Roberto

"O jornal 'O Jogo', citando pareceres de quatro agentes FIFA, escreveu recentemente que o guarda-redes Roberto 'está a calar quem disse mal dele e quem criticou o Benfica' pelo investimento para o contratar. E rematava: 'Roberto promete render milhões'.
Roberto Jiménez Gago, 24 anos, natural de Madrid, é o mesmo guarda-redes que há pouco tempo 'se tinha dedicado à produção de aves de capoeira', como cacarejava uma estação de rádio. A comunicação social parece que engoliu inteiros, crus e com penas os 'frangos à Roberto', como chegou a apregoar um canal de TV. Dir-se-á que alguns comentadores terão sido enganados pela adaptação do guarda-redes no início de época do Benfica. Mas este não foi caso virgem.
Antes de Roberto, diversos outros guarda-redes tiveram dificuldades em se afirmarem no Benfica, enfrentando um coro afinado de críticas destrutivas e mal-intencionadas que chegaram a produzir efeitos de rejeição por parte de adeptos do Clube. Poderia citar vários exemplos. Mas centro-me no caso do guarda-redes Hans-Jorg Butt, contratado ao Bayer Leverkusen em 2007 e que saiu de Lisboa em 2008, directamente para o Bayern de Munique e daí para a selecção alemã, sucedendo a Oliver Kahn. Foi sempre um mal-amado por parte da crítica desportiva portuguesa, produzindo efeitos na bancada, o que terá condicionado a prestação do atleta e as opções dos treinadores.
Agora, Roberto parece firme na baliza do Sport Lisboa e Benfica, revelando para além das qualidades de guarda-redes um firme carácter e um estado de espírito que afasta para canto as críticas desestabilizadoras. Assim se conserve e progrida, resistindo agora à adulação tal como resistiu à maledicência."

João Paulo Guerra, in O Benfica

(In)fiéis no ataque ao Benfica

"O último 'Trio d'Ataque' na RTPN continua fielmente conduzido pelo portista Hugo Gilberto, a encenar as descontextualizações em que é perito o Blind Zero, que podemos traduzir pela portuguesmente 'Não vejo um boi à minha frente' Miguel Guedes (MG). Com o seu fiel escudeiro, já completamente 'convertido' ao portismo, Rui Oliveira e Costa (ROC) a fazer coro: a parelha formada de tudo se serve para atacar o Benfica. Primeiro foi (por MG) a torpe invenção que se incita à violência na Benfica TV com o coro da desgraça (por ROC) a dizer que os Benfiquistas tentaram assassinar um autocarro, qual demagogo, pois o citado autocarro estava estacionado (e vazio) a mais de 300 metros do Estádio. Depois inventou-se (por ROC) uma 18.ª Lei do Futebol, estabelecendo que o 'bandeirinha' deve levantar sempre a dita, mesmo que haja apenas fora-de-jogo posicional. Mas, de facto (pela Lei 11) esse fora-de-jogo não é sancionado, nem o árbitro auxiliar deve induzir em erro o árbitro principal (novamente a Lei 11). Logo o coro funcionou (por MG) a dizer que sim - parecendo nem perceber do que se estava a falar -, pois talvez ouvisse ROC falar de 'bandeirinha' e se recordasse melancolicamente e com saudade... de um tal Bandeirinha, que de caceteiro das Antas passou a mundialista do México'86 (via FCP) e através de uma substituição 'à última hora, a caminho do aeroporto de embarque para Saltillo' do nosso Veloso, vítima de um escabroso processo de eventual dopagem, que a contra-análise revelaria ser mentira. Mas... já nada podia fazer-se e nem desculpas pediram. Quer em 1986 ou em 2010...
Já não há pachorra para aturar este 'coro das duas velhas' do especialista em 'sondagens e afins', ROC, e do 'não vejo um boi à minha frente', MG.
Paz à vossa 'alma', gente sem a dita."

Alberto Miguéns, in O Benfica

Sete anos!

