quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Um impressionante conjunto de anormalidades

"Uma tempestade chamada 'Stephanie', uma arbitragem sem casos, 'derby' sem 'penalties' e golos de cabeça de Gaitán somam anormalidades que marcaram com originalidade o jogo.

O último derby teve a rodeá-lo um impressionante conjunto de anormalidades. E a maior de todas nem terá sido a anormalidade da tempestade Stephanie de domingo que obrigou ao adiamento do jogo para terça-feira.
A anormalidade das anormalidades foi não haver penalties.
Cresci ouvindo dizer aos mais velhos e mais sábios que não há derby sem penalty. Fui constatando a verdade desse axioma ao longo de muitos anos.
Penalties para um lado, penalties para o outro lado, penalties indevidamente assinalados, penalties que ficaram por assinalar, penalties mal marcados, guarda-redes para um lado e a bola para o outro lado, guarda-redes e bola para o mesmo lado, bola ao poste, bola na trave, bola por cima, bola para o lado, enfim, todo um elenco de situações que tombam a cada derby e dão pano para mangas nos dias subsequentes.
É ou não é?
Anteontem não houve penalties. Desse ponto de vista foi um derby atípico. É essa a anormalidade maior quando se trata, como é o caso, de fazer o rescaldo do jogo entre os dois grandes clubes de Lisboa.
E não havendo penalties, é que nem sombra deles, do que falaremos então?
Sugiro que falemos do árbitro. Marco Ferreira, por mérito próprio, foi também uma das anormalidades do Benfica-Sporting.
E bem mais anormal foi o trabalho sem mácula do árbitro do que, por exemplo, o facto totalmente anormal de Nicolás Gaitán ter marcado um golo de cabeça, o primeiro do Benfica e, por sinal, bem bonito.
Voltemos ao árbitro.
Marco Ferreira começou por sair da norma antes mesmo de o jogo começar. Mal foi conhecida a sua nomeação logo irrompeu nas redes sociais um despejar de factos avulsos e intimidatórios associando o árbitro madeirense ao Benfica e ao Sporting, conforme dava jeito a cada lado da barricada da Segunda Circular.
Veio a terreno o árbitro, contrariando e muito bem a absurda lei do silêncio que impera no sector, para pôr fim à boataria: «Não sou sócio do Benfica, não sou cunhado de Leonardo Jardim nem andei como ele na escola», disse e ficou dito.
Contribuiu assim de forma frontal para o desanuviamento do ambiente que, em vésperas de derby, é sempre turvo, agitado, quando não trauliteiro, fruto de rivalidade mais do que centenária entre os dois emblemas em causa.
É difícil de entender que espécie de ganho advém para os árbitros estarem obrigados ao silêncio. Passam a vida a dizer-nos, quando as coisas correm mal para um lado ou para o outro, que os árbitros se erram é porque são humanos. Ora se são humanos podem falar à vontade, ou não é assim?
Segundo o que se leu nos jornais na semana que antecedeu o derby, Marco Ferreira foi uma segunda escolha do presidente dos árbitros visto que a primeira escolha, Jorge Sousa, se terá recusado a apitar na Luz.
Quando Jorge Sousa é nomeado para dirigir jogos que metam o Benfica nunca veio a lume, ao contrário do que sucedeu com Marco Ferreira, que se trata de um sócio do Benfica ou que foi colega de escola da águia Vitória.
O mais comum, quando se fala em Jorge Sousa nos areópagos benfiquistas, sendo Sousa um dos melhores árbitros portugueses, é lançar ao ar que o referido árbitro pertenceu à claque dos Super Dragões quando era jovem.
Poderá, se quiser, Jorge Sousa pôr fim à boataria um dia em que diga publicamente: «Eu nunca fui um Suepr Dragão.» E muito contribuirá com isso para desanuviar o ambiente. Por que não o faz?
Entrou, assim, Marco Ferreira na noite de terça-feira na Luz auto-liberto dos estigmas que lhe quiseram colar e rubricou uma actuação que mereceu elogios de todos os lados, inclusivamente de Bruno de Carvalho, o presidente do Sporting, e de Leonardo Jardim, o falso cunhado e o falso colega de carteira do árbitro.
E um derby em que, entre vencedores e vencidos, ninguém diz mal do árbitro é, só por si, uma grande anormalidade.
Outra anormalidade, ainda que menor em comparação com as já enunciadas, prendeu-se com aquilo a que vulgarmente se chama a sorte do jogo. Derbies, clássicos e quejandos são, por norma, tão renhidos, tão disputados, tão equilibrados que a sorte do jogo é, frequentemente, factor decisivo em favor do vencedor.
Pois na terça-feira aconteceu precisamente o contrário. O Sporting teve toda a sorte do jogo e o Benfica saiu vitorioso por 2-0, um resultado bastante económico tendo em conta a exibição de uns e de outros e tendo em conta o número de oportunidades construídas pelos donos da casa. Estivesse a sorte do jogo do lado do Benfica e o resultado teria sido, certamente, bem mais expressivo.

