quinta-feira, 17 de julho de 2014

Karma is a b... enfiquista

"Chego à Zeca Diabo às 16h30 em ponto, hora combinada na roulotte do costume para encontrar os amigos indefectíveis. No espaço de um quarto de hora rebentam uns cinco petardos nas imediações e os nervos ficam definitivamente em franja - não propriamente pelo estardalhaço, mas porque hoje, dia do jogo do título, já acordei tenso.
Depois do tenebroso mês de Maio de 2013, todos ansiamos pela incrível ressurreição do 'Glorioso' de Jesus em pleno domingo de Páscoa. E, por essas e por outras, começo a depositar cada vez mais fé no karma:
a) penso em indivíduos como Kelvin e Danilo que - a destempo e a despropósito - assumiram ter torcido pelo Chelsea na final da Liga Europa;
b) penso nas 'bojardas' praticamente diárias de Bruno Carvalho, como aquela de 'nos terem retirado o que é nosso por direito'... por direito, Sr. Presidente? Isso é algum resquício do sangue azul? Se consideram que títulos são vossos por direito, para quê competir, praticar desporto?
c) penso nas lendas que perdemos esta época, Eusébio e Coluna; no trauma com que começamos a temporada; na catadupa de lesões; na venda daquele que era então o nosso maior craque, Matic;
d) penso no clássico de há quatro dias, quando demos a volta a uma eliminatória jogando 67 minutos com menos um jogador e com o golo da glória marcado de forma magistral por um miúdo dispensado do adversário aos 14 anos e, precisamente, pelo actual treinador do FCP. Perfeito.
E concluo:
1) a arte imita a vida - e nem o melhor produzido blockbuster de Hollywood poderia bater a verdade e os factos desta semana vitoriosa;
2) está na altura de o karma, qual boomerang, inverter as fatalidades do destino e trazer-nos, finalmente, o merecido happy-end.
Mas falta o quase. O golpe de asa. Cumprirmo-nos. E começa a partida, oportunidades umas atrás das outras, um grande calafrio de permeio. Bancadas repletas. Dois portugueses no 11 titular. Novo infortúnio de Salvio. Mil desculpas às famílias circundantes pelas hãa, vá, palavras novas que, inadvertidamente, introduzi aos mais jovens membros das ditas. Perco cigarros, a calma, a compostura. E de repente Lima mete duas batatinhas. Nos três minutos decorridos entre um e outro golo, confesso sem pudor, caíram-me lágrimas de felicidade pura. Pensei no único dia em que consegui vir à 'Catedral' com o meu pai; lembrei-me de quando me deixaram ir ao relvado com o meu irmão e uma bola - cinco minutos de toques e correria, sem palavras, como se fossemos miúdos de novo; recordei o dia em que vi o Benfica jogar pela primeira vez, na antiga Luz, 18 anos/caloiro de Direito/recém-aterrado na capital vindo dos Açores.
Já podemos respirar então, devolver o coração ao seu ritmo quotidiano, e até discutir quem será eleito o melhor jogador desta liga: Luisão? Rodrigo? Enzo Pérez? Gaitán? Com uma arma apontada à cabeça, escolheria o último. Porque finalmente cumpriu-se em todo o seu esplendor. O karma funciona, a chama é imensa, o campeão voltou.

Taça da Liga
Bela partida de futebol perante um adversário valoroso, também ele em luta pela História, com quem discutiremos nada mais nada menos que três troféus (na Supertaça já decerto não orientado pelo excelente Nuno Espírito Santo). Foi bonito ver a festa dos nossos, no final, alegria sincera e volta ao relvado. Não menosprezamos títulos nem desrespeitamos competições. Continuem lá, outras, a contar Supertaças.

Liga Europa
Perdê-la sem perder um único jogo. Somos grandes até na sina, na desdita, no fado. Tiraram-nos demasiados Matic's para este jogo: ao Markovic, nem a defesa espontânea do adversário (Vucinic) serviu para a UEFA tirar as palas dos olhos. E depois Sulejmani despachado com requintes de malvadez e um árbitro pérfido: um, dois, três penalties não assinalados? Deve ser um novo recorde em finais europeias, e com patrocínio Moulinex. Paciência. Grande orgulho nos Manéis. E para o ano nos aguardem. Um abraço aos meus amigos, entre eles sportinguistas e um portista, com quem sofri nesta final, algures na Madeira em trabalho. Para os antis, aqueles que celebraram a vitória do Sevilha, só uma notinha de rodapé: quem pontapeia os que estão no chão nunca andará de pé.

Taça de Portugal
Domingo, último dia da época. Tínhamos que ser dignos, e fomos. Parece que se chama 'triplete' este feito: pela primeira vez um clube nacional junta no seu museu campeonato, Taça de Portugal e da Liga. Que Rio Ave na segunda parte! Que lindo o Jamor cheio de famílias em dia de sol. Escrevam: Jan Oblak será o melhor guarda-redes do mundo. E agora venha o Mundial para nos distrair dos medos do defeso: as notícias sobre craques em debandada, angústias quando ao treinador, atoardas dos rivais. Salvé 'King' Eusébio, Sr. Coluna, mister Jesus, presidente Vieira, capitão Luisão, plantel para a História. Repito-me, com orgulho a incendiar o peito: o campeão voltou."