"1. Foi há sete anos, completados há dias, a inauguração da nossa Nova Catedral. Para trás ficara o velho estádio, que tantas alegrias nos deu. Foi polémica a opção pela construção de um novo recinto e não terá sido fácil a opção então tomada, face à situação do Clube, que começava a recompor-se do 'terramoto' Vale e Azevedo. Mas Luís Filipe Vieira mostrou-se fortemente determinado e, sete anos depois, já não haverá benfiquista que não lhe dê razão. Mais que um campo de futebol com bancadas, todo aquele espaço é uma cidade desportiva que os outros não têm e é um espaço comercial que dá boas receitas ao Clube e leva diariamente milhares de pessoas àquela ampla zona, algo que não se vê nem no Alvalade XXI, nem no Dragão. Sete anos depois, só nos podemos orgulhar da obra feita.
2. Voltámos a perder na Liga dos Campeões, continuamos a ganhar por cá. Foi mau o jogo de Lyon, com uma excepção: Roberto terá convencido tudo e todos da sua categoria - temos guarda-redes! Continuamos a ganhar na nossa Liga mas, com o Portimonense, voltámos a falhar demasiados golos e estamos agora com quatro jogadores em risco de não jogar com FC Porto, devido às escandalosas arbitragens das jornadas iniciais. Estou com receio do que possa acontecer hoje à noite, com o Paços Ferreira...
3. Leio e pasmo. Mas, depois, pensando melhor, já nem me admiro. O FC porto preparou uma golpada com o antigo presidente do Conselho de Justiça, no sentido de impedir a presença na reunião de um dos seus elementos, que sabia ir votar a favor da condenação do clube (e os seus dirigentes) por tentativa de corrupção (confirmando anterior decisão do Conselho de Disciplina da Liga). Esse elemento, mais tarde, denunciou essa tramóia numa entrevista.
Pois o FC Porto, armando-se em vítima, queixou-se dele à justiça. E na primeira sessão do julgamento, o bem conhecido (até das escutas...) Adelino Caldeira, administrador da SAD do clube, teve o desplante de afirmar, sobre esse elemento, que fazia parte igualmente de uma outra comissão da Federação, que 'quem é capaz de fazer conluios com membros da FPF, também é capaz do mesmo com árbitros...' Olha quem!..."

Arons de Carvalho, in O Benfica

Elefantes brancos

"Está na altura de o debate sobre o estado das finanças públicas chegar também ao futebol. O melhor exemplo da irresponsabilidade nacional foi o Euro’2004.

O estádio de Coimbra custou 40 milhões de euros, recebeu apenas dois jogos do Euro e nem os concertos ali realizados chegam para cobrir os custos. A Câmara cedeu o estádio à Académica, que vai gastar este ano 450 mil euros só com a manutenção. O clube gostava de construir um estádio mais pequeno e mais barato. Os encargos com o estádio de Braga são de 6 milhões anuais, cerca de 6 por cento do orçamento da autarquia, e não tem lugares suficientes para receber o Mundial. O do Algarve custa, todos os anos, às câmaras de Faro e Loulé, 2,1 milhões em pagamentos à banca e 1 milhão em manutenção. É usado como parque infantil e não serve para o Mundial.

Procura-se um comprador para o de Leiria, que suga à Câmara 8 por cento do seu orçamento. Um jogo normal em Aveiro dá em receita um terço do que custa. E há quem proponha a demolição deste elefante branco. As câmaras que se meteram nesta aventura pagam, por ano, mais de 13 milhões de euros à banca e gastam um total de 20 milhões.

Quando nos envolvemos neste desastre, havia uma minoria absoluta que contestava a realização do Euro. Ainda me lembro dos epítetos que lhe estavam reservados: miserabilistas, elitistas, do contra. Agora o clamor popular é outro e anda tudo à caça dos culpados pela nossa situação. Eu digo quem são: todos os que, por megalomania, aplaudiram esta aventura. Que no estado em que estamos esteja em cima da mesa uma candidatura, mesmo que ibérica, a um Mundial, já raia a estupidez. Será que nunca aprendemos com os erros?"

