continuar a mostrar o meu valor no futsal e chegar a este patamar.

- Falavas há pouco nos 50 euros com que ficavas. Não houve alguma coisa que quisesses mesmo comprar com o primeiro dinheiro?
- Quando comecei a ganhar aqueles 750 euros dava tudo aos meus pais. Mas um dia disse à minha mãe: "No dia em que já não precisares tanto do dinheiro, podes dar-me 500 euros?" E ela muito surpreendida: "Ai filho, para que é que queres tanto dinheiro?" Na altura tinham saído uns telemóveis topo de gama e eu queria comprar um, porque já tinha um amigo lá na escola que felizmente tinha uma vida melhor do que a minha e tinha um. E passados uns tempos, a minha mãe deu-me o dinheiro e foi a primeira coisa a sério que eu comprei, mais para mostrar aos amigos do que para mim até [risos]. A segunda coisa que quis comprar, logo depois de tirar a carta de condução, foi um carro, claro. Foi um Audi A3 cinza. Ainda dormir algumas noites dentro do carro [risos]. Qualquer coisa que acontecesse dizia "vou ali". "Ali onde?", "ali", desde que andasse um bocado de carro [risos].

- Foste para o Japão pelos 30 mil euros por mês?
- Ainda foi mais um bocado [risos]. Já em 2009, quando ganhava 10 mil euros no Benfica - o que em Portugal já era demasiado forte para um jogador de futsal, como algumas pessoas dizem, porque só os de futebol é que merecem esses valores -, queriam que fosse, mas não me quiseram pagar tanto. No ano seguinte, perguntaram-me o que queria, e eu estava com a minha mulher a mandar o e-mail e dizia: carro, viagens, internet, fogão... sei lá, tudo o que me lembrei. Disse-lhe para ela se preparar, porque ela é cantora e as músicas dela já andavam a passar nas novelas, mas se eles dissessem que sim tínhamos de ir. Achávamos que não iam aceitar, mas a conversa nem sequer durou cinco minutos, porque chegou logo o e-mail a aceitar. Ficámos com cara de parvos. Até tivemos de casar à pressa pelo registo para irmos os dois. Não me arrependo de nada, foi uma aventura fantástica, trataram-me muito bem. O único senão eram os terramotos e a distância para Portugal. Perdi mais de 30 internacionalizações com isso, porque eram 22 horas de viagem e era muito desgastante, por isso só vinha para a seleção nos jogos mais a sério.

- E em Espanha ganhas menos?
- Agora está quase ela por ela. Quando vim, no ano passado, ganhava menos 30%, porque tive de me vir mostrar aos espanhóis, eles são muito desconfiados. “És bom em Portugal e no Japão, mas quero ver em Espanha.” Então fizemos um contrato que era revisto de três em três meses, dependendo da minha prestação. Felizmente, já estou com o valor semelhante ao do Japão. E estou muito bem aqui.

- Fizeste quinta-feira 30 anos...
- Acabaste comigo agora. Isso é o pior assunto de todos [risos]. As pessoas dizem que estou sempre a sorrir, mas já tinha dito que quando chegasse aos 30 ia ficar triste. Começam a pesar as pernas e as costas e tudo mais. Se Deus quiser e me proteger das lesões, espero jogar a alto nível, a fazer a diferença, até aos 35 ou 36 anos.

- Como é sentires-te o melhor do mundo - já por duas vezes?
- O que acho é que ser o melhor do mundo é um momento. Porque tu fazes uma temporada fantástica, marcas muitos golos, a tua equipa ganha títulos e é mais fácil seres nomeado melhor do mundo. Mas aconteceu-me isso no Japão e aí não me deram nada. "No Japão até eu", devem ter dito. Foi preciso vir para a melhor liga do mundo, contra os que são supostamente melhores do mundo, para mostrar, até parece que as pessoas só olham para a liga espanhola. Sinto que, mais importante do que ganhar qualquer título, ganhei o respeito dos treinadores contrários, dos adversários, do treinador, dos companheiros... Um português ser recebido em qualquer estádio aqui e ser aplaudido e parado durante uma ou duas horas para fotografias e autógrafos, isso sim é um grande troféu. Por isso é que digo que estou a passar o meu melhor momento. Estou na melhor equipa do mundo para jogar futsal e na melhor liga. Infelizmente não tem os melhores adeptos, porque esses são os do Benfica [risos] mas sou muito bem tratado e espero seguir aqui muitos anos.