Luís Filipe Borges, in Mística

Não serão Manéis a mais?

"Comungo as angústias de muitos benfiquistas dispostos a interrogarem-se perante o desmantelamento da equipa que ganhou três competições nacionais e foi finalista europeu.

EVITE-SE a melancolia a qualquer custo.
Nem ouso escrever os nomes dos jogadores que eram do Benfica em 2013/2014 e que não vão ser jogadores do Benfica em 2014/2015.
E, por ignorância da matéria, não ouso escrever o nome dos seus substitutos diariamente confirmados ou desconfirmados ou presos por detalhes, tal como a imprensa pouco caridosa nos vem dando conta. 
Comungo as mesmas dúvidas e angústias de muitos benfiquistas dispostos a interrogarem-se perante a voracidade do desmantelamento da equipa que ganhou três competições nacionais e foi finalista indecentemente vencida de uma competição europeia:
- Não serão Manéis a mais? – eis a questão.
Sou por natureza pessimista. O que me tem valido grande alegrias, diga-se de passagem, como as do ano passado, em todo o seu esplendor.
Tal como em Maio, nos dias que antecederam a final da Liga Europa, me era claro que sem Enzo, sem Salvio e sem Markovic, dificilmente o Benfica venceria o Sevilha, imagine-se o que me é claro neste meio de Julho sabendo que é sem… e sem… e sem… e sem… e sem… e sem… e sem… e sem… e sem… que o Benfica parte para a defesa dos seus títulos tão brilhantemente arrecadados.
E Jorge Jesus? O treinador vai cumprir o seu último ano do contrato com o Benfica contando com tarefa de produzir Manéis em catadupa e em força e em velocidade porque o tempo urge e a época oficial está quase à porta. O que poderemos exigir ao nosso treinador neste ano em que a sina de vender mais se assemelha a uma ditadura do que a uma sina propriamente dita?
Antonio Conte, que venceu três campeonatos de seguida para os milionários da Juventus, bateu esta semana com a porta porque não lhe deram os jogadores que pretendia para assaltar o quarto título e o regresso em grande à Europa. Privilégios de clubes ricos.
Os privilégios dos clubes pobres são os Manéis. Cá estaremos para os apoiar, a todos. E não, não há nenhuma conspiração contra o Benfica. Ou melhor, há, sempre houve, é o privilégio dos clubes grandes. O resto são loas.

A Alemanha é campeã do mundo de futebol e nem se discute. Foi a melhor equipa. Parabéns a Joachim Low, a Pep Guardiola e ao Bayern de Munique, os grandes responsáveis pelo sucesso germânico no Brasil. 
No jogo da final, tal como muita boa gente, estava do lado da Argentina. Fez-lhe muita falta Angel Di Maria, o único argentino capaz de esticar o jogo visto que Messi passou de tal modo ao lado deste Mundial que, para não ficar triste e cabisbaixo, a organização até lhe outorgou o prémio humanitário do melhor jogador mais agoniado do evento.
Enzo Pérez entrou neste Mundial na fase decisiva a valer. Esteve muito bem o jogador ou o ex-jogador do Benfica, como melhor entenderem ou preferirem. Foi titular na final do Maracanã e quando foi substituído a Argentina perdeu o fio à meada.
Teria sido bonito ver Enzo Pérez campeão do mundo enquanto jogador do Benfica. Mesmo que esteja de partida, como se adivinha, seria um campeão do mundo do Benfica a vender, já nessa qualidade, a quem der mais ou menos pelo seu passe.
Se os argentinos choram a ausência de Di Maria imaginem o que nós não choraremos a ausência de Enzo Pérez.
Raios partam a vida dos clubes periféricos e pobrezinhos!

A Holanda brilhou no Brasil. É uma excelente notícia para o Manchester United. Louis Van Gaal vai entrar em Old Trafford como um senhor. Coisa que Moyes não conseguiu nem de perto nem de longe.

PERDOE-SE-ME a interrupção dos temas futebolísticos. Mas é urgente saudar um dos maiores acontecimentos desportivos do mundo. A Volta a França em bicicleta.
Que espectáculo diário nos oferece a RTP 2. Temos um pequeno batalhão de ciclistas portugueses no Tour distribuídos por várias equipas. Temos um campeão do mundo, Rui Costa que tem na sua equipa, a Lampre, outro valoroso português, Nelson Oliveira. Ambos têm nomes de jogadores do Benfica, perdoe-se-me a interrupção do tema ciclístico.
Mas foi Tiago Machado o português de quem mais se falou nos primeiros dias do Tour porque o ciclista de Famalicão chegou a ocupar o terceiro lugar da classificação geral por um dia. Depois, no dia seguinte, sofreu uma queda grave e a organização da prova chegou a noticiar a sua desistência para, minutos passados, noticiar a sua não-desistência.
Tiago Machado é de boa cepa. Foi ele o vencedor, em Junho, da Volta à Eslovénia. No primeiro lugar do pódio, de amarelo vestido e com coroa de louros, Machado mostrou-se muito feliz por ter ganho na Eslovénia, país de Jan Oblak, a quem aproveitou para cumprimentar à distância e para pedir quer não se fosse embora do Benfica.
Tiago Machado não é boa cepa. É de excelente cepa.

