segunda-feira, 14 de novembro de 2011

A Terra Prometida

"Esta foi a semana em que jogadores agridem em campo sem punição, outros acusam, outros refutam e contra-acusam; em paralelo, circulam os “vídeos”. Pergunta-se novamente: o que esperar da Comissão Disciplinar (CD) da Liga? Bastará confirmar o regresso ao passado da justiça desportiva, empenhada desde Junho de 2010 em obter a “acalmia” num “meio” difícil: quem atua, julga e, se for caso disso, condena nunca será bem quisto no futebol, habituado por longos anos a posições benignas e “a contento”. Como questionava um presidente no tempo de Hermínio Loureiro, “sensibilizado” com os castigos da CD: “então a Liga não é feita pelos clubes e para proteger os clubes?”; “afinal, quem manda aqui?” É esta a mentalidade dominante que, indiferente aos poderes públicos do Estado delegados nas federações e nas ligas e ao caráter técnico-jurídico da função, explica o suficiente.
Hoje parece evidente que se tomou um caminho “não jurídico” para evitar… instabilidade. O órgão disciplinar da Liga:

(1) deixou de promover por sua iniciativa os processos disciplinares para averiguar a prática de ilícitos, refugiando-se em terminologias do Regulamento Disciplinar (RD) e esquecendo a lei: diz o regime jurídico das federações e das ligas que cabe aos órgãos disciplinares desportivos “apreciar e punir, de acordo com a lei e os regulamentos, as infrações disciplinares em matéria desportiva”; não diz a lei que os processos se instauram quando o órgão disciplinar quer ou só quando lhe chega uma queixa (a prática do pretérito recuperado) ou a descrição nos relatórios do jogo…;

(2) suavizou as punições dos castigos “correntes” (agressão física, jogo violento, injúrias), sem reprimir e prevenir os mais graves (sirva de ilustração: duplo amarelo = cabeçada a adversário sem disputa de bola = 1 jogo!);

(3) esqueceu os “processos sumaríssimos”, mesmo com o RD a impor inequivocamente que a CD atue “oficiosamente” (por iniciativa própria);

(4) deixa arrastar e não julga em tempo útil os processos;

(5) não explica as decisões finais nem faz publicitar com rigor a sua “fundamentação” (muito menos se publicam os acórdãos mais significativos).
E para quê cumprir a lei e ser transparente e célere? Para quê instaurar mais de uma centena de processos por ano? Para quê esclarecer os critérios de atuação? Para quê julgar entre 1 a 2 meses? Para quê propor sumaríssimos e aplicar os princípios do RD? Para quê castigar diferenciadamente jogadores em razão da gravidade das condutas? Para quê fiscalizar permanentemente as declarações de dirigentes? Para quê explicar, por exemplo, a suspensão de 5 meses de um delegado do Estoril por factos ocorridos há mais de meio ano? Para quê tudo isto se só nos convém mexer quando a “coisa” mexe (muito) nos jornais (como no caso “Jesus-Luís Alberto”)? Para quê julgar todos por igual e não deixar impunes os que não são denunciados e não são alvo do “alarido” da imprensa?
Para quê trabalho, escrutínio e incómodo? Ao que parece, nos tempos que correm, não é por esse caminho e com esse “perfil” que se ganham eleições!"



Vacas Magras

"Parece ter vindo para ficar, e por mais que a tentemos esquecer, ela não nos larga. Falo da profunda crise económica e financeira em que o País, e pelo menos parte da Europa, estão mergulhados, e que ninguém sabe ao certo até onde nos vai levar.
Não cabe aqui dissecar as suas origens, encontrar os culpados, ou discutir as melhores formas de a combater. No âmbito deste espaço, interessa sobretudo perceber que efeitos directos ou indirectos pode ela trazer ao mundo do futebol, e particularmente ao nosso Clube. Interessa também saber o que podemos fazer para atravessar este período com o menor dano possível, sabendo-se que, aconteça o que acontecer, o mundo não irá acabar - e o futebol também não -, existindo, apesar de tudo, um futuro para além da densa escuridão deste tempo presente.
Enquadrando o panorama económico-financeiro dos principais clubes portugueses no actual contexto de crise, ressalta desde logo à vista um elevado nível de endividamento, em larga medida ainda resultante dos efeitos da construção dos estádios do Euro-2204. A recente diminuição das taxas de juro por parte do Banco Central Europeu pode ser uma boa notícia relativamente a esses Passivos. Contudo, a falta de liquidez no sistema bancário, e a consequente dificuldade na obtenção de crédito, vai provavelmente obrigar-nos a rever algumas práticas, desde logo quanto ao modelo de abordagem ao mercado de transferências que tem sido genericamente seguido ao longo dos últimos anos.