QUANDO Javi Garcia se foi embora, Matic cumpriu uma época inteira a fazer o seu papel e o de Javi Garcia. Por ter feito dois papéis tão bem feitos foi recompensado com um regresso pela porta grande ao clube, o Chelsea, que o tinha tratado como trocos na compra de David Luiz.
Agora que Matic se foi embora, é Enzo Pérez que anda a fazer dois papéis, o seu e o de Matic, com grande solenidade e eficácia. Foi, pelo menos, o que se viu com o Sporting.

O campeonato já vai a mais de meio e o Sporting de Braga, que há quatro anos discutiu o título até ao fim da prova, anda agora na luta por um lugar na Europa atrás dos inesperados Estoril e Nacional. Inesperados, com o devido respeito.
Normalmente chama-se de «equipa sensação» aos menos afortunados em questões de orçamento e de dimensão que capricham em atingir patamares que não lhes estavam, de modo algum, reservados.
Na última Liga, a de 2012/2013, foi o Paços de Ferreira de Paulo Fonseca o brilhante intruso nestas discussões maiores, o que lhe valeu uma experiência curtinha mas saborosa na competição de clubes mais importante da Europa.
Na Liga corrente, olhando para o estado actual do topo da tabela, os três primeiros lugares voltaram aos seus donos históricos, Benfica, FC Porto e Sporting, precisamente por esta ordem cumprida que foi a 18.ª jornada.
Do Sporting, terceiro classificado, para o Nacional quarto classificado, distam 7 pontos, muito ponto a dar confronto à equipa de Alvalade cujo anseio assumido é, desde o princípio, a qualidade para a fase de grupos da Liga dos Campeões.
Do Benfica, primeiro classificado,para o FC Porto, segundo classificado, distam 4 pontos que dão alento aos da Luz mas que não chegam, nem por sombras, para dar a mínima garantia de sucesso final, tal como a história recente já sobejamente demonstrou.
Em 2011/2012 o Benfica chegou a ter 5 pontos de avanço sobre o FC Porto (em Fevereiro) e em 2012/2013 o mesmo Benfica chegou a ter 4 pontos de vantagem sobre o mesmo FC Porto (em Maio) e depois aconteceu, como certamente estarão recordados, exactamente a mesmíssima coisa.
A três meses do próximo desenlace, o, apesar de ser líder, é tão favorito ao título como o é o FC Porto, apesar de não ser líder. Estamos entendidos? E, sinceramente, não é de crer que o Sporting abdique de lutar pelos seus pergaminhos até à última jornada só por ter perdido anteontem na Luz.
É muito cedo, portanto, para ter certezas embora se aceitem prognósticos porque os prognósticos fazem parte intrínseca destas emoções.
Há, no entanto, uma certeza e muito notável à 18.ª jornada do campeonato. O Estoril soma 6 vitórias e 1 empate nos 9 jogos que realizou fora do seu campo. O Estoril tem tantas vitórias fora na Liga quantas as têm o Benfica e o Sporting.
O Estoril já somou 20 pontos fora da Amoreira, tantos quantos os que somou o Benfica fora da Luz. Fora de casa, o Estoril já somou mais 6 pontos do que o FC Porto fora do Dragão e mais 1 ponto do que o Sporting fora de Alvalade. É da mais elementar justiça, por tudo isto, dar os parabéns ao Estoril.

O Benfica-Sporting a contar para o campeonato só pôde ter sido jogado anteontem, terça-feira, porque o FC Porto-Benfica da Taça da Liga marcado para ontem, quarta-feira, foi desmarcado em função do caso dos minutos de atraso com que se iniciou o FC Porto-Marítimo da Taça da Liga.
Há um inquérito em curso, já foram ouvidas todas as partes. Não é muito verosímil que o Sporting venha a beneficiar de uma decisão da secretaria e lhe caiba substituir o FC Porto nessa meia-final em suspenso da Taça da Liga.
Dizem que para a semana já há decisão.
Mas a perspectiva (ainda que muito longínqua) de ter de voltar a jogar com o Benfica nem sequer deve ser, por estes dias, o mais forte desejo dos comandados de Alvalade."