VISTO de cá, o desastre do Brasil no seu Mundial atenuou e de que maneira o impacto da pífia prestação da selecção portuguesa, tão pífia que nem sequer se pode alcandorar ao estatuto de desastre.
Foi o que foi, apenas isso. Uma derrota copiosa face aos futuros campeões do mundo (mas os brasileiros conseguiu fazer muito pior), um empate sortudo face aos EUA (bem melhor, apesar de tudo, do que a derrota sofrida face aos EUA no Mundial de 2002) e uma vitória triste sobre o Gana.
Paulo Bento continuará a ser o seleccionador nacional. Não rolaram cabeças, para quê? De modo mais ou menos desassombrado, alguns vieram explicar a mediocridade da presença portuguesa no Brasil pelo facto de a selecção de Paulo Bento ser, segundo eles, a selecção de Jorge Mendes, o super-empresário que é nosso compatriota.
A culpa, portanto, nem sequer foi do Paulo Bento, foi antes do Jorge Mendes. O que, francamente, me parece ser um grande disparate.
A muitos dos que, abusivamente, se viraram contra Jorge Mendes por ter tomado conta de selecção e de a ter levado a lado nenhum, ouvem-se agora loas a Jorge Mendes por ter feito as pazes com o FC Porto e estar a trabalhar com afinco para levar os ex-campeões nacionais de regresso ao galarim nacional e internacional.
É de presumir que num caso e no outro se trate da mesma pessoa, do mesmo Jorge Mendes.
Ou seja, o Mendes que deu cabo da selecção é o Mendes que vai dar cabo do Benfica.

O Benfica, seja lá o Benfica que for, arranca a sua época oficial no próximo dia 10 de Agosto com a decisão da Supertaça. O adversário é o Rio Ave, outra vez.
Respeitinho pelo Rio Ave é o que se exige. Seria muito bom começar a temporada a vencer.
Até porque a Supertaça é a Taça da Liga do FC Porto.
Explicando-me melhor. O FC Porto tem sido o grande açambarcador do troféu desde a sua criação que coincidiu com o crescimento dos nortenhos como potentado nacional. Sem a Supertaça dificilmente o FC Porto estaria perto da discussão com o Benfica pelo número de troféus oficiais conquistados.
O que não é, de todo, razão para desprezar a importância e o significado da dita Supertaça. Tomem nota: 10 de Agosto, está a chegar um dia muito importante para a época de 2014/2015. Sobre isto não há volta a dar.

LAZAR MARKOVIC, que nos encantou a todos durante a última época, a sua primeira e última época na Luz, foi-se também embora. Agora é jogador do Liverpool. Que sorte a deles. Refiro-me aos adeptos de Anfield Road.
O sérvio foi-se embora mas com elevação. Disse à chegada a Liverpool que se não fosse o Benfica certamente que não estaria ali.
Passa-se o mesmo comigo. Se não fosse o Benfica certamente que não estaria aqui."

Leonor Pinhão, in A Bola

Código de ética desportiva

"Há dias, foi apresentado publicamente o Código de Ética Desportiva. Um facto que deveria ter merecido mais ênfase na comunicação social,
Um trabalho de excelência, impulsionado pelo Coordenador do Plano Nacional de Ética no Desporto (PNED) José Carlos Lima, que merece ser lido, reflectido e praticado, como exemplo de ética intensiva e geracionalmente reprodutiva.
A ética desportiva não difere, no essencial, da ética individual e colectiva. Mas, num contexto cada vez mais importante do desporto nas suas diversas componentes e nos seus directos ou indirectos participantes, deve-se saudar, com esperança, um código de conduta ética e deontológica de todos os seus intervenientes.
A ética não se estrutura na dicotomia legal/ilegal, mas radica na consciência. O conjunto do que é moralmente aceitável (o legítimo) é mais restrito do que é juridicamente aceitável (o legal). Nem tudo o que a lei permite se nos deve impor, e há coisas que a lei não impõe mas que nos podem e devem impor.
Como há tempos aqui escrevi, na (falta de) ética desportiva, onde há adversários, vêem-se inimigos. Onde deveria haver competição dura mas leal, há batota e amoralidade. Onde se deveria saber ganhar e perder, há atitudes inconsequentes e perniciosas. Onde deveria haver valores e princípios, há interesses nem sempre legitimados.
Dizia Raymond Aron que «a ética da convicção e a ética da responsabilidade não são contraditórias. Completam-se uma à outra e constituem no seu conjunto a expressão do homem autêntico». Acrescento: onde não há lugar para essa proclamada terceira categoria ética dos actos indiferentes entre o bem e o mal."

Bagão Félix, in A Bola