Busca de talentos
Sem crédito, não há investimento, pelo que é natural que se torne muito mais difícil e clubes como o Benfica desenvolver uma política de contratações alicerçada na busca de talentos sul-americanos para valorização e venda, como aquela que tem sido seguida, com sucesso, nos anos mais recentes. Para dar alguns exemplos, poderia mencionar nomes como Di Maria, Ramires (já vendidos com imponentes mais-valias financeiras e desportivas), Cardozo, Gaitán, Bruno César ou Garay (entre aqueles que constam do nosso plantel, e cuja cobiça dos mercados garante largo retorno no caso de eventual cedência). Neste conjunto aleatório de jogadores está somado um investimento de mais de 40 milhões de euros, habilmente tornado possível e concretizado pela sagacidade dos dirigentes benfiquistas, mas que nas actuais circunstâncias, e com as crescentes dificuldades de acesso ao crédito, dificilmente poderemos ver repetido. Esta será pois uma das mais prováveis consequências da crise financeira em clubes como o Benfica, a qual irá obrigar a recentrar a nossa política desportiva em parâmetros alternativos - nomeadamente num melhor aproveitamento dos jovens oriundos da formação (e já vamos vendo alguns casos, como Nelson Oliveira, Miguel Vítor, David Simão, Luís Martins, Ruben Pinto ou Roderick), e provavelmente também num regresso ao mercado nacional, e à aposta em jogadores afirmados em território doméstico, coisa que, embora de forma ainda tímida, também já se vai verificando (vejam-se por exemplo, as recentes apostas em Jardel, ex-Olhanense, Artur Moraes, ex-Sp.Braga, Mika, ex-U.Leiria, e André Almeida, ex-Belenenses).

Tempos difíceis
Para além de uma diminuição da capacidade de investimento, também as receitas de bilheteira irão, necessariamente, sofrer quebras acentuadas. Por muito que os benfiquistas amem o seu clube, teremos de estar preparados para, nos próximos tempos, ver mais cadeiras vazias no nosso estádio (...e nos restantes) do que aquilo a que estávamos habituados. A situação actual obriga muitos portugueses a prescindir das despesas não essenciais, e por muito que o Benfica, com as vitórias que todos esperamos, constitua uma preciosa vitamina emocional para ajudar a ultrapassar um quotidiano extremamente complicado, a verdade é que, para muitos de nós, a ida ao estádio terá de deixar de ser uma rotina para passar a ser uma excepção. É natural que as receitas de quotização apresentem igualmente alguma quebra, pois também nesse caso, a depauperada carteira de muitos benfiquistas não deixará, infelizmente, muitas opções.
Por fim, mas não menos importantes, há que ponderar uma inevitável diminuição dos patrocínios, resultante do contexto difícil que, de igual modo, enfrentam muitos dos nossos parceiros comerciais. O próximo ano será de forte recessão, sendo que a publicidade é naturalmente uma das primeiras rubricas a sentir-lhe os efeitos.
Por tudo isto, mais do que nunca, a nossa equipa de futebol tem uma acrescida responsabilidade nas suas costas. É a ela, em primeiro lugar, que cabe atenuar (com vitórias, títulos, entusiasmo, valorização competitiva e atracção do público) todo este elenco de dificuldades que o horizonte próximo vai inevitavelmente colocar no nosso caminho."

Luís Fialho, in O Benfica

70%

"From: Domingos Amaral
To: Alan

Caro Alan
O que mais me chocou nas tuas declarações não foi a denúncia do suposto insulto racista com que Javi García te terá brindado, no qual não acreditei. O que mais me chocou foi teres dito que “70 por cento dos adeptos do Benfica eram negros”. Isso sim, foi um choque. Ó Alan, importas-te de repetir? É que, sabendo que existem 6 milhões de benfiquistas, 70 por cento dá o espantoso número de 4 milhões e 200 mil negros! Leste bem. Ora, asseguro-te que não existem 4 milhões e 200 mil negros em Portugal. Serão talvez 600 mil, não mais, e obviamente não são todos do Benfica. Em que benfiquistas estarias tu a pensar? Nos que vivem no Canadá, nos Estados Unidos, no Luxemburgo, em França, na Alemanha? É impossível saber. Penetrar nas profundezas do teu cérebro é difícil, há muita missanga a empatar. Assim sendo, suspeito que, além de seres um ignorante no que toca a percentagens e talvez devesses voltar à escola para aprender a fazer contas de cabeça, o mais grave em ti é veres a realidade de uma forma sempre distorcida. Pobre Alan, a tua mente anda tão torcida quanto as tuas tranças! O ano passado, Javi tocou-te no peito e tu agarraste-te ao pescoço! Este ano, depois de uma noite bem dormida, inventas insultos e proclamas barbaridades sobre o Benfica. Antigamente, à arte que tu tão bem praticas chamava-se falsificação. É o que tu és, um falsificador. Mas, para teu azar, és um falsificador incompetente, e a esses ninguém respeita. Até a aldrabar convém sermos bons, e tu és apenas medíocre. Ou melhor, és 70 por cento medíocre. O resto, que são os pés, até são razoáveis."