- Os teus filhos jogam?
- O meu filho, Lisandro, tem 7 anos, é canhoto e joga futsal. Mas diz que gosta mais de jogar futebol do que futsal porque tem medo do barulho dos pavilhões [risos]. Infelizmente nunca tive oportunidade de ver um jogo dele, porque ele joga ao sábado e eu raramente tenho sábados livres, mas claro que já joguei com ele e já vi que tem um pé esquerdo bem vincado. Mas eu não sou muito aquele pai de dizer "aqui temos o próximo Cristiano Ronaldo ou Maradona" [risos]. Quanto à minha filha, posso dizer-te que adoro futsal feminino, vejo muito e falo com a Mélissa Antunes, com a Rita Martins e com jogadoras espanholas e brasileiras, mas Deus queira que a minha filha vá por outros caminhos.

- Porquê?
- Porque acho que o futsal feminino está muito discriminado, muito subvalorizado. Portanto o que vejo, é verdade que já há mais aposta, mas elas sofrem muito para terem o valor reconhecido e preferia não ver a minha filha a passar por essas dificuldades, claro. É só por isso, porque eu adoro futsal feminino, acompanho muito e vou ver a Supertaça feminina aqui de Espanha, por exemplo. Mas é uma luta quase sem fim.

- Um dia destes disseste que ias escrever um livro no qual ias falar de temas polémicos. A que te referes?
- Ui, está quase pronto e vou contar muita coisa que as pessoas não vão gostar de ouvir. As pessoas de quem vou falar, quero eu dizer. Mas acho que está na hora.

- Como por exemplo...
- Não, não posso contar ainda. Posso dizer que o livro vai falar da minha história, dos bastidores da história. O que aconteceu no Mundial, o que aconteceu quando o Ricardinho voltou ao Benfica seis meses e foi expulso dois ou três jogos seguidos, o problema que houve nessa altura no balneário... Agora é que as pessoas vão saber. Sairá brevemente."

Vai tudo a tiro

"A táctica do bulldozer

O Sporting quer processar Pedro Guerra? Decisão curiosa, que talvez pudesse levar-nos a pensar que Pedro Guerra é ou muito mau ou muito bom comentador. Tanto quanto percebi pelas poucas vezes que o vi em acção, é um daqueles que fazem da facilidade em ser obnóxio a sua principal força. Nem por isso se destaca dos demais, porém. E processá-lo porque disse que os leões queriam Mitroglou - note-se bem: porque disse que os leões queriam Mitroglou, essa revelação dos diabos, e ademais tão ofensiva - torna a provar que já não importa quem é o alvo nem qual o motivo. O Sporting faz questão de estar em guerra com tudo e com todos na Luz - grandes, médios e pequenos; vermelhos, amarelos e cor-de-rosa às bolinhas. Alguém convenceu Bruno de Carvalho de que se trata de boa estratégia. Ficará para dividir as responsabilidades?

SEMANA HISTÓRICA
O triunfo islandês
A chegada da Islândia ao Europeu não significa apenas mais uma estreia numa grande competição. Se atendermos à população, o apuramento da Islândia não é tão extraordinário como seriam os de San Marino, Andorra ou Liechtenstein, mas é mais extraordinário do que seriam os de Luxemburgo ou Malta, 30 vezes mais do que seria o do Azerbaijão e 60 vezes mais do que seria o do Cazaquistão. Como se os Açores ou a Madeira se qualificassem, no fundo. E, na hora do balanço, só me ocorrem a grave crise de 2008 e a frase imortal de Valdano: "A pobreza nunca foi boa para nada, a não ser talvez para o futebol."

Joel Neto, in O Jogo