A Greve

"Uma ação de protesto levada a cabo pelos árbitros portugueses pode colocar em risco a deslocação do Benfica à Faixa da Gaza, no próximo fim-de-semana. De acordo com os seus representantes, os árbitros colocam a hipótese de não apitar o FC Porto-Benfica da próxima jornada, o que não se pode dizer que constitua uma grande ameaça. Se atentarmos nos lances que esta época se têm passado dentro da grande área do FC Porto, já é isso que os árbitros fazem: não apitam. Ou seja, a verdadeira ameaça dos árbitros é não apitarem os lances do FC Porto-Benfica que acontecerem nos restantes dois terços do terreno de jogo. Trata-se, portanto, de uma greve relativa.

Entretanto, o “Correio da Manhã” noticiou que uma das alternativas que estariam em cima da mesa seria a contratação de um árbitro espanhol para apitar o clássico do golfe português. Devo dizer que se trata de uma opção que não me tranquiliza minimamente. Temo que isso fornecesse um pretexto para que houvesse ainda mais portugueses a queixarem-se da fruta espanhola.

Ainda assim, esta ameaça de greve serviu para nos inteirarmos um pouco mais sobre os regimes fiscais e de segurança social que abrangem os árbitros. É curioso que estejamos, desde os anos 80, a falar publicamente sobre o que recebem os árbitros, e esta seja a primeira vez que estamos a falar especificamente dos seus ordenados. Posso dizer que outra surpresa foi a categoria fiscal em que estão inseridos: julgo que só quem não tem assistido às arbitragens dos últimos jogos do Benfica e do FC Porto é que pode dizer que os árbitros portugueses são trabalhadores independentes. Confesso que, não sei bem porquê, sempre deduzi que fossem trabalhadores por conta de outrem."

Um CJ moderno

"O recente abandono do Conselho de Justiça (CJ) da Federação (FPF) deveria ser pretexto para uma atenção profunda sobre o funcionamento dos órgãos jurisdicionais do futebol. Algo mais penetrante do que o mero registo jornalístico do facto (por si só caricato na forma atabalhoada da “demissão coletiva” dos seus membros). Algo que saísse da mera escolha de nomes, da putativa impossibilidade dos juízes, da doentia investigação das preferências clubísticas desses nomes. Em suma, uma estratégia.

O primeiro dado para essa análise é a instabilidade dos órgãos. Vejamos o caso do CJ da FPF. Só neste mandato de Gilberto Madaíl o CJ terá quatro presidentes. Com as sucessivas mudanças de lideranças e das equipas constituídas no “supremo tribunal” do futebol, as consequências são profundamente lesivas da estabilidade das competições. Relembro que no CJ “cai” – ou “pode cair” – tudo: desde o castigo sumário dos campeonatos até às deliberações da Comissão Executiva da Liga ou da Direção ou do Conselho de Arbitragem da FPF. É neste órgão, por isso, que mais se pede uniformidade de critérios ao longo dos anos, em especial nas questões relativas aos “casos recorrentes” e “típicos”. Isto é, que se fizesse “jurisprudência”, que, mal ou bem, sempre transporta consigo o valor da segurança jurídica.

O segundo dado é a falta de coordenação. As lideranças destes órgãos devem ambicionar internamente um sistema credível de decisão. Um sistema que respeite a individualidade da deliberação de cada um dos seus membros, mas que a integre na orientação antecipada do órgão julgador em matérias estruturantes. Um exemplo: no que toca à prescrição da responsabilidade disciplinar, não se pode decidir num sentido quando um processo é distribuído por um dos membros e decidir em sentido oposto quando um outro processo é distribuído a outro dos seus membros. Aconteceu no CJ. Não pode ser. Ninguém percebe com o que conta.

O terceiro é a falta de fundamentação. Os órgãos de justiça desportiva não podem viver de parágrafos soltos e excertos incompreensíveis. Têm que ser uma referência na interpretação da lei desportiva e dos regulamentos e legitimarem-se pela bondade técnica. Dá trabalho e exige muita dedicação? Claro – como tudo o que, na vida, é feito com rigor.