Tomba-gigantes

"Há muito tempo que os baptizaram com o inspirado cognome de 'tomba-gigantes'. São em regra pequenas equipas não profissionais, sem historial nacional nem responsabilidades especiais, que se agigantam quando têm em presença um adversário de peso e conseguem obter resultados que contrariam as previsões e as estatísticas.

Se porventura existisse uma ciência exacta para explicar estes fenómenos, por certo apontaria como causa para tão inesperadas vitórias a força interior que permitiu a David derrotar Golias, deitando por terra não só o gigante mas sobretudo o seu favoritismo.

Nas eliminatórias da Taça, alguns destes 'tomba-gigantes' já mostraram bem do que são capazes e dos verdadeiros milagres que a força anímica é capaz de produzir.

Em regra, não se encontram em causa, nestas situações, 'cachets' de monta ou inusitadas promoções desportivas.

O que está verdadeiramente em jogo é o amor à camisola, o brio, a vontade de vencer e muitas vezes até o bairrismo ou o regionalismo que tornam mais forte e irradiante o amor a um emblema e a uma terra. Muitos destes vencedores de circunstância trabalham a semana inteira em ofícios que pouco tempo lhes deixam para os treinos que os tornam aptos para os jogos decisivos. Mas fazem das tripas coração e correm atrás daquilo que amam, daquilo que mais profundamente os realiza. E levam com eles entusiásticos grupos de apoiantes, claques calorosas que fazem de cada um destes jogos decisivos uma página única das suas vidas.

É como se todos vestissem o fato domingueiro para estarem à altura de um cerimonial que não se compadece com a informalidade do improviso. E é assim que nascem verdadeiros heróis locais cujos feitos passam, pelos canais da memória colectiva, de geração para geração. É bom que estes exemplos frutifiquem entre os profissionais experientes, pois em matéria de entrega e de dádiva plena convém sempre aprender alguma coisa com quem deixa falar mais alto o coração."


José Jorge Letria, in O Benfica

Futebol incolor

"O tema já foi levantado nestas páginas pelo Manuel Arons de Carvalho, mas parece-me oportuno trazê-lo aqui de novo.

Sabemos que os novos tempos são marcados por um mercantilismo radical, e que a imagem (de pessoas, de países, empresas ou clubes) é hoje explorada até à exaustão.

Entende-se pois que os equipamentos alternativos sejam uma forma de rentabilizar a imagem dos clubes, traduzida, em grande medida, nas suas camisolas. A utilização de cores, eu diria, criativas, é pois um mal, não só aceitável, como necessário. Já o exagero nessa utilização me parece mais difícil de compreender.

Um destes dias assisti pela televisão a um Marselha-Arsenal, da Champions, e confesso que até aos minutos finais senti dificuldades em interpretar o jogo, pois o Arsenal sendo vermelho, surgia vestido de azul, ao passo que o Marselha, sendo azul, equipava estranhamente de vermelho. Na mesma competição, também não percebi porque motivo o Benfica não equipou de vermelho nos jogos de Bucareste e de Basileia, pois não creio que a nossa cor tradicional perturbasse a necessária distinção entre as equipas em campo. Recentemente, até no Hóquei em Patins, e em pleno pavilhão da Luz, deparei com um Benfica vestido de amarelo(?), justamente na primeira partida que disputou esta época.

A paixão por um clube é algo difícil de racionalizar, e nessa medida os símbolos são o que resta de um desporto marcado por grande volatilidade de atletas e técnicos (outrora figuras geradoras de afectos e fidelidades, de que o nosso Eusébio terá sido o mais expressivo paradigma). Por este motivo, entendo que as camisolas, assim como os emblemas, são algo que não podemos tratar com ligeireza, sob pena de empurrar o objecto das nossas paixões para o espaço de uma mera abstracção.

Há ocasiões suficientes, creio, para que a necessidade de utilizar equipamentos alternativos se possa cruzar com a oportunidade de os mostrar ao público, rentabilizando-os. Ir para além disso, parece-me perigoso e contraproducente."


Luís Fialho, in O Benfica