quinta-feira, 14 de junho de 2012

Não-perder é o que está a dar

"A Espanha jogou sem ponta de lança e a opção chocou. A verdade é que a Espanha não tem um Cristiano Ronaldo... Nós temos. Também não joga a ponta de lança

O Europeu começou com a Grécia a conseguir não-perder o jogo inaugural com a Polónia, co-anfitriã do torneio. Os treinadores, os jogadores e os adeptos, todos sem excepção, reconhecem a importância do chamado não-perder no primeiro jogo da fase de grupos.
No entanto, como é da praxe, a História regista as suas excepções ao preceito fundamental da tal entrada com o pé direito. No Europeu de 1988, a Holanda perdeu o seu primeiro jogo e viria a conquistar o título e no Mundial de 2012 a Espanha começou por perder com a Suíça e acabou a ganhar na final à Holanda.
Deixemos as excepções em paz e regressemos à regra, ou seja, à importância do não-perder no primeiro jogo de competições desta envergadura.
O nosso compatriota Fernando Santos é o treinador da Grécia e como é um profissional experiente sabe destas coisas todas. Por isso mesmo, apresentou a sua equipa no jogo inaugural com uma filosofia de retranca, sempre à espera do erro do adversário, à partida favorito porque jogava em casa.
Acabou por ser uma grande felicidade para os espectadores neutrais o facto o facto de a Polónia ter marcado aos 17 minutos, obrigando a Grécia a entrar a sério no jogo e a correr para salvar o resultado.
Obrigado a mexer na equipa, reduzida a 10 jogadores ainda antes do intervalo, foi feliz Fernando Santos ao lançar Salpingidis, que não é propriamente nenhuma vedeta do areópago mundial, mas que deu a volta ao jogo, marcou o golo do empate e ainda fez um segundo golo que o árbitro invalidaria por fora de jogo, deixando os polacos aliviados e felizes porque, também para eles, era crucial a tal coisa de não-perder o primeiro jogo.
Quanto ao árbitro, não haja dúvida de que foi um grande  malandro...

UMA das graças destes torneios entre selecções - e com a nossa Selecção também envolvida - é constatar que os nossos comentadores arrumam criteriosamente a sua estrutural isenção profissional e passam a gozar a liberdade de poderem ser adeptos à vontade.
Certamente porque Fernando Santos é português e também porque, devido à conjuntura política e económica actual, somos todos gregos, os nossos analistas puderam revelar os esplendores da sua não-imparcialidade e do seu desapego ao bom senso.
O árbitro do Polónia-Grécia até ficou com as orelhas a arder com a rapidez de julgamento e o desassombro nos qualificativos com que a sua actuação foi observada em Portugal. Malta que em jogos do campeonato português precisa de, no mínimo, meia dúzia de repetições em slow motion para conseguir dizer que, por exemplo, houve infração para grande penalidade em lances como o de Pablo Aimar na área da Académica, em Coimbra, ou o de Gaitán na área do Sporting, em Alvalade, quando chega o Europeu manda logo às malvas o temor devido nos árbitros como se, afinal, eles não fossem humanamente propensos ao erro.
«Calamitosamente» foi o advérbio de modo ouvido no decorrer da transmissão televisiva para qualificar o trabalho do árbitro espanhol Velasco Carballo. Pelo contrário, cá no burgo, não há arbitragens calamitosas nem desvarios de linguagem.

NÃO conseguimos não-perder o nosso jogo de estreia neste Europeu. Não tivemos a sorte da Grécia de Fernando Santos, que sofreu um golo aos 17 minutos de jogo e viu-se obrigado a acordar cedo e a abandonar aquele futebol anti-espectáculo do não-jogam-vocês-não-jogamos-nós-não-joga-ninguém, na fé de um 0-0 que nunca é mau presságio no arranque deste género de torneios.
Exactamente ao contrário da Grécia, sofremos um golo dos alemães a 17 minutos do fim e, acordando tarde, já não fomos a tempo de impedir a derrota que, de um modo geral, foi considerada bastante injusta entre nós.
E até do adversário soubemos merecer a comiseração. O próprio Ozil disse a Pepe, no final do jogo, que o empate seria o resultado mais certo para o que se passou em campo.
É um bocadinho parecido como quando a senhora Merkl diz que está satisfeita com o esforço e o sacrifício dos portugueses ou como quando o New York Times escreve que os portugueses são tão boa gente que até aceitam sem protestar os ditames da Banca internacional.
Estes cumprimentos estrangeiros no infortúnio sabem sempre bem e consolam a depauperada alma nacional.
Infelizmente para Paulo Bento não houve no banco de Portugal nenhum Salpingidis que entrasse em campo para, pelo menos, empatar o jogo. E o árbitro, que era francês, voltou a ser um malandro do pior como só são os árbitros estrangeiros.
Felizmente que a Liga portuguesa, numa decisão histórica, decidiu acabar de vez com as avaliações dos nossos árbitros nas provas nacionais. Avaliações para quê? Os nossos árbitros são os melhores do mundo, não precisam de ser avaliados.