O quarto é a falta de transparência. Devemos sempre conhecer, até porque a lei o impõe, as decisões e o seu percurso. Conhecer como deve ser, seja pela exposição sumária dos seus fundamentos de facto e de direito, seja pela publicação dos acórdãos mais significativos. Ainda hoje me dizem que o futebol não merece isto, porque o facciosismo a tudo se sobrepõe. Mas tenho como certo que a opacidade não provou ser o melhor caminho.

Estabilidade, coordenação, fundamentação e transparência. Ainda é tempo de acrescentar a iniciativa, porque há quem pense que estes órgãos só funcionam empurrados por queixas e participações – e não é assim!

Seria bom que a federação pensasse nestas cinco palavras, em especial para um CJ moderno, sem condicionalismos e com “resistência psicológica”. Porventura se falasse menos, então, de “tribunal desportivo”."

Ricardo Costa, in Record

Depois do treinadro de bancada, o árbitro de bancada: uma evolução natural

CONFESSO que tenho dificuldade em compreender os receios que rodeiam a hipotética greve dos árbitros na semana do Porto – Benfica. Não sei se ainda mantém em rigor a velha regra segundo a qual, na ausência do árbitro, deve ser recrutado um espectador na bancada para arbitrar a partida. S assim fosse, o mais provável seria que o árbitro do jogo acabasse por ser um adepto do Porto. Sinceramente, creio que ninguém daria pela diferença. Seria um Porto – Benfica perfeitamente normal.
Já aqui recordei a noite histórica em que o Sr. Donato Ramos, depois de ter permitido que o Vítor Baía defendesse com as mãos fora da área, anulou um autogolo do Porto por fora-de-jogo posicional de um jogador do Benfica. Hoje, lembro o saudoso árbitro Carlos Calheiros (que é também o eminente turista José Amorim), que um dia assinalou um penalty contra o Benfica por uma razão que permanece misteriosa até agora. Na primeira repetição, José Nicolau de Melo descortinou (e José Nicolau de Melo descortinava como ninguém) uma falta de Mozer. Na segunda repetição, julgo que aventou uma mão de Hélder. E, na terceira repetição, concluiu que não existia falta nenhuma das infracções anteriores nem qualquer outra, mas optou por dar o benefício da dúvida ao árbitro. Gente maldosa comentou que o benefício da dúvida tinha sido o menor dos benefícios que o árbitro tinha recebido nessa noite. Acredito mesmo que qualquer adepto do Porto faria um trabalho mais isento.

Quanto à greve, não sei se tem razão de ser, mas não percebo a forma do protesto. Quando os trabalhadores da TAP fazem greve, não comparecem na TAP, que é a morada do patrão. Quando os funcionários da EDP fazem greve, abstêm-se de comparecer na EDP, que é a morada do patrão. Quando os árbitros fazem greve, ameaçam não comparecer no estádio do Dragão? Que esquisito.

Todos estes meses depois, o túnel da Luz continua a afastar o inigualável Givanildo da convocatória da selecção brasileira. Há, perversa infra-estrutura! Perversa e sectária, que o David Luiz passa lá todas as semanas e continua a ser convocado.



“ (…) é assustador verificar a frequência com que, graças a uma redacção voluntariamente ambígua da lei, são anuladas em julgamento as escutas telefónicas.”
MIGUEL SOUSA TAVARES
Expresso, 11 de Junho de 2007

“ Durante quatro semanas a fio, o jornal «Sol» levou a cabo, tranquilamente, a divulgação de escutas telefónicas recolhidas num processo em segredo de justiça e abrangendo até alguma gente que, tanto quanto sabemos, não é suspeita de qualquer crime. (…) E todos nós, mesmo os discordantes, fomos obrigados a ler as escutas e concluir a partir dos factos e indícios nelas contidos, sob pena de sermos excluídos da discussão pública”.
MIGUEL SOUSA TAVARES
Expresso, 25 de Março de 2010

Como já aqui tive ocasião de notar, há um grande consenso social em torno do fenómeno das escutas. Até gente de clubes diferentes se encontra no essencial, o que é notável e bonito. Por exemplo, eu concordo com o Miguel Sousa Tavares quando diz que é assustador o número de escutas telefónicas, algumas bem incriminadoras, que são anuladas em tribunal. E também me sinto obrigado a tomar conhecimento dos factos e indício nelas contidos, para não ser excluído da discussão pública. O que pretende quem deseja fingir que as escutas não existem é decretar a obrigatoriedade da hipocrisia. E isso, fiquem sabendo, Miguel Sousa Tavares nunca permitiria. E eu estou com ele nesta luta. Juntos venceremos, tenho a certeza.


