quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Ímpar

"O Benfica não é só um Clube e não é apenas Futebol. O Benfica não é só aquela vitória saborosa, ou aquela outra, periclitante, nem apenas aquele empate arreliador, ou aquela derrota amarga, ou o título que fugiu. O Benfica não é o lugar que ocupa na classificação, seja de que modalidade ou de que escalão foi, nem o apuramento ou a eliminação. O Benfica não é somente aquele jogador inesquecível, não é apenas o atleta memorável, ou o atleta injustiçado, o treinador que passou, o atleta que ficou no coração, ou o que ficou na ideia, não é simplesmente aquele lance genial, ou aquela bola falhada, a substituição que deu fruto ou aquela outra, azarada. O Benfica não é só Desporto, nem apenas actividade social ou cultural, ou unicamente mercado.
O Benfica não é simplesmente o dirigente histórico, ou para a história, o técnico responsável, o funcionário zeloso, nem unicamente o árbitro justo, o árbitro vesgo, o azar e a sorte. O Benfica não é somente a claque que grita 90 minutos, os adeptos que seguem a equipa por meio Mundo, ao vivo, na TV ou em pensamento, não é o adepto que se impacienta, ou aquele que perde mesmo a paciência, aquele que sonha, ou aquele que espera para além da razoabilidade, não é só alegria e menos ainda tristeza. O Benfica não é exclusivamente o passado, nem tampouco só o presente, não é unicamente a glória, nem tão só o possível presente, o viável futuro, o que pode ser, agora ou depois. O Benfica não é unicamente memória, não é só nem apenas presença. O Benfica é mais que tudo isso, parcela a parcela e muito para além da soma final. O Benfica, como diz a canção promovida a hino, é o conjunto de «milhões numa só alma». E isso não tem par no Mundo. O Benfica é um, a soma de todos. E o um é ímpar."

João Paulo Guerra, in O Benfica

Lima tem consciência política

"Só faltava marcar um golo beneficiado de uma má decisão do árbitro para passar o resto do campeonato a suportar remoques por causa do penaltizinho no Estoril. Fizeste bem, Lima.

FEZ nesta última terça-feira três anos que Paulo Bento se estreou no comando da selecção nacional substituindo Carlos Queirós cujo processo de despedimento foi tudo menos elegante, se é que alguma vez se poderá apelidar de elegante qualquer processo de despedimento.
Processo de despedimento é uma coisa má, todos sabemos. Processo de despedida é outra coisa e bem distinta. E, sem qualquer espécie de dúvida, é bem mais fácil ser-se elegante num processo de despedida do que num processo de despedimento.
Por exemplo, o processo de despedida de Valentim Loureiro da condição de presidente da Câmara de Gondomar foi não só elegante como histórico. Uma pérola do regime, no mínimo.
Condecorando com a medalha de ouro da cidade que foi sua o presidente do FC Porto, o ex-autarca, ex-presidente do Boavista e ex-presidente da Liga de Clubes deixou para os vindouros uma imagem muito expressiva de um Portugal ufano e triunfante da segunda década do século XXI, Portugal esse que se começou a desenhar no final da sétima década do século XX.
Era de Paulo Bento que falávamos, peço desculpa pela incursão noutros domínios.
O balanço de Paulo Bento na qualidade de seleccionador nacional é de 18 vitórias em 35 jogos. Não está mal, mais de metade dos jogos foram ganhos pela equipa sob o seu comando, dirão os defensores do treinador. Está péssimo, dirão os outros, os da oposição.
Nos próximos dias, a selecção terá pela frente os dois jogos que definirão a sua sorte no que respeita à qualificação para o Mundial de 2014 e, por isso mesmo, talvez seja cedo para se fazerem balanços da era Paulo Bento. Olhando para a situação actual, francamente, torna-se difícil acreditar noutra hipótese que não seja a da presença da equipa nacional portuguesa no Brasil embora o conjunto de jogadores que a forma seja, de uma maneira geral, mediano nuns casos e envelhecido noutros casos.
Contra a corrente, Cristiano Ronaldo persiste em mostrar-nos, semana a semana e com a afinação de um metrónomo, que está muito acima, mas mesmo muito acima, dos seus compatriotas da equipa nacional. Sem desprimor para os demais jogadores da selecção, mas às vezes até parece desperdício ter à disposição um Cristiano Ronaldo em grande e mais ninguém de vagamente grande que se lhe compare, excepção feita a João Moutinho.
Tive uma sensação assim parecida, na década de 90 do século passado, quando Michel Preud’homme era o guarda-redes de uma das mais à toa das equipas que o Benfica teve. À sua maneira, outro desperdício. 