QUEM precisa de ser avaliado é o realizador ucraniano que assinou a transmissão televisiva deste Alemanha-Portugal porque induziu, repetidamente, em erro milhões de telespectadores.
Á força de mostrar tantas vezes José Mourinho, bem sentado, a vibrar com as ocorrências na Arena de Lviv e ignorando a presença de Paulo Bento, sentado à flor da relva, no lugar do verdadeiro treinador, deve haver muita gente por esse mundo fora que está convencido de que o treinador do Real Madrid é, na verdade, o seleccionador de Portugal.

GRANDE jogo e grande espectáculo houve em New Jersey. O mano-a-mano Messi-Neymar terminou em glória para o argentino, que fez três golos, sendo que o último foi fabuloso e os outros dois também não foram nada maus.
Ou a Argentina tem um novo seleccionador, muito sagaz, que pôs a equipa a jogar à Barcelona, ou seja, em exercícios de geometria no espaço, ou Leonel Messi está mesmo a viver o momento mais fabuloso da sua não menos fabulosa carreira e, assim sendo, vai tudo à frente...
Depois de o verem marcar três golos ao Brasil é de duvidar que os argentinos continuem a embirrar com Messi, acusando-o de não produzir na selecção o que produz ao serviço do Barcelona.
E que bem jogou o nosso Garay, que não deu um palmo de terra ao Neymar. Nada de surpreendente. E muita falta fez Garay ao Benfica este ano quando se lesionou antes do jogo com o Zenit.

ESPANHÓIS e italianos ficaram todos contentes porque ambos conseguiram não-perder o seu jogo. A Itália, no entanto, já não é o que era. Onde é que já se viu uma squadra azurra a adiantar-se no marcador e, três minutos mais tarde, a consentir o empate?
A Espanha jogou sem ponta de lança e a opção de Del Bosque chocou o público e a crítica. A verdade é que a Espanha não tem nenhum Cristiano Ronaldo...
Nós temos. Mas também não joga a ponta de lança.

A Inglaterra também conseguiu não-perder com a França. Por seu lado, a Grécia já não conseguiu não-perder com a República Checa.

E agora um bocadinho de hóquei em patins: o FC Porto conseguiu não-perder com o Benfica na Luz mas o empate não era de todo o resultado pretendido. Agora o FC Porto quer repetir o jogo por erros do árbitro. Excelente ideia.
Penso que o Benfica, pelas mesmas razões, pode pedir ao senhor Fernando Gomes e ao senhor Tiago Carveiro, da Federação Portuguesa de Futebol, para mandarem repetir, pelos mesmos motivos, os jogos com a Académica, em Coimbra, e com o FC Porto, na Luz.
Até podem pedir por SMS.

ONTEM, não sei se viram, mas quase, quase que íamos não-ganhar à Dinamarca. Era obra."

Leonor Pinhão, in A Bola

PS: Esta noite, no Europeu, assistimos a mais uma deslumbrante exibição... dos Irlandeses!!! (resultado final: Espanha 4 - 0 Irlanda)!!!
A malta mais nova, pode não se recordar, mas eu lembro-me bem do Euro 88, em Itália no Mundial 90, na América no Mundial 94 e no Mundial na Ásia em 2002, além do famoso jogo na Luz - com muita chuva e com o majestoso golo, do nosso Maestro -, os adeptos Irlandeses são de facto os Melhores Adeptos do Mundo, e o resto é treta...!!!