“ Jornalista – O best seller de Carolina assume foros de escândalo. As críticas vêm até indefectíveis portistas.
Rui Moreira O Sr. Jorge Nuno Pinto da Costa devia ter falado com os adeptos, devia ter falado com os sócios, sobre esta matéria. E devia ter-lhes pedido desculpa
(…)
Jornalista – As críticas aos administradores da SAD não se limitam à gestão.
Rui MoreiraÀ volta daqueles que são os grandes líderes, aquilo que acontece é que se começa a confundir a fidelidade com o cortesão. Perante o Sr. Jorge Nuno Pinto da Costa são absolutamente acríticas, mas nas costas do Sr. Jorge Nuno Pinto da Costa são as pessoas mais críticas. E esta tendência, que é típica dos cortesãos, como nós sabemos, aquilo a que se chama jogos de corredor, é típica também de uma instituição cuja a liderança se aguenta durante muitos anos. (…) Aquele passeio da fama que o FC Porto tem, Faltam lá alguns nomes, claramente.
Jornalista – Mas quem é que é o responsável por isso?
Rui MoreiraÉ a política de guerrilha”.

Numa interessante reportagem da RTP, disponível aqui: http://www.youtube.com/watch?v=5yjllkmd4wg&feature=related.

Tenho acompanhado com muito interesse o Trio D’Ataque na sequência do despedimento com justa causa de Rui Moreira. Por muito que me custe admiti-lo, o comunicado emitido pela SAD do Porto estava correcto: de facto, o novo elemento (além de ter a estanha mania de permanecer no estúdio durante toda a duração do programa, honrando o contrato que o liga à RTP), emite livremente opiniões que são da sua exclusiva responsabilidade. O novo modelo do programa faz lembrar o tempo em que Rui Moreira não era sequer candidato a sócio do ano, antes de ter percebido que as suas opiniões não eram as mais correctas, quer para as suas ambições inconfessadas, quer para a sua saúde. Espero que o estádio do Dragão tenha corredores espaçosos: há mais um jogador para albergar.

P.S. - Tanto Miguel Sousa Tavares (que esta semana nos obsequiou com uma excelente redacção subordinada ao tema A Caça aos Patos) como Rui Moreira (que fornece aos leitores informações interessantíssimas, como o facto de não ter visto um jogo por estar a entreter um Sr. Que até é comendador) insistem que eu não escrevo aqui sobre o que devia. O jurista que cita a declaração de independência pensando estar a citar a constituição americana considera que eu não sei do que falo; o comentador desportivo que foi despedido por não comentar tem reparos a fazer aos meus comentários. Vivemos num mundo estranho.

Ricardo Araújo Pereira, in A Bola

Heresia

"'Deixem jogar o Mantorras.'
Todos se lembram, a frase entrou, lancinantemente, na linguagem das gentes da bola. Também entrou, não menos lancinantemente, nos afectos maiores das gentes vermelhas. Fez-se até oração. E quando o deixaram jogar, o Pedro levou tantas vezes o delírio às bancadas.
'Deixem jogar o Mantorras.' A frase, cuja paternidade reivindico, foi o mote de uma conferência de Imprensa, corria Agosto de 2001. Lá esteve o Pedro, também o Eusébio, ainda o Simões. Lá estive eu, depois de chamados os jornalistas, exigindo condições para que o Pedro pudesse exteriorizar todos os seus predicados.
'Deixem jogar o Mantorras.', porque havia, nessa altura, defesas cruéis que o castigavam de forma ímpia. Massacravam-lhe o corpo, amarrotavam-lhe a alma. Também nessa altura, árbitros houve que ignoraram as grosserias, as agressões. Prejudicaram o Pedro, prejudicaram o Benfica, prejudicaram o futebol.
'Deixem jogar o Mantorras.' , porque, nessa altura, mais à frente também, o Pedro exibia fundações de mestre, parecia jogador infinito. Sempre com aquele ar de menino puro, sempre com aqueles resquícios de futebol virginal. A bola, com ele, percebia-se mais mimosa.
'Deixem jogar o Mantorras.' Aflitivamente, não deixaram, não deixam mais. O Pedro despede-se com títulos? Despede-se ainda no limitado território da lenda."