NO Benfica de hoje, anda tudo de tal forma às avessas que até Cardozo marcou de pé direito – ele que só tem o pé contrário, dizem os seus detractores – o golão que, no Estoril, garantiu ao Benfica a vitória e os três pontos.
Luisão dedicou a vitória a Luís Filipe Vieira que jamais falta às necessidades dos jogadores. Os jogadores, sabe-o o seu capitão, não têm de passar por necessidades. Recebem sempre o salário a tempo e a horas, independentemente do lugar que a equipa ocupa na tabela. Normalmente, é o primeiro ou o segundo, com mais queda para o segundo. Neste Outubro, por contingências, várias é o terceiro. Mas ainda há muito por andar.
Com dez anos de clube, coisa rara nos tempos que correm, o capitão do Benfica não pensou em si quando disse, na mesma ocasião, que os jogadores tinham corrido «pelo presidente» no jogo com o Estoril. Não foi egoísta, o Luisão. E se há coisa de que os jogadores de futebol são frequentemente acusados é de serem egoístas, de pensarem só em si.
Se tivesse pensado só em si, Luisão não tinha dito aquilo. Porque, tal como acontece a toda gente, Luisão não vai para novo e perdendo velocidade, como é natural, põe-se à bica para ouvir dos adeptos mais intransigentes, sempre que lhe falhem as pernas, ditirambos como: «corre lá um bocadinho mais pelo presidente!»
E isto não é bom nem para o Luisão, nem para o presidente.
O público é e será sempre cruel. Limito-me a antecipar-lhe a crueldade para depois não estranharem.

A vitória no Estoril foi suada e justa. O jogador de que mais gostei foi do Lima. Como, se até falhou um penalti? – perguntam-me os senhores.
Ora, precisamente, por ter falhado um penalti é que eu gostei do Lima. Era crucial falhar aquele pontapé. Como terão tido a oportunidade de ver, o lance que deu origem ao castigo foi mais do que duvidoso à luz da interpretação actual desse tipo de situações de bola na mão ou de mão na bola na área.
Que foi bola na mão, foi. Mão na bola é que não foi, embora a bola se tenha desviado da sua trajectória natural depois de ter embatido na mão de um jogador do Estoril.
Uma coisa é certa: tivesse o lance ocorrido no meio do campo e o árbitro, qualquer árbitro, teria marcado falta. Tendo acontecido na área, aí entram logo as novas teorias que, conforme dá ou não dá jeito, ou se aprovam ou se reprovam.
Pode ser que, um dia destes, Pedro Proença vá até ao Seixal dar uma lição sobre este tema candente aos jogadores do Benfica. Quanto ao Lima, está dispensado da aula. Ele sabe da matéria. Está actualizado. Viu, como muitos vimos, que não houve pecado na área do Estoril e quando foi marcar o castigo decidiu, e bem, que daquilo não podia nascer nenhum golo sob pena de sermos mais tramados no futuro próximo, para compensar o benefício na Amoreira.
Explico-me melhor: com 5 pontos de atraso em relação ao líder e depois de sofrer espoliamentos múltiplos nas primeiras jornadas da Liga, só faltava ao Benfica, para piorar as coisas, marcar um golo beneficiando de uma má decisão do árbitro para, depois, ter de passar o resto do campeonato a suportar remoques por causa de um tal penaltizinho no Estoril.
Fizeste bem, Lima. Bola para um lado, guarda-redes para o mesmo lado. O Lima tem consciência política, qualidade sem a qual não se faz nada de jeito.