Palavras leva-os o Euro

"A catadupa de jogos do Euro é, também, um teste à capacidade de resistência para escutar frases que constituem um quase dialecto de lugares-comuns, eufemismos, pleonasmos e paradoxos.
Não me refiro aqui ao modo como o capitão da nossa Selecção se dirigiu ao mais alto magistrado da Nação: «Em nome da Selecção entrego-lhe esta camisola e convidamos você para ir assistir a um jogo, tá?». Frase no mínimo inapropriada, mas que não admira quando por toda a parte e em programas e galas televisivas se ouve a feia expressão «com vocês» em vez de «convosco».
Antes registo aqui algumas deliciosas frases que venho ouvindo: «a bola morreu nas redes» (pergunto-me se depois de tão súbito fenecimento do esférico, ainda há jogo?), «o jogador x tem que interagir com os colegas» (ou interagir... sozinho?), «as duas selecções acabaram dividir os três pontos» (1,5 pontos para cada uma delas ou será que, em aritmética de empates, 1+1=3?), «o hino espanhol foi cantado em silêncio, isto é sem letra» (intrigante oximoro). Por fim, no fim do jogo com a Alemanha ouvi o presidente da FPF confessar que «se hoje houvesse um vencedor, seria a Selecção portuguesa» (será que empatámos?).

P.S. 1 - Intitulava A BOLA: «Toni conformado no Tractor». Confesso que fiquei surpreendido com esta serôdia vocação do grande benfiquista. Li a notícia: afinal Tractor é um clube iraniano de Tabriz. A agricultura é outra. Também não me havia lembrado que o jornal aplica o Acordo Ortográfico, pelo que o Tractor de Tabriz não é o trator de Avis.

P.S. 2 - Ainda a tempo de registar a vitória tão preciosa quanto sofrida contra a Dinamarca."

Bagão Félix, in A Bola

O polvo Paulo para o tacho, já!

"POZNAN - Confesso que, até há dois anos, não era muito de acreditar nas capacidades divinatórias dos animais. No entanto, durante o Mundial de 2010, o polvo Paul, alemão, fez-me ver a vida de outra forma. Fiquei, pois, naturalmente apreensivo quando um polvo, de nome Paulo - dizem que é primo do infalível Paul - residente num aquário do Porto, vaticinou a vitória da Alemanha sobre Portugal no Euro-2012. Passei da apreensão à resignação - «lá tenho de ouvir mais um polvo» - quando o oito pernas acertou no triunfo germânico. E foi com natural pânico que li que o Paulo tinha apostado as fichas todas no sucesso da Dinamarca, ontem, frente a Portugal. Começou o jogo, Pepe, 1-0, Postiga, 2-0, e dei comigo a rogar pragas ao polvo pelo susto que me tinha pregado. Reduziram os vikings, começaram a ameaçar o empate, o Cristiano falhou o 3-1 e a seguir sofremos o 2-2. «Ora queres ver que o polvo Paulo tinha razão?», cogitei com os meus botões, porque para Portugal empatar ou perder ia dar ao mesmo...
Surgiu então em cena Silvestre Varela, que agitou mais as águas que já estavam mexidas depois da entrada de Nélson Oliveira. E chegou o golo da vitória, um triunfo imprescindível, crucial, justo e, acima de tudo, desnecessariamente sofrido.
Numa esplanada de Poznan, apoiado apenas pelo Paulo Esteves, repórter fotográfico que me acompanha, e pela Joana Guimarães e a Mara Nunes, da BOLA TV (todos os outros, croatas, polacos, italianos e irlandeses estavam pela Dinamarca...), festejei. Durou pouco, porém, a celebração. Porque senti que o polvo tinha de pagar pela angústia que me tinha provocado. Fui à net e num ápice encontrei uma série de maneiras de fazer justiça:
»Polvo cozido com cebola»; «Polvo à lagareiro com batatas a murro»; «Filetes de Polvo»; «Arroz de Polvo malandrinho»; «Salada de Polvo»; Polvo à galega». Opções não faltam para dar ao Paulo aquilo que merece...

PS - Contra a Holanda, 90 minutos que valem a passagem aos quartos de final, não podemos dar as largas que demos aos dinamarqueses. Precisamos de controlar melhor o meio-campo. E Cristiano Ronaldo deve recuperar o instinto matador..."

José Manuel Delgado, in A Bola