João Malheiro, in O Benfica

Jonnny Haynes: 'O Eusébio só ganha 50 libras por mês? Eu faria greve'

"Eusébio nasceu em Janeiro de 1942. Quando chegou a Portugal via Lourenço Marques, em Dezembro de 1960, só tinha 18 anos. Menos de um ano depois, em Outubro de 1961, já era o novo Pelé. À conta dos três golos ao Santos de Pelé em pouco mais de um quarto de hora num torneio internacional em Paris, mas também de outros dez marcados no campeonato em meia dúzia de jogos.

Esta pontaria assinalável para um jovem tão inexperiente mereceu a convocatória para a selecção nacional, chamado por Fernando Peyroteo, outro fura-redes. A estreia foi amarga, na surpreendente derrota com o Luxemburgo (2-4), na qualificação para o Mundial-62. Três semanas depois, Eusébio encarou Wembley (2-0 para a Inglaterra) e foi a última vez que se ouviu o seu nome. A partir daí, foi Pantera Negra. Por culpa de Walter Winterbottom, seleccionador inglês, que gritava a plenos pulmões para Flowers.

"Flowers, look at the Black Panther." Flowers é o defesa do Wolves, marcador de Eusébio, campeão mundial em 1966 sem jogar um minuto - só recebeu a medalha de campeão em Junho deste ano, por cortesia de Gordon Brown. E Black Panther é o Pantera Negra, ou Eusébio, anteriormente conhecido como Pérola Negra, alcunhado pela imprensa francesa em Junho de 1961 (à conta do tal hat trick com o Santos de Pelé), que calou Wembley duas vezes, com remates ao poste.

Pois bem, o Black Panther, com 19 anos e no primeiro ano de profissional pelo Benfica, ganhava quatro contos, qualquer coisa como 1357 euros à luz do que se ganha hoje. Embasbacados com o talento de Eusébio, os ingleses festejaram a qualificação para o Mundial-62 no Chile, claro, mas preferiram enaltecer as qualidades daquela força da natureza. E o capitão Johnny Haynes estava mais que admirado. Perguntou tudo ao enviado especial do jornal "A Bola" e quando soube do salário dele, soltou: "Cinquenta libras? Eu fazia greve." E ele, Haynes, sabia do que falava.

Mais conhecido como maestro, foi uma espécie de Beckham dos anos 50/60. Pelé diz que ele foi o melhor passador que já viu, e Haynes foi o primeiro jogador a fazer publicidade, para a Brylcreem, um produto masculino para o cabelo. Além disso, Haynes, companheiro de Bobby Robson no Fulham, clube que representou por 18 anos, está na história do futebol inglês por ter sido o primeiro a ganhar 100 libras por semana, precisamente a partir de Agosto de 1961, quando se registou um entendimento entre a Associação de Jogadores e a Federação para a abolição do tecto salarial de 20 libras.

Tommy Trinder, folclórico presidente do Fulham, disse logo que Haynes valia o triplo. Errado. Valeu o quíntuplo. De 20 para 100 libras. E Haynes disse não ao Milan, que oferecera 800 mil libras para o Fulham, o que quebraria o recorde de transferências da época (menos de metade naquela época) e faria dele o jogador mais bem pago do mundo. Haynes não quis. Preferiu o Fulham, onde jogou oito épocas na 2.a divisão, durante as quais, curiosamente, foi o capitão da selecção. Nessa qualidade, insurgiu-se contra o salário de Eusébio. Que depressa foi aumentado. E porque dinheiro traz felicidade, o Benfica e a selecção portuguesa foram felizes à conta dos remates de Eusébio. Aqueles da bola ao poste e (já agora) os outros que deram golo."

Rui Tovar, in ionline