quarta-feira, 18 de abril de 2012

Eles não aprendem

"Durante anos esforcei-me por explicar uma evidência: só com paciência e estabilidade o SL Benfica conseguiria atingir o patamar do FC Porto. Por isso, disse que Vieira teria de ficar muito tempo na liderança e Jesus deveria ser o Ferguson do Benfica – que esteve 5 anos em Manchester sem ganhar nada. Mas a emoção em Portugal sobrepõe-se à racionalidade.
1. Critica-se o facto de Jesus ter desperdiçado 5 pontos de avanço. Até parece que foi outro que os ganhou e Jesus que os esbanjou. Ora esses pontos de avanço foram conquistados por... Jesus.
2. Diz-se que Jesus falha nos momentos decisivos. Só que os outros não falharam porque não chegaram... aos momentos decisivos.
3. Afirma-se que Jesus tinha obrigação de ganhar porque tem um plantel caríssimo. Mas esse plantel é quase dez vezes mais barato do que o de equipas (como o United) que o Benfica eliminou. E além disso foi pago em boa parte com o dinheiro 'ganho' por Jesus. Quanto embolsou o Benfica nesta Champions ou com a venda de jogadores que ele potenciou, como Di Maria, David Luiz ou Coentrão? Já se esqueceu o tempo em que os jogadores vinham para a Luz e perdiam valor em vez de o ganharem?
4. Em que épocas recentes a equipa do Benfica atingiu o patamar exibicional médio dos últimos 3 anos?
5. Quem poderá fazer melhor que Jesus, que foi o treinador do Benfica nos últimos 60 anos com maior percentagem de vitórias (70%)?
Mas todos os argumentos são inúteis. Quando não corre tudo bem, há que arranjar um bode expiatório. E esse hoje chama-se Jorge Jesus. O resultado é previsível: o treinador que vier será despedido ao fim de um ano, depois acontecerá o mesmo ou pior - e assim por diante. Não há nada a fazer."

A Taça da Liga

"Bem sei que a Taça da Liga está para o futebol como o vencedor final das metas volantes está para o Tour de França. E também sei como é regra enfatizarem-se as competições que se ganham e desdenhar-se das que se perdem.
E, no entanto, para se vencer a Taça da Liga é necessário ser vitorioso em 5 jogos, sendo um deles, por regra, contra um grande. Quem nunca ganhou esta Taça acha que outra - chamada pomposamente Supertaça - tem mais pedigree. Ainda hoje não percebo porque se lhe chama super quando, não raro, é disputada entre o campeão da Liga e o vencido da Taça de Portugal...
Para a história, o Benfica venceu a quarta Taça da Liga consecutiva. Curiosamente, só numa delas com um resultado folgado: contra o Porto por 3-0 e onde o mesmo árbitro de sábado, Jorge Sousa, deixou incólume a barbárie de Bruno Alves e do tatuado Meireles.
Venceu-a contra um valoroso Gil Vicente que tinha eliminado o Sporting e o Braga. Curioso é que foi esta Taça, dita de segunda ordem, que muito terá contribuído para o afastamento do então treinador leonino.
A final deixou à vista, ainda, um erro de gestão do plantel encarnado. Matic, Capdevila e Saviola demonstraram quão importante poderia ter sido uma melhor e mais equilibrada rotação da equipa. Sobretudo Saviola, um jogador de grande integridade profissional e de uma inteligência no campo acima da média.
No fim, um certo sabor agridoce. O Benfica salva a época com esta taça. Provavelmente, o Porto vai salvar a época com o campeonato. Faz diferença. E logo este ano, em que é difícil compreender como se perde uma liga relativamente fácil..."

Bagão Félix, in A Bola

PS: O Matic antes do jogo com o Chelsea, sempre que era utilizado, era sempre criticado, nem que fosse com o típico: '...não jogou mal, mas o Javi é outra coisa...'!!! Agora temos o inevitável: '...devia ter jogado mais...'!!!