A cerimónia de Gondomar terminou de maneira inaudita. O presidente do FC Porto, já depois de medalhado, declarou guerra a Arouca, município delimitado a noroeste precisamente por Gondomar. Tudo ali tão pertinho, o que mais se estranhou.
O que levará um homem que é um ícone deste Portugal, a ser profundamente desagradável com o Arouca momentos depois de lhe ter sido atribuída a medalha de ouro da cidade de Gondomar? É que foi dizer aos jornalistas que o Arouca não jogava nada, mas por outras palavras. Para quê?
Se atirou com o Arouca para a frente de batalha só para provar que não está sempre a pensar exclusivamente no Benfica, ficou-lhe mal o subterfúgio.
Se atirou com o Arouca para a fogueira porque já lá jogou, precisamente no sábado passado, e não tem lá voltar este ano, pior ainda.
A verdade é que o presidente do FCP atirou-se ao Arouca, logo depois de lá ter jogado, e optou por não se atirar ao Sporting de Leonardo Jardim, que é o próximo adversário dos campeões nacionais. O jogo está marcado para o fim do mês. Aguardemos pela evolução dos acontecimentos. Com ou sem medalha de ouro.

DE Miguel Lourenço Pereira e de João Nuno Coelho, acaba de ser publicado um livro muito curioso, obra séria de historiadores e de sociólogos, que se chama Noites Europeias – Uma História das Competições Europeias de Clubes, 1897-2013. A editora tem sede em Guimarães e chama-se Amor à Camisola, está tudo dito. Sim, benfiquistas, podem comprar. Até lá vem a história da conquista da nossa Taça Latina."

Leonor Pinhão, in A Bola

Um primeiro olhar

"A pausa nas competições de clubes deixa espaço para uma primeira reflexão acerca do início da temporada futebolística da nossa equipa. Há que começar por dizer, sem subterfúgios, que o rendimento atingido tem estado aquém do esperado. E várias podem ser as explicações.
Em primeiro lugar, embora o mercado não nos tenha retirado nenhuma das principais figuras do onze, houve necessidade de integrar novos reforços, grande parte dos quais jovens com vincada qualidade, mas naturalmente sem identificação com os processos da equipa. Markovic, por exemplo, tem um talento que ninguém discutirá, mas que ainda não foi possível adaptar plenamente ao modelo de jogo 'encarnado'. Djuricic será outro caso, ao qual as mesmas palavras poderiam encaixar na perfeição. E a articulação entre Fejsa e Matic está ainda longe de ser uma aposta ganha. As lesões de Gaitán, e sobretudo de Salvio, obrigaram a apressar alguns destes processos, impondo indesejadas experiências em plena competição.
Não podemos também ignorar o calendário que tivemos pela frente neste mês e meio. Deslocações à Madeira, Alvalade, Guimarães e Estoril, em apenas sete jornadas, eram algo que, à partida, seria sempre de impor respeito. Desses jogos, vencemos dois, empatamos um, e perdemos o outro. Não é um bom registo, mas está longe de ser uma catástrofe - e o pior resultado terá mesmo sido o empate caseiro com o Belenenses.
Era também natural que, depois de um fim de temporada decepcionante, os níveis de confiança dos jogadores se ressentissem. Nova derrota a começar o Campeonato foi, nessa medida, o que de pior podia ter acontecido.
Last but not least, as arbitragens têm tido, uma vez mais, um papel determinante. Cinco pontos surripiados não são coisa pouca, e não podem, de modo algum, deixar de figurar em qualquer ponderação deste tipo. Agora vamos olhar para a frente, e, unidos, serenos e determinados, recuperar 'à Benfica', partindo para uma época que nos devolva os sucessos que a infelicidade roubou há poucos meses atrás."

Luís Fialho, in O Benfica