"Ninguém acredita nem os benfiquistas, que o Benfica consiga reunir uma equipa capaz de conquistar o segundo campeonato consecutivo. Ora aí está a boa novidade.
TAL como eu vejo as coisas não há jogos a feijões entre Benfica e Sporting seja em que modalidade for. Considero até tal pressuposto um intolerável insulto aos feijões.
Bem me lembro como fiquei feliz numa matiné carnavalesca no antigo cinema Monumental com a vitória do Benfica numa partida de futebol disputada no palco entre cãezinhos equipados a rigor com os jerseys dos dois emblemas rivais. Eu era uma criança, pois era. E há muitas coisas que mudam com o andar dos anos. Hoje, só a ideia de animais em espectáculos circenses me causa náuseas e revolta. Mas a ideia de ganhar ao Sporting, essa não.
Vem isto a propósito do jogo da final da Taça de Honra da AFL entre, praticamente, os dois rivais históricos.
Ganhou o Sporting. Olha que chatice. Era um jogo sem grande importância, apenas mais uns noventa minutos de preparação para a temporada que se avizinha, assim teimaram em defini-lo os responsáveis e os jogadores das duas equipas, desvalorizando o resultado. Isto tanto do lado dos vencidos como do lado dos vencedores.
Muito bonito, sem dúvida, tanta espiritualidade e tanto fair-play dos dois lados da Segunda Circular entre vencedores e vencidos. Mas para mim, não, não faz sentido tanto desprendimento da matéria.
A final da Taça de Honra foi transmitida pela Benfica TV. Há coisas estranhas. Tal como a organização do Tour legitimou o inglês como língua oficial da Volta a França - ah, como eu gostaria de conversar sobre estas novidades linguistas com Carlos Miranda, extraordinário repórter desta casa que durante anos a fio acompanhou o Tour... -, também a língua inglesa é a oficial na Benfica TV.
É verdade que os comentadores se expressam em português. Mas os gráficos inseridos, as informações escritas são em inglês. Assim ficámos a saber que o referee se chamava Rui Rodrigues, que o coach do Benfica e o coach do Sporting se chamam, respectivamente, Jorge Jesus e Marco Silva e que o goal da vitória do rival foi obtido por André Martins.
Modernices...
Quanto ao jogo, propriamente dito, o Benfica dominou toda a primeira parte e acabou por sofrer a poucos minutos do descanso. Na second half não houve goals e ainda bem porque o Sporting esteve sempre mais perto de marcar do que o Benfica. Aliás, fazendo um inútil esforço de memória não me consigo lembrar de nenhuma defesa protagonizada pelo guarda-redes do Sporting no jogo todo. E isto já é dizer muito.
O guarda-redes do Sporting não foi Rui Patrício, ainda em gozo de férias, mas sim Marcelo Boeck que teve uma noite santa ou uma saint night, como preferirem. Certamente que foi a ausência do Rui Patrício a explicação mais plausível para o veemente improdutividade do nosso Óscar Cardozo, o falha-penalties mais querido do mundo, ou o caça-osgas, como alguns de nós, mais assanhados gostam de o tratar. Com Patrício na baliza, Cardozo é sempre outra música. Esta é uma grande verdade.
Talisca, que jogara bem e marcara o golo da vitória sobre o Estoril, jogou poucochinho contra o Sporting. Não é para admirar depois de quarenta e oito horas de elogios e de primeiras páginas nos jornais.
Mesmo assim o brasileiro ganhou o troféu concedido ao melhor jogador da Taça de Honra 2014. Decisão, no entanto, bastante menos discutível do que o troféu para o melhor jogador do Mundial atribuído a Lionel Messi. Politiquices.
DE volta às politiquices. E ao Mundial. E às notícias sobre o assunto que ainda se vão lendo nos jornais especializados e não só. Como esta:
O nosso compatriota Pedro Proença acusou directamente Vítor Pereira, o presidente do Conselho de Arbitragem, de não ter mexido uma palha para que fosse ele, o árbitro português, e não um árbitro italiano a dirigir a final do Maracanã, tal como veio a suceder.
Que desilusão. E o pessoal a acreditar que era o mérito que comandava nestas nomeações operativas ao mais altíssimo nível. Não, não é. São os lobbies e o seu arrasto de tráfego de influências. O que nos vale é que em Portugal não se passa nada destas coisas.
CONHECI em tempos uma pessoa estrangeira e bastante aluada que julgava ser sangria um espanholíssimo Santo de altar e não uma bebida de verão, muito menos um exaurimento sanguíneo.
San Gría, julgava ele errada e maravilhosamente.
Basicamente, era um engraçado.
Sangria pode ser, na verdade, imensas coisas. Por exemplo, e no que diz respeito ao Benfica, a iniludível sangria da equipa do triplete é um exaurimento que se pode vi a revelar abençoado.
Como? Pois não sei se já terão reparado que a pressão da renovação do título - apanágio dos campeões - desvaneceu-se por completo. Basta ler a imprensa especializada. Ninguém acredita que o Benfica consiga reunir, em 2014/15, uma equipa capaz de conquistar o segundo campeonato consecutivo, coisa que não acontece há décadas. Nem os próprios benfiquistas tendem a acreditar nisso. O campeão que corre por fora, ora aí está a novidade.
É esta a tendência do verão de 2014. O FC Porto será campeão com uma equipa recheada de nomes feitos e de contratações sonantes dirigida por um treinador especialista em jovens. O Sporting será também campeão da verdade desportiva e não só. Quanto ao Benfica, népia. Ninguém lhe exija nada porque metade da equipa maravilhosa já bateu asas e voou.
Valha-nos, portanto, nesta temporada o nosso San Gría, o santo que vela pelos trambolhões montanha a abaixo que sempre se sucedem à lindíssima escalada montanha acima.
NUNO ESPÍRITO SANTO vai ter no seu Valência uma plêiade de jogadores muito, mas mesmo muito acima da média. As maiores felicidades para este jovem treinador português, é o que se deseja. Meteram-lhe um Ferrari nas mãos. Boa viagem, mister Santo. Estamos em maré de santos, não há nada a fazer.
COM o Marselha também não há jogos a feijões. Não tem a ver com o Olympique. Tal como, francamente, não tinha a ver com o Sporting na noite de domingo. Tem a ver com o Benfica. Com o Benfica não há jogos a feijões, ponto final.
Ontem assisti ao jogo numa esplanada repleta de benfiquistas saídos da praia. Desejavam, naturalmente, a vitória das nossas cores. Isto até ao jogo começar. Quando Gaitán fez o 1-0 mais se reforçou essa vontade de vencer. Depois, com o andar da carruagem e do resultado, acabaram todos por ficar felizes por razões estritamente políticas:
- Nesta altura, meus amigos, quando pior, melhor - diziam.
Eu percebo-os. E dou-lhes razão. Politicamente, em Julho, quanto pior, melhor."
Leonor Pinhão, in A Bola