#Sporting

"Na rede social twitter, a junção entre o sinal # e uma palavra-chave constitui um indexador a que deram o nome de hashtag para simplificar o acesso dos interessados aos temas. Assim, como na internet anda tudo ligado, “cardinal + sporting” (#sporting) é um tópico muito utilizado, popular mesmo, embora não exclusivo de assuntos do clube lisboeta. A hashtag #sporting enche-se de comentários dos adeptos do Gijón, do Anderlecht, do Kansas City, além de outros dispersos sobre material desportivo, gente a quem os nomes de José Cardinal e Paulo Cristóvão nada dizem.
Esta confusão coincide com o estado bipolar que assiduamente atrapalha a vida do clube, primeiro em prontidão e logo depois em negação, como uma atração pelo abismo.
Ao longo de três décadas, os emblemas de Lisboa sonharam ter o seu guarda Abel, capaz de manter no redil os jogadores com tendências para o tresmalho noturno, de pregar sustos a árbitros e auxiliares e de gerir todo o tipo de informação útil, porque esta garante o poder. Antes de o método descambar na pouca-vergonha do Apito Dourado, todos invejavam a “organização” que se revelava fundamental para o sucesso, arriscando mesmo algumas imitações foleiras que só aumentaram a admiração pelo original. Todos queriam ter o seu dirigente malvado e poder bater-se de igual para igual.
Em vinte anos, o subserviente agente de coação básica evoluiu para executivos de “inteligência”, de fato e gravata, e deixou de ostentar as coronhas à cinta. Pela causa, pela “raça”, pelos objetivos, a capacidade de dominar a informação continua a fazer sentido, embora a elevação formal dos autores fique mais perto de causar desconforto e repulsa, se, por falta de jeito ou descuido, as operações fracassarem.
Em poucos dias após o retumbante triunfo sobre o Benfica, num calendário minuciosamente cumprido pela investigação para “não prejudicar” as prestações da equipa de futebol, a “organização” leonina envergonhou-se como um parente pobre a quem se recusa um abraço, mas se dá uma sopa. Paulo Cristóvão terá agido para o Sporting, mas não para a SAD. Terá mandado depositar dinheiro em conta alheia, mas não corrompeu. Terá afastado um árbitro de um determinado jogo, mas não contrariou a verdade desportiva. Terá sugerido o envolvimento criminoso de outro clube, mas não vê lugar à punição social. Não quer condicionar os árbitros, mas está aflito perante nova reação corporativa. Reconhece o abuso, mas acha que Cardinal “merecia”. Sente-se vulgar, mas não tanto como os que já fizeram parecido ou pior. Lamenta, mas não se arrepende, ignorando olimpicamente a vítima, sem uma palavra de contrição.
Como na rede social os seguidores de #Sporting se confundem com a dispersão do tema, também os responsáveis do clube se sentem numa encruzilhada ao desejarem, em simultâneo, dominar o horizonte e passar incógnitos, influenciar sem serem discutidos, “trendy” mas em circuito privado. No futebol esta duplicidade é incompatível – nenhum clube pode ser ao mesmo tempo cândido e devasso, nem ligar-se a um Cardinal sem mergulhar de cabeça no lodaçal da arbitragem. O Sporting entregou a virgindade sem prazer ou benefício. E ainda se cala, consentindo."

Uma decisão deplorável

"Escrevo, abismado, em cima da meia-noite. Portugal ainda tem particularidades únicas. Uma reunião, com um assunto importante, embora nem por isso transcendente, durou mais de dez horas para chegar a conclusões. Dentro de uma sala, um grupo restrito de sportinguistas a lutar heroicamente contra a fadiga, o tédio, o sono, a fome, a insensatez, até mesmo contra uma peculiar forma de masoquismo. Todos vencidos, no final.
A questão era apenas esta: o que fazer de um dirigente formalmente acusado de crime grave de lesa futebol e lesa clube?
O próprio dirigente dera, em devido tempo, uma resposta sensata: suspender funções, até se apurar a verdade. Fora, aliás, essa atitude que lhe valera, do presidente, um elogio sentido pelo enorme sportinguismo demonstrado. Porém, horas depois, o autosuspenso dirigente automudou de opinião, trazendo um infindável imbróligo aos seus pares, desgraçadamente regressados à pergunta angustiante: que fazer?
Contornemos, pois, as questões de estratégia pessoal, centremonos, apenas, na defesa do bom nome do clube, da moral desportiva e da ética dos comportamentos. Quem é acusado de tão graves crimes tem todo o direito de se defender do que diz ser uma falsidade, mas não pode, nem deve arrastar o clube na sua angústia, na sua inquietação e, especialmente, na sua suspeita. Mas se por uma fraqueza, a que todo o espírito humano está sujeito, decidir ficar, os seus pares têm de ter a coragem de dizer muito simplesmente: não pode! Teria sido essa a única maneira de defender o Sporting. Deploravelmente, a decisão foi outra."

Vítor Serpa, in A Bola