Leonor Pinhão, in A Bola

Cinco pontos

"1- Na 8.ª jornada o Benfica estava a 8 pontos dos rivais (5 do FCP e 3 do SCP). Na 18.ª jornada tem 9 pontos de avanço (4 do FCP e 5 do SCP). Ou seja uma inversão de 17 pontos: 9 para o FCP e 8 para o SCP.
2- Espero que não ressurja a fatalidade dos últimos anos nas derradeiras jornadas. Basta o Benfica entrar nos jogos como nesta 3.ª-feira. Dominador, demolidor e consciente que tudo começa no 1.º minuto. Porque, afinal, o Benfica ganhou com facilidade jogos difíceis, mas perdeu incríveis 6 pontos com Belenenses e Arouca (na Luz) e Gil (num batatal).
3- Muitos comentários pré dérbi eram quase só Sporting, tal a hiperbolização da sua capacidade. Viu-se quão exagerados foram, perante um jogo muito desequilibrado, um vendaval de sentido único em que o SCP nem um único canto obteve... Aliás, nestas últimas 5 jornadas, os leões perderam 9 pontos em 15 possíveis e só marcaram em Arouca. E há 8 anos que não marcam na Luz...
4- O dérbi foi exemplar. Além de um justo (embora escasso) resultado, houve desportivismo, rivalidade saudável, arbitragem limpinha sem os rodriguinhos dos habituais consagrados, declarações avisadas e serenas de técnicos e dirigentes, regresso da águia Vitória, ausência de casos para serem explorados ad nauseam por programas televisivos de sangue.

5- Jorge Jesus, tantas vezes mal-amado, evidenciou toda a sua mestria. «Sai Matic, entra o Manel» ilustra bem um técnico que não se lamuria perante a adversidade de ver sair jogadores cruciais por ele feitos craques: Coentrão, David Luiz, Di Maria, Ramires, Witsel, Javi, Matic... A fábrica de talentos continua."


Bagão Félix, in A Bola

O 'derby' disse...

"Benfica crescente força, vinda de... estabilidade. Sporting: Jardim errou (eu faria o mesmo) e não assumiu

Evidente: é o Benfica a equipa que melhor joga e se revela mais forte ao cabo de quase dois terços da Liga. Mais: fá-lo num crescendo de forma e de convicção, sobretudo a partir da noite quiça chave, em que, derrotando o FC Porto com clareza de 2-0, terá mandado às malvas o bloqueio mental - e táctico - que, nas três épocas imediatamente anteriores, exibiu perante máximo rival.
Sim, consentiu recente empate em Barcelos; mas mais vítima do que réu naquele miserável estado do terreno. Agora, na mais exuberante exibição - ou terá sido a da Grécia, onde jogou para golear mas saiu da Champions porque o ex-seu Roberto se desforrou assumindo inacreditável gigantismo? -, triturou um Sporting que muito apostava em ascender a líder e ainda estará entontecido na confusa miscelânea dos seus erros com superioridade, tremenda!, do adversário.
Tão longe, este Benfica, daquele que iniciou campeonato em flagrante incapacidade para superar violento trauma no fecho da época anterior. Aliás, não só essa grande perturbação psicológica então afectava o Benfica; arrastada indefinição do disciplinar caso Cardozo, catadupa de ditos reforços que - paradoxar apenas aparente... - projectou insegurança (sucessivas experiências de lança-los iam, afinal, redundando em fiasco) e, talvez o mais importante ao muito agravar dificuldades no acerto das agulhas, outra catadupa... esta de lesões: de Salvio (crucial ausência que permanece) a Sílvio, passando por Enzo Pérez, Markovic, Sulejmani, Rúben Amorim, Siqueira...
Muito tempo demorou o Benfica a estabilizar onze base. E, até à perda de Matic, só 2 aquisições desta época nele se fixaram: Markovic e Siqueira - quando recuperados de várias baixas clínicas... Agora, consumado o adeus a Matic, também Fejsa (Oblak só é novidade ao muito bem aproveitar lesão de Artur). Por isso (fracasso da grande maioria das compras no verão e perda do pilar Matic), mas não só, continuo desalinhado da corrente tese de que o plantel benfiquista é muito superior ao portista. E permanece dúvida sobre saída de Garay até ao fim deste mês...
Benfica em crescendo, FC Porto estagnado nas falhas do motor de arranque, Sporting no choque de ter percebido as suas limitações, tão compreensíveis. Benfica firmemente lançado para o título? Amiúde, as aparências iludem na definição do futuro. E o enorme fantasma que paira sobre o Benfica - duas épocas a fio, e com a pressão extra de terem sido as últimas, esbanjando vantagem de 5 pontos no jacto de 2 jornadas! - é a grande esperança do FC Porto e Sporting.
(...)"

Santos Neves, in A Bola