"O Olhanense tem uma cegonha como mascote. Boa escolha. A cegonha é um pássaro simpático, anunciador de meninas e de meninos, de voo bonito e ninho vistoso. Não passa pela cabeça de nenhum ser minimamente humano querer matar cegonhas. Houve tempos tristes em que estiveram à beira da extinção. Nesse tempo dir-se-ia delas o que Harper Lee dizia da cotovia: Por favor não matem as cegonhas! E as pessoas decentes deram ao bicho pernalta uma nova vida. A cegonha do Olhanense ainda não é bem como a águia do Benfica, não voa de asas largas em redor do estádio para pousar depois no sítio escolhido pelo seu tratador. É uma cegonha mais abonecada, chamemos-lhe assim, com um homem dentro a dar-lhe vida e movimento, acenando aos adeptos e alegrando as crianças. E assim, com homem e tudo, seria ainda mais lógico que não passasse pelo bestunto de um qualquer imbecil a ideia de a matar. Mas passou. Ou quase.
Segundo rezam as crónicas, o imbecil lançou-se ao pescoço de cegonha e arrancou-lhe a cabeça, ficando muito perto de arrancar a cabeça ao pobre infeliz que nela se escondia.
Geralmente a imbecilidade e a desonestidade andam de mãos dadas. Sem cabeça, indefesa, a cegonha, ou o homem no seu interior, ficou à mercê do criminoso. E viu desaparecerem-lhe a carteira e o telemóvel.
Pois é: que porcaria de mamífero se lembraria de assaltar uma mascote? Esse mesmo que se deu ao trabalho de viajar até ao Algarve sabe-se lá com quantas mais malfeitorias na agenda. Os jornais descrevem o acto vil, mas não põem o nome ao boi. Dizem-nos só o clube do qual o animal é adepto. Mas isso já todos sabemos, não é?"
Afonso de Melo, in